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Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior FIES

1.4 As políticas públicas de acesso e permanência no ensino superior entre as décadas de 1990 e

1.4.1 As políticas educacionais de garantia de acesso e permanência no ensino superior nas instituições privadas: entre os governos FHC e Lula.

1.4.1.1 Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior FIES

Apesar de o governo FHC defender a privatização de bens e serviços e estar alicerçado na ideologia neoliberal, havia grupos que objetivavam o fortalecimento de um Estado Social e que buscavam alternativas para a democratização do acesso ao ensino superior. Sendo assim, a partir da correlação de forças estabelecida entre as partes envolvidas no processo, de um lado os que defendiam a gratuidade e expansão do ensino superior público e do outro aqueles que defendiam o setor privado de educação superior, foi possível combinar os interesses mútuos de forma a garantir a coexistência de instituições públicas e privadas de ensino superior, porém, com forte incentivo à privatização da área. É interessante pensar que qualquer ação que visasse a expansão do acesso ao ensino superior teria suas bases alicerçadas em ações de fortalecimento das IES privadas e, também, de enfraquecimento das IFES ou mesmo de quaisquer ações que viessem a ser de responsabilidade do Estado. Sobre o exposto, Paula (2006, p. 134) traz que, em especial na década de 1990,

[...] com a crise fiscal do Estado em várias partes do mundo e o avanço do modelo neoliberal, começou a se dar um novo tipo de relação universidade- governo. O Estado vai retirando-se progressivamente do financiamento da mesma, adotando políticas de ajuste neoliberal. Nesse sentido a educação superior passa a ser concebida como serviço a ser vendido e comprado no mercado, deixando de ser vista como direito do cidadão e dever do Estado. Esta concepção, ditada sobretudo nos organismos internacionais, tais como OMC, Banco Mundial, FMI, dentre outros, tem exercido forte influência sobre o caso brasileiro, sendo a educação superior colocada numa relação estreita de custo/benefício, segundo uma ótica instrumental reducionista. Dessa forma, as políticas públicas para o ensino superior e de garantia de acesso a esse nível educacional, nesse período, foram fortemente conduzidas pela lógica neoliberal. O discurso e a prática relativos às políticas educacionais estiveram bastante afinados e revelaram a intensificação da parceria público/privada, com a propagação de cursos pagos de extensão e com a estreita relação entre fundações privadas e universidades públicas (CARVALHO, 2006,

p. 130). Nesse período, as políticas sociais e o Estado Social não eram incentivados. As políticas e programas criados nesse momento refletiam exatamente a concepção adotada pelo governo FHC, alicerçada na ideologia neoliberal. Indo ao encontro dos interesses desse governo, o FIES surge como reflexo dessa ideologia que permeava esse momento, tornando- se a principal alternativa para aqueles que desejavam graduar-se, mas não tinham condições financeiras imediatas para se manter no curso superior.

O FIES foi, portanto, um instrumento criado objetivando compor a proposta do governo FHC de democratização da educação superior, indo ao encontro também da questão da ociosidade das vagas da rede privada (PINTO, 2004, p. 747). Naquele momento, a expansão do setor privado, apresentava resultados desagradáveis: excesso de vagas ociosas nas várias instituições privadas, ou por não preenchimento das mesmas no momento do vestibular, ou ainda por evasão. Sendo assim, o FIES foi um mecanismo de acesso ao ensino superior destinado aos graduandos das IES particulares de forma a financiar o curso daqueles que não apresentam condições econômicas para arcar com as mensalidades. Para tanto, o aluno deveria estar matriculado em uma IES particular inscrita no programa e o curso teria que ter passado por avaliação do MEC e deveria ter obtido resultado satisfatório nessa avaliação.

O Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior – FIES – foi instituído em 1999 para substituir o Programa de Crédito Educativo – PCE/CREDUC, criado em 1975 e extinto por motivo da inadimplência dos beneficiados pelo programa. Pinto (2004, p. 748) traz, em seu estudo, a seguinte afirmativa sobre o PCE/CREDUC: “[...] segundo dados da Caixa Econômica Federal, cerca de um milhão de estudantes foram atendidos pelo CREDUC e, de um total de 194.520 contratos em fase de amortização (valor de R$ 1,864 bilhão), 163.870 contratos estão inadimplentes, o que corresponde a 84% deste total”. Verifica-se, com os dados explicitados pelo autor, que o índice de inadimplência do antigo programa era verdadeiramente alto, conduzindo-o ao insucesso.

O FIES foi criado pela Medida Provisória nº 1.827, de maio de 1999, e orientado pelas Portarias nº 860, nº 861 e nº 1.386, de 15 de setembro de 1999. Essa última dispunha sobre a forma e critérios de seleção dos candidatos ao programa, afirmando que “os candidatos ao FIES seriam selecionados em função da renda familiar e das condições de moradia, ou seja, teriam prioridade aqueles com menores disponibilidades financeiras, desde que a parcela da mensalidade não financiada não excedesse 60% da renda familiar per capita” (CORBUCCI, 2007, p. 25). Outros dados relevantes sobre esse programa e que devem ser considerados nessa análise são expostos por Corbucci (2007, p. 25): a taxa de juros aplicada é fixada no

momento da assinatura do contrato, estando em vigência por todo o período do contrato; o período máximo para se utilizar o FIES deve ser o mesmo período de duração regular do curso, devendo ser descontados os semestres já cursados antes do ingresso do estudante no programa; o trancamento ou afastamento do curso não pode ser superior a um ano; o aluno deve apresentar um rendimento acadêmico em que haja 75% de aprovação nas disciplinas cursadas. Sobre a taxa de juros, pode-se afirmar que até 2005 ela estava fixada em aproximadamente 9% ao ano. A partir de 2006, a taxa era de 3,5% para alguns cursos específicos, como, por exemplo, cursos tecnológicos e licenciaturas, e de 6,5% para os demais cursos. Em 2012 essa taxa foi reduzida para 3,5% ao ano para qualquer curso. Isso demonstra que, nos últimos anos, houve um empenho do governo no sentido de reduzir os juros cobrados pelo financiamento do ensino superior de forma a garantir maior acesso a esse nível educacional e, consequentemente, reduzindo a evasão.

O orçamento anual destinado ao FIES é oriundo dos recursos da Loteria Federal, do orçamento do MEC, e dos reembolsos dos próprios empréstimos concedidos pelo FIES (SCHWARTZMAN, 2005, p. 38). Corbucci (2004, p. 684) expõe, porém, que esse sistema foi criado para se tornar autofinanciável, mas que o índice de inadimplência tem sido muito alto, impossibilitando a rotatividade do financiamento. Desde a criação do FIES, entre as renovações do financiamento e as novas contratações foram destinados aproximadamente R$ 4,6 bilhões, e somente no ano de 2007 aproximadamente 500 mil estudantes contaram com o FIES, estando eles matriculados entre as 1.459 IES inscritas no programa. Corbucci (2007, p. 25) apresenta ainda os seguintes dados:

O FIES contemplou, em seu primeiro ano de existência, aproximadamente 67 mil estudantes, selecionados entre pouco mais de 131 mil candidatos inscritos. Do momento de sua criação a 2005, foram beneficiados cerca de 372 mil estudantes. Deste total, 7,7 mil já haviam liquidado seus contratos, enquanto outros 19 mil foram suspensos. Por sua vez, a inadimplência atingia cerca de 38 mil beneficiários, o que representava pouco mais de 10% do total de contratos.

Há autores que veem o FIES mais como um incentivo às instituições de ensino superior privadas do que como um benefício aos graduandos. Pinto (2004, p. 748) ressalta que, “[...] longe de ser um auxílio aos estudantes, o FIES é antes um subsídio ao setor privado da educação superior”. Pinto (2004, p. 748) acredita que uma parcela dos participantes do FIES não conseguirá, quando formada, saldar seus empréstimos com a Caixa Econômica Federal/FIES. Esse autor afirma ainda que

Como dos atuais participantes do FIES boa parte não terá condições, quando formada, de saldar seus empréstimos com a CEF, o que o atual provoca é uma transferência de recursos públicos, a fundo perdido, para o setor privado. E, o que é pior, o financiamento é feito sobre a tarifa ‘cheia’ da instituição, sem qualquer desconto. E, mais grave, a cada ano este sistema consome recursos adicionais, caso se queira incluir novas vagas. (PINTO, 2004, p. 748).

Carvalho (2006, p. 993) afirma que

O financiamento estudantil dado pelo FIES deixa de ser uma alternativa viável aos alunos de baixa renda, face à defasagem entre a taxa de juros do empréstimo e a taxa de crescimento da renda do recém-formado, combinada ao aumento do desemprego na população com diploma de nível superior. Ademais, como os requisitos são mais rigorosos, a fim de evitar inadimplência (a exigência de fiador e a possibilidade de financiamento de apenas 50% do valor da mensalidade), grande parte da população de baixa renda não é atingida por tal política pública.

Outra questão apontada por Pinto (2004, p. 749) é o fato do FIES atender “[...] proporcionalmente, muito mais os cursos elitizados, como medicina e odontologia, em detrimento daqueles que predominam os alunos de menor poder aquisitivo, como pedagogia e matemática”. Schuwartzman (2005, p. 38) traz, em seu estudo, uma discussão acerca da cobertura do FIES, ou seja, esse autor acredita que esse programa não atenda a toda a demanda, e exemplifica afirmando que haveria mais alunos de baixa renda do que possibilidade de financiamento pelo FIES.

Alguns anos depois, no governo Lula, esse programa viria também a compor o financiamento do ensino superior daqueles graduandos que obtivessem bolsa parcial do PROUNI, ou seja, a partir de 2005, o FIES passou, em casos específicos, a complementar as bolsas parciais do PROUNI. Para isso, o estudante deveria passar pelos dois processos de seleção: o do PROUNI e o do FIES. Os alunos beneficiados pelo PROUNI, ao se inscreverem no FIES, teriam alta prioridade nesse processo de seleção. No item seguinte esse processo será melhor explicitado.