• Nenhum resultado encontrado

2. Júlio César Machado e o folhetim

2.4 Folhetins de outros periódicos

Da longa lista de títulos de periódicos onde Júlio César Machado prestou contributo, muitos acolheram os seus textos em formato folhetim, o que habitualmente implicava uma colaboração em vários números, sendo de menor extensão os casos de folhetins esporádicos – estes, aliás, sucediam por vezes como transcrição realizada a partir de outro jornal. As largas dezenas de publicações periódicas em que o autor colaborou repartem-se por revistas e jornais literários, noticiosos, ilustrados e números

35

comemorativos. Em muitos deles, trata-se de prestações episódicas, e, por outro lado, encontram-se vários textos repetidos em diferentes publicações, uns na íntegra, outros parafraseados. A natureza dos textos divide-os em dois grandes blocos maioritários: crónicas de actualidades e contos breves.

No que se refere ao folhetim em particular, ele surge muito cedo na carreira de Júlio César Machado. Embora se costume associá-lo de imediato ao jornal A Revolução de

Setembro, em outros locais já tinha o autor experimentado o folhetim antes de entrar nessa

empresa. É no nº 930 do jornal A lei, datado de 3 de Novembro de 1852, que encontramos o primeiro folhetim de Júlio César Machado, acabado de completar 17 anos. Na biografia escrita por Napoleone Portalupi, menciona-se também os folhetins de A lei como os primeiros de Machado (1873: 7). Nesse mesmo jornal tinha Mendes Leal, seu redactor, publicado em folhetim o drama O tributo das cem donzelas, depois de aí publicar também a comédia A afilhada do barão (1851). Os folhetins de crónica dos teatros eram assinados por Luís de Vasconcelos, que se debatia com a dificuldade de contornar a pressão exercida pelos partidos que se formavam em torno das cantoras líricas do São Carlos.

O primeiro folhetim de Júlio César Machado versa nem mais nem menos do que o teatro, no aspecto da crítica teatral, que haveria de marcar toda a sua carreira jornalística. Recenseia o momento coevo da crítica, enquanto árbitro severo da moral no teatro; por outras palavras, reproduz o ideário liberal de fazer do teatro “uma escola de moral, espelho em que a sociedade, os seus costumes e vícios, se devem retratar exacta e francamente”. Preconiza, em consequência, uma indissolúvel ligação entre teatro e crítica. Embora conhecendo o teatro um grande desenvolvimento entre nós durante o século XIX, em especial depois da vitória definitiva do regime constitucional, o jovem Machado ecoa no seu primeiro folhetim o comum lamento de que, afinal, o estado do nosso teatro era deplorável: “Nem obras nem actores! (…) Não há gosto pelas letras, nem entusiasmo pelo teatro!” (A lei, 3.11.1852).

Júlio César Machado prosseguiu os seus folhetins no jornal A lei até 9 de Junho de 1853, em parte deles escrevendo sobre teatro, e na outra parte publicando o romance contemporâneo Estêvão: páginas da última noite de vida. No total, perfazem 14 folhetins. Em relação aos de crítica teatral, é digno ainda de nota o folhetim de 23 de Abril de 1853, que se debruça sobre o drama em 3 actos Rafael, de Ernesto Biester, o qual se começou pouco depois a publicar em folhetins do mesmo jornal A lei.

Uma série assinalável de folhetins de Júlio César Machado foi publicada num total de 53 números da Gazeta do povo, entre 21 de Outubro de 1869 e 20 de Outubro de 1870.

36

A série intitulava-se “Cartas lisbonenses”, que era, no fundo, outro modo de dizer a revista de Lisboa. Foi, sem dúvida, um espaço pensado e negociado, uma vez que o primeiro da série apresenta o autor e enuncia o que os leitores dele podem esperar, todas as quintas- feiras. Na maior parte destes folhetins que se prolongam por um ano, uma vez por semana, o assunto é a discussão das peças em cartaz na capital. Eis aqui algumas delas: O judeu

polaco, Os solteirões, A judia, O lago de Killarney, O viver de Paris, A lei dos morgados, A ponte dos suspiros ou O dente da baronesa.

Nos periódicos, Júlio César Machado assinou algumas vezes sob pseudónimos, dos quais se conhecem Zzzt, Odacham, Carolina e Oiluj. Ora, é relativamente ao pseudónimo Carolina que surge um conjunto significativo de folhetins que Machado escreveu, primeiro para o Rei e ordem, a partir de Fevereiro de 1860, e depois para A política liberal, em 1860-1861. Este grupo de artigos configura-se também ele como revista da semana, mas com a particularidade de se colocar na perspectiva de uma senhora. Veja-se, por exemplo, alguns dos temas do folhetim de 19 de Julho de 1860 n’A política liberal: “Dicionário de frases para uso das senhoras portuguesas”, “A prosa do belo sexo”, “Toilette dos cavalheiros”, “Jornal das damas, ou a mulher do século XIX”. O voto é mesmo o de que “os folhetins de Carolina ergam o grito da emancipação da mulher e da defesa dos seus direitos” (A política liberal, 19.7.1860).

Os temas são, por conseguinte, de molde a agradar o público feminino. Enquanto revista da semana, inclui o exame dos espectáculos, mas em menor quantidade, visto que “uma senhora não pode andar a saltar do Salitre para a Rua dos Condes, e daqui para o Rossio”, como um folhetinista masculino (A política liberal, 2.8.1860). Deste modo, Júlio César Machado assume a personagem feminina. Tem temas específicos, distintos, como modas, direitos das mulheres, relações com os homens. E, quando fala Carolina, apresenta uma perspectiva diferente da de Machado, que a tenta adaptar aos gostos de uma senhora letrada.

São de destacar, por último, os folhetins que Machado escreveu para o Jornal do

comércio do Rio de Janeiro entre 1880 e 1886, juntando-se assim ao número dos escritores

portugueses, como Eça de Queirós e Guilherme de Azevedo, que naquela época colaboraram assiduamente na imprensa brasileira. No caso de Júlio César Machado, trata- se de crónicas de Lisboa enviadas ao Rio, comunicando o que de mais relevante se passava na sociedade lisboeta, bem como as novidades políticas, sociais, económicas e culturais. O Museu Municipal do Bombarral conserva dois álbuns de recortes organizando escrupulosamente este conjunto de folhetins.

37