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Galho quebrado enfraquece a árvore

No documento Ramatís Diário Mediúnico Volume 2 (páginas 50-53)

Deve ser uma constante preocupação de um dirigente o recrutamento de médiuns; tarefa árdua, inglória, diante da dificuldade de se achar médiuns que queiram se doar incondicionalmente, mas extremamente necessária para a sustentação dos trabalhos.

Surpreendentemente, a maioria esmagadora dos médiuns tem expectativa de troca com os espíritos, como se precisassem trabalhar para ficar bem, deixando a caridade desinteressada em segundo plano.

Naturalmente, existe rotatividade no corpo mediúnico, a qual devemos minimizar ao máximo, para não se tornar negativa. Contudo, não há como se fazer vistas grossas diante dos ajustes, visando ao bem-estar geral.

Caboclo Ventania nos instrui que "um galho quebrado só faz enfraquecer o tronco da árvore", devendo ser podado. E caboclo Pery sempre orienta que "uma banana podre não deve contaminar o cacho".

E como os médiuns tornam-se os galhos quebrados e as bananas podres? Quando são faltosos e não possuem regularidade; os que só vêm ao terreiro para se beneficiar; os invejosos, que mais se preocupam com a manifestação do colega do que com seus guias; os fofoqueiros de plantão, sempre a postos para sorrateiramente fazer intrigas nos corredores e vestiários; os vaidosos, que anseiam por elogios para seus guias fortes; os encrenqueiros, que já são prontos e tudo sabem; e, finalmente, os que não têm humildade e se acham indispensáveis. Não quebramos nenhum galho, eles se quebram sozinhos. Por outro lado, é obrigação podá-los o quanto antes, para que o arvoredo esteja forte e frondoso.

Mesmo com todo zelo e cuidado com a corrente, não há como fugir da rotação entre os médiuns. Existem ocorrências que fazem parte de nosso cotidiano e situações que inevitavelmente far-nos-ão afastar das tarefas mediúnicas: um doente que se enfraquece; os acidentes normais da vida; um curso de formação; uma transferência de emprego ou de cidade; esses são fatos que podem acontecer a qualquer momento. Há ainda os que se desligam por vontade própria; não encontrando afinidade com o tipo de ritual da choupana, vão procurar terreiros mais afins com suas disposições íntimas e com as experiências existenciais por que precisam passar no mediunismo, para evoluir.

Não julgamos ninguém neste ir e vir, e as porteiras do terreiro estão sempre abertas para quem chega e para quem sai, como se fosse o oxigênio que circula em um organismo, sendo vital para sua sobrevivência. , Todos os médiuns que fazem parte de nossa corrente estão livres para, a qualquer momento, sair, assim como temos liberdade de, a qualquer tempo, convidá-los a se retirar, acordo feito no momento em que se entra na casa e fundamentado em nosso conjunto de normas e diretrizes de segurança mediúnica, ditado por caboclo Pery, desde a fundação da choupana.

Claro está que não existe a intenção premeditada de se dispensar quem quer que seja, assim como acreditamos que nenhum medianeiro entra no grupo com a disposição íntima de vir a se desligar.

Esses dias tivemos uma situação insólita, que me deixou muito triste. Estávamos com um casal de médiuns em período inicial na casa. Oriundos de um centro espírita e dizendo-se comprometidos com a umbanda, procuraram-nos reservadamente, em dia de sessão, pedindo a oportunidade de ingressarem na corrente.

Como fazia mais de ano que freqüentavam a casa e diante dos bons antecedentes de ambos, ela psicóloga e ele médico psiquiatra, os dois sempre presentes em nossos seminários e cursos, resolvi dar a oportunidade, sem eles passarem por uma consulta com caboclo Pery.

Para minha tristeza, a jovem esposa e médium mostrou-se irascível, rígida e autoritária. Ele era demais complacente, de personalidade fraca e dominado por ela. Visivelmente em processo obsessivo, a mulher apresentou-se rapidamente com muito medo de continuar. Foi-lhe dada orientação adequada, atendimento individual e marcado um preceito de segurança mediúnica com seu orixá regente - Iansã -, para harmonizá-la psiquicamente. Ocorreu que a médium, no meio de uma sessão, desapareceu, saiu do terreiro e foi até o vestiário, trocou-se e foi embora, sem avisar ninguém. Ela e o esposo, que tinha faltado no dia da "médium fujona", não apareceram mais e sequer deram uma satisfação. Fiquei triste com isso.

Na sessão seguinte à fuga da médium, caboclo Pery tomou a frente dos trabalhos, o que não é muito comum, já que geralmente é caboclo Ventania quem dirige como chefe do terreiro. Orientou-me que eu ficara entristecido pelo fato de não ter sido avisado da desistência da médium, que caiu nos braços do obsessor. Afora isso, recomendou-me não esperar, em nenhuma hipótese, reconhecimento seja de quem fosse. Também determinou que fosse a primeira e última vez que eu admitiria médiuns por minha conta; aconselhou-me vigiar sempre, para nunca me sentir autossuficiente e me deixar envolver com tagarelices amparadas por falsa humildade, dispensando a cobertura dos guias.

Após orientar-me, avisou toda a assistência presente de que os interessados em ingressar como médiuns deveriam passar com ele, na frente do congá, após a consulta.

Nesse dia creio que atendemos mais de vinte pessoas interessadas em entrar na corrente, e somente a três foi dada a oportunidade. Chamou-me a atenção o fato de os que foram aprovados terem sido exatamente os que se consideraram incapazes, o que me levou a fazer a seguinte pergunta para caboclo Pery:

- Meu pai, por que os que ingressaram foram os que disseram ser incapazes, diante de tão árdua tarefa futura, de consultar na umbanda, enfrentando todo o tipo de embates e rogativas com os consulentes e desencarnados?

Ao que ele respondeu:

- Meu filho, lembre-se de que os capazes são exatamente os que não conseguirão intento de tal envergadura. Os que se exaltam se diminuem, e os que se sentem pequenos se fazem grandes. Ao se declararem preparados, prontos, formados, experientes, vividos, estudados, entre outras ilusões do ego, afastam-se da simplicidade e humildade requeridas para ser "cavalo" na umbanda. Não nos esqueçamos do exemplo de Jesus, que foi buscar os futuros apóstolos da boa-nova evangélica, que ficariam encarregados de perpetuar os ensinamentos libertadores do Cristo universal, nos homens simples e toscos, singelos pescadores que se achavam incapazes, por conseguirem enxergar somente a pedra bruta exterior, o que os tornava ásperos diante dos olhos dos sacerdotes dos templos de outrora. O Divino Mestre, profundo conhecedor das almas humanas, visualizava a pérola oculta que jazia em cada um. Lapidá-lasia calmamente, fazendo-as despertar em suas potencialidades interiores adormecidas. Você, ao se deixar influenciar pelos títulos profanos, quais os de psicólogo e médico psiquiatra do casal que o procurou, sob certo aspecto envaideceu-se, antecipando o quanto isso qualificaria a corrente mediúnica de que é zelador. Esqueceu-se de que os diamantes mais valiosos são exatamente os que ainda não foram encontrados e lapidados. A formação intelectual não prescinde de outros requisitos, como a humildade e a falta de vaidade, para que se tenha "sucesso" e se fique na casa de Pery.

Guiné.

É o vento que balança a folha. É, é, é Pai Guiné.

No documento Ramatís Diário Mediúnico Volume 2 (páginas 50-53)