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Capítulo 3. Descrição da área de estudo e metodologia

3.2. Fonte de dados

Os dados primários provêm dos levantamentos sociodemográficos (surveys) em uma unidade territorial no Pará, realizados no âmbito do projeto de pesquisa “Desflorestamento da Amazônia e a Estrutura das Unidades Domésticas” executada pelo Núcleo de Estudos de População da Universidade Estadual de Campinas (NEPO/UNICAMP) em parceria com a Anthropological Center for Training and Research da Universidade de Indiana (ACT/IU).

Consultar Côrtes (2012b) para obter o detalhamento sobre as motivações e metodologia do projeto.

A unidade amostral da pesquisa adotou a divisão territorial dos lotes originais do INCRA e o casal chefes do domicílio como sujeitos da pesquisa. Foram contemplados ao todo 402 lotes em uma área adjacente a BR-230, sobrepondo parte de Altamira, Uruará, Medicilândia e Brasil Novo. Os lotes foram selecionados com a estratégia para obtenção de um conjunto representativo para cada período de ocupação populacional na área. O pressuposto era de que o ano do primeiro indício de desmatamento representaria o início de ocupação no lote. Portanto, os lotes foram agrupados por períodos a partir de 1970, sendo selecionado de forma aleatória um número igual de lotes em cada um dos grupos.

Em 2005 retornou-se aos 402 lotes para novamente aplicação dos questionários no campo follow up e verificação das mudanças ocorridas ao longo do tempo. Durante o período o lote original do INCRA pode ter sofrido mudanças na sua dimensão, podendo ser agregada a outra (torando-se uma propriedade maior que a original) ou ter sido dividida em parcelas (tornando-se um conjunto de propriedades). A Figura 3.2 ilustra as possibilidades de mudança fundiária nas unidades entrevistadas de 1997/98 à 2005.

Figura 3.2. Mudança na estrutura fundiária dos lotes entrevistados em propriedades rurais durante o período de 1997/98 à 2005

Ao todo são nove tipos de questionários possíveis de serem aplicados, dependendo da condição do lote, conforme descrito a seguir.

A. Identificação da propriedade original (um por lote): Resumo com as principais mudanças na família e tamanho da propriedade, e o controle do campo

Lote do INCRA

Mesma dimensão (lote = propriedade)

Consolidação de lotes (ou partes) em uma propriedade

Fragmentação do lote em mais de uma propriedade

B. Descrição espacial da propriedade (um para cada propriedade oriunda do lote): principais características da propriedade e croqui com descrição espacial do uso e cobertura da terra

C. Unidade doméstica e composição familiar (um para cada domicílio nas propriedades): informações gerais e história de vida da mulher chefe do domicílio, características populacionais dos membros da unidade doméstica, história reprodutiva da mulher chefe do domicílio, e características do domicílio

D. Unidade doméstica e composição familiar- filha/nora fora do lote original (um para cada domicílio de filhas ou noras que deixaram de residir no lote): igual ao C. Aplicado somente se localizado dentro da área de estudo.

E. Economia e uso da terra (um para cada propriedade): informações gerais do homem chefe do domicílio, detalhes sobre aquisição da propriedade, descrição do uso e cobertura da terra e produção na propriedade

F. Economia e uso da terra- meeiros/empregados (um para cada meeiro residindo nas propriedades): versão resumida de E.

G. Economia e uso da terra- filho/genro fora do lote original (um para cada filho/genro que deixou de residir no lote): versão resumida de E. Aplicado somente se localizado dentro da área de estudo.

H. Economia e uso da terra- urbano (aplicado em domicílios urbanos chefiados por antigos residentes do lote, quer fossem donos ou filhos): informações gerais sobre homem chefe do domicílio, sobre o processo migratório e atividade atual.

I. Outras mulheres (todas as mulheres em idade reprodutiva residentes das propriedades): informações gerais sobre a mulher, história contraceptiva e reprodutiva

A pesquisa da tese utilizou somente os questionários: A, B, C, D, E, G e H. Dessa forma foram trabalhadas informações sobre a população e propriedades oriundas do lote original, assim como as informações sobre a população dos domicílios de ex-donos e filhos(as) que deixaram o lote e passaram a morar em outra localidade na área de estudo (urbano ou rural), e quando possível, dados sobre o uso da terra dessa nova moradia. Foi realizada também uma sistematização das anotações de campo presentes nos questionários, que foram usadas em diversos momentos durante a construção das variáveis.

A existência dos questionários D, G e H é fundamental para a proposta da metodológica da tese em reformular a unidade de análise na escala micro da mudança no uso e cobertura da terra. Estes questionários levantam informações de pessoas não residentes na área original do

lote do INCRA, possibilitando a construção do grupo familiar expandido. Estes questionários foram uma inovação do campo de 2005 e, apesar de não representar necessariamente o espaço de vida da família plenamente, pode ser interpretado como sendo uma amostra deste universo.

Para orientar a forma de condução do banco de dados e as análises foi realizado trabalho de campo retornando a 11 lotes previamente visitadas durante a pesquisa (1997/98 e 2005) na região de Brasil Novo, na BR230. Realizado em outubro de 2013, o propósito central do campo foi observar como quesitos dos questionários poderiam se aplicar para captar a dinâmica familiar. Uma vez que a projeto foi moldado para compreender a relação entre domicílio e uso da terra, uma parte fundamental na adaptação do banco de dados ao interesse da pesquisa é exatamente avaliar quais informações fazem menção a dimensão da família e quais fazem sentido para compreender o espaço de vida e tomada de decisão.

Pela logística de campo a pré-seleção dos lotes à visitar foi feita com base no raio de distância tendo como referência Brasil Novo, evitando perdas por deslocamento diário. A escolha do município para base do campo foi determinada pela facilidade de acesso e custo de estadia. A proposta inicial era visitar ao menos 10 lotes, selecionou-se, portanto, um número extra de 11, totalizando uma lista com 21 lotes potenciais a serem visitados. O pré-requisito adotado eram lotes que mantiveram os mesmo donos no período entre 1997/98 a 2005, garantindo uma perspectiva temporal. A lista priorizou a máxima de diversidade de arranjos populacionais e de patrimônio fundiário.

A primeira chave da seleção diz respeito da localização do domicílio do dono, garantindo ao menos um caso de residência urbana em Brasil Novo, de forma a explorar motivações da migração e as implicações no lote da relação urbana. A segunda chave buscou considerar a dinâmica temporal da família e formação de novos domicílios no lote. A última chave contempla a existência de outros lotes, quer seja do dono ou de filhos(as), para averiguar a existência de compartilhamento de terra e redes de suporte. O conjunto final em cada grupo contém exemplares com diferentes arranjos familiares (localização de filhos) e atividades produtivas (produção de anuais, perenes, gado e misto).

Dos 21 lotes selecionados foram realizadas entrevistas em profundidade em 10 delas, conforme mostra a Figura 3.3. Cada dia de campo previa o percurso de um travessão da Rodovia Transamazônica, sendo descartados os lotes vazios ou vendidos. A visita ao lote tinha um roteiro aberto de perguntas e previa uma caminhada no lote para verificação do uso e cobertura da terra. Participavam da entrevista todos aqueles presentes no domicílio e dispostos a colaborar, fornecendo diferentes pontos de vista sobre um mesmo assunto. As entrevistas foram

realizadas em todos os domicílios localizados no perímetro original do lote (conjunto de propriedades) e nos domicílios de filhos(as) fora do lote, quer seja em área vizinhas ou no urbano. Ao fim de cada visita tinha-se uma narrativa detalhada da história familiar e trajetórias de uso da terra, e uma visão qualitativa de como esses dois processos se conectam.

Figura 3.3. Estratégia para seleção dos lotes a serem visitados no trabalho de campo em Brasil Novo – PA, 2013

O trabalho de campo, além de auxiliar na seleção das variáveis e no processo de reorganização do banco de dados, foi importante em elucidar qualitativamente a relação entre família e mudança no uso e cobertura da terra, esclarecendo dinâmicas que os dados não seriam capazes de expor. Essa experiência foi fundamental para a elaboração do modelo teórico- conceitual que será apresentado no próximo item do capítulo, assim como deu suporte para construção da forma de análise da pesquisa que culminou na construção de três modelos comparativos para serem avaliados, apresentado adiante.

Os dados utilizados para o desenvolvimento das análises do Capítulo 5 são secundários, provenientes basicamente de duas fontes: o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para os dados dos quesitos populacionais e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) para os dados sobre uso e cobertura da terra. As bases utilizadas referem-se aos bancos de dados numéricos e espaciais, para a construção de uma grade comum de análise.

Com relação aos dados populacionais, utilizou-se o banco de microdados do IBGE para o Censo Demográfico 2010. No questionário da amostra do censo são preferencialmente utilizadas as variáveis de migração/mobilidade populacional e outros quesitos de caracterização demográfica, como sexo e idade. Para análises espaciais foram trabalhados os dados provenientes da Grade de Estatística 2010, uma grade regular com informações do volume de pessoas – discriminado por sexo – e a quantidade de domicílios ocupados segundo Censo Demográfico 2010 (questionário universo) – com células de 1 km2 nas áreas rurais e 250m2 nas áreas urbanas, aproximadamente. O datum adotado é o SIRGAS2000 em sistema de projeção cartográfica (BUENO; D’ANTONA, 2012; IBGE, 2016).

A disponibilidade destes dados surge pela demanda em utilizar dados populacionais dos Censos Demográficos em análises de geoprocessamento integrando-os com informações de diversas origens e escalas de abordagem. A utilização de uma grade regular possibilita a criação de unidades artificiais e a compatibilidade com dados ambientais, por exemplo com a definição de uma escala delimitada por uma bacia hidrográfica. Este formato de disseminação de dados também favorece os estudos que tratam de territórios que passam por variação na sua extensão num dado período de tempo (BUENO; D’ANTONA, 2012; D’ANTONA; DAGNINO; BUENO, 2015; IBGE, 2016). Os benefícios da Grade de Estatística em unidades regulares foram aplicados para a demarcação de territórios de análise e integração com dados sobre uso e cobertura da terra, oriundos de classificação de imagens de satélite.

Os dados de uso e cobertura da terra foram obtidos no Projeto TerraClass do INPE, que tem como objetivo central qualificar o desmatamento da Amazônia legal detectado pelo Projeto PRODES Monitoramento da Floresta Amazônica Brasileira por Satélite. O PRODES foi desenvolvido para produzir dados que auxiliassem o controle do desmatamento na Amazônia e portanto, se limita a classificar as imagens em áreas de floresta e desmatamento. O método prevê que o polígono classificado como desmatamento seja excluída dos próximos monitoramentos. O reconhecimento dessa limitação e a demanda por conhecer os usos e coberturas nas áreas desmatadas culminou no Projeto TerraClass (ALMEIDA et al., 2016).

O TerraClass apresenta o resultado do mapeamento do uso e cobertura da terra na Amazônia Legal para todas as áreas desflorestadas mapeada pelo PRODES a cada dois anos – 2004, 2008, 2010, 2012, 2014. A classificação é feita a partir de imagens de satélite Landsat com resolução de 30 metros (pixel de 0,09 hectares) e disponibilizadas no Sistema de Projeção Lat/Long e Sistema Geodésico de Referência SAD 69 (ALMEIDA et al., 2016). Para a análise do estudo utilizou-se somente os dados de 2010, trabalhando a classificação no referido ano e

a categoria antecedente classificada em 2008, permitindo a construção de matrizes de transição da terra. A área de estudo abrange dez cenas, identificadas na Figura 3.4. A metodologia permite trabalhar com 12 classes de uso e de cobertura da terra, conforme o Quadro 3.1. Figura 3.4. Identificação das dez cenas do satélite classificadas e utilizadas na análise do uso e cobertura da terra na área de estudo

Fonte: Retirado de INPE (2016), destaque em vermelho elaboração própria