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Capítulo 2- A neologia de empréstimos

2.3 Formas de apresentação das unidades lexicais estrangeiras

Quanto à forma, há unidades lexicais estrangeiras que podem causar certo “estranhamento” ao sistema ortográfico da língua de acolhimento, como é o caso da palavra

bungee-jumping. Essas formas importadas são sentidas como estranhas quando adentram nosso sistema linguístico, pois muitas vezes preservam as características ortográficas do seu sistema de origem. Exemplo disso são palavras como personal-banking, personal-trainer,

gigabyte,aftershave muito recorrentes na língua portuguesa. Convém lembrar que “LÍDER até bem pouco foi leader e que BIFE foi beaf. Seriam esses empréstimos intrinsecamente menos impuros do que shopping ou homepage?” (GARCEZ; ZILLES, 2001, p.20).

Precisamos deixar claro para nossos alunos a ideia de língua pura, pois afinal o que seria pura numa língua como a nossa, de tanta diversidade linguística? Quem é que decide sobre a legitimidade de um empréstimo como digno de uso ou não? Como cita Bagno (2001, p. 82):“querer uma língua pura é o mesmo que querer uma raça pura, e já sabemos a que tipo de situações trágicas as ideias desse tipo podem levar”.

A tentativa de coibir o uso de uma forma linguística é inteiramente inócua. Exemplo disso foi o que aconteceu com a palavra futebol que durante a ditatura militar presenciou “o fracasso dos esforços empreendidos pelo Estado Novo para promover, entre outros, o termo ludopédio5 como substituto para o então anglicismo football” (GARCEZ; ZILLES, 2001, p.21).

No que diz respeito às formações estrangeiras em uso no português brasileiro, há um mito de que tais unidades lexicais podem descaracterizar a língua portuguesa, sendo assim consideradas “profanas” ao sistema linguístico importador, na medida em que ameaçam a unidade linguística nacional, além de colocar o falante nativo em situações embaraçosas por não saber pronunciá-las “corretamente”, ou escrevê-las, ou por não as entender. Ora, este argumento é no mínimo questionável, pois nos dá a ideia de que a nossa língua é,per se, única e, por conseguinte, todos compreendem qualquer variante. Será que todo cidadão brasileiro é capaz de compreender plenamente as palavras que usualmente aparecem nas bulas de remédio, nos contratos e nas receitas médicas? “Compreender ou não uma língua ou uma variedade dela é um problema de escolaridade do cidadão e de frequência a discursos, e não de nacionalidade da língua ou de origem de um termo” (POSSENTI, 2001, p. 166).

Todo item léxico percebido como externo ao vernáculo, ao entrar na língua receptora, sofre algum tipo de alteração no nível fonológico, ortográfico, morfológico e semântico. O

percurso deste se dá, a princípio, na sua grafia de origem: se for adotado pelo uso corrente na fala e na escrita, o item léxico é adaptado à língua receptora;caso contrário, se o item léxico for adotado e a forma escrita não sofrer alterações, é denominado xenismo.

[...] tomando como exemplo cartoon. Só será empréstimo posteriormente, quando adotado verdadeiramente pela integração na forma da língua e pelo uso corrente de falantes. Passa então a não ser notado como um termo estrangeiro: cartum. Se o termo importado permanece na grafia original, mesmo sendo muito usado, será um

xenismo. [...] Palavras como skate, shopping, gay, show continuam em sua forma original, sendo por tanto xenismos. São empréstimos: biônico, videocassete, estande, mixagem, jingle, mídia, pôster, folder, turnê (CARVALHO, 1984, p. 56).

No nível fonológico, os empréstimos podem sofrer mudanças no acento da palavra, perda da distinção em relação à quantidade das vogais. Observemos adaptações na pronúncia de alguns exemplos entre tantos encontrados em um corpus do blogue Kibeloco:6Site aparece grafado como sait; Trident como Traid, shopping ,choppen e yorkshire como okchai.

Figura 3 - Exemplo de adaptação fonológica do item lexical estrangeiro.

Figura 4 - Exemplo de adaptação fonológica do item lexical estrangeiro.

Figura 5: Exemplo de adaptação fonológica do item lexical estrangeiro.

Figura 6 - Exemplo de adaptação fonológica do item lexical estrangeiro

De acordo com Alves (1988), o item lexical estrangeiro tende a adaptar-se ao sistema fonológico desse idioma. É o caso, por exemplo,da palavra inglesa snooker, um empréstimo adaptado fonologicamente ao português que se transformou em “sinuca”, com a sílaba inicial si. Por outro lado, palavras como balé (ballet), colã (collant), xampu (shampoo) são exemplos de adaptações gráficas que se encontram em consonância com as normas ortográficas da língua portuguesa. Não obstante essas palavras já pertencerem ao vocabulário da língua corrente, constatamos que há algumas hesitações por parte do usuário da língua sobre a utilização correta do registro dessas unidades encontradas nos dicionários gerais de língua. De fato há certa incoerência no que tange à inclusão de formas estrangeiras e vernáculas que concorrem entre si, inserções feitas de maneira aleatória, desprovida de critérios, tanto para a organização dos verbetes como para a escolha das unidades que irão compor a nomenclatura do dicionário.

Se o dicionário se propõe a ser um instrumento de esclarecimento, de compreensão para os consulentes, então, critérios bem claros precisam ser delimitados quanto às entradas em que aparecem as definições dos verbetes. No caso, palavras como hamburger e hambúrguer, ambas já pertencentes ao vocabulário da língua corrente, poderiam levar a situações de dúvida. Correia e Almeida (2012, p.74) ressaltam que “essas questões são ainda mais problemáticas em contexto educativo, quando se ensinam questões ortográficas de língua portuguesa, por exemplo”.Assim sendo, é preciso que o processo de inserção de um item lexical estrangeiro nos dicionários de língua portuguesa seja feito a partir de uma avaliação mais rigorosa. Ainda não percebemos essa urgência e isso pode ser um problema para o consulente que não consegue encontrar, por exemplo, palavras como back-up porque desconhece tal vocábulo, tomando apenas como referência o som de como ouve tal palavra, neste caso, becape.