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Frames Básicos e Frames Culturais

No documento alexandramoreira (páginas 43-47)

3 FUNDAMENTOS TEÓRICOS ADOTADOS DA LINGUÍSTICA COGNITIVA

3.2 O Conceito de Frames

3.2.1 Frames Básicos e Frames Culturais

Segundo Johnson (1987), a interação com o ambiente por meio do aparato sensório-motor humano e a repetição dessas experiências levam ao surgimento, no sistema conceitual, de esquemas imagéticos. Esquemas imagéticos correspondem a um subtipo de frame que parece ser fundamental e universal, possuindo um papel em todas as linguagens e que lidam, em grande parte, com relações físicas, movimento e percepção. São estruturas conceptuais primitivas, ou seja, frames, denominados também de frames básicos.

Esses frames básicos resultam de experiências pré-linguísticas corporificadas. A partir de nossa experiência cotidiana com objetos que ocorrem dentro de outros objetos, surge na mente humana o esquema de imagem CONTAINER (RECIPIENTE). Os frames básicos surgem pela repetição da experiência e, uma vez gerados, são registrados

no sistema conceitual como um padrão. Uma vez que surgem a partir de nossa interação corporificada, formam a nossa base de conceitos mais primários. Eles são tão fundamentais que não estamos conscientes de possuí-los. Em geral, somos conscientes de conhecer conceitos tais como ÁRVORE, porém, não estamos conscientes de dispor da noção de RECIPIENTE. Os frames básicos geram conceitos mais específicos. O conceito de RECIPIENTE leva ao surgimento dos conceitos de DENTRO e FORA, elementos deste frame.

A observação do comportamento de crianças muito pequenas brincando é uma evidência forte de que elas aprendem os frames básicos, como SUPORTE e RECIPIENTE, antes de aprenderem as palavras associadas.

Segundo Feldman (2006, p. 136), o primeiro grande insight sobre esquemas imagéticos surgiu em 1983, com os trabalhos de Len Talmy (1983). A partir da análise de uma grande variedade de línguas, ele observou que os construtos usados para descrever o espaço podiam ser reduzidos a relações espaciais primitivas, que eram as mesmas em todas as linguagens. Essas estruturas primitivas são organizadas de forma diferente em cada língua para a geração dos construtos.

Em inglês, o sentido central da palavra on usa as primitivas conceituais “acima”, “contato” e “suporte”. Apesar de todas as línguas possuírem maneiras de expressar essas relações, nem todas possuem um conceito complexo estruturado da mesma forma que o lexema on. Em japonês, por exemplo, o lexema com o significado mais próximo não exige o contato, mas é mandatório o objeto estar localizado acima de outro. Ou seja, em japonês a relação se aplica apenas a superfícies posicionadas horizontalmente e em inglês, é possível aplicar a superfícies verticais. A Fig. 3 mostra a diferença de aplicação do conceito nas duas linguagens.

FIGURA 3 – Diferença da aplicação do conceito complexo associado ao lexema inglês

on.

FONTE – FELDMAN, 2008.

Mas quantos esquemas imagéticos ou frames básicos existem? Segundo Hampe (2005, p. 2), a lista de esquemas imagéticos nunca foi uma lista fechada. Além disso, cada autor apresenta uma lista, sendo que, em alguns casos, parte dos elementos que não estão totalmente alinhados com o espírito da teoria original. Hampe (2005) apresenta uma lista de esquemas imagéticos que aparece em Lakoff (1987) e que constitui o seu inventário básico:

a) RECIPIENTE/CONTEÚDO, CAMINHO/ORIGEM- CAMINHO-DESTINO,

LIGAÇÃO, PARTE-TODO, CENTRO-PERIFERIA, EQUILÍBRIO.

b) Esquemas de forças: DESBLOQUEIO, BLOQUEIO, CONTRA FORÇA, ATRAÇÃO, COMPULSÃO, RESTRIÇÃO, REMOÇÃO, DESVIO.

Interessante, também é mencionar os esquemas orientacionais, definidos em relação à orientação corporal, propostos por Talmy apud Feldman (2006, p. 136): ACIMA-ABAIXO, FRENTE-ATRÁS, ESQUERDA-DIREITA etc.

Pode-se notar que alguns dos esquemas estão diretamente relacionados com a nossa experiência do mundo, como é o caso dos conceitos ACIMA e ABAIXO, que estão relacionados com a gravidade. A palavra acima, em português, é baseada nesse esquema.

Feldman (2006) argumenta que a palavra in, em inglês, envolve uma situação complexa. Envolve a existência de um recipiente esquemático ou região delimitada no espaço composta de um interior, um exterior e limites. É preciso existir também um ponto de referência no interior e um elemento, denominado de trajetor, que está, pelo menos parcialmente no interior do recipiente. Além disso, como ressalta Feldman, alguns usos da palavra in implicam em esquemas de dinâmica de forças, em que o recipiente exerce força sobre o trajetor, como é o caso de garrafa, que impede que a água em seu interior derrame.

Grady (2005, p. 38) destaca que, apesar da ênfase frequente no caráter sensório- motor dos frames básicos, existem esquemas imagéticos propostos na literatura que não estão ligados a qualquer aspecto da experiência sensória. Considere-se o caso de frames básicos como CICLO, PROCESSO e ESCALA (JOHNSON, 1987). Esses esquemas referem-se a uma dimensão que está relacionada a diferentes tipos de experiências sensórias e não sensórias.

Os frames básicos são usados para descrever unidades básicas e universais de conhecimento. Porém, grande parte do conhecimento humano é específica para uma determinada cultura ou ambiente social ou para um determinado contexto. As estruturas conceituais que armazenam esse tipo de conhecimento são os modelos culturais. Um modelo cultural é um frame complexo, estruturado por muitos frames básicos. Esses frames complexos são estruturados a partir dos básicos e moldados pela cultura. Por exemplo, um frame complexo como é o do JOGO DE FUTEBOL envolverá diversos frames mais básicos, tais como CORRER, SEGURAR, CONTATO e OBJETIVO, que por sua vez, sem baseiam em esquemas imagéticos

Além de uma estrutura complexa, o frame delimita um conjunto de cenas ou objetos de forma não homogênea. Ou seja, o enquadramento de uma cena percebida em um conceito pode ter um nível de gradação. Esta forma de enquadramento não exato está relacionada com a concepção de categoria da LC que será discutida a seguir.

No documento alexandramoreira (páginas 43-47)