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CAPÍTULO I – AS BASES TEÓRICO-METODDLÓGICAS DO ENSINO DE

1.2 Importância do ensino de Geografia na contemporaneidade

O cenário atual (primeiro quartel do século XXI) demanda por uma formação escolar concatenada à realidade vivida pelos estudantes – conjuntura esta expressa e manifesta a partir de contextos político-econômicos culturais e sociais diversificados. Tais circunstâncias exigem dos estudantes, em processo formativo, compreender situações e contextos múltiplos e distintos, tendo como referência o lugar de vivência cotidiana e também outros lugares e realidades próximas e/ou distantes.

A leitura da realidade-mundo tem revelado um quadro de difícil compreensão, dada a velocidade e intensidade que as transformações e acontecimentos se sucedem. Na contemporaneidade, têm emergido grandes mudanças no âmbito local e global. O mundo se globalizou, ainda que como fábula (SANTOS, 2001), as grandes empresas transnacionalizaram-se, as crises econômicas se tornaram mais constantes e envolvendo um número maior de países, os conflitos globais se intensificaram, os problemas e questões ambientais se agravaram, aumentaram-se as desigualdades entre países e regiões, as migrações globais passaram a fazer parte do debate internacional, a violência, a intolerância e o terrorismo se afloraram e se manifestaram em muitos países, a explosão tecnológica transformou a forma de produzir, se comunicar/relacionar, viajar e ver o mundo, de maneira que pode-se afirmar que houve “uma passagem do espaço e do tempo ao espaço-tempo ou espaço-temporalidade” (HARVEY, 2012, p. 11). Nessa leitura, todo esse cenário de transformações locais e globais pode conduzir a percepções e compreensões simplistas, superficiais e equivocadas do mundo. Nesse sentido, Cavalcanti (2017) encaminha que

requer capacidades de leitura, de análises mais autônomas das inter-relações entre os elementos, dos processos que os formam, dos contextos em que foram formados, da abrangência dos fenômenos. São essas capacidades de leitura que possibilitam a ampliação da análise dos fenômenos como interconectados e como resultantes de processos históricos e espaciais determinados. (CAVALCANTI, 2017, p. 16)

Toda essa conjuntura se coloca à compreensão a partir de prismas diversos, objetivos e teorias de análises distintas. Destaca-se a interpretação da realidade a partir de diferentes visões de mundo, a economicista, a antropológica, a histórica e a sociológica entre outras. Nesta pluralidade de concepções de análise, é imperativo entender como a Geografia interpreta, compreende e explica o mundo. Essa busca encaminha aos questionamentos centrais desse debate. Qual a relevância do componente curricular Geografia na Educação Básica? Qual a importância do ensino de Geografia na contemporaneidade?

Há de se compreender a princípio que a escola, de acordo com Cavalcanti (2012b, p. 57), é “um lugar de encontro de culturas, de saberes, de saberes científicos e de saberes cotidianos”, e a efetividade desse encontro entre ciência e cotidiano, na perspectiva geográfica, possibilita ver o mundo a partir dos pressupostos teóricos da Geografia. Ampliando essa concepção, Pereira e Carloto (2016) entendem a escola como

[...] espaço de desenvolvimento e aprendizagem, [que] envolve todas as experiências contempladas no processo de educar, considerando tudo como significativo: aspectos culturais, cognitivos, afetivos, sociais e históricos, os quais estão inseridos nas interações e relações entre os diferentes segmentos presentes na escola. (PEREIRA; CARLOTO, 2016, p. 11)

Nesse entendimento, a escola se coloca como local privilegiado onde a aprendizagem se desenvolve e se estrutura. Contudo, não com status de exclusividade, haja vista que o entorno da escola, a rua, o bairro, a cidade, as localidades próximas e distantes constituem-se como referências e espaços para a construção de aprendizagens, de forma que entender e relacionar os diversos signos e significados presentes no espaço se coloca como via de compreensão do mundo. Assim, há que se explicitar e reafirmar que a relação entre objetos de conhecimentos e espaços percebidos e vividos pelos estudantes são aspectos potencializadores do processo de construção de aprendizagens.

Desta maneira, a Geografia tem sua importância materializada atualmente no currículo da escolarização básica e os temas da educação geográfica devem possibilitar a compreensão da realidade-mundo em sua complexidade. Com este objetivo o ensino de Geografia se constitui como meio de análise e compreensão das inter-relações e processos históricos, econômicos, sociais e culturais que se estabelecem desde a escala local à global.

Nesta compreensão, Cavalcanti (2012) sustenta que

[...] a inclusão da Geografia como uma matéria escolar, nessa perspectiva, tem a ver com o entendimento de que ela contribui para o desenvolvimento das capacidades e habilidades do aluno. [...] a Geografia escolar lida com conhecimentos sobre o espaço, visando o raciocínio espacial necessário ao exercício da cidadania, pois se acredita [...] que a espacialidade é uma dimensão importante da realidade. (CAVALCANTI, 2012a, p. 48)

Nesse sentido, ainda recorrendo à Cavalcanti (2012a, p. 35) que, apresenta o ensino de Geografia na escola “como uma maneira específica de raciocinar e de interpretar a realidade e as relações espaciais, mais do que uma disciplina que apresenta dados e informações sobre lugares para que sejam memorizados, aproxima a disciplina dos princípios construtivistas”, revelando a importância da Geografia no processo de construção de aprendizagens sobre o mundo vivido pelos estudantes. Cavalcanti (1998) encaminha ainda que, para a efetividade do ensino de Geografia, na perspectiva construtivista,

Um ponto de partida relevante para refletir sobre a construção de conhecimentos geográficos na escola, parece ser o papel e a importância da Geografia para a vida dos alunos. Há um certo consenso entre os estudiosos da prática de ensino de que esse papel é o de prover bases e meios de desenvolvimento e ampliação da capacidade dos alunos de apreensão da realidade do ponto de vista da espacialidade, ou seja, de compreensão do papel do espaço nas práticas sociais destes na configuração do espaço. (CAVALCANTI, 1998, p. 11)

Neste mesmo entendimento, Callai (1999, p. 57) afirma que há três motivos para se ensinar Geografia: o primeiro trata-se em conhecer o mundo e obter informações a seu respeito; o segundo é conhecer o espaço produzido pelo homem; o terceiro é fornecer informações que possibilitem ao estudante em formação condições para construir sua cidadania. Dessa forma, a Geografia se coloca como instrumento de desvelamento, decifração e tradução de estruturas espaciais em seus aspectos políticos, econômicos, sociais e culturais, realidades estas que configuram o espaço em sua totalidade e o lugar em sua especificidade. Partindo dessa compreensão, Cavalcanti (2017) sustenta que a Geografia escolar, guardadas suas relações, inter-relações e diferenças com a Geografia acadêmica, deve

[...] contribuir para o desenvolvimento do pensamento espacial do aluno, de modo que ele, com a maior autonomia possível, possa pensar e agir sobre o mundo considerando a espacialidade das coisas, nas coisas. Esse é o sentido que deve ter os conteúdos geográficos: o de ajudar os alunos a compreenderem o mundo em sua espacialidade. (CAVALCANTI, 2017, p. 18)

raciocínio espacial, pois pensar geograficamente permite ao aluno perceber e compreender a realidade na qual está inserido e com a qual se relaciona, entendendo que o seu cotidiano de vivência/experiência faz parte de uma dinâmica global. Nessa perspectiva, o ensino de Geografia se torna imprescindível por possibilitar a compreensão da realidade em âmbito local e global, entendendo este como um cenário permeado por contradições, injustiças, conflitos e desigualdades. Nesse entendimento, deve-se evidenciar, para que não se incorra em localismos, que tal realidade é parte da complexidade e totalidade das relações globais. Desse modo, Callai (2010) assevera a importância e a relevância do ensino de Geografia para a compreensão do mundo. De acordo com a autora,

A geografia escolar, assim como a ciência geográfica, tem a função de estudar, analisar e buscar as explicações para o espaço produzido pela humanidade. Enquanto matéria de ensino cria as condições para que o aluno se reconheça como sujeito que participa do espaço em que vive e estuda, e que pode compreender que os fenômenos que ali acontecem são resultado da vida e do trabalho dos homens em sua trajetória de construção da própria sociedade demarcada em seus espaços e tempos. (CALLAI, 2010, p. 17)

Nessa mesma interpretação, Pontuschka et al. (2009) consideram o ensino de Geografia indispensável à compreensão do espaço geográfico, ao enfatizarem que

A Geografia, como disciplina escolar, oferece contribuição para alunos e professores enriquecerem suas representações sociais e seu conhecimento sobre múltiplas dimensões da realidade social, natural e histórica, entendendo melhor o mundo em seu processo ininterrupto de transformações, o momento atual da chamada mundialização da economia. (PONTUSCHKA et al., 2009, p. 38)

Castellar (2011) reforça essa concepção ao apontar o ensino e aprendizagem em Geografia a partir da ideia da formação de uma consciência geográfica, que tem como base a construção do pensamento espacial. Dessa forma, a autora defende que

O fundamental para a Geografia escolar é possibilitar ao aluno uma aprendizagem no sentido da consciência geográfica, entendendo a localização dos lugares e fenômenos e a partir disso podendo raciocinar geograficamente, compreendendo a ordenação territorial, a espacialidade e/ou territorialidade dos fenômenos, a escala social de análise. (CASTELLAR, 2011, p. 134)

A partir das proposições apresentadas, percebe-se uma forte tendência teórico- metodológica de centralidade da análise espacial no ensino de Geografia como forma de aproximação entre o conhecimento sistematizado pela ciência geográfica e a vida cotidiana dos estudantes. Neste sentido, a formação de um modo de pensar característico, alicerçado a

partir da análise espacial, coaduna para a formação do raciocínio geográfico, o que permite perceber e compreender fenômenos, objetos e ações (SANTOS, 1996), distribuídos e organizados no espaço com base em uma lógica específica, intrínseca ao modo de produção dominante. A referida análise possibilita uma compreensão mais aproximada da realidade- mundo em sua complexidade e a partir da relação local-global no contexto contemporâneo. Dessa maneira, estabelece-se uma relação entre o pensamento espacial e o raciocínio geográfico, de modo que Cavalcanti (2006, p. 34) afirma que “na relação cognitiva de crianças, jovens e adultos com o mundo, o raciocínio espacial é necessário, pois as práticas sociais cotidianas tem uma dimensão espacial”. Duarte (2017, p. 31) reforça essa concepção ao afirmar que “pensar geograficamente envolve, em grande medida, pensar espacialmente”. No entanto, Cavalcanti (2012) faz uma observação pertinente ao considerar que

O espaço como objeto da análise geográfica não é aquele da experiência empírica, não é um objeto espacial em si mesmo, mas sim uma abstração, uma construção teórica; o espaço geográfico é concebido, construído intelectualmente como um produto social e histórico, que se constitui em ferramenta que permite analisar a realidade em sua dimensão material e em sua representação. (CAVALCANTI, 2012, p. 18)

Desse modo, compreende-se que a escola é um espaço de encontro de culturas e de interação entre os saberes científicos e cotidianos. Nesta perspectiva, a presença da Geografia como componente curricular na Educação Básica reforça a importância do ensino de Geografia na contemporaneidade como aspecto importante para a compreensão da realidade, tendo como objetivo a formação do raciocínio geográfico a partir da análise espacial. Dessa maneira, e a partir desses pressupostos, constroem-se caminhos para a leitura e cognição do mundo em suas múltiplas dimensões, escalas, relações e conexões expressas e manifestas entre o cotidiano vivido pelos estudantes e a dimensão espacial em sua totalidade. Destarte, os temas da Geografia escolar encaminham, ou devem encaminhar, para a compreensão da espacialidade contemporânea, de forma a instrumentalizar os estudantes a realizar análises espaciais em situações/realidades complexas e de difícil entendimento, de modo que possam construir, com autoria e autonomia, sua própria concepção de mundo, fundamentada a partir dos pressupostos científicos e cotidianos.

Desta forma, buscou-se até aqui, apresentar os referenciais históricos da sistematização da Geografia acadêmica e escolar no contexto da modernidade, de modo a apresentar a ciência geográfica como um dos caminhos para a compreensão do mundo em meio à atual pluralidade de concepções científicas e metodológicas. Dessa forma, a Geografia (como ciência parcelar), em seu decurso histórico, buscou definir seus objetos e métodos e

superar dualidades e crises suscitadas.

De forma específica neste estudo, compreendeu-se que as bases teórico- metodológicas do ensino de Geografia refletiram uma tentativa da Geografia escolar em suplantar o ensino fundamentado em pressupostos da Geografia Tradicional em sua forma mecanicista, que apresentava caráter descritivo, enumerativo e mnemônico, revelando a fragmentação da Geografia que se praticava na escola. Nesse contexto, a renovação da ciência geográfica e sua diversidade teórico-metodológica inovou e revolucionou a Geografia no cenário acadêmico e se colocou como possibilidade de transformação em contexto escolar.

Portanto, demonstrou-se, a importância da Geografia escolar como forma de compreensão e leitura de mundo a partir da formação do raciocínio geográfico, tendo como referência o pensamento espacial. Dessa forma, entende-se que as relações que os estudantes estabelecem em seu cotidiano somada às relações que estes constroem com outros lugares próximos e/ou distantes são fundamentais para o ensino e aprendizagem em Geografia.

Deste modo se entende que, no ensino de Geografia, é fundamental se estabelecer de forma efetiva a relação e articulação entre aspectos teóricos e a vivência cotidiana dos estudantes desde seus espaços mais imediatos à espaços mais amplos e abrangentes. Destarte, a cidade, como construção teórica, como um dos objetos de conhecimento da Geografia escolar deve ser apresentada no ensino de Geografia em articulçao com os espaços percebidos e vividos pelos estudantes, de modo que o ensino de cidade se reverbera na educação geográfica como mediação na construção de processos de aprendizagens mais complexos e efetivamente significativos.

A seguir, aborda-se a cidade no ensino de Geografia, entendendo que este tema não é um objeto de estudo exclusivo da ciência geográfica, haja vista que a cidade é tema de estudos e análises de outras ciências, destacando-se, dentre elas, a economia, a sociologia, a antropologia, a história e outras. De forma que o que se propõe é uma abordagem geográfica da cidade e sua relação e importância para o ensino de Geografia nos Anos Finais do Ensino Fundamental.