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O Frame do Nossa São Paulo: Controle Social por uma Outra Cidade

7. CONTROLE SOCIAL: O FRAME DO NOSSA SÃO PAULO

7.3. O Frame do Nossa São Paulo: Controle Social por uma Outra Cidade

O produto dos frames compostos pelo Nossa São Paulo ao longo do seu processo de mobilização é o do Controle Social. O Movimento propõe um pacto à sociedade política, de reapropriação da cidade e do diálogo entre cidadãos, organizações da sociedade civil e poder público. O espaço do Nossa São Paulo é o canal para esse diálogo e o mecanismo do plano de metas é o código, a nova linguagem proposta. Por isso o “Nossa” no nome do Movimento. Por isso Padre Ticão associa Oded Grajew a Dom Paulo Evaristo Arns como figuras articuladoras entre esses mundos.

O conceito de Controle Social é construído a partir do repertório dos diferentes grupos que fazem parte do Movimento. Aqueles oriundos da luta pela redemocratização, já apresentados anteriormente como vinculados ao frame de justiça social, trazem ao Controle Social as noções de participação, incidência política e democratização do espaço político. Alinhado com a teoria de Grau (2006), o Controle Social é entendido não apenas como fiscalização expost, mas também como participação na formulação das decisões para o futuro.

Vê-se, neste caso, o papel de incidência do grupo na apresentação de propostas para os candidatos durante as eleições e nas suas respostas ao programa de metas entregue pelo prefeito. A visão é a de que os cidadãos devem poder contribuir com a definição dos rumos de sua cidade (tirando-a da deriva), não apenas no momento das eleições, mas também ao longo do processo político deliberativo sobre o desenvolvimento da cidade. O representante eleito não é mais o único a falar em nome da população, tendo que dialogar com organizações e movimentos que se autointitulam também representantes dos cidadãos. As eleições deixam de ser o único espaço de validação do processo representativo. O sistema tradicional de uma democracia puramente representativa pelo voto começa a ser penetrado por mecanismos participativos como diz o membro do Colegiado entrevistado: “isso significa que a democracia representativa que vivemos terá que ser completada pela democracia participativa de alguma forma”.

Os grupos empresariais agregam uma visão de accountability trazida do mundo dos negócios, destacando a demanda por eficiência na aplicação dos recursos públicos e exigindo qualidade nos serviços e a prestação de contas para a sociedade. A gestão pública é avaliada por indicadores e metas e a cidade é compreendida e administrada por

um sistema de informações que permite análises estatísticas. O planejamento público sai da medida dos investimentos realizados (meios) para os resultados, tangíveis, alcançados (fins).

De todos os lados, o Controle Social implica, ainda, a expectativa de probidade moral e ética, promovidas pela transparência que permite a chegada de informação aos cidadãos e às organizações e movimentos sociais fortalecidos assim para o exercício do monitoramento dos atos e omissões dos oficiais eleitos. Padre Ticão, em entrevista, disse, nesse sentido: “O Rei tem que ficar nu!”.

O plano de metas vira instrumento de pressão, a serviço do debate na sociedade civil e do seu diálogo com o poder público. Com esta nova informação, as eleições transformam- se efetivamente em momentos de sanção.

Então, cada subprefeitura está fazendo o seu Plano de Metas para 2012, para as eleições 2012. Pegando o que o Kassab falou e pegando aquilo que ficou fora do Plano de Metas. Pra quê? Isso nós já estamos falando abertamente. Daqui 2 anos, um ano e meio, vai estar pegando fogo as eleições em São Paulo, cada subprefeitura fazer o plano de metas da sua subprefeitura. Né? Então, tá nesse pique agora (Padre Ticão, dez. 2010). Ao estarem mais bem informados, espera-se também que os cidadãos, reapropriados de suas cidades, demonstrem-se sensibilizados para o comportamento cívico em que a ação particular leva em consideração o bem público e se engaja nos espaços políticos abertos. O membro do Colegiado entrevistado, depois de caracterizar um governo accountable como aquele que é transparente e que tem canais de comunicação, afirma definindo Controle Social:

Aí já é tarefa de um cidadão consciente, ou das organizações da sociedade civil, que usam o canal de comunicação, ou qualquer outro canal, para expressar seu aplauso, ou sua crítica. E que possa, através disso, dar sua contribuição, ou propor parcerias. [...] A palavra controle é um pouco desagradável, porque... o que quer dizer a sociedade controlar o governo.. a sociedade elegeu o governo, né. Já elegeu o governo. Portanto, ele nos representa, a maioria. [...] Monitoramento seria melhor, porque você tem informação disponível, então, olha, lê, opina! Sobre o que você está vendo, ou exija transparência, quando ela não existe (Membro do Colegiado, nov. 2010).

Participação Incidência Democratização Direitos Ética Probidade Moral Transparência Informação Prestação de Contas Controle Monitoramento Avaliação Fiscalização Sanção Eficiência Gestão Metas Resultados Indicadores CONTROLE SOCIAL

Esquematizando as palavras-chave deste frame de Controle Social, composto pelo Movimento Nossa São Paulo, tem-se o seguinte quadro:

Quadro 1: O Controle Social no Frame do Movimento Nossa São Paulo. Elaboração nossa, 2010.

O mais interessante é notar que esses discursos se influenciam e se recompõem a partir das novas articulações promovidas neste encontro de frames anteriores. Veem-se lideranças comunitárias religiosas falando em prestação de contas e transparência, militantes de esquerda falando em indicadores e metas e empresários demandando espaços de particpação. A contribuição da interpretação oferecida pelo Movimento Nossa São Paulo abre novos canais e novas linguagens na promoção da accountability governamental.

A questão da representação - matéria clássica apresentada na abertura do capítulo que trata das teorias relacionadas a accountability e controle social – surge no pano de fundo de um counterframe que surge na entrevista com o vereador Police Neto. Outros quadros interpretativos contestativos podem ter sido trabalhados em contraposição ao Movimento Nossa São Paulo, ou até mesmo em uma dialética interna envolvendo seus participantes, mas o foco deste trabalho não mirou esse âmbito da pesquisa e portanto as entrevistas e o levantamento de documentos não visavam obter essas visões alternativas.

Eu acho que controle é algo que... ele não se encaixa muito e a gente insiste muito nesse lance do controle... ele não se encaixa nessa democracia que a gente está construindo, porque não é um ato de controlar. Isso pra mim... eu sempre me assusto muito... „mas cadê o controle social?‟... Eu acho que a gente vive em uma sociedade de compromissos, não de controles e esse compromisso é testado a cada quatro anos. Porque senão a gente parte do pressuposto que todo mundo precisa ser controlado porque a tarefa dele é descumprir. Eu estou acreditando que é o inverso. Todos têm compromisso com o fazer, a gente precisa encontrar quem é mais competente para fazer.

Por isso que você está saindo dessa necessidade do controle, porque na presença do controle é que você enxergava que tinha malfeitor. Então, eu acredito que a gente está indo para um ambiente do compromisso e aí esse compromisso é testado anualmente a partir de regras como essa e aí [a Lei do Plano de Metas] (Police Neto, dez. 2010).

Seriam então os homens anjos, contradizendo Madison (2006)? Esta provocação, talvez alinhada com as posições de Manin (2006) e Przeworski (1999) apresentadas na introdução, vale ser registrada para uma reflexão futura e como espelho do dilema eterno na relação entre representantes e representados.