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2 FENOMENOLOGIA E MODELAÇÃO NUMÉRICA DO COMPORTAMENTO DO

2.2 Fenomenologia

2.2.1 Hidratação do cimento

Nos primeiros dias de cura o betão experimenta uma importante variação de temperatura, decorrente do calor libertado pela reacção de hidratação do cimento. De facto, o conjunto das reacções químicas responsáveis pelo desenvolvimento da microestrutura resistente da matriz cimentícia tem um carácter marcadamente exotérmico. O processo de hidratação do cimento pode ser dividido em quatro fases distintas representadas na Figura 2.1: (i) a fase plástica ou inicial, que ocorre quando a água e o cimento entram em contacto, e inclui uma primeira fase em que têm lugar reacções altamente exotérmicas - donde surgem os primeiros produtos de hidratação à superfície das partículas de cimento -, seguida de um período de dormência devido ao efeito protector desta camada formada em torno das partículas, que desacelera a hidratação; (ii) a fase de presa, quando os produtos de hidratação começam a desenvolver-se nos espaços existentes entre as partículas de cimento ainda não hidratadas (a presa ocorre aproximadamente entre as 5-15 horas de idade, dependendo de factores como o tipo de cimento e a presença de adjuvantes); (iii) a fase de formação do esqueleto básico, em que se formam produtos de hidratação instáveis, caracterizado por uma fase inicial de grande reactividade até ser atingido um pico, seguido por um período de desaceleração; e finalmente (iv) a fase de formação do esqueleto sólido,

caracterizada por velocidades de reacção inferiores, em que se dá a formação de produtos de hidratação estáveis.

Figura 2.1 Processo de hidratação (Atrushi 2003)

2.2.2 Variações volumétricas nas primeiras idades do betão

O betão, ao longo dos processos de hidratação e ganho de resistência, experimenta deformações intrínsecas decorrentes de variadas causas: retracção (plástica, autógena, de secagem ou de carbonatação), deformação térmica e fluência. Alguns destes fenómenos ocorrem simultânea ou sequencialmente, sendo que a soma de todos as componentes resulta na deformação total, como se apresenta esquematicamente na Figura 2.2. A retracção plástica εp é causada por uma perda prematura de água devido a evaporação ou absorção, e pode ocorrer antes da solidificação, numa fase denominada como as ‘muito primeiras idades’ do betão. A retracção autógena εa é uma diminuição de volume, consequência directa do processo físico e químico provocado pela hidratação, e é principalmente gravosa no caso dos betões de alto conteúdo em cimento. A retracção de secagem εh desenvolve-se como resultado da perda de água livre dos poros do betão para o meio ambiente, e revela-se maioritariamente na fase de pós cura. A retracção por carbonatação εcar é o resultado da reacção química entre os produtos de hidratação e o dióxido de carbono existente no ar, e ocorre nas camadas de betão expostas ao meio ambiente. A deformação por fluência εφ é devida a um fenómeno de

fluxo de humidade interna, sendo de relevante importância desde as idades jovens. A deformação térmica εt é causada pelo calor proveniente da hidratação do cimento, sendo especialmente gravosa em estruturas de betão em massa ou com elevada dosagem de cimento. Além das deformações referidas podem naturalmente ocorrer ainda

deformações devidas a acções exteriores, εs, e devidas a variações externas de temperatura, εt,e.

Figura 2.2 Períodos de ocorrência de diferentes tipos de deformações no betão (Glisic e Inaudi 2006)

As deformações mais relevantes para as primeiras idades do betão, e que serão objecto de discussão no âmbito deste trabalho, são as decorrentes dos gradientes térmicos gerados pelo calor libertado pela reacção de hidratação do cimento e pela interacção com o meio exterior, a retracção autógena e a fluência.

2.2.3 Tendência de fissuração do betão jovem

O betão jovem, devido à sua relativa baixa resistência à tracção e aos fenómenos intrínsecos que levam à ocorrência de variações volumétricas, apresenta uma elevada propensão para a fissuração. De facto, o ciclo térmico causado pela libertação do calor de hidratação nas primeiras idades, conduz a expansões e contracções volumétricas que, na presença de restrições internas ou externas, podem levar à ocorrência de fissuração das estruturas antes destas serem colocadas em serviço.

As estruturas de betão estão sempre sujeitas a restrições de alguma natureza. As restrições internas surgem a partir de gradientes de temperatura e humidade, ou em resultado da não uniformidade das propriedades materiais em diferentes localizações nos elementos de betão. As restrições externas são causadas pela existência de outros elementos adjacentes às estruturas em estudo. Deste modo, é a existência de restrições que transforma as deformações de origem térmica e de retracção autógena em tensões auto-induzidas.

Nas primeiras horas de cura o betão apresenta baixas rigidezes e resistências mecânicas, que vão evoluindo à medida que a reacção de hidratação se processa. Ao

longo da hidratação, por um lado, o aumento da resistência à tracção do betão diminui o risco de fissuração, mas por outro lado, o desenvolvimento da rigidez conduz a um agravamento das tensões auto-induzidas. Desta forma, existe uma competição interna entre o desenvolvimento das tensões auto-induzidas e da resistência à tracção, sendo que a existência da relaxação proveniente da fluência ajuda na limitação daquelas tensões. No entanto, no instante em que as tensões de tracção igualarem a resistência à tracção do betão poderão ocorrer fissuras.

O desenvolvimento das tensões auto-induzidas e das propriedades do betão ao longo da hidratação podem ser estimadas numericamente através de modelos termo- mecânicos, como o que exporá seguidamente. A aplicação destes modelos requer a caracterização experimental das várias propriedades térmicas e mecânicas do betão.

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