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Esta seção foi organizada para analisar a preocupação com a qualidade e com a formação continuada nas publicações e nas pautas do programa A Rede em rede que se reportam à frente de formação da dupla gestora.

Qualidade é uma das categorias de análise utilizada para verificar as preocupações com esse aspecto nos documentos e pautas do programa. Complementar a esta, a formação continuada é outra categoria analisada no conjunto das pautas e dos documentos pesquisados. Conforme tratado no capítulo 1, a acepção de qualidade adotada neste trabalho coincide com a de Silva (2009). O propósito é perscrutar as pautas para desvelar as perspectivas ou concepções de qualidade envolvidas e se estas coadunam com a acepção adotada.

Qualificar ou garantir a qualidade são termos frequentemente utilizados nas publicações e pautas das ações formativas do programa A Rede em rede. A publicação que normatiza a fase 3 (2008) para a dupla gestora, traz como um dos objetivos:

Ampliar a qualidade das vivências dos tempos e espaços nas Unidades de Educação Infantil, por meio da implantação e implementação do documento “Orientações Curriculares: Expectativas de Aprendizagens e Orientações Didáticas para a

Educação Infantil Paulistana.” (SÃO PAULO – município, Comunicado SME n. 489/2008).

Em outra publicação, a da fase 6 (2011), encontra-se a definição dos objetivos para formação da dupla de gestores:

Dar condições aos gestores para ampliar a qualidade das vivências das crianças nas Unidades de Educação Infantil, tomando como referência o documento “Orientações Curriculares: Expectativas de Aprendizagens e Orientações Didáticas para a Educação Infantil”. (SÃO PAULO – município, Comunicado SME n. 634/2008) Verifica-se, a partir das publicações do programa, que o termo qualidade está associado à “qualidade das vivências das crianças nos CEI e EMEI” e o principal indicador para o alcance dessa qualidade, encontra-se na implementação da proposta curricular cujo documento basilar foi o publicado em 2007 sob o título de Orientações Curriculares:

Expectativas de Aprendizagens e Orientações Didáticas para a Educação Infantil Paulistana.

Nessas publicações, a implementação é apontada como uma prioridade em todas as frentes de formação do programa. Em diversos momentos os documentos do programa de formação apontam a responsabilidade coletiva dos profissionais atuantes no CEI e na EMEI na efetivação da proposta curricular.

Outra preocupação com a qualidade, vinculada à organização dos tempos e espaços dos CEI e EMEI, é expressa na fase 4 (2009), na fase 6 (2011) e na fase 7 (2012) do programa, de forma mais direta.

Na fase 4 (2009), essa preocupação com a organização dos tempos e espaços é corroborada ao constatar-se que os trabalhos pessoais solicitados tinham como foco as ações dos gestores para a organização de tempos, espaços, materiais e a observação de como estes estavam organizadas as rotinas de trabalho dos educadores junto às crianças no CEI e EMEI. Exemplo de um desses trabalhos pessoais é o constante no excerto de pauta da Figura 2.

Em 2011, na fase 6, percebe-se a predominância da tematização das rotinas das jornadas de trabalho dos professores junto às crianças e o papel do gestor na organização dos ambientes de aprendizagem, ampliando a perspectiva de gestão dos tempos e espaços. O conjunto de conteúdos tratados que denota essa predominância são os que constam na Figura 16, que traz o cronograma dos encontros de formação em 2011 e o excerto de pauta da Figura 17 exemplifica como essa tematização era proposta nos encontros.

Em 2012, na última fase do programa, também encontram-se indícios do enfoque na qualidade das vivências, especialmente porque a centralidade nos tempos, espaços, materiais e interações das crianças no CEI/EMEI deveriam estar presentes nos planos de trabalho dos

professores40 e, igualmente, o plano de gestão de prioridades da dupla gestora tinha que prever ações para apoiar os professores nessa organização do planejamento.

Figura 16 - Excerto de pauta de formação da fase 6 do programa A Rede em rede, 1º encontro

Fonte: Documento disponibilizado por formador do programa A rede em rede (SME/SP, Formação Central, pauta do 1º encontro, 2011)

Figura 17 - Excerto de pauta de formação da fase 6 do programa A Rede em rede, 2º encontro

Fonte: Documento disponibilizado por formador do programa A rede em rede (SME/SP, Formação Central, pauta do 2º encontro, 2011)

40 De acordo com o definido pelo programa, o plano de trabalho do professor “sintetiza os registros das intenções

de trabalho dos professores com as diversas turmas de crianças da unidade. Revelam a intencionalidade, considerando os tempos, espaços, materiais e interações que serão propostos num espaço de tempo definido na rotina institucional de planejamento da unidade. Os planos de trabalho dos professores são ferramentas poderosas de mediação do coordenador para elaboração dos planos de formação e orientar os registros das atividades junto às crianças”. (SÃO PAULO – município. A Rede em rede – a formação continuada na Educação Infantil, Formação de Diretores e Coordenadores Pedagógicos – Fase 7, 2012, pauta do encontro 1)

A última fase do programa apresenta reiteradamente a importância do planejamento das rotinas de trabalho para todas as frentes. Os conteúdos da formação da dupla gestora foram estabelecidos com ênfase nas rotinas de trabalho pedagógico e constituição dos ambientes de aprendizagem para as crianças. Com essa ênfase, percebe-se qual é a preocupação com a qualidade objetivada nas publicações.

Evidencia-se que a implantação da proposta curricular e a apropriação dos aspectos contidos nesse documento seriam os indicadores do que era considerado qualidade para a educação infantil, pretendida pela SME/SP, durante esse período.

Essa concepção de qualidade, vinculada a implementação da proposta curricular, referenda parcialmente o que Silva (2009) define como qualidade, pois a autora afirma que um dos aspectos da qualidade é o compartilhamento dos bens materiais e culturais produzidos pela humanidade. A proposta curricular pode ser compreendida como um dos instrumentos que favoreça esse compartilhamento dos bens materiais e culturais. No entanto, ao limitar a concepção de qualidade a implementação da proposta curricular, o programa desconsidera outros fatores compósitos da qualidade definidos pela autora, como as questões referentes ao financiamento da educação, das políticas governamentais e da compreensão socioeconômica dos contextos de vida das crianças e suas famílias, aspectos apresentados detalhadamente no capítulo 1.

A implantação da proposta curricular como evidência de qualidade, faz emergir a necessidade de analisar como o programa compreende a formação continuada, a partir do conteúdo das pautas destinadas a frente de formação da dupla gestora. No capítulo 1 a concepção de formação continuada adotada neste trabalho, se fundamenta em Schön (1992), Nóvoa (1992b) e Imbérnon (2010).

Nas pautas do programa da frente de formação dos gestores, a formação continuada é ancorada pelo plano de formação dos profissionais da unidade, o qual deveria vincular-se ao plano de trabalho dos professores junto às crianças.

As duplas de gestores deveriam estabelecer prioridades em seus planos que coadunassem com o estabelecido nos planos anteriormente citados – de formação e de trabalho. Os excertos constantes nas Figuras 18 e 19 são exemplos de como as pautas trataram, respectivamente, da elaboração e do acompanhamento desses planos.

Figura 18 - Excerto de pauta de formação da fase 7 do programa A Rede em rede, 2º encontro

Fonte: Documento disponibilizado por formador do programa A rede em rede (SME/SP, Formação Central, pauta do 2º encontro, 2012)

Figura 19 - Excerto de pauta de formação da fase 7 do programa A Rede em rede, 3º encontro

Fonte: Documento disponibilizado por formador do programa A rede em rede SME/SP, Formação Central, pauta do 3º encontro, 2012

Todas as fases do programa para a dupla gestora revelaram ações que objetivavam apoiar a compreensão do conceito de qualidade, articulada com as ações de formação a serem desenvolvidas pelos gestores nos CEI e EMEI.

A fase 3 (2008), ao propor que a dupla gestora deveria estabelecer uma rotina de observação da prática pedagógica dos professores e demais funcionários junto as crianças, com o objetivo de elencar os problemas que mais se evidenciavam no CEI e EMEI a partir das práticas observadas (Figuras 1, 8 e 11), subsidiou as ações do programa na fase subsequente.

A fase 4 (2009), considerando as demandas levantadas pelos gestores na fase anterior (2008), propôs a intervenção dos gestores nos ambientes dos CEI/EMEI (Figuras 2 e 14), e

gerou novas demandas de formação para as questões da convivência – da instituição com as famílias, entre os profissionais da unidade e entre a dupla gestora. Essas demandas foram objeto de trabalho pelo programa na fase 5 (2010), de acordo com o que consta no excerto disponível nas Figuras 9 e 13.

Todas essas ações do programa demandaram, por parte dos gestores, a elaboração de propostas de intervenção em suas respectivas unidades educacionais – os planos de formação e os planos de gestão.

A formação da dupla gestora, portanto, estaria fundamentada na garantia de um conjunto de direitos para as crianças matriculadas nos CEI e EMEI, preconizados no corpo legal das publicações do MEC já apresentadas no capítulo 1 como princípios de qualidade.

Concomitantemente, essa formação se baseou na ideia de que a atuação dos gestores, ao observarem e discutirem seus cotidianos de trabalho com a finalidade de problematizarem as práticas pedagógicas junto a suas respectivas equipes de profissionais, poderia caminhar para a constituição da escola como espaço de vivência do que Schön (1992) categorizou como sendo practicum reflexivo.

As ações dos gestores de tematizarem e proporem intervenções sobre a própria prática através dos planos de gestão de prioridades e de formação dos profissionais, verificadas nas pautas dos encontros, coadunam com a ideia de Schön, ao definir que essa atuação conjunta de gestores e professores, onde a própria escola pode ser local de trabalho e de reflexão sobre a prática, constitui-se no practicum reflexivo.

Entretanto, há que se ponderar que o programa pode ter limitado o exercício pleno da prática reflexiva em seu interior, ao apartar os públicos docentes e gestores em ações de formação diferenciadas. Se a formação de gestores e professores tivesse ocorrido num mesmo grupo, esse exercício reflexivo poderia ter sido mais favorecido pelas ações internas do programa e se ampliado no interior das unidades de CEI e EMEI, a partir da formação continuada nos horários coletivos. Portanto, a formação continuada dos profissionais nos horários coletivos, entendida como eixo fundamental da qualidade, teve nesse período o gestor como principal articulador, na expectativa por parte do programa, de que este seria capaz de mobilizar a unidade educacional na perspectiva da sua constituição como lócus de formação.

A formação continuada, considerada fundamental para a definição da profissionalidade de acordo com Nóvoa (1992b) e Imbernón (2010), deveria ter sido favorecida pelo programa de formação destinado a dupla gestora.

No caso específico da rede paulistana, durante a vigência do programa A Rede em

rede, foram as propostas de observação, tematização e intervenção nas práticas de cada escola

por parte dos gestores, por meio dos planos de gestão e de formação, propostas na frente de formação que frequentavam, os únicos instrumentos de formação continuada e, por conseguinte, de favorecimento da construção da profissionalidade aos professores e gestores da educação infantil.

Considerando que, especialmente em se tratando de profissionais da educação infantil, essa formação continuada deve ser cada vez mais elaborada, dada a fragilidade da formação inicial dos professores para atuação junto às crianças de zero a cinco anos, a profissionalidade desses professores é constituída, em grande parte, nas formações continuadas oferecidas pelas redes nas quais atuam, constituindo-se uma das principais ferramentas para a construção da qualidade na educação das crianças dessa modalidade de educação.

As implicações das concepções de gestão, qualidade e formação na constituição da profissionalidade dos profissionais de educação infantil da rede paulistana, será tratada na seção seguinte, a partir do conteúdo das pautas e dos documentos oficiais do programa de formação tratados até aqui.

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