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CAPÍTULO III O ENSINO DE GEOGRAFIA E O ENSINO DE CIDADE NA VISÃO

3.2 O ensino de Geografia e o ensino de Cidade segundo estudantes e professores do

3.2.2 Geografia segundo os/as estudantes

Cumpre ressaltar inicialmente que os estudantes que participaram da pesquisa responderam espontaneamente às questões sem interferências ou auxílios de qualquer forma

ou meio. Assim, estabeleceu-se uma diferenciação entre os questionários aplicados aos estudantes do 6º e 7º anos e os aplicados aos estudantes do 8º e 9º anos, de modo que essa diferença não obstaculiza a análise e interpretação dos resultados, pois se considerou que os estudantes do 6º e 7º anos respondem melhor, a algumas questões específicas, de forma mais lúdica (colagem e desenho), e os estudantes do 8º e 9º anos já conseguem responder ao questionário a partir de questões mais complexas.

A primeira pergunta comum a todos estudantes foi “O que é Geografia?”. Os/as estudantes do 6º ano responderam, em sua maioria, afirmando ser uma matéria e complementando de forma vaga com expressões como, por exemplo, “é uma matéria legal

que fala sobre quase tudo” (6-E), ou “Geografia para mim é uma matéria que ensina várias coisas legais” (6-F). Aspecto importante foi destacado pelo (a) estudante 6-B ao afirmar que

Geografia “é a matéria que nos ajuda a entender o espaço onde vivemos e saber identificar os

nomes de vários espaços diferentes e a formação deles”. À exceção da resposta dada pelo (a)

estudante 6-B, que pode ser considerada uma resposta que apresenta certo grau de compreensão da Geografia, percebeu-se, a partir das respostas dos (as) estudantes, aspectos indicados por Cavalcanti (1998), como, por exemplo, expressões que denotam vaguidade e pouca compreensão acerca da Geografia.

Os/as estudantes do 7º ano estabeleceram relação entre Geografia e mapas, como demonstrado a partir das respostas dos (as) estudantes 7-A, “é uma matéria que ensina sobre

mapas, espaço geográfico e sobre muitas coisas que tem a ver com o nosso planeta” ou,

ainda, a partir da resposta dada pelo (a) estudante 7-C, “é uma matéria que estuda os mapas,

as regiões, a população e etc.”. Corroborando a perspectiva apresentada por Cavalcanti

(2012b) ao afirmar existir “forte associação entre os termos Geografia e mapa, podendo-se até mesmo afirmar que o mapa é a imagem mais forte da Geografia na escola.” (CAVALCANTI, 2012b, p. 64). No entanto segundo indicações da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) deve-se ter “uma preocupação norteadora do trabalho com mapas em Geografia. Eles devem, sempre que possível, servir de suporte para o repertório que faz parte do raciocínio geográfico, fugindo do ensino do mapa pelo mapa, como fim em si mesmo.” (BRASIL, 2018, p. 364).

No 8º ano, destacaram-se respostas genéricas que indicaram ser a Geografia uma matéria que estuda o mundo, como pode-se perceber nas respostas do (a) estudante 8-B, “estuda o mundo e as coisas que existe neste mundo”, ou, ainda, “para mim a Geografia é

uma matéria que fala sobre o mundo” (estudante 8-E), aspectos que reforçam a ampliação da

(BNCC) ao afirmar que “nos dois últimos anos do Ensino Fundamental – Anos Finais, o estudo da Geografia se concentra no espaço mundial.” (BRASIL, 2018, p. 382). As respostas dos (as) estudantes estabeleceram também relação entre Geografia e mapas, “fala muito de

mapa” (estudante 8-G), evidenciando a importância da cartografia escolar no ensino de

Geografia e para a educação de forma mais ampla. Segundo Seemann (2011), “a educação se alimenta e retroalimenta dos conceitos derivados da cartografia e da Geografia, bastante abstratos e generalizados, assim como das práticas socioculturais realizadas na nossa sociedade” (SEEMANN, 2011, p. 38).

Os/as estudantes do 9º18 ano, em sua maioria, afirmaram que a Geografia é uma matéria/ciência que estuda o planeta Terra, os fenômenos da natureza, os países, de forma que pode-se perceber nas respostas dos (as) estudantes 9I-B, 9I-E e 9I-F a associação a estes termos ou expressões: “a Geografia é uma ciência relacionada aos fenômenos da natureza

etc.” (estudante 9I-B); “é o estudo do nosso planeta, países” (estudante 9I-E), ou, ainda;

“matéria que estuda os países ou continentes” (estudante 9I-F). A resposta dada pelo (a) estudante 9II-I evidencia o espaço como objeto de análise da Geografia, no entanto, não o especifica, “é a ciência que estuda o espaço e outras coisas”. Merece destaque mais uma vez a associação entre Geografia e mapas realizada pelos (as) estudantes 9I-A, 9I-C, 9I-H e 9II-J, sintetizada na resposta do (a) estudante 9I-A, “Geografia é o estudo de mapas, países, entre

outros”. Este aspecto reforça a importância que os/as estudantes dão aos mapas, aspecto que

fundamenta a cartografia escolar como um importante espaço para a educação geográfica. No entanto, deve-se considerar a indicação de Seemann (2011), “o que é de maior interesse não é o mapa como produto final, mas os processos da sua concepção e elaboração inseridos nos contextos socioculturais, econômicos e políticos de cada época e lugar” (SEEMANN, 2011, p. 40).

Sobre as respostas dos (as) estudantes quanto à definição para a Geografia, faz-se importante explicitar a associação realizada entre Geografia e termos tradicionalmente utilizados pela ciência geográfica, apresentados na nuvem de palavras19 na Figura 7. Nas respostas dadas pelos (as) estudantes, houve o predomínio dos termos „mapas‟, „mundo‟, „espaço‟ e „países‟, corroborando aspecto identificado por Cavalcanti (1998) ao afirmar que “nas respostas, os termos mais citados são espaço, mapas, mundo, território, países e

18 A identificação dos (as) estudantes desta turma apresenta uma particularidade referente ao fato de a investigação ter sido desenvolvida em duas turmas de 9º ano do turno matutino, de forma que o número cardinal refere-se ao ano escolar, o algarismo romano diz respeito à turma e a letra é o identificador do (a) estudante. 19 Uma nuvem de palavras (também conhecida como nuvem de tags ou texto) é uma representação visual da frequência e do valor das palavras. Quanto mais vezes uma palavra-chave estiver presente em um conjunto de dados, maior e mais forte será a palavra-chave.

continente [pode destacar-se] pela sua concretude, a referência à mapa e a mundo, sugerindo uma imagem significativa de Geografia para esses alunos” (CAVALCANTI, 1998, p. 63). Deste modo, pode-se afirmar, a partir das respostas dos (as) estudantes, que existe grande identidade entre a Geografia e estes termos.

Figura 7 - Nuvem de palavras com a apresentação de termos/expressões destacadas pelos (as) estudantes ao definir Geografia

Elaborado pelo autor

Outra questão colocada foi se os estudantes gostam das aulas de Geografia e, de forma geral, a maioria respondeu positivamente. No entanto, as respostas apresentaram justificativas superficiais e simplistas, não sendo possível identificar a relação entre os termos utilizados para definir a Geografia ao fato de gostarem das aulas do referido componente curricular. As respostas se limitaram a explicações como a do estudante 8-H e a do/a estudante 9-E, “porque é onde a gente aprende várias coisas” e “o professor explica bem”, respectivamente. Deve-se destacar também a resposta negativa dada pelo (a) estudante 6-E que afirmou não gostar da Geografia, “porque escreve muito”. Aspecto que pode ser relacionado ao caráter mnemônico e descritivo associado às práticas tradicionalistas de Geografia em sala de aula que, segundo Vesentini (2009), “tem como escopo primordial a memorização de informações sobrepostas” (VESENTINI, 2009, p. 88).

Perguntou-se ainda aos estudantes se se recordam de conteúdos estudados nas aulas de Geografia. Em geral, as respostas afirmaram que os/as estudantes se recordam dos conteúdos já estudados; contudo, limitaram-se a listar apenas conteúdos do corrente ano, de forma que se predominou:

 6º ano - Planeta Terra, relevo, estações do ano, vulcões e terremotos;  7º ano - Mapas e vulcões;

 9º ano – Europa/União Europeia, Oceania, Ásia, Antártica e espaço geográfico. A partir destas informações, pode-se aferir que os/as estudantes tiveram dificuldade para articular conhecimentos geográficos da série/ano escolar anterior à atual, por isso limitaram-se a listar conteúdos estudados no corrente ano de forma desconexa. Sobre esse aspecto, Callai (2001) afirma que, na Geografia,

a fragmentação acontece de tal forma que impede o raciocínio lógico capaz de dar conta do objeto que deve tratar. São questões (físicas) naturais e humanas, são termos de relevo, vegetação, clima, população, êxodo rural e migrações, estrutura urbana e vida nas cidades, industrialização e agricultura... estudados como conceitos a-históricos, abstratos, neutros, sem ligação com a realidade concreta. (CALLAI, 2001, p. 139)

Deste modo, evidencia-se aspectos relacionados não apenas às práticas de sala de aula, mas também revela características do currículo adotado (ressalta-se que a análise do currículo não é objeto desta pesquisa).

Questionou-se aos estudantes se conseguem associar os conteúdos das aulas de Geografia ao seu dia a dia e as respostas foram surpreendentes por indicar que 48% dos estudantes (16 estudantes) não conseguem relacionar os conteúdos da Geografia Escolar ao seu cotidiano, enquanto que 52% (17 estudantes) afirmaram estabelecer a referida relação. Deste modo, parafraseando Moreira (2008b), percebeu-se relativa distância entre a „Geografia real‟ e a „Geografia teórica‟ na relação entre o que se estuda nas aulas de geografia e o que os (as) estudantes expressaram vivenciar no cotidiano da cidade. Esse aspecto é indicado por Kaercher (1996) ao afirmar que “a Geografia existe desde sempre e nós a fazemos diariamente. Romper então com aquela visão de que Geografia é algo que só veremos em aulas de Geografia” (KAERCHER, 1996, p. 109) é fundamental, reconhecendo-se a importância da relação entre o que se estuda nas aulas de Geografia e o que se vive fora da escola. Como observado, percebe-se que, na prática, que essa relação ainda é frágil, visto que os resultados indicaram para permanências de aspectos tradicionais do ensino de Geografia, como, por exemplo, pouca relação entre os conteúdos e o espaço vivido pelos estudantes. Aspecto indicado como fundamental por Cavalcanti (2012b) ao afirmar que a partir da Geografia cotidiana, “da dimensão do espaço vivido pelos alunos [...] se tem a possibilidade de reelaboração e maior compreensão do vivido. Este entendimento implica ter como dimensão do conhecimento geográfico o espaço vivido ou a geografia vivenciada cotidianamente na prática social” (CAVALCANTI, 2012b, p. 221).

Questionado sobre a contribuição do ensino de Geografia para a vida (pergunta exclusiva para estudantes do 8º e 9º anos) obteve-se como resposta majoritária “sim”; no entanto, os/as estudantes não demonstraram compreensão dos objetivos do ensino de Geografia, como se pode perceber nas respostas dos (as) estudantes 9I-F e 9I-H que responderam, “aprendendo sobre outros países e continentes”, “... quando me falam de

alguma capital eu lembro o país e algum acontecimento sobre”, respectivamente. Aspectos

também evidenciados por Cavalcanti (1998) ao afirmar que “os alunos apontam algumas ideias que têm sobre o que se estuda em Geografia, mas demonstram dificuldades em explicar as finalidades que esses estudos têm para a vida prática deles e das pessoas em geral” (CAVALCANTI, 1998, p. 63). A exceção foi o/a estudante 9II-I que afirmou, “me

proporciona mais conhecimento do mundo em minha volta”, se aproximando da concepção

apresentada por Callai (2005), ao sustentar que cabe à Geografia “ler o mundo da vida, ler o espaço e compreender que as paisagens que podemos ver são resultado da vida em sociedade, dos homens na busca da sua sobrevivência e da satisfação das suas necessidades. Em linhas gerais, esse é o papel da Geografia na escola.” (CALLAI, 2001, p. 228).

Desse modo, tentou-se até aqui identificar como estudantes e professores concebem a Geografia no cotidiano da escola. A seguir, busca-se compreender como professores e estudantes entendem a cidade e qual a importância do ensino de cidade na educação geográfica.