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Formação Discursiva

No documento 2007DeboraCristinaSchneider (páginas 39-42)

1. OS PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

1.2.5 Formação Discursiva

A Formação Discursiva (FD) representa um conjunto de regras históricas e grupais, determinadas no tempo e no espaço, definindo uma época, uma área social, econômica, geográfica ou lingüística determinada que condicionam o exercício do processo discursivo. A FD, portanto, surge atrelada à formação ideológica e define o poder e o dever no discurso. Os significados específicos de uma FD são determinados pelo exterior em sua relação com o interdiscurso, mas os sujeitos não estão cientes dessa determinação externa, considerando-se a fonte dos significados de uma FD, quando, na verdade, são seus efeitos.

A AD, conforme já referido, considera que o sentido não pode ser produzido sem que o sujeito esteja inscrito numa Formação Discursiva determinada que irá definir os sentidos

possíveis de serem construídos. A sociedade dispõe de uma conjuntura sócio-histórica, atravessada por formações ideológicas, que se interligam as Formações Discursivas, lugares que normatizam o dizer.

Assim, uma FD está sempre condicionada a outras FD’s que instauram limites, fronteiras a essa FD. As FDs são abrangentes, relacionando-se às relações de classe e às lutas pelo poder. Desta forma, uma das características das FD’s é a heterogeneidade onde se engastam conflitos e tensões, havendo imprecisão na demarcação de seus limites em relação às FD’s vizinhas, o que gera constantes reconfigurações, mudanças, perdas, acréscimos.

A sociedade usa o discurso para perpetuar sua estruturação, ou seja, os grupos que detêm o poder veiculam, através de certas Formações Discursivas, concepções ideológicas que objetivam sedimentar e manter relações de poder cristalizadas. As estruturas sociais ou noção de classes foram, com o tempo, sendo arraigadas no espírito da sociedade e, conseqüentemente, direcionando as relações de produção. Todavia, de acordo com Foucault: ‘[...] o que pertence propriamente a uma Formação Discursiva e o que permite delimitar o grupo de conceitos, embora discordantes, que lhe são específicos, é a maneira pela qual esses diferentes elementos estão relacionados uns aos outros. ’ (1990, p.66)

Num terreno instável como esse, é impossível imaginar que os sentidos estejam prontos e disponíveis com uma base sólida de significância, pois nossas palavras não significam de acordo com nossa vontade imediata e individual. Os sentidos surgem de processos inscritos em FDs que condicionam a sua construção. Assim, podemos dizer que os sentidos originam-se, primeiramente, pela memória discursiva ou interdiscurso e depois pela relação dialógica com o outro.

Para compreender a noção de Formação Discursiva, é necessário entender que nela há a paráfrase, lugar onde discursos são recuperados e reformulados a fim de preservar e fechar seus limites; a polissemia, lugar onde os sentidos se expandem, ampliam-se, multiplicam-se; e o pré-construído, que retoma o já-dito, a condição anterior. Segundo Pêcheux e Fuchs, isso significa que:

[...] a espécie discursiva pertence, assim pensamos, ao gênero ideológico, o que é o mesmo que dizer que as formações ideológicas de que acabamos de falar ‘comportam necessariamente, como um de seus componentes, uma ou várias

Formações Discursivas interligadas que determinam o que pode e deve ser dito {...} a partir de uma posição dada numa conjuntura’, isto é, numa certa relação de lugares no interior de um aparelho ideológico, e inscrita numa relação de classes. Diremos, então, que toda Formação Discursiva deriva de condições de produção específicas, identificáveis a partir do que acabamos de designar. (1997b, p.166-167)

Na perspectiva teórica da AD, é consenso o fato de que uma FD não é da ordem da completude e, muito menos, algo delimitado a priori – uma FD se ‘constrói’ e se configura como gesto de interpretação, ou seja, como resultado do ‘olhar’ do analista, funcionando, portanto, como um princípio de organização metodológica. A Formação Discursiva faz com que o discurso não se associe a um sentido específico, mas seu sentido varia conforme um conjunto de fatores externos ao discurso que o condicionam. Essa construção de sentido estará relacionada a limites e condições impostas pelos demais discursos com os quais se relaciona e aos quais remete, dentre outros fatores igualmente determinantes. Neste sentido, uma FD é um aparato de relações que estabelecem regras de conduta, normalizando discursos e vivências. O sujeito aceita essa matriz de sentido por reconhecer nela significações que parecem óbvias e naturais, as verdades de um tempo histórico. De acordo com Foucault: ‘A Formação Discursiva aparece, ao mesmo tempo, como principio de escansão no emaranhado dos discursos e princípio de vacuidade no campo da linguagem’. (1990, p.138)

Segundo Grigoletto (2003), a primeira menção ao termo Formação Discursiva é feita por Foucault em sua obra A arqueologia do saber, posteriormente, Pêcheux e Fuchs (1975) reelaboram esse conceito, associando-o ao conceito de Formação Ideológica, ambos operando na constituição do discurso e dos efeitos de sentido. É importante salientar que o conceito de FD, no âmbito da AD, vivenciou três momentos distintos: em princípio (1969), a FD era vista como um conjunto homogêneo, havendo diversas FDs distintas e isoladas, num segundo momento (1975), considera-se a existência de um complexo de FDs em que há uma dominante que relaciona-se com as demais. No terceiro momento (1981), a partir do trabalho de Courtine, apregoa-se a existência de uma FD heterogênea a si própria em que a contradição é presença marcante e as posições-sujeito são diferenciadas o que permite a instabilidade e os deslocamentos de sentidos. Sobre essa questão, Gregolin afirma:

Foi a partir dessa releitura que Courtine faz da Arqueologia do Saber que a análise do discurso – que em sua primeira fase tratava de corpus como se fossem homogêneos - se encaminhou para os estudos da alteridade, da heterogeneidade. [...] É por essa via que Courtine, focalizando a heterogeneidade do discurso comunista, pode mostrar enunciados divididos, evidenciando o fato de que uma formação discursiva é sempre assombrada pelo seu antagonista. Essa contradição é constitutiva de toda formação discursiva: a alteridade sempre afeta o mesmo. (2004, p.174-175)

Sendo assim, em nossa análise, a noção de FD a ser utilizada é a pertencente ao terceiro momento mencionado anteriormente. Uma FD em que a contradição, a instabilidade, a dispersão e a transitoriedade são pontos marcantes e constituintes de seu caráter heterogêneo. A Formação Discursiva, o discurso, o interdiscurso, a memória discursiva, o

silêncio e a ideologia estão relacionados à noção de sujeito, que não remete automaticamente ao indivíduo, mas a um sujeito discursivo e a posições do sujeito no discurso. Desta forma, nosso próximo conceito-chave é o sujeito.

No documento 2007DeboraCristinaSchneider (páginas 39-42)

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