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3 Funções residuadas e algumas álgebras da lógica fuzzy

3.2 Funções residuadas

3.2.1 t-normas e t-conormas

Definição 3.5. Uma t-norma é uma operação T : [0, 1]2 → [0, 1] que é associativa, comutativa,

não decrescente em cada entrada, que satisfazT (1, x) = x (elemento neutro) e T (0, x) = 0 para todox ∈ [0, 1].

Uma t-norma T é contínua se para todas sequências convergentes {xn}n∈N e {yn}n∈N em

[0, 1] tem-se T lim n→∞xn, limn→∞yn  = lim n→∞T (xn, yn).

Por exemplo, as seguintes t-normas contínuas são fundamentais no sentido de que qualquer outra t-norma contínua será uma combinação dessas.

(1) t-norma de Gödel: T (x, y) = min(x, y);

(2) t-norma do produto: T (x, y) = x · y;

(3) t-norma de Łukasiewicz: T (x, y) = max(0, x + y − 1).

Para verificar a continuidade em cada item, considere as sequências {xn}n∈N e {yn}n∈N em

[0, 1] tais que xn→ x e yn→ y. A desigualdade

T (x, y) − 1

n ≤ T (xn, yn) ≤ T (x, y) + 1 n

fornece, pelo Teorema do confronto de limites, lim

n→∞T (xn, yn) = T (x, y) = T  lim n→∞xn, limn→∞yn  . É fácil verificar que as demais condições da definição 3.5 também são válidas.

Em muitos casos, formas mais fracas de continuidade são suficientes. Para t-normas, essa propriedade é chamada semi-continuidade inferior (KLEMENT; MESIAR; PAP, 2000, Seção 1.3). Uma vez que uma t-norma é não-decrescente e comutativa, ela é semi-contínua inferiormente se, e somente se, for contínua à esquerda (left-contínuous) em sua primeira componente. Isto é: Se, e somente se, para cada b ∈ [0, 1] e para toda sequência não decrescente {an}n∈Ntem-se

Tlim

n→∞an, b



= lim

n→∞T (an, b).

A propriedade de continuidade a esquerda está intimamente ligada a noção de residuação. Isso será visto mais adiante. No que segue apresenta-se a noção de implicações fuzzy.

Definição 3.6. Uma implicação fuzzy é um operador I : [0, 1]2 → [0, 1] satisfazendo as seguin-

tes condições:

(I1) I(0, 0) = I(0, 1) = I(1, 1) = 1 e I(1, 0) = 0

(I2) x ≤ z implica I(x, y) ≥ I(z, y), ∀x, y, z ∈ [0, 1] (Antitonia à esquerda)

(I3) y ≤ z implica I(x, y) ≤ I(x, z), ∀x, y, z ∈ [0, 1] (Monotonia a direita)

A partir de uma t-norma, é possível obter canonicamente uma implicação que satisfaz a Definição 3.6.

Lema 3.2. (BACZYNSKI; JAYARAM, 2008) Uma função I : [0, 1]2 → [0, 1] é uma implicação se existe uma t-normaT tal que

I(x, y) = sup{r ∈ [0, 1] | T (x, r) ≤ y}, para cada x, y ∈ [0, 1]. (3.4)

Nesse caso I chama-se uma implicação gerada a partir de uma t-norma T ou R-implicação. Frequentemente ela será denotada por IT.

O próximo resultado mostra que apenas no caso em que uma t-norma T é contínua à es- querda, o par (T, IT) forma uma família de funções que satisfazem conexão de Galois monotô-

nica.

Teorema 3.3. (BACZYNSKI; JAYARAM, 2008) Para uma t-norma T , as seguintes afirmações são equivalentes:

(ii) T e IT formam um par adjunto, isto é, satisfazem o princípio de residuação

T (x, z) ≤ y ⇔ z ≤ IT(x, y), ∀x, y, z ∈ [0, 1];

(iii) o supremo em (3.4) é o máximo, isto é,

IT(x, y) = max{z ∈ [0, 1] | T (x, z) ≤ y}

onde o lado direito existe para todosx, y ∈ [0, 1].

Observação 3.4. Se qualquer uma das afirmações acima vale, a função IT é chamada de im-

plicação residuada gerada porT .

As t-normas podem ser divididas em classes. A seguir, descreve-se duas delas que são consideradas neste trabalho.

Definição 3.7. Diz-se que uma t-norma T é positiva se, ela satisfaz a condição: T (x, y) = 0 se, e somente se,x = 0 ou y = 0.

Definição 3.8. Uma t-norma T chama-se estrita, se ela é contínua e estritamente monotônica, i.e.,T (x, y) < T (x, z) sempre que 0 < x e y < z.

As noções de t-normas podem ser naturalmente estendidas para o contexto mais geral de reticulados (SAMINGER-PLATZ; KLEMENT; MESIAR, 2008; PALMEIRA et al., 2014; PALMEIRA; BEDREGAL, 2012). Nessa perspectiva, apresenta-se algumas definições particulares requeridas ao longo deste trabalho.

Exemplo 3.3. Seja L um reticulado limitado. A função T : L2 → L dada por T (x, y) = x ∧Ly

é uma t-norma que generaliza a clássica t-norma do mínimo, i.e. TM(x, y) = min{x, y}, para

todosx, y ∈ [0, 1].

Definição 3.9. Uma t-norma T sobre um reticulado limitado L é chamada:

(i) ∧-distributiva, se T (x, y ∧ z) = T (x, y) ∧ T (x, z) para todos x, y, z ∈ L

(ii) ∨-distributiva, se T (x, y ∨ z) = T (x, y) ∨ T (x, z) para todos x, y, z ∈ L

Se os itens(i) e (ii) são ambos satisfeitos, então T é chamada (∧ e ∨)-distributiva.

A seguinte definição fornece uma condição para um elemento y de um reticulado L per- tencer à imagem da operação unária T (x, ·) : L → L (SAMINGER-PLATZ; KLEMENT; MESIAR, 2008).

Definição 3.10. (Divisibilidade) Um reticulado L equipado com uma t-norma T : L2 → L chama-se divisível, se para todos x, y ∈ L, com y ≤L x, existe algum z ∈ L tal que

y = T (x, z).

Além das conjunções fuzzy, funções de agregação também fornecem modelos para as dis- junções (para o OU inclusivo) da lógica fuzzy. Uma classe de exemplos de funções de agregação disjuntivas são as t-conormas.

Definição 3.11. Seja L um reticulado limitado. Uma operação binária S : L2 → L chama-se

t-conorma se, para todosx, y, z ∈ L, tem-se:

(1) S(x, y) = S(y, x) (comutatividade);

(2) S(x, S(y, z)) = S(S(x, y), z) (associatividade);

(3) se x ≤Ly então S(x, z) ≤L S(y, z), ∀ z ∈ L (monotonicidade);

(4) S(x, 0L) = x (Elemento neutro).

Observe que T (x, y) 6L x, y e x, y 6L S(x, y), para todos x, y ∈ L. De fato, T (x, y) 6L

x ∧ y 6L x e x 6Lx ∨Ly 6LS(x, y). Observe também que a Definição 3.10 pode ser reescrita

para t-conormas por dualidade.

Exemplo 3.4. Dado um reticulado limitado arbitrário L, a função S dada por S(x, y) = x∨Ly,

para todosx, y ∈ L, é uma t-conorma sobre L que generaliza: SM(x, y) = max{x, y}.

Com base na observação de que t-normas e t-conormas possuem em comum os três axi- omas: associatividade, comutatividade e um elemento neutro, uma generalização dessas duas classes de funções de agregação torna-se bastante útil. Trata-se da classe funções chamadas de uninormas.

Definição 3.12. Considere L um reticulado limitado. Uma uninorma é uma função de agrega- çãoU : L2 → L que é monotônica, associativa, comutativa e que possui um elemento e ∈ L

tal queU (e, x) = x, para todo x ∈ L.

Observação 3.5. Uma uninorma é uma t-norma se e = 1Le uma t-conorma see = 0L.

3.2.2 Funções overlap

Definição 3.13. (BUSTINCE et al., 2010) Uma aplicação O : [0, 1]2 → [0, 1] chama-se função

(O1) O(x, y) = O(y, x);

(O2) O(x, y) = 0 se, e somente se, x · y = 0 (O não possui divisores de zero);

(O3) O(x, y) = 1 se, e somente se x · y = 1 (O não possui divisores de um);

(O4) O é não-decrescente;

(O5) O é contínua.

Exemplo 3.5. (BEDREGAL et al., 2013) As aplicações dadas por Omin(x, y) = min{x, y},

OP(x, y) = xy e Omin max(x, y) = min(x, y) · max(x2, y2), para todos x, y ∈ [0, 1], são

exemplos de funções overlap. Além disso, se O : [0, 1]2 → [0, 1] é uma função overlap en-

tãoO2(x, y) = O(x2, y2) e O√(x, y) = O(√x,√y) são também funções overlap.

Definição 3.14. Uma função overlap O : [0, 1]2 → [0, 1] chama-se deflacionária se:

∀x ∈ [0, 1], O(x, 1) ≤ x; (3.5)

e chama-se inflacionária se:

∀x ∈ [0, 1], x ≤ O(x, 1). (3.6)

Observação 3.6. Uma função overlap O satisfaz 3.5 e 3.6 se, e somente se, O tem 1 como ele- mento neutro. No entanto, existem funções overlap satisfazendo 3.5 (ou 3.6) que não possuem 1 como elemento neutro. Por exemplo, a função overlap Omp(x, y) = min{xp, yp}, com p > 0

ep 6= 1. Sempre que p > 1, Omp satisfaz 3.5, mas não satisfaz 3.6. Por outro lado, quando

p < 1, Ompsatisfaz 3.6, mas não satisfaz 3.5.

Dadas duas diferentes funções overlap O1 e O2, é possível obter outros interessantes exem-

plos de overlap como segue:

(1) (O1∧ O2)(x, y) = min(O1(x, y), O2(x, y));

(2) (O1∨ O2)(x, y) = max(O1(x, y), O2(x, y));

(3) O(x, y) = wO1(x, y) + (1 − w)O2(x, y), para cada w ∈ [0, 1] (soma convexa).

A propriedade da soma convexa para overlap pode ser estendida:

Lema 3.3. Se O1, . . . , Omsão funções overlap ew1, . . . , wm são pesos não-negativos tais que

Pm

i=1wi = 1, então a soma convexa

O(x, y) =

m

X

i=1

é uma função overlap.

Definição 3.15. Considere α ∈ [0, 1]. Uma operação O : [0, 1]2 → [0, 1] chama-se α-migrativa se

O(αx, y) = O(x, αy), para todos x, y ∈ [0, 1]. (3.7)

SeO é α-migrativa para todo α ∈ [0, 1], então O é simplesmente chamada de migrativa.

Exemplo 3.6. A função overlap OP (no Exemplo 3.5) é uma overlap migrativa.

Em (BUSTINCE et al., 2012) foi apresentada uma forma de generalizar a Definição 3.15 considerando uma função de agregação binária A e reescrevendo a Equação (3.7) como segue:

O(A(α, x), y) = O(x, A(α, y)), para todos x, y ∈ [0, 1]. (3.8)

Neste caso, diz-se que O e (α,A)-migrativa e apenas A-migrativa se O é (α,A)-migrativa para todo α ∈ [0, 1].

Proposição 3.5. (BEDREGAL et al., 2013) Uma função overlapO é associativa se e somente se, para todosx, y, z ∈ [0, 1], ela satisfaz o conhecido princípio de intercâmbio:

O (x, O(y, z)) = O (y, O(x, z)) .

Proposição 3.6. (PAIVA et al., 2018) Seja F : [0, 1]2 → [0, 1] uma função. F é uma função

overlap associativa se, e somente se,F é uma t-norma contínua e positiva.

A partir de agora, implicações derivadas da classe particular de conjunções fuzzy determi- nada pelas funções overlap serão consideradas.

Lema 3.4. Uma função I : [0, 1]2 → [0, 1] é uma implicação se existe uma overlap O tal que

I(x, y) = max{r ∈ [0, 1] | O(x, r) ≤ y}, para cada x, y ∈ [0, 1]. (3.9)

Se I é uma implicação gerada a partir de uma overlap O, então frequentemente ela será denotada por IO. Neste caso, IO é chamada uma RO-implicação. Em (DIMURO; BEDREGAL,

2015), os autores consideraram resultados existentes sobre implicações induzidas por conjun- ções fuzzy para introduzir o conceito de implicação residual derivada de funções overlap, de- notada por RO-implicações.

Corolário 3.2. As funções O e IO formam um par adjunto, i.e, elas satisfazem princípio de

Naquele mesmo artigo, foi provado que as RO-implicações são mais fracas que as R-

implicações construídas a partir de t-normas contínuas, no sentido de que as RO-implicações

não satisfazem necessariamente propriedades satisfeitas por tais R-implicações, por exemplo o princípio de troca.

Corolário 3.3. O é associativa se, e somente se, IOsatisfaz princípio de troca:

IO(x, IO(y, z)) = IO(y, IO(x, z)), ∀x, y, z ∈ [0, 1].

O próximo resultado trata-se de um caso particular de um teorema para conjunções fuzzy residuadas, e seus respectivos resíduos, cuja demonstração pode ser vista em [(KRÓL, 2011), Teorema 2].

Teorema 3.4. Seja O : [0, 1]2 → [0, 1] uma função overlap. Considere a implicação fuzzy

IO : [0, 1]2 → [0, 1] derivada de O. Então, as seguintes afirmações são equivalentes:

(i) O é contínua à esquerda;

(ii) O e IOsatisfazem o princípio de residuação;

(iii) IO(x, y) = max{z ∈ [0, 1] | O(x, z) ≤ y}, para todos x, y ∈ [0, 1].

A próxima seção apresenta a ação de automorfismos em funções overlap e algumas propri- edades relacionadas.

3.2.3 Automorfismos e propriedades relacionadas

Definição 3.16. Uma função ρ : [0, 1] → [0, 1] é um automorfismo se, e somente se, ρ é monotônica e bijetiva.

Desde que o inverso de um automorfismo é também um automorfismo e automorfismos são fechados sob a composição, então o conjunto dos automorfismos sobre [0, 1], denotado por AU T ([0, 1]), com o operador de composição forma um grupo. Assim, como de costume em álgebra, pode-se considerar a ação do grupo hAU T ([0, 1]), ◦,−1i em um conjunto de funções de [0, 1]nem [0, 1].

Definição 3.17. A ação de um automorfismo ρ em uma função f : [0, 1]n → [0, 1] é a função fρ : [0, 1]n → [0, 1] dada por fρ(x

1, . . . , xn) = ρ−1(f (ρ(x1), . . . , ρ(xn))). Neste caso, fρ

Um conjunto F de funções n-árias em [0, 1] é fechado sob automorfismos se para cada f ∈ F e ρ ∈ AU T ([0, 1]) tem-se que fρ∈ F .

Para quaisquer f, g ∈ F defina a relação: f ∼ g se, e somente se, g = fρ. Claramente, se g é uma conjugada de uma função f , então também f é uma conjugada de g. De fato, se g = fρ, então (fρ)ρ−1 = f e, portanto, f = gρ−1. Além disso, se f é uma conjugada de g e,

por sua vez, g é uma conjugada de h, então f é uma conjugada de h. Portanto, cada função é conjugada de si mesma. Isto mostra que “∼” é uma relação de equivalência sobre o conjunto F fechado sob automorfismos. Em particular, as classes de t-normas, t-conormas e implicações são fechadas sob automorfismos (KLEMENT; MESIAR; PAP, 2000; BACZYNSKI; JAYARAM, 2008; BUSTINCE; BURILLO; SORIA, 2003).

O próximo resultado mostra que a classe das funções overlap também é fechada sob auto- morfismos (PAIVA et al., 2018;BEDREGAL et al., 2013).

Proposição 3.7. Seja O uma função overlap. Uma conjugada de O, denotada por Oρ, satisfaz as seguintes propriedades, para qualquerρ ∈ AU T ([0, 1]) e x, y ∈ [0, 1]:

(i) Oρé não-decrescente;

(ii) Oρ(x, y) = Oρ(y, x);

(iii) Oρ(x, y) = 0 se, e somente se xy = 0;

(iv) Oρ(x, y) = 1 se, e somente se xy = 1;

(v) Oρé contínua.

No que segue, apresenta-se uma generalização da noção de automorfismos para o contexto de reticulados.

Definição 3.18. Seja L um reticulado limitado. Uma função ρ : L → L é um automorfismo se:

(i) ρ é bijetiva;

(ii) x6L y se, e somente se, ρ(x) 6L ρ(y).

Proposição 3.8. (PAIVA et al., 2019) Seja ρ : L → L um automorfismo e f : Ln → L uma

operaçãon-ária. Se ρ (f (x1, . . . , xn)) = f (ρ(x1), . . . , ρ(xn)) Então

Demonstração. Desde que f (ρ−1(x1), . . . , ρ−1(xn)) = ρ−1(ρ (f (ρ−1(x), . . . , ρ−1(xn)))) segue-

se da hipótese que

ρ−1 f ρ ρ−1(x1) , . . . , ρ ρ−1(xn) = ρ−1(f (x1, . . . , xn))

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