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CAPÍTULO 3: Saúde Bucal no município de São Paulo

3.2. Fundamentos dos procedimentos coletivos em saúde bucal

A cárie dentária constitui-se em importante problema de saúde e no maior problema de saúde bucal no Brasil, atingindo cerca de 90% (noventa porcento) da população. Em estudo realizado pelo Ministério da Saúde em 1985/86 demonstrou- se que as crianças de 12 anos apresentavam uma média de 6,7 dentes permanentes atacados pela cárie, mais que o dobro da meta proposta pela Organização Mundial da Saúde – OMS e Federação Dentária Internacional – FDI para o ano 2000 – de até 3 (três) dentes atacados nesta idade.

O estado de saúde de uma população é definido em função do conjunto de fatores sociais, biológicos e psíquicos que estabelecem diferentes níveis de suscetibilidade às doenças e aos agravos à saúde. As doenças bucais compõem o quadro geral de saúde da população e suas manifestações refletem as formas de organização social da produção e da apropriação de bens e serviços na sociedade.

A proposta para superação dos graves problemas detectados na população brasileira, no referente à saúde bucal, é a mudança no modelo de atenção, buscando na prevenção e no trabalho em equipe a estratégia de redução dos mesmos.

Os chamados Sistemas de Prevenção em Saúde Bucal Coletiva estão baseados nesta proposta de atuação. Assim, são constituídas programações que possam, a médio prazo, reduzir as doenças e as necessidades de tratamento. Tais programações não supõem a eliminação ou ausência de ações assistenciais, mas sim, propõem a sua diminuição.

A base do sistema de prevenção é a fluoretação das águas de abastecimento público, com adequado controle dos teores de flúor, e extensão da rede de abastecimento a toda população. Os outros métodos de prevenção serão eleitos de acordo com as necessidades e risco da população.

Os sistemas de Prevenção, planejados localmente a partir da articulação entre a unidade de saúde e suas escolas/creches, incluem ações como bochechos com solução fluorada, aplicações tópicas de fluoretos, escovações supervisionadas, entre outras. Nessas ações a atenção não se limita a cada criança, mas ao coletivo, procurando-se o controle epidemiológico dos problemas de saúde identificados no grupo.

No Brasil, em 1986, o Ministério da Saúde realizou o primeiro estudo de abrangência nacional no sentido de investigar os problemas de saúde bucal prevalentes na população brasileira residente em zona urbana, com amostra de 16 capitais estaduais.

A prática odontológica hegemônica, preocupada em responder às consequências das doenças já instaladas, sem conhecer adequadamente seu comportamento nas diferentes situações sociais, tem sido muito questionada e é facilmente descaracterizada, visto que não tem atendido às necessidades de tratamento da população, nem alterado o quadro de doenças.

O relatório final da I Conferência Estadual de Saúde Bucal, realizada em 1986, indicava que

A prática odontológica do setor privado, centrada na atuação curativa, tem custo elevado e torna-se acessível para apenas 5% da população que pode utilizar tais serviços de forma regular. O restante da população fica sujeita a irregularidades, ou total ausência dos serviços. Quanto aos serviços públicos, observa-se que apresentam uma oferta inelástica de serviços, operando com os mais variados modelos de atendimento e escassos recursos.

Na II Conferência Nacional de Saúde Bucal, em 25/09/1993, o relatório menciona que:

A odontologia brasileira vem carregando há vários anos uma contratação insustentável: ao mesmo tempo em que é considerada uma das mais avançadas do mundo sob o ponto de vista técnico, constata-se na população do país um dos índices mais elevados de doenças bucais entre a comunidade de mais de 180 nações do planeta. Trata-se, portanto, de uma odontologia tecnicamente de qualidade e sofisticação, cientificamente discutível e socialmente caótica.

O conhecimento da situação epidemiológica da população é essencial para o planejamento e a execução de ações em saúde bucal, sendo o caminho correto de superação do atendimento indiscriminado da livre demanda, ou seja, do atendimento às pessoas que por sua própria iniciativa recorrem às unidades de tratamento disponíveis. (PINTO,1990).

A superação do empirismo no desenvolvimento de ações e adequado acompanhamento da saúde bucal de uma comunidade é responsabilidade da equipe de saúde local. Para desempenho da sua missão, a equipe deverá identificar e medir os problemas, fazer o diagnóstico das doenças dentárias e bucais na comunidade, a fim de poder traçar um plano de ação. (CHAVES, 1986)

Quadro 4 – Critérios de Risco de Cárie

Classificação Grupo Situação individual

Baixo Risco A Ausência de lesão de cárie, sem placa, sem gengivite e/ou sem mancha branca ativa

B História de dente restaurado, sem placa, sem gengivite e/ou sem mancha branca ativa

Risco Moderado

C Uma ou mais cavidades em situação de lesão de cárie crônica, mas sem placa, sem gengivite e/ou sem mancha branca ativa

D Ausência de lesão de cárie ou presença de dente restaurado, mas com presença de placa, de gengivite e/ou de mancha branca ativa E Uma ou mais cavidades em situação de lesão de cárie aguda Alto Risco

F Presença de dor e/ou abscesso

Do ponto de vista biológico, a cárie resulta da presença de microorganismos, carboidratos, susceptibilidade do hospedeiro e ação ácida prolongada. A estrutura dentária está constantemente exposta à ação dos ácidos produzidos pelos microorganismos na fermentação dos carboidratos, sofrendo desmineralização que, em seus estágios iniciais, pode ser revertida, sendo que frequentemente ocorre no ambiente bucal. Em condições desfavoráveis, com manutenção de pH ácido por período prolongado e recorrente, esse processo não é suficiente para interromper a desmineralização, situação em que a doença instala-se de forma definitiva através de cavitações na estrutura dentária.

A capacidade de diferenciar as lesões de cáries ativas das inativas é essencial para diferenciar o indivíduo doente que deve ser submetido a um tratamento específico para controlar a doença, do indivíduo com sequelas de uma doença que ocorreu em outro momento.

Outra doença bastante prevalente na população é a doença periodontal. A doença periodontal, como a cárie, é decorrente da placa bacteriana. Os cuidados com a higienização são os mais ligados à presença e evolução da doença periodontal. A limpeza adequada das superfícies dentárias, inclusive das áreas interdentais e sulcos gengivais é suficiente para previnir sua ocorrência.

Quadro 5 – Classificação do sextante segundo critérios de Risco para a Doença Periodontal

Classificação Código Critérios

0 Elemento com periodonto sadio Baixo Risco

X Ausência de dentes no sextante 1 Elemento com gengivite

2 Elemento com cálculo supra gengival Risco Moderado

B Seqüelas de doença periodontal anterior

6 Elemento com cálculo subgengival e com mobilidade reversível ou sem mobilidade

Alto Risco

8 Elemento com mobilidade irreversível e perda da função

Fonte: Diretrizes para a Atenção em Saúde Bucal – Crescendo e Vivendo com Saúde Bucal. SMS/SP, 2009.

Essa classificação toma por base o índice de Russell modificado, examina-se e classifica-se apenas os dentes-índice para cada sextante, o indivíduo será classificado pelo código de seu pior sextante.

É preciso compreender que ter saúde bucal significa não apenas ter dentes e gengivas sadias. Significa estar livre de dores crônicas e outras doenças e agravos que acometem o aparelho estomatognático. Implica na possibilidade de uma pessoa exercer plenamente funções como mastigação, deglutição e fonação, exercitar a auto-estima e relacionar-se socialmente sem inibição ou constrangimento, o que contribuirá para sua saúde geral (PETERSEN 2003; NARVAI 2003; SES-SP 2004).

Durante muitas décadas, a atenção à saúde bucal caracterizou-se por prestar assistência às crianças, fossem estas escolares ou não, através de programas curativos voltados para o tratamento da cárie e as atividades preventivas, quando realizadas nas escolas, limitavam-se a um método, o bochecho com solução fluorada.

A mudança no perfil epidemiológico da cárie dentária na população infantil se caracteriza como um fenômeno denominado polarização, que corresponde ao fato de 25 a 30% da população escolar acumular 80% das necessidades de tratamento, enquanto o restante encontra-se livre ou com baixos índices de cárie.

A falta de acesso dos adolescentes e da população adulta aos serviços de saúde bucal gerou um número muito grande de necessidades acumuladas e de maior complexidade das ações resolutivas.

Com isso, faz-se necessária uma mudança no modelo de atenção em saúde bucal com o redirecionamento das ações assistenciais, tanto no que diz respeito ao público alvo contemplado, quanto na sua complexidade, sendo primordial a utilização dos dados epidemiológicos disponíveis no planejamento dos serviços, aliados aos determinantes sócio-econômicos do processo saúde-doença.

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