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CAPS III – municípios com população acima de 200.000 habitantes

GEOINDICADORES E ÍNDICE PARA POLÍTICA PÚBLICA DE

SAÚDE MENTAL

Si Nan, a bússola chinesa do século I d.C.

Fonte: Museu de Astronomia e Ciências afins (http://www.mast.br).

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A dimensão teórico-conceitual é imprescindível no campo acadêmico, pois as diversas áreas do conhecimento formulam, reformulam, refutam e contextualizam os conceitos e as teorias, a lógica de construção do conhecimento científico. Uma parte dos estudos busca analisar as contribuições, as limitações e os equívocos de uma ou mais teorias ou conceitos. Outros estudos partem de teorias na busca de evidências empíricas, com o objetivo de dar continuidade na construção da ciência. Um exemplo é a definição de saúde proposta pela OMS, que a compreende como uma situação de perfeito bem-estar físico, mental e social, que é considerada por muitos estudiosos um avanço em relação à antiga noção de ausência da doença, mas atualmente bastante polemizada por ser inatingível e imensurável. Nas palavras

de Donnangelo e Pereira (1976), é uma definição “irreal, ultrapassada e unilateral”.

Na universidade, além da preocupação com o desenvolvimento dos conceitos e teorias, pode-se pretender as aplicações destes conhecimentos no processo de construção da justiça social ao propor uma metodologia para os movimentos sociais, os gestores ou cidadãos que oriente a tomada de decisões, de modo a atender a população equitativamente. Esta é a pretensão deste estudo, ao buscar na diferenciação espacial e nas desigualdades sociais, materiais e imateriais, o entendimento do processo de mal-estar/ bem-estar psicossocial e propor uma forma mais equitativa de distribuição dos serviços de saúde mental, a construção de ambientes terapêuticos e de ações de promoção à saúde da população.

A operacionalização de estudos, que tem por objetivo apreender um fenômeno, se fundamenta na análise de uma ou mais variável. Tal procedimento se justifica por ser impossível de apreender o real, como discutido na introdução, assim a seleção das principais variáveis pode ser utilizada como indicadores da situação da saúde mental de uma população de determinado tempo e espaço, ou seja, auxiliam no dimensionamento do objeto de estudo num determinado contexto geográfico. Uma observação importante é evidenciar que os indicadores não substituem os conceitos, apenas os tornam factíveis de serem mensurados na realidade, que, no presente estudo, são as frequências absolutas e relativas dos óbitos e das internações por suicídios e transtornos mentais e a disponibilidade e a taxa de cobertura dos serviços de saúde mental.

Ao analisar a organização dos serviços da atenção básica à saúde de uma cidade mineira, Faria (2012, p. 246) questiona se devem criar territórios para os

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serviços de saúde ou se devem adaptar estes aos territórios e sintetiza que “território-população-serviço, nessa ordem, permite, portanto, inverter a lógica

territorializadora que propõe serviço-população-território”.

4.1– GEOINDICADORES E ÍNDICE:CONCEITOS E APLICABILIDADE

A proposta de mensurar a saúde da população de determinado contexto geográfico, conforme Laurenti et al (1987) e Costa et al (2009), traz desafios teóricos e metodológicos, o que torna comum medi-la por sua ausência, ou seja, pelas frequências e causas de mortalidade de uma população, o que é justificável pela maior facilidade de se definir os eventos relacionados à saúde, pela uniformidade do conceito de morte entre as diversos contextos socioculturais.

Em texto da OPAS (2001) sobre os indicadores de saúde como elementos básicos para análise da saúde, destaca-se, sinteticamente, que as principais características da qualidade de um indicador depende dos seguintes fatores: das qualidades dos componentes utilizados em sua construção e dos sistemas de informação, coleta e registro dos dados. Evidencia também que a utilidade e a qualidade do indicador é definida por sua validez, confiabilidade, especificidade, sensibilidade, mensurabilidade, relevância e da relação custo benefício. Assim como Laurenti et al (1987) e Costa et al (2009), este texto da OPAS reafirma a necessidade dos indicadores serem construídos de forma simples, para que analistas e usuários os interpretem facilmente, os utilizem.

Indicadores mais potentes são os indicadores compostos, que são denominados de medidas-resumo, ao agregar medidas de morbidade e mortalidade num único indicador. Como são os casos do IMOIS e do IMOIT, elaborados neste estudo para dimensionar a morbimortalidade pelas lesões autoprovocadas intencionalmente e pelos transtornos mentais e comportamentais, respectivamente. Por serem indicadores referenciados geograficamente, por ter como finalidade a comparação do processo saúde-doença nos contextos geográficos, foram denominados de geoindicadores, que podem ser aplicados a outras áreas das Ciências Humanas e Sociais. Tal definição se difere do emprego deste termo nos

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estudos de geólogos, biogeógrafos, geomórfologos e demais especialidades das Ciências da Terra.

Um indicador não é uma “prótese técnica” neutra, conforme Barcellos et al.

(2002, p. 134) “o indicador é um elemento de legitimação dos discursos a respeito de uma determinada realidade que se pretende retratar. A criação e escolha de

indicadores carregam implícitos pressupostos e hipóteses do pesquisador”. Neste

capítulo a intenção é evidenciar a desigualdade socioespacial no acesso aos serviços de saúde mental, reflexo de “uma distribuição desigual de recursos e

oportunidades entre os indivíduos e grupos localizados no espaço”.

Costa et al (2009) diferencia indicador de índice, ao compreender o primeiro como a métrica de apenas um aspecto do fenômeno estudado, enquanto um índice é uma síntese de diferentes dimensões do atributo estudado em uma única medida. Partindo-se de tal distinção, se denominou a síntese dos indicadores composto IMOIS e IMOIT de IMSAME (M), ao sintetizar em uma única medida a morbimortalidade por estes dois tipos de causas, que refletem a quase totalidade do aspecto “negativo” da saúde mental. O IMUPRI, apesar de ser um índice, por reunir o índice M e o indicador de cobertura de serviço de saúde, se preferiu denomina-lo de indicador por evocar o sentido de indutor de ação que o termo possui.

No subitem 4.2, se aplicou os indicadores e o índice no Paraná para dimensionar suas potencialidades em retratar a situação do processo saúde-doença mentais e a cobertura dos serviços de saúde mental, dos quais se destacam as potenciais coberturas dos Centros de Atenção Psicossocial e dos leitos psiquiátricos.

4.2–DESAFIOS E POSSIBILIDADES DA POLÍTICA NACIONAL DE SAÚDE MENTAL: UM EXEMPLO A PARTIR DO ESTUDO DO ESTADO DO PARANÁ

A unidade federada do Paraná possui uma das maiores taxas de suicídios e transtornos mentais do país. Nos anos de 1998 e 2010, em média, oitenta pessoas tentaram suicídio por mês nesta unidade federada. Dentre estas, 53 foram a óbito, em que o suicídio foi registrado como a causa básica. Outros 48 óbitos foram registrados no Sistema de Informações sobre Mortalidade, que tiveram como causa

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básica os TMC, que somados aos registros de óbitos por LAI, pode-se afirmar que, em média, ocorreram anualmente no Paraná o registro de 101 óbitos por suicídio e por transtornos mentais (BRASIL, 2013). Na etapa exploratória, identificou-se que os dados de morbidade hospitalar no SUS dos municípios é proporcional à quantidade de internações, variando anualmente de 0 a 2 óbitos, por isso não se considerou relevante a elaboração de mapas e a análise da espacialidade.

Conforme o estudo de Meneghel et al. (2004), o Paraná teve, nos anos de 1980 a 1999, uma média de 7,1 suicídios por 100 mil habitantes, que, junto com as taxas de Santa Catarina (7,9) e do Rio Grande do Sul (10,2), configuraram a região do Brasil com maior taxa de suicídios.

Para análise do suicídio e dos transtornos mentais nas unidades federadas utilizou-se o recorte temporal dos anos de 1998 a 2010, para compararmos dois quinquênios, o primeiro de 1998 a 2002 e o segundo de 2006 a 2010. Os municípios paranaenses mencionados neste subitem foram destacados no mapa de localização da unidade federada (Mapa 14).