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Os Fundamentos do Toque Estético

No documento Denis Diderot: uma estética do corpo musical (páginas 172-182)

CAPÍTULO III CONTRIBUTOS PARA UMA ESTÉTICA DO CORPO

1. Os Fundamentos do Toque Estético

a) A Ressonante Sensibilidade Estética

A expressão “sensibilidade estética” edifica-se sobre um pleonasmo, atendendo à etimologia da palavra estética. Deriva do grego aisthesis que significa percepção e sensação. Este termo entra no vocabulário filosófico como uma tentativa, muito modesta, para explicar os processos fisiológicos envolvidos na percepção de um objecto. A ele se aliam outros termos como aisthete que significa “os sensíveis” e aistheton que denomina tudo aquilo que pode ser percepcionado pelos sentidos, ou seja, objecto dos mesmos (opondo-se a noeton). Exercendo-se a “sensibilidade estética” sobre o universo do belo, daquilo que produz em nós o prazer estético, urge delimitar a origem e essência da beleza, para que aprendamos a reconhecer a privacidade desta categorização e do seu toque tocante. Este toque distinto demonstra, mais uma vez, a reflexividade de toda a sensibilidade vital devido à sua estrutura receptivo - activa que se particulariza na relação do nosso corpo animado e ressonante com o instante em que a coisa nos toca, da qual resulta uma vibração demorada da coisa em nós.

Com Diderot reinicia-se uma investigação sobre o timbre identitário do toque estético, uma vez que o nosso corpo musical polifónico é capaz de executar tantos outros toques ímpares.

b) A Origem e Essência do Belo

Diderot inicia uma reflexão histórico-filosófica sobre a concepção do belo, na obra

Investigações Filosóficas sobre a Origem e a Natureza do Belo, de 1752. O autor ao

querer provar a sustentabilidade da sua tese sobre o belo sensível que recai sobre a natureza, vai afastando para a periferia as especulações exemplares dos filósofos que conceberam o belo como entidade inteligível com os seus cânones, modelos e princípios

a priori. Com esta finalidade afirma que Platão, na obra Fedro, reflectiu sobre o amor

natural que se sente pela beleza e não sobre a beleza enquanto tal e que no escrito Hípias

Maior desenvolveu uma definição não circular, mas negativa da beleza. No entanto,

Platão legitimava a transcendência da Ideia de Belo pela sua simplicidade e incorruptibilidade, tradução da perfeição, bem como, ulterior e diversamente, Santo Agostinho que associava a essência da beleza a uma certa unidade original, eterna,

soberana e perfeita que transcendia o espírito humano. Esta unidade trans-humana que Santo Agostinho enunciava tratava-se da regra ancestral do belo. Assim, por exemplo, uma construção arquitectónica deveria assegurar a similitude, a igualdade e a conveniência das suas partes que, por sua vez, na sua individualidade se subdividiriam numa infinidade de parcelas ainda mais pequenas. Concluía, pois, que a unidade que todo o edifício humano ou que qualquer outra obra de arte deveriam imitar para serem belos, jamais copiaria a perfeita unidade, devido à insuficiência da materialidade corpórea. Sabemos, no entanto que Diderot, já em 1752, procura a génese e essência comum da beleza não no céu, mas na terra, no plano desta materialidade corpórea precedentemente menosprezada. Por conseguinte, o autor só poderá considerar como característico do toque estético tudo aquilo que se conceba sem Deus ou sem a perfeição trans-humana acima explicitada.

Diderot distancia-se, também, de Wolff3 que definia a beleza como aquilo que nos agrada, porque a coisa onde esta recai é perfeita e é a perfeição objectiva que produz em nós esse efeito, o que demonstra uma certa confusão entre a beleza, o prazer e a perfeição. O seguidor de Leibniz não foi tão longe na sua investigação como, por exemplo, Santo Agostinho ou Platão, que sustentavam a primazia do Belo em relação aos graus subjectivos de agradabilidade. Do mesmo modo, critica Crousaz4, porque este deu mais valor à aprovação, à impressão que se experimenta na presença da beleza do que à essência da mesma. Para além disso, discorda da definição muito vaga que o autor tece sobre a noção em causa. Diderot contesta, assim, os cinco caracteres crousazianos do belo que são, a saber, a variedade que este nunca soube definir, a unidade que é a relação de todas as partes em relação a um fim, a regularidade que consiste na posição semelhante das partes constituintes entre si, a ordem que é uma certa degradação das partes que é preciso observar na passagem de umas para outras e a proporção que se trata de uma unidade “temperada” de variedade, de regularidade e de ordem entre as partes. Diderot defende ainda que esta noção é demasiado particular, na medida em que só convém aos grandes todos dos diversos géneros artísticos como uma obra de arquitectura, uma peça de eloquência, um drama, mas que nunca pode convir a uma porção circunscrita de um objecto estético como uma palavra ou um pensamento. No que

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. A estética de Jean-Chrétien Wolff está transcrita na obra Psychologia Empírica de 1732.

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A obra de Jean-Pierre Crousaz, Traité du Beau, foi publicada, pela primeira vez, em Amesterdão no ano de 1714.

respeita a Hutcheson5, refere que a realidade do sentido interno da beleza que o autor colocou em relevo continua por justificar. De facto, o autor irlandês defende este sexto sentido sem o saber situar concretamente no domínio humano. Apesar de o definir como a faculdade anímica através da qual distinguimos as coisas belas e que nos permite receber na alma a ideia de beleza, não refere o seu lugar determinado nem a causa que a evoca, cingindo-se a uma ideia vaga de uniformidade na variedade. Todavia, este sentido interno parece habitar na alma que, para Diderot, só faz sentido enquanto corpo, corpo este dotado apenas de cinco sentidos exteriores comuns ao homem e aos animais.

Diderot questiona ainda Shaftesbury6, porque este cria um sistema que considera a utilidade como o único fundamento do belo. Para este autor, o útil é entendido como aquilo que melhor e mais perfeitamente produz o efeito que se pretende e o belo como a coisa que está ordenada de forma a produzir mais perfeitamente o efeito que se propõe, o seu dever - ser. Seguindo este pensamento, um homem só pode ser belo quando os seus membros estão tão bem proporcionados que asseguram a prossecução de todas as suas funções animais. Pelo contrário, os baixos-relevos, os vasos e todos os objectos ornamentais como são inúteis jamais poderão ser belos. Diderot confessa que observa tantas obras irrecusavelmente belas e inúteis na natureza, que a utilidade não pode ser universalmente responsável pela beleza.

Releva ainda uma limitação no pensamento de Padre André7: não basta definir o belo subdividindo-o reiteradamente: partindo do belo essencial que consiste na observância da regularidade, da ordem, da proporção e da simetria em geral, passa pelo belo natural que faz recair a aplicação das características anteriores nos seres naturais e pelo belo artificial que as revê nas produções mecânicas. Mas nada quer saber sobre o seu surgimento.

Para Diderot, importa primacialmente reflectir sobre a origem do toque musical da beleza. Neste sentido, encontra a génese ou origem do belo na experiência, na viagem guiada, entre a natureza e a técnica8, pelos passos da humanidade. Assim, os seres humanos nascem, segundo ele, simultaneamente com a faculdade de sentir e de pensar. Nascem, igualmente, com necessidades ou indigências que não são apenas de ordem natural, por isso são obrigados a recorrer a vários subterfúgios - as necessidades

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Francis Hutcheson escreveu obras como An Inquiry into the Original of our Ideas of Beauty and Virtue, de 1725 ou An Essay of the Nature and Conduct of the Passions, de 1728.

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Desde a tradução que Diderot fez da obra do autor supracitado Ensaio sobre o Mérito e a Virtude, que une a beleza à virtude e assegura que a primeira é inseparável da segunda que a reflecte. Insiste particularmente no cariz objectivo destas qualidades.

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Diderot interpreta a obra Essai sur Le Beau, do Padre André, obra do jesuíta que foi editada em Amesterdão no ano de 1759.

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supérfluas de que falava o taitiano no Suplemento à Viagem de Bougainville - constitutivos do mundo além natural da artificialidade como os utensílios, as máquinas ou quaisquer outras invenções do mesmo género. Estes subterfúgios supõem a combinação e arranjo das partes tendentes a um fim determinado. Assim, das nossas necessidades e do exercício das nossas faculdades nascem em nós as ideias de ordem, arranjo ou combinação, relação (relações), simetria, mecanismo, proporção e unidade. Como vemos, estas ideias são baconianamente positivas como todas as outras, são a

posteriori ou experimentalmente conquistadas, pois provêm do exercício reiterado dos

órgãos dos sentidos e da experiência. São, pois, representações claras e distintas, tão reais como as noções cartesianas de comprimento, largura, profundidade, quantidade e número. É através da actividade abstractiva da razão, que todas estas imagens de ordem, arranjo ou combinação, relação (relações), simetria, mecanismo, proporção e unidade, se vão convertendo, a seu tempo, em noções puramente lógicas que todos nós aplicamos ao mundo envolvente. Para Diderot, estes caracteres são os elementos plurais, configuradores da noção mais geral de beleza que terá, necessariamente, um fundamento real capaz de denunciar o carácter objectivo da beleza, não limitando a sua essencialidade a um juízo estético determinado, produto e produtor de uma agradabilidade ou de um sentimento estritamente subjectivo. Movido por estas razões, o autor pretende descobrir o princípio comum e singular responsável pela presença da beleza em todos os seres e objectos sem excepção. Este denominador universal não poderá coincidir, por exemplo, com a noção aristotélica de diferença específica, na medida em que a predicação da beleza se tornaria privilégio de uma só espécie.

c) A Tessitura do Belo: o belo real e o belo percebido

Poderemos traçar a história diderotiana das suas impressões sobre o belo e sobre o seu toque fecundo a partir do convívio que o autor teve com os Mestres Jesuítas. Através deles, Diderot conheceu o mundo da poesia clássica. Paralelamente, o seu fascínio e admiração pela álgebra e pela geometria entraram em crescendo, sobretudo, quando terminou os seus estudos entre os Jesuítas. Consequentemente, a beleza que vira ligada à poesia é substituída por uma beleza que se aparenta mais com a harmonia numérica ou com a chamada beleza abstracta que De D’Alembert aprendera a dignificar. Por esta razão, a obra em estudo estende a distribuição do predicado da beleza a objectos como os teoremas e os problemas matemáticos ou as figuras

geométricas, em vez de a limitar às concretizações artísticas e naturais. Este momento do seu pensamento sobre o belo é profundamente influenciado pela música que se nutre das matemáticas, sua matriz invisível. Aliás, Diderot reescreve esta relação secreta entre a harmonia dos sons e o jogo dos números, centrando-se nela para definir a beleza em termos gerais e enquanto propriedade distintiva que provoca o acto supremo do paradigmático entendimento do sábio ou do filósofo, criador de sínteses. Seguindo este modelo humano ainda não artístico, define o belo do modo que se segue: “Chamo, pois,

belo fora de mim, a tudo o que contém em si algo capaz de despertar no meu

entendimento a ideia de relação; e belo em relação a mim, tudo aquilo que desperta esta ideia”9.

O autor concebe, assim, o belo como um atributo relacional, visto que a relação (relações) é a única qualidade comum que encontramos ao percorrer o universo de seres que consideramos belos. Distingue, no entanto, o belo no objecto ou belo real, do belo para o sujeito ou belo percebido, afastando a sua noção de belo de uma exacta adequação entre sujeito e objecto.

A noção de relação (relações) é a causa diderotiana da beleza, pois os seres poderão excluir de si mesmos qualidades acessórias como as de grandeza, de utilidade, de aparência ordeira e simétrica. São casos ilustrativos de assimetria natural a representação irregular e caótica de um temporal ou a dissonância de sons corpóreos como o grito. Define pois a noção de relação como adiante se transcreve: “A relação, em geral, é uma operação do entendimento, que considera quer um ser, quer uma qualidade, enquanto esse ser ou essa qualidade supõe a existência de um outro ser ou de uma outra qualidade”10. Infere-se das palavras de Diderot que, embora a relação (relações) seja uma operação do entendimento, retira o seu fundamento da realidade. As verdadeiras relações radicam nas próprias coisas que são constituídas intrinsecamente por estas. A substância das coisas é um tecido de relações reais, logo as relações que se descobrem fora das coisas ou que colocamos nelas não podem ser a causa da beleza; são puras quimeras. Nesta classe, poderemos incluir as relações intelectuais ou fictícias que o nosso entendimento e a nossa imaginação acrescentam às coisas.

9 D. Diderot, Recherches Philosophiques sur L’Origine et La Nature du Beau, in Denis Diderot, Oe. Esth.,

p. 418: “J’apelle donc beau hors de moi, tout ce qui contient en soi de quoi revéiller dans mon entendement l’idée de rapports; et beau par rapport à moi, tout ce qui reveille cette idée.”

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D. Diderot, idem, p. 424: “Le rapport en général est une opération de l’ entendement, qui considère soit un être, soit une qualité, en tant que cet être ou cette qualité suppose l’existence d’un autre être ou d’une autre qualité.”

Consequentemente, quando consideramos um ser belo, estamos atentos às relações que nele observamos, ou seja, às relações reais que o nosso entendimento encontra nesse ser, com o auxílio dos sentidos. Estas tornam-se relações percebidas para o sujeito estético. A beleza reside, pois, nas relações reais contidas nas coisas e a sua percepção constitui o elemento essencial da noção que o homem forma em si de beleza.

A ideia de relação (relações) só se torna, efectivamente, compreensível se a unirmos à ideia diderotiana de percepção. Neste momento, a objectividade das coisas dialoga com a organização subjectiva e relativa do homem. Desta articulação nasce o sentimento ressonante do belo que ocorre sempre que o toque da coisa fora de nós impressiona a nossa sensibilidade e suscita o julgamento do nosso entendimento que combina estas ideias (relação ou relações). Assim, o sujeito que percebe a coisa com o seu corpo, é guiado pela sensação que esta provoca e que faz tocar algumas das suas cordas tocáveis. Só elas reagem a esta exterioridade delimitada, vibrando entre si e estendendo a sua vibração a outras, como acontece com um som emitido que traz consigo as suas harmónicas11, a partir das quais se engendram outros sons. Como vemos, a exterioridade que exige, primeiramente, receptividade, transporta-se para a interioridade humana através duma actividade de ressonância primeira e segunda que engendram, pelo reconhecimento perceptivo das relações, o sentimento do belo. Oportuno será relembrar que o termo “percepção de relações” é originário do vocabulário musical tão expressivo do valor dado pelos Enciclopedistas a esta arte. Diderot inspira-se também em Leibniz que via na percepção das relações entre sons o princípio do prazer musical. Mas, o que importa relevar não é a simples repetição deste princípio leibniziano, mas a forma como o autor o vai interpretar: o corpo do homem permuta a sua veste, tornando-se um todo montado pela música, facto que lhe permite saborear a melodia do belo, despido das peças dispostas ruidosa e mecanicamente. Para além disso, estende este princípio a todas as artes, fazendo dele o emblema estético do prazer em geral que, como vemos, nasce da mais imaterial das artes. Terá sido ainda influenciado pelo fenómeno de recepção musical que faz convergir o sujeito e o objecto estéticos quando ocorre a harmonia ou a consonância das cordas vibrantes subjectivas com os sons do objecto estético que se unificam no timbre.

Diderot tem o mérito de sublinhar, com o auxílio da música, a natureza relacional e, ao mesmo tempo, relativa do belo. De facto, o homem não tem a percepção de uma coisa

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Em linguagem musical representa um som produzido numa série de sons que acompanham um outro que é fundamental.

diferente de si, em estado de “verdade sensorial pura”, antes estabelece um acorde consonante que pode ter derivado da dissonância entre as impressões exteriores e a sua interioridade própria, sendo o termo “percepção” equivalente ao termo “organização”. Diderot define este diálogo do seguinte modo: “A percepção das relações é, então, o fundamento do belo.”12

A união entre relação e percepção, como constatámos, é o emblema estético e aplica-se a todas as artes, ciências e à natureza, de modo que quando avaliamos, por exemplo, uma máquina, um quadro, um concerto, um fenómeno natural, só os categorizamos como belos, desde que expressem este fundamento estético unitivo. No entanto, a sua compreensão mais profunda pressupõe a explicitação da essência do belo real e do belo percebido.

Diderot afirma que um mesmo objecto ou ser, qualquer que seja, pode ser considerado belo, solitariamente, em si mesmo (belo real), ou relativamente a outros objectos ou seres (belo relativo). Assim, quando se consideram belos, por exemplo, uma flor ou um peixe, em si mesmos, desligados de todas as outras flores ou peixes, estamos a falar do belo real. Se, pelo contrário, atribuímos a qualidade de belo à flor ou ao peixe, por comparação a outras flores e a outros peixes, estamos perante o belo relativo. Nos dois casos, não nos afastamos do elemento comum originante da beleza que é a percepção das relações, ou seja, a apreensão, nas partes que compõem estes seres, de qualidades como a ordem, o arranjo ou combinação, a simetria, que traduzem as suas relações essenciais expressivas. Infere-se que se o homem julgar a realidade, desenvolvendo um esforço particularizante, “encontra” o belo real; se desenvolver um esforço generalizante e, simultaneamente, comparativo (há múltiplos belos relativos – ex: comparação entre rosa – rosas – flores – plantas – seres vivos), “encontra” o belo relativo. Afirma o autor o seguinte, a propósito desta problemática: “Podemos assegurar que qualquer que sejam os exemplos tomados na natureza, na pintura, na moral, na arquitectura, na música, etc., encontrá-los-ão sempre que se atribua o nome de belo real a tudo o que contém em si algo que desperte ou acorde a ideia de relação; e o nome de belo

relativo, a tudo o que desperte as relações convenientes com as coisas a partir das quais

foi feita a comparação.”13

12 D. Diderot, Recherches Philosophiques sur L’Origine et La Nature du Beau, in Oe. Esth., p. 428: “La

perception des rapports est donc le fondement du beau.”

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D. Diderot, idem, p. 422: “Mais nous pouvons lui assurer que, soit qu’il prenne ses exemples dans la nature, ou qu’ils les emprunte de la peinture, de la morale, de l’architecture, de la musique, il trouvera toujours qu’il donne le nom de beau réel a tout ce qui contient en soi de quoi réveiller i’idée de rapport,

O belo real recai sobre as coisas mesmas, sobre a exterioridade, sem desprezar o sujeito cujo entendimento observa a ideia de relações, enquanto o belo percebido, sempre relativo ao sujeito, à sua interioridade, não despreza a própria coisa que suscita a ideia de relações. O suporte do belo real é a coisa e do belo percebido é o sujeito que alicerça a sua consideração estética na coisa. O belo percebido é um belo relativo ao sujeito e que exige reconhecimento objectivo. Como nos diz Diderot: “O belo é sempre belo. Só a minha sensação varia. Eu passo à frente da fachada do Louvre sem a ver. Ela será menos bela para mim? De modo nenhum.”14

Resumindo a mensagem anterior, se o homem deixar de pensar ou de ver a fachada do Louvre, as partes que a compõem continuarão a ter a mesma forma e arranjo entre si, tal como a fachada continuará a ser bela independentemente da existência da humanidade. O desaparecimento desta última seria acompanhado do desaparecimento da noção de belo relativo ou percebido. A beleza é, pois, uma percepção do homem que resulta da sua estrutura física e mental, exigindo sempre a aplicação desta estrutura subjectiva a um dado objecto.

As relações radicam nas ideias de origem, arranjo, simetria, mecanismo, proporção e unidade. Sem elas o homem torna-se incapaz de qualificar as coisas que revelam, através destas qualidades, a sua melodia essencial. Ora, na medida em que a palavra beleza se aplica às coisas belas, são estas relações percebidas que aproximam a humanidade da sua natureza e o momento psicológico em que isso acontece é o da percepção.

Mas as relações percebidas podem ser confusas e indistintas. A beleza resulta, neste caso, de uma percepção confusa da riqueza e da complexidade das relações, sem que haja

No documento Denis Diderot: uma estética do corpo musical (páginas 172-182)