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FIGURA 21 MAPA: CONCENTRAÇÃO DOS CTDI, VITÓRIA

O outro conglomerado foi formado pelos bairros Ilha do Príncipe, Vila Rubim, Quadro, Cabral, Caratoíra e Santo Antônio com um raio de influência de aproximadamente 500m. O mesmo congregou cerca de 19% dos 499 CTDI da capital capixaba.

Insta salientar que um conglomerado com níveis médio-baixos (cores de tonalidades verdes) ficou evidenciado pelos bairros Ilha das Caieiras, Redenção, Santo André,

São Pedro, Santos Reis e São José. O referido cluster apresentou um raio de influência de 400m e concentrou cerca de 6% das 499 ocorrências de tráfico de drogas ilícitas.

Por meio da interpretação cartográfica dos mapas de concentração de Crimes Violentos contra a Pessoa - CVPES (figura 10, p. 71) e de Crimes de Tráfico de Drogas Ilícitas - CTDI (figura 21) constatou-se uma forte correlação espacial, sobretudo, nos conglomerados da Ilha do Príncipe e Penha. Essa correlação, como já ressalvado, de ordem espacial, revela a existência de uma associação positiva entre os CVPES e CTDI nas referidas regiões.

Realizando uma ampliação da análise cartográfica por meio do mapa populacional segundo o gênero das pessoas residentes (figura 12), da composição de mapas da população segundo as faixas etárias (figura 14) e dos mapas que conjugaram informações referentes aos níveis de instrução dos chefes de domicílios e a distribuição espacial das escolas de ensino público (figuras 16 e 17), comprovou-se que os clusters da Ilha do Príncipe e Penha além de registraram predominância de pessoas residentes do sexo masculino, prevalência de população infantil, adolescente e jovem, altas taxas de analfabetismo e predomínio de responsáveis pelos domicílios que cursaram apenas o ensino fundamental, também evidenciaram um problemático déficit no número de escolas públicas de ensino médio. Tais características são de fundamental relevância para compreender a correlação entre os CVPES e CTDI nessas regiões.

Várias pesquisas ressaltam a associação dos crimes contra a pessoa, em especial os homicídios, com os crimes de tráfico de drogas ilícitas como o ápice da violência, ou seja, quando este fenômeno social assume suas características mais atemorizantes, bárbaras e cruéis: confrontos armados em espaços públicos entre gangues, chacinas, execuções, eliminação de informantes, punições severas aos devedores e outros tipos de atrocidades.

Os CVPES podem estar associados à problemática das drogas devido à combinação de uma série de fatores. Uma corrente de estudiosos do campo da saúde aponta para a importância dos efeitos das substâncias tóxicas sobre o comportamento das pessoas. Segundo Minayo (1998, p. 36), a combinação drogas

ilegais e violência é um tanto que complexa. O uso dessas substâncias pode implicar mudanças das funções cognitivas, estados emocionais, hormonais e/ou fisiológicas dos usuários. Tais alterações, que variam facultativamente de indivíduo para indivíduo, podem motivar a violência. A autora citada também chama atenção para o problema da abstinência. De acordo com ela, assim como os usuários ativos, as pessoas em abstinência de drogas tornam-se passiveis à cometer transgressões.

Além disso, as influências do meio e as características sócio-culturais individuais e coletivas dos usuários de droga não devem ser descartadas. A respeito disso, Zaluar (2004, p. 29) ressalta que “a motivação para o ato desviante, para se efetivar, sofre os efeitos combinados das novas formas de organização familiar, dos novos padrões de consumo, do novo ethos do trabalho, do hedonismo e do sistema escolar”.

Outrossim, a referida autora também indica que o mais consistente e significativo nexo entre crimes contra a pessoa, sobretudo, os letais, e as drogas ilícitas encontra fundamento na atuação das quadrilhas do tráfico. As ações violentas, perpetradas pela delinqüência organizada, são geralmente promovidas em decorrência das disputas de território que se resumem em estratégias de proteção, controle e ampliação do mercado e subordinados.

Segundo Zaluar (2004, p. 13), a associação do uso de drogas e armas de fogo, dinheiro no bolso, conquista de mulheres, do enfrentamento da morte e a concepção de um indivíduo completamente autônomo e livre, revela que as práticas do mundo do tráfico se vinculam a um etos da virilidade, que por sua vez é centrado na idéia de chefe. Talvez por isso, observa-se a completa perda dos valores da vida nas comunidades assoladas pelo tráfico. Para o tráfico não há distinção de valores, isto é, o usuário que deve R$ 5,00 tem o mesmo tratamento daquele que possui uma dívida de R$ 50,00. Caso o débito não seja zerado, nas duas circunstâncias a vida se torna moeda de troca.

Em meio à desestruturação familiar, descrédito e insegurança social, falta de espaço e escolarização para um trabalho qualificado, ineficiência de serviços e equipamentos coletivos que proporcionem condições básicas de vida, ambiente degradado, apelo midiático ao consumismo exacerbado e a espetacularização da violência (alguns destes aspectos serão melhor explorados nos próximos subitens),

parte dos adolescentes e jovens dos bairros desprivilegiados passam a ver os traficantes, que possuem cargos mais altos (soldados, vapor, fiel, sub-gerente, gerente da boca, gerente geral, dono) como modelos de heróis.

A transformação quase mágica da vida sofrida de seus familiares e as chances de tornar possível o acesso aos bens de consumo da moda (celular, acessórios, roupas e outros produtos ostentados pelas classes privilegiadas) são os ingredientes básicos que levam parte dos jovens das comunidades desprivilegiadas para o mundo do tráfico. Com o recurso da droga, o adolescente expressa toda a fantasia de poder. A “viajem” anula as barreiras e frustrações, fazendo com que ele se sinta visível à sociedade que outrora o deserdou.

As expectativas de participar das investidas de assaltos e roubos, integrar a gangue, sentir-se mais forte diante dos inimigos, portar armas e de ascender na hierarquia da estrutura organizacional da “boca de fumo” nutrem o imaginário desses jovens. Entretanto, eles sabem que o ingresso no mundo do tráfico denota perdas importantes, como a morte prematura.

A partir daí, compreende-se por que tantos jovens matam-se uns aos outros devido a brigas e rivalidades individuais e comerciais, “seguindo o padrão estabelecido pelo crime organizado, que, além de criar as regras terroristas de lealdade e submissão, distribui-lhes fartamente armas de fogo moderníssimas” (ZALUAR, 2004, p. 34). A respeito das armas de fogo, instrumento utilizado para impor respeito e dominação nos bairros assolados pelo tráfico de drogas ilícitas e disseminar a cultura do medo em toda a cidade, o mapa da figura 22 revela que o registro dos Crimes de Armas e Munições - CAM apresenta-se concentrado justamente nas áreas que evidenciaram altos graus de concentração de Crimes de Tráfico de Drogas Ilícitas - CTDI e/ou Crimes Violentos contra a Pessoa - CVPES. Isso pode ser melhor corroborado pela análise cartográfica conjugada das figuras 10, 21 e 22.