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Formação continuada de professores para inclusão escolar: uma breve revisão de

2. FORMAÇÃO DE PROFESSORES, EDUCAÇÃO ESPECIAL E INCLUSÃO

2.1. Formação continuada de professores para inclusão escolar: uma breve revisão de

Os estudos sobre formação continuada de professores para a inclusão escolar tem se intensificado nas últimas décadas, especialmente em virtude das reformas educacionais associadas a processos de inclusão social em âmbito internacional e nacional. No Brasil a proposta de construção de sistemas de ensino inclusivos, tem direcionado o foco de atenção para a política de formação dos profissionais da educação, enfatizando formações para o professor do ensino comum, do ensino especializado e para gestores na perspectiva da Educação Inclusiva.

O conceito de formação continuada é explicitado por Santos (2001, p. 124) como sendo:

[...] todas as formas deliberadas e organizadas de aperfeiçoamento profissional do docente, seja através de palestras, seminários, cursos, oficinas ou outras propostas [...] voltadas para a qualificação docente, tendo em vista possibilidades de melhoria de sua prática pelo domínio de conhecimentos e de métodos de seu campo de trabalho.

De um modo geral, as formações continuadas podem se dá por iniciativas pessoais e/ou institucionais, podendo ser estas últimas, coletivas quando se envolve grupos ou individuais – um curso de especialização, por exemplo. As formações continuadas englobam cursos de atualização, capacitação, aperfeiçoamento, especializações e participações em eventos, palestras, congressos, oficinas que assumam o objetivo de contribuir com o aprimoramento dos conhecimentos atuação do professor como intelectual inserido em uma sociedade e um profissional da educação que busca constantemente, melhoria de sua prática pedagógica. Mas há intencionalidades ideológicas, políticas e pedagógicas que fundamentam as diversas concepções de formação continuada de professores que precisam ser problematizadas no interior deste debate.

Alarcão (2001) concebe a formação continuada dos professores com uma importância fulcral na construção de sua profissionalização, definindo-a como “um processo dinâmico por meio do qual, ao longo do tempo, um profissional vai adequando sua formação às exigências de sua atividade profissional” (ALARCÃO, 2001, p. 100).

A necessidade da formação de um profissional reflexivo que reflita na ação e sobre a ação pedagógica é destacada por diversos estudiosos que tomam a prática do professor como foco de análise e espaço rico para a produção de saberes profissionais. Com base nestas concepções, há uma defesa de que as propostas de formação de professores deverão se desenvolver considerando a própria realidade pedagógica e os saberes práticos dos professores e no seu exercício reflexivo (ALARCÃO, 1998; 2001; NÓVOA, 1992; 1995; PÉRES GÓMEZ, 1991; SCHÖN, 1991; TARDIF, 2000; 2001; 2002; 2003; PERRENOUD, 1993; 2001; 2002; ZEICHNER; 1993).

Há autores que defendem a concepção de professor reflexivo, mas que ressaltam que esta reflexão excede a realidade imediata da prática se articulando com o contexto maior da sociedade, destacando a necessidade de se ter um equilíbrio na valoração dos saberes práticos dos professores nos processos de formação, quando comparados aos conhecimentos teóricos e acadêmicos-políticos que constituem a profissão docente (CONTRERAS, 2002; GHEDIN, 2002; BENASSULY, 2002; LIBÂNEO, 2002; PIMENTA, 2002).

Para Benassuly (2002, p. 190):

Falar de professores reflexivos é proporcionar-lhes elementos por meio dos quais possam romper com ideologias tecnocráticas e instrumentais que, na maioria das vezes, perpassam sua prática cotidiana. É colocá-los no patamar de sujeitos políticos, capazes de refletir as mediações que estão postas no espaço de seus mundos vividos e no espaço social [...].

Ghedin (2002) assume uma postura crítica similar, reforçando que a experiência do professor pode gerar conhecimentos, desde que este assuma uma postura crítica sobre sua prática profissional em inter-relações com o contexto social, político, econômico e cultural.

A respeito da tendência expressa no uso do termo professor/a reflexivo/a nas propostas de formação alguns autores (BENASSULY, 2002; GHEDIN, 2002; LIBÂNEO, 2002; PIMENTA, 2002) analisam ser problemático o uso banalizado do termo sem a adoção de uma postura crítica nas reflexões. Na prática profissional do professor é necessário ir além dos muros da escola, sem se restringir a ações que visem à solução de problemas imediatos da prática, sem que se problematizem os determinantes sociais, políticos, econômicos e ideológicos que determinam as condições materiais e humanas de sua prática pedagógica.

Nos estudos que tratam da formação de professores, tem preponderado uma concepção de valoração da prática pedagógica do professor a chamada “epistemologia da prática” (PÉRES GÓMEZ, 1991; SCHÖN, 1991; NÓVOA, 1992; 1995; GAULTIER, 1998; TARDIF, 2000; 2001; 2002; 2003; PERRENOUD, 1993; 2001; 2002). Sem dúvida a prática pedagógica do professor é de grande relevância, por se constituir também um espaço de formação e produção de saberes, contudo, sem o diálogo coerente e intencional com os conhecimentos acadêmico-científicos, com o exercício intelectual e político do professor; esta restrição termina por alienar o ato “reflexivo” do professor, já que a reflexão sobre e na prática pedagógica, dificilmente se amplia aos determinantes sociais, culturais, políticos, ideológico e pedagógico que recaem sobre a educação.

Os saberes do professor não se originam apenas de sua prática, tem raízes nas teorias educacionais, o papel desta teoria que não pode ser negligenciado deste debate e no processo de formação continuada. Neste espaço formativo é possível ampliar as oportunidades de articulação teórica e prática no trabalho pedagógico do professor, condição necessária para sua prática reflexiva e crítica. Pimenta (2005, p. 24) esclarece esta concepção:

O saber docente não é formado apenas da prática, sendo também nutrido pelas teorias da educação. Dessa forma, a teoria tem importância fundamental na formação dos docentes, pois dota os sujeitos de variados pontos de vista para uma ação contextualizada, oferecendo perspectiva de análise para que os professores compreendam os contextos históricos, sociais, culturais, organizacionais e de si próprios como profissionais.

A problemática é, quando somente os saberes da prática são enlevados, com destaques para saberes técnico-instrumentais do “saber fazer” docente. Segundo Freitas (2002) essa é a tendência mais forte presente nas políticas de formação de professores.

Nossa hipótese é a de que as atuais políticas para graduação e também para a pós- graduação pretendem gradativamente retirar a formação de professores da formação científica e acadêmica própria do campo da educação, localizando-a em um novo “campo” de conhecimento: da “epistemologia da prática”, no campo das práticas educativas ou da práxis. Vários estudos vêm firmando esta perspectiva, fortalecidos pelas reformas educativas das últimas décadas, em particular aqueles que se ancoram, em nosso país, nas contribuições de Nóvoa, Schön, Zeichner, Gaultier, Tardiff e Perrenoud, entre outros (2002, p. 147).

Ao se retomar essa crítica radical de Freitas (2002) pretende criar bases para uma reflexão crítica comprometida com uma concepção de formação de professores mais emancipadora, especialmente em tempos de políticas de educação inclusiva que se pretende, solucionadora da condição de exclusão que muitos alunos vivenciam no espaço escolar.

A formação de professores para a educação de alunos com NEEs está imbricada destas concepções e os estudos sobre a formação continuada para a educação especial e educação inclusiva (MENDES, 2002; PRIETO, 2003; OLIVEIRA, 2007; JESUS, 2008a; OLIVEIRA, 2009), revelam que os professores do ensino comum e ensino especial, expressam um constante “despreparo” para lidar com os alunos público-alvo da educação especial. E com as exíguas oportunidades de formação inicial para a educação especial e educação inclusiva, recai um peso maior sobre os espaços de formação continuada.

Com base em um levantamento bibliográfico de pesquisas na área de formação continuada de professores para educação especial e educação inclusiva, preponderam estudos de levantamento que analisam propostas de formação continuada para a inclusão escolar em determinadas realidades do Brasil e que influenciam a prática dos professores (CARNEIRO, 1999; ROSA, 2002; ANDRADE, 2005; NASCIMENTO, 2008; VIEIRA, 2010; OLIVEIRA; 2011). Em outros estudos o foco é a identificação demandas de formação, saberes necessários aos professores, trazendo suas percepções e representações sobre as propostas de formação

continuada para a inclusão escolar dos alunos público-alvo da educação especial (IVANOVICI, 2003; LEITE, 2007; MENEZES, 2008; RIBEIRO, 2008; RABELO, 2011).

Essas pesquisas revelam que o desenvolvimento da política inclusiva, precisa vir acompanhada, de uma política efetiva de formação inicial e continuada de professores, que contribua com a construção de práticas pedagógicas inclusivas. Os resultados destes estudos identificaram dificuldades que os professores enfrentam na escolarização dos alunos com NEEs, lacunas em sua formação, sentimentos de frustrações pelos insucessos em sua prática, uma incidência elevada de adoção de propostas do governo federal com poucas e insuficientes iniciativas locais com proposições de programas de formação que atendam satisfatoriamente as demandas dos professores.

A exigência da política nacional de educação inclusiva (BRASIL, 1996; 2008a) de perfis profissionais diferentes – professor do ensino comum e professor do ensino especial – são tematizadas nas pesquisas a respeito da formação continuada de professores, que em sua maioria especificam as singularidades na formação e atuação de cada um destes profissionais, ao mesmo tempo em que confrontam as exigências da legislação a respeito da formação e a realidade como se conformam e se efetivam na realidade brasileira (PRIETO, 2003; OLIVEIRA, 2009).

Esses questionamentos são aprofundados nos estudos de Mendes (2002; 2010b; 2011b) que problematiza a direção das políticas, trazendo indefinições quanto a como, onde e em que modalidade deverão ser desenvolvidas as formações, tanto inicial como continuada de professores.

Siems (2010) realizou uma pesquisa sobre a constituição identitária dos professores para Educação Especial e destacou a dicotomização entre os professores do ensino comum e ensino especial e o distanciamento da discussão em torno da formação desses profissionais para a educação especial e inclusiva, das discussões sobre a formação de professores no contexto da educação mais ampla e analisa:

[...] não há formação especializada prévia que possa dar conta de todo o espectro da diversidade humana, mas há a necessidade de investir-se em processos de formação que, articuladamente, favoreçam a predisposição à reconstrução das práticas docentes por todos os profissionais, no contexto de seu desenvolvimento profissional, postura que demanda uma reorientação nos processos atualmente adotados na Formação de Professores (SIEMS, 2010, p. 39).

Jesus e Alves (2011) desenvolveram um estudo sobre a formação inicial e continuada de professores do AEE, analisando as políticas de formação inclusivas e seus

pressupostos balizadores, destacando também a importância de articular as pesquisas da Educação Especial às questões da educação geral. É indiscutível a importância da Educação Especial enquanto área de conhecimento, contudo não se pode perder de vista seu pertencimento a educação de forma mais ampla, isso repercute nas propostas de formação continuada de professores e nos modos que tem sido implementadas e analisadas em pesquisas:

Tendo a educação especial o seu lugar, mas necessitando articular-se à educação geral, é preciso considerar que os profissionais que atuam nesses espaços educativos demandam conhecimento e formação que os possibilitem compreender que tais espaços precisam ser planejados, organizados e coordenados por processos de gestão que os assumam imbricados dialeticamente. Nessa direção, apontamos para que a formação desses profissionais consolide conhecimentos que contribuam para esse propósito de atuação (JESUS; ALVES, 2011, p. 23).

Foram identificados estudos que propõem intervenções e contribuições à formação continuada de professores, como na pesquisa de Lauand (2000) que planejou, desenvolveu e avaliou um programa de formação continuada de professores e seus impactos no trabalho pedagógico do professor. Na mesma linha de trabalho, há pesquisas que assumem uma concepção de pesquisa denominada como colaborativa8, com algumas variações terminológicas, justificadas pelo desejo de precisar as raízes epistemológicas, teóricas e políticas da opção (PIMENTA; MOURA, 2004; IBIAPINA; FERREIRA, 2005; PIMENTA, 2005; JESUS, 2006; MENDES; ALMEIDA; TOYODA, 2011a).

As pesquisas colaborativas no contexto da educação inclusiva são analisadas por Almeida (2008), Jesus (2008b), Martins (2008) e Naujorks (2008) que direcionam o olhar para as possibilidades de contribuir por meio da pesquisa, com práticas educacionais mais inclusivas, apontando possibilidades e descrevendo experiências de “pesquisa-ação” como espaços de formação continuada para educação especial na perspectiva da educação inclusiva. De acordo com o que nos revela a literatura consultada, as propostas de formação continuada desenvolvidas como programas nacionais, parecem ter pretensões ousadas de atingir os municípios de todo Brasil, mas que em sua materialidade, estão distantes de sanar os desafios para a construção de sistemas de ensino inclusivos e as demandas por formação de professores para o ensino comum e ensino especial, como premissas fundamentais concreção das políticas inclusivas.

Diversas propostas do MEC e de governos estaduais e municipais estão sendo analisadas por pesquisadores que revelam um descompasso com as demandas reais do

professor que atua na inclusão escolar. A frustração diante dos desafios da prática produz um sentimento de impotência e de incompetência na vida do professor. Os professores comumente não são ouvidos no processo de construção das propostas de formação continuada, salvo em situações e experiências de pesquisas colaborativas que incentivam o protagonismo, emancipação, reflexão crítica do professor em pensar sobre sua realidade, identificar dificuldades e conquistas, expressar suas demandas de formação e discutir sobre os possíveis caminhos de formação continuada que desejam participar como colaboradores e coautores.