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GREVES E MOVIMENTOS OPERÁRIOS NA FOTOGRAFIA DO INÍCIO DO SÉCULO

1. O FINAL DA MONARQUIA

Os trabalhadores da primeira década do século XX são apresentados como tendo razões para as suas reivindicações. Havendo uma certa aceitação dos dirigentes operários cujos atos fúnebres e comemorativos eram noticiados. Viviam-se os anos finais da monarquia, sendo o apoio operário fortemente disputado pelos dois lados em confronto. Mesmo assim, em algumas situações, criticavam-se as formas de luta, tentando fazer a separação entre os operários que lutavam por meios legítimos e os que, irresponsavelmente, praticavam

3 José Pedro de Aboim Borges, Joshua Benoliel- Rei dos fotógrafos, (Tese policopiada de

excessos. Esta divisão era feita para os representantes do movimento operário estrangeiro de passagem por Portugal que podiam ter uma cobertura semelhante à de outro político ou um tipo de tratamento fortemente desfavorável, quase como se fossem criminosos.

As primeiras notícias com fotografia são do 1.º de Maio que vão aparecendo na Ilustração Portuguesa a partir de 1905. Neste ano, trata- se de fotografias de multidão, sem grande realce para os dirigentes, mas com mulheres, crianças e ramos de flores. Tudo é descrito como «A Festa do Trabalho», havendo uma conotação positiva, mas ainda não muito politizada. É sobretudo uma festa popular. Note-se que em 1905 se está ainda na 1.ª série da Ilustração Portuguesa em que ainda não há muitas fotografias, a sua presença é um sinal da importância dada ao 1.º de Maio4.

Em 1907, e já na 2.ª série da Ilustração Portuguesa, que tem muito mais fotografias, há de novo imagens do 1.º de Maio. São fotografias conhecidas que têm sido reproduzidas em várias obras sobre a época, sobre os movimentos operários, ou mesmo sobre fotografia. Estas fotografias são muito diferentes. São centradas nos dirigentes e nos discursos que fazem em cima de uma carroça, há fotografias feitas de longe dos dirigentes e também uma da multidão5.

4 Ilustração Portuguesa 8/05/1905. 5 Ilustração Portuguesa 13/05/1907.

Estas imagens são já, claramente, de um acontecimento político que se sobrepõe ao lado festa da fotografia de 1905. Há dirigentes a discursar, há uma clara visão de que se está a transmitir uma mensagem política. A visão continua a ser favorável, estas movimentações iam no mesmo sentido de outras que foram, de certa forma, minando o regime existente.

No 1.º de Maio de 1908 temos, ao mesmo tempo a componente política, com a fotografia dos dirigentes e a presença da multidão, mais marcada que em 1907, mas a visão continua a ser semelhante e positiva6.

As grandes iniciativas do movimento operário, em especial o 1.º de Maio, eram o principal alvo de cobertura fotográfica no que respeita ao movimento dos trabalhadores. Na maioria das imagens, estes são apresentados como uma massa anónima em manifestação. O primeiro objetivo era dar uma ideia do número de pessoas presentes, o que obrigava a planos afastados. As exceções ao anonimato são dadas pelas inevitáveis fotografias dos oradores dos comícios. Estes tentam assumir o aspeto da respeitabilidade burguesa: não seria pelo aspeto, pela atitude e pela pose dos oradores que se distinguiria uma manifestação operária de um comício republicano. O 1.º de Maio era a exceção à regra da cobertura fotográfica das iniciativas operárias ser limitada a Lisboa, já que os números da Illustração Portuguesa das semanas seguintes iam apresentando fotografias das manifestações em várias localidades do país. Estas eram feitas por amadores locais que as enviavam para a revista, o que mostra que estas situações se incluíam no grupo das fotografáveis para os amadores.

Se os oradores se apresentavam de forma semelhante num comício operário ou republicano, é a nível dos assistentes que se encontram as maiores diferenças. Mesmo sendo possível acreditar que houvesse alguns assistentes comuns, a predominância dos bonés no comício operário é fácil de distinguir da massa escura dos chapéus das iniciativas republicanas. Esta era a única forma de identificar socialmente as pessoas presentes, dada a utilização de planos afastados e a baixa qualidade da reprodução. De notar, tanto nuns como noutros, a presença de um número reduzido de mulheres.

O tratamento fotográfico que é dado a movimentos republicanos e operários é bastante semelhante, mesmo nas publicações pró- republicanas. O movimento reivindicativo operário não representava

ainda uma ameaça, talvez fosse visto, na maior parte dos casos, como um aliado, criando-se mesmo alguma confusão entre os dois.

Esta visão parece ter continuidade nos primeiros tempos que seguem a implantação da República com o aparecimento, nas semanas seguintes, de fotografias de heróis da revolução, dos quais muitos eram operários, alguns dos quais tinham fabricado e colocado bombas. Estes conseguem sair do anonimato da fotografia das multidões, ou do instantâneo do dirigente discursando para a população, para ter honra de retrato individual, ou em pequeno grupo, por vezes com a encenação do fabrico das bombas que tinham feito para a revolução republicana. A atitude da imprensa era entendida pelos próprios operários como favorável, o que explica a manifestação que os corticeiros fizeram a agradecer o apoio que lhes tinha sido prestado por O Século7, mesmo se

esse apoio se devesse, seguramente ao motivo da greve: a luta contra uma lei que previa a exportação de cortiça em bruto.

2. GREVES E MOVIMENTOS NO PERÍODO REPUBLICANO