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FIGURA 3 REPRESENTANTES DAS MULHERES DE TODO O BRASIL

1 A JOVEM AMABILIA E MARIA DA CONCEIÇÃO: A AFIRMAÇÃO DE UMA CONSCIÊNCIA DE GÊNERO.

FIGURA 3 REPRESENTANTES DAS MULHERES DE TODO O BRASIL

DISCUTIRAM SEUS PROBLEMAS FONTE: DIÁRIO DO POVO, 26/11/1949. p.5

A matéria trazida pelo jornal discute os trabalhos desenvolvidos nessa I Assembléia Nacional de Mulheres, que aconteceu na cidade do Rio de Janeiro, entre os dias 14 a 18 de novembro de 1952, que teve a participação de representantes de mulheres oriundas de vários cantos do Brasil, para a discussão dos direitos das mulheres e a luta pela paz. Segundo a reportagem, nessa Assembléia se encontrava uma grande parcela da população feminina representando as Federações, Associações e Organizações femininas de cada região do país e a Bahia se fez presente nesse encontro, através da AFB e tendo como representante a poetisa baiana Elisa Bandeira.

A AFB trouxe uma proposta mais ampla que a da União Democrática Feminina93 (1945), pois além do trabalho que se caracterizava nos bairros e basicamente no apoio às lutas pelo direito à moradia, defendendo as invasões, tinha o intuito de atingir outros setores da população feminina como profissionais liberais, operárias, etc. Em seu programa de trabalho incluía uma nova reivindicação específica; a reforma do código civil, resolução essa aprovada na primeira Convenção Estadual das Mulheres Baianas (1951). Fazia, também, protestos contra as injustiças no Estado e buscava a solução através de denúncias e reivindicação (O MOMENTO, 1950).

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A UDF foi uma entidade muito importante criada em 1945, pois era uma articulação internacional capitaneada pela URSS.

FIGURA 4 - PROTESTO DA A.F.B. NA CÂMARA FONTE: Diário do Povo, 14/11/1952, p.1

A matéria do jornal enfoca esse outro lado político da AFB, que não deixava passar sem uma reivindicação para reparação das injustiças pelo qual passava a sociedade. Nesse momento, a notícia fala de mulheres lutando por questões gerais a exemplo dos atos arbitrários que vinha acontecendo na cidade contra a população. Amabilia e os membros da associação buscavam o apoio de todos os segmentos da sociedade para fortalecer essa luta. O objetivo era atingir e chamar atenção dos órgãos competentes para os abusos cometidos pelo Estado e para que conseguisse a resolução dessas questões, elas protestavam através de denúncias, passeatas e movimentação em geral, como mostra a notícia em O Momento. Amabilia já casada com Contreiras e envolvida com os movimentos de esquerda e acreditando que para mudar a situação do país era preciso participar da luta, ela se filia como membro da AFB, na primavera de 1952. Quando ela adentra para a associação, a presidência era ocupada pela Sra. Maiaze Valença e a entidade sobrevivia com muitas dificuldades, como a maioria das instituições da época. O momento era difícil, não tinha recursos para muitas atividades e funcionava com a ajuda dos membros e doações de pessoas e empresas, mas não tinha auxílio do Estado ou órgão Federal, até a impressa não ajudava na divulgação da associação, por acreditar que a entidade desenvolvia atividades subversivas, e isso se dava na maior parte pelo trabalho de denúncia que a AFB prestava contra as prisões ilegais e arbitrárias que aconteciam no estado por ordem da Comissão de Inquérito.

Nesse sentido, a interpretação que faço é de que, como a entidade era ligada as lutas sociais e algumas das mulheres envolvidas nessas atividades tinham vínculos com o Partido Comunista, era considerada uma entidade esquerdista e por levantar suspeitas subversivas não tinha ajuda para divulgação ou prestação de serviço público à população, logo só contavam

com o apoio do jornal O Momento94, órgão oficial do PCB na Bahia, um jornal de linha comunista, no qual jornalistas militantes do partido atuavam na direção do diário, que enfocava em suas páginas debates e informes em defesa dos direitos e reivindicação imediata da classe operária, como a luta contra a carestia. O jornal também realizava sabatinas e debates oferecendo o seu espaço como canal para veicular as reivindicações dos trabalhadores e se apresentava como seu porta-voz. Visava ainda diferenciar-se antagonicamente dos outros jornais do Estado, que se apresentavam como jornais das classes dominantes, a serviço do imperialismo e sustentados pelas forças retrógadas do capitalismo95.

Dessa forma, a AFB sobrevivia e atuava com recursos precários. A entidade ficava localizada na Rua Ruy Barbosa, atrás da Câmara de Vereadores, na Praça Municipal. Funcionava numa sala pequena, que fora cedida por amigos e de lá se concentravam os trabalhos sociais em prol das mulheres de bairros periféricos da cidade.

Dentro da AFB enquanto membro, Amabilia trabalhou nos bairros periféricos,96 e conseguiu várias associadas para o movimento que tendia a crescer. Nesse sentido, Amabilia utilizava a estratégia de reuniões com pautas que traziam em seu discurso as informações dos direitos da mulher; fazia palestras contra a carestia da vida, falava sobre saúde, higiene, cuidados com as crianças, o direito a creche, a união das mulheres em prol de suas demandas femininas 97. Assim, ela se articulava com os sindicatos, as fábricas de tecidos 98 localizadas na Cidade Baixa, através de moradoras locais que participam de suas palestras e a procuravam para falar das explorações no ambiente de trabalho (O MOMENTO, 1953). Nesse ínterim já se tornava uma figura conhecida pelo movimento e logo foi indicada à presidência da AFB. Em 1953, toma posse e torna-se a mais nova presidente da instituição feminina. Ela nos conta:

Eu virei presidente da Associação Feminina Baiana porque participava muito dos movimentos e ouvia as reivindicações daquelas mulheres nas associações de mulheres filiadas a AFB, tinha 21 associações, todas localizadas em bairros muito

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Jornal vinculado ao PCB, fundado em abril de 1945, tinha como diretor Almir Matos e redator J. Quintino de Carvalho. Funcionava na Ladeira de São Bento em Salvador. Imprensa combativa e polêmica, guiada pela ciência do marxismo-leninismo-stalinismo, representando as forças progressistas e o novo mundo do socialismo, mantido pelas classes trabalhadoras e sua vanguarda. Deixou de funcionar em novembro de 1957 por inúmeras perseguições e invasões da polícia em sua sede e pelas dificuldades em sua manutenção. Ver: Sônia Serra. O

momento: história de um jornal militante. Dissertação/UFBA, 1987.

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BIBLIOTECA PUBLICA ESTADO DA BAHIA. Subgerência de Periódicos; Setor de Períodos e Livros Raros. SSA, 2010.

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O Momento (1948-1953), fotografias do período da AFB e depoimento de Amabilia Almeida. 97

A forma como ela militava na busca de promover espaços de empoderamento das mulheres, possibilitando a estas refletirem de forma crítica acerca de como o fato de serem ―mulheres‖ regia as relações sociais, econômicas, culturais, políticas em que estavam envolvidas, é a sua atitude em promover palestras onde socializava com as associadas as discussões realizadas nos congressos em que participava.

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A respeito ver, o trabalho de: SARDENBERG, Cecília. Mulheres e sindicatos: presença feminina no sindtextil-Ba nos anos 50. In: Fazendo Gênero na historiografia baiana. SSA: NEIM/UFBA, 2001.

carentes, eram mulheres pobres que precisavam de atendimento e informação e a associação era uma organização ligada ao PCB. Eu não tinha filiação nenhuma com o partido, mas era simpatizante, exercia tarefas, participava, apoiava a linha do partido, lutava para tirar o povo da cadeia. Eu não era do PCB, mas fazia tudo o que o partido precisasse, éramos chamados nessa época pelas pessoas de os ―inocentes úteis‖, chamavam a gente assim.

Nesse depoimento percebemos que a AFB tinha uma articulação com o PCB para preparar as mulheres para frente nacionalista feminina na década de 1950. A associação atuava com mulheres que tinham de algum modo uma ligação ou vínculo com o partido, seja através de seus companheiros (como o exemplo de Amabilia), amigos ou mesmo parentes e isso era significativo porque o partido assim podia atuar como contraponto, assessorando e organizando os movimentos de base através dessas mulheres. Nesse sentido se criavam novas formas de estruturação e de mobilização, embasadas na criação de redes, articulações setoriais, regionais e nacionais, a exemplo das 21 associações de mulheres filiadas a instituição.