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5 RESULTADOS E DISCUSSÃO

5.2 Fontes de água

5.2.2 Formas de controle das fontes de água e problemas

Partindo de definições desenvolvidas por Feeny et al. (2001), sobre a propriedade de recursos naturais, buscou-se delinear, minimamente, as formas de controle das fontes de águas para famílias associadas à ASPROHPEN nas comunidades rurais do Planalto. O autor define quatro formas de acesso aos recursos naturais:

[1] livre acesso, é a ausência de direitos de propriedade bem definidos. O acesso aos recursos não é regulado, sendo livre e aberto a qualquer pessoa [...]

[2] propriedade privada, os direitos de exclusão de terceiros, na exploração e na regulação de recursos, são delegados a indivíduos [...]

[3] propriedade comunal, os recursos são manejados por uma comunidade identificável de usuários interdependentes. Esses usuários excluem a ação de indivíduos externos, ao mesmo tempo em que regulam o uso por membros da comunidade local [...]

[4] propriedade estatal, os direitos aos recursos são alocados exclusivamente no governo que, por sua vez toma decisões em relação ao acesso aos recursos e ao nível e natureza da exploração [...] (FEENY et al., 2001, p. 21).

O que se buscou aqui foi uma tentativa de traçar as formas de controle do recurso água, utilizando as definições de Feeny et al. (2001). No entanto, a água não se enquadra como um recurso natural passível de propriedade. A água, como vital para a sobrevivência de todas as espécies vivas, precisa ser

de acesso a todos em quantidade e qualidade satisfatórias. Está clara, na Política Nacional de Recursos Hídricos, a proibição do estabelecimento da água como propriedade privada, pois a água é um bem de domínio público.

Porém, na pesquisa, foram encontradas formas distintas de controle de acesso às águas. Essas formas perpassam desde a não existência de controle, passando pelo controle estatal e chegando a um controle privado.

Poços artesianos: enquadram-se na forma de controle de acesso estatal, pois, devido ao fato de serem perfurados e equipados pela prefeitura, essa define normas e regras para o seu uso, como exemplo, a decisão de destinar a água do poço exclusivamente para o consumo doméstico.

Rios: enquadram-se como recurso sem controle, pois as suas águas não apresentam nenhuma ou pouca forma de regulação. Quem tem um rio mais próximo de sua casa, tem maior facilidade de acesso.

Nascentes: enquadram-se como controle privado, pois o dono do terreno em que se encontra uma nascente tem acesso privilegiado a ela. No entanto, há negociações locais para que vizinhos utilizem essas fontes.

Cisternas: enquadram-se como controle privado, pois o acesso a essas águas é mediado por investimentos privados, em terrenos privados e para usos privados. Assim, a família é a responsável pela perfuração, gestão e controle da água das cisternas, e terceiros não têm acesso, sem permissão.

O controle comunal não foi percebido de forma clara no estudo. Os que mais se aproximaram dele foram as nascentes, que são controladas pelos donos dos terrenos, mas onde o acesso de terceiros pode ser negociado.

A partir das formas de controle, foram avaliadas as formas de captação da água. O que se percebeu foi que as bombas elétricas são equipamentos indispensáveis às famílias da base da ASPROHPEN, com exceção de três famílias, que utilizam carneiro hidráulico. São elas que viabilizam o acesso à água do poço, dos rios, das nascentes e das cisternas. A principal forma de captação de água das famílias demanda um gasto significativo de energia elétrica. A água proveniente dos poços, na maioria dos casos, é custeada pela prefeitura; já a captação de água de outras fontes é de responsabilidade da família.

A sazonalidade no abastecimento de água do poço não foi percebida de forma generalizada. Nem todas as famílias fizeram referência a esse fato, ou seja, o racionamento na distribuição de água atinge as famílias de forma diferenciada. Estudando comunidades do Vale do Jequitinhonha, Galizoni (2005) mostrou a existência de desigualdades na distribuição de água, quando a prefeitura está envolvida: “Isto é claro em obras de captação e distribuição realizadas pelas prefeituras, que geram partilhas desiguais da água” (GALIZONI, 2005, p. 87).

A construção de barragens no curso dos rios e em nascentes é prática comum no Planalto. Essa técnica favorece a captação de água em maior quantidade e, mesmo quando diminuem as chuvas, continuam sendo viáveis as atividades irrigadas. A água captada nos rios, nas nascentes e nas barragens geralmente é armazenada em reservatórios e, posteriormente, destinada aos seus devidos fins. Porém essa prática faz com que a quantidade de água à jusante da barragem fique reduzida e promova um acesso desigual ao recurso, com é revelado pela TAB. 3.

TABELA 3

Problemas e dificuldades relacionadas ao abastecimento doméstico para famílias associadas à ASPROHPEN, nas comunidades rurais do Planalto,

Montes Claros – MG, em percentual

Problemas e dificuldades no abastecimento Percentual (%)

Problemas com a bomba/carneiro 39,1

Falta ou diminuição da disponibilidade de água 17,4

Alto custo da energia 8,7

Sazonalidade no abastecimento 4,3

Reservatório pequeno 4,3

Falta de encanamento 4,3

Transferência da água do rio para a barragem 4,3

Fonte: Pesquisa de campo, julho de 2008.

Algumas famílias fazem uso do carneiro hidráulico, técnica de menor custo e de menor gasto de energia, mas que apresenta problemas. Quando ocorrem enchentes ou quando o rio seca, o carneiro para de funcionar. Nesses casos, as famílias são obrigadas a coletar água em baldes e em

vasilhas. Isso mostra realidades desiguais entre as famílias da base da ASPROHPEN: enquanto algumas famílias dispõem de técnicas mais avançadas de captação, outras sofrem com o desgaste físico de buscar água na cabeça. A capacidade de captar água de forma mais eficiente, juntamente a outros fatores, possibilita maior capacidade produtiva da família.

Uma técnica com bases na agricultura ecológica foi identificada, na captação e na utilização de água, para a produção. Esse é o Sistema Mandala, que prima pela racionalização do uso da água e pela otimização do espaço produtivo dentro da propriedade. O detalhamento desse sistema será apresentado mais adiante.

Os sistemas de captação de água muitas vezes apresentam alguns problemas. Segundo dados da pesquisa de campo, 60,0% das famílias enfrentam problemas ou dificuldades em relação ao abastecimento doméstico (TAB. 3) e 52,2%, para uso produtivo.

A principal dificuldade destacada se refere aos problemas com as bombas de captação, principalmente os problemas de ordem técnica, como a queima da bomba e problemas de falta de manutenção. O custo da energia também é um problema no abastecimento doméstico, mas essa questão aparece com muito mais importância quando a água é utilizada para o uso produtivo, pois o consumo é muito maior.

Em relação aos problemas enfrentados com o abastecimento de água para o uso produtivo, a diminuição da disponibilidade de água foi a principal dificuldade: 50,0% das famílias entrevistadas referem-se a esse problema, seguido pelo alto custo da energia, problemas com o sistema de bomba, falta de encanamento e a distância da casa em relação ao local de captação.

A diminuição da disponibilidade de água está diretamente relacionada às condições de degradação ambiental, às mudanças climáticas regionais e, pode-se dizer, ao constante consumo de água para a irrigação dos cultivos.