• Nenhum resultado encontrado

5. ESTUDO DE CASO

5.4. Será o Women capaz estimular a mudança?

5.4.1. Gerir a diversidade na Big4 Porto

O Women constitui a primeira iniciativa formal desenvolvida pela Big4 Portugal no âmbito da instituição de uma política de diversidade na organização.

O conceito de diversidade no contexto da Big4 – e tendo apenas em consideração as análises efetuadas no âmbito deste projeto de investigação – pode ser enquadrado numa das dimensões de diferenciação de indivíduos propostas por Mavin e Girling (2000): o género. Assim sendo, é possível afirmar que o conceito de diversidade na Big4 se centra, ainda, ao nível da análise dos atributos primários dos indivíduos, conforme a classificação proposta por Ewijk (2011). Tal não significa, porém, que outros atributos de ordem primária, ou até secundária, não possam ser tidos em conta pela Big4 como relevantes para a gestão eficiente e eficaz dos seus recursos humanos. No entanto, não se encontram cobertas pelas iniciativas recentemente apresentadas, e sobre o qual recai este projeto de investigação.

xxv. “Podia ser criada uma comissão (com homens e mulheres!) que definisse políticas para garantir a igualdade no momento de reentrada no mercado de trabalho das mulheres em licença de maternidade.”

Colaborador 11, Consultoria Financeira, Operacional

xxvi. “Era importante existir formação orientada para as mulheres”

Colaboradora 8, Auditoria, Operacional

xxvii. “Também é importante ter em conta que existem características específicas das mulheres que podem ser limadas para efeitos de liderança, recorrendo por exemplo à formação. Mas se isso acontecer, também têm que ser disponibilizadas para homens.”

O tema da diversidade de género encontra-se na ordem do dia da Big4, do mesmo modo que para a generalidade das organizações internacionais. De facto, e tal como apresentado e analisado em diversos estudos académicos e empíricos, a questão do género continua a ser um problema no mundo empresarial, uma vez que homens e mulheres continuam a não ter acesso às mesmas oportunidades, sobretudo no que se relaciona com as posições que ocupam dentro das organizações e os benefícios de que auferem. No caso da Big4, tal é visível através de uma análise da percentagem de mulheres que ocupa posições relevantes ao nível da gestão e liderança da organização – que é ainda significativamente reduzido, tal como apresentado nos capítulos anteriores. Porém, e mais uma vez em linha com a tendência verificada no tecido empresarial nacional e internacional, fatores como a existência de cada vez mais mulheres nos processos de recrutamento, a existência de mulheres com currículos académicos e profissionais mais evoluídos e a existência de cada vez mais mulheres dentro da organização, levaram a que a Big4 tivesse necessidade de repensar qual o papel profissional da mulher, e de que forma estão a ser desenvolvidos todos os esforços necessários à criação de condições para a sua perfeita integração, a par da correta orientação profissional e aproveitamento das suas competências.

Por outro lado, torna-se cada vez mais comum a necessidade de tirar partido das capacidades e competências reconhecidas às mulheres, e identificadas como distintas das dos homens. Entre muitas importa destacar, os diferentes estilos de liderança, a capacidade para desenvolver e promover relações mais empáticas entre colaboradores, a preferência por estruturas organizacionais menos hierárquicas, bem como a apetência natural para a promoção da criatividade, da cooperação e da intuição. Tais vantagens apresentadas pelas mulheres foram reconhecidas pela Big4 – quer na versão oficial como na versão local do projeto em estudo – e constituem um dos drivers fundamentais que despoletou o aparecimento do Women.

“As mulheres têm capacidades de liderança superiores aos homens, que vêm da sua capacidade de multitasking e de lidar com várias realidades em simultâneo: casa, família e trabalho.”

“(… )o papel da mulher na firma e as valências que pode trazer para o trabalho: ser multitasking, ser mais realista e ter um lado mais humano.”

Colaboradora 13, Consultoria Financeira, Gestão de topo

“O contributo da mulher é diferente do Homem no trabalho. Ambos têm qualidades diferentes. As mulheres têm mais bom senso, são tendencialmente mais sérias. O equilíbrio entre homens e mulheres é perfeito.”

Colaboradora 2, Auditoria, Operacional

Para além da Big4 ser capaz de reconhecer a existência de diferenças significativas entre homens e mulheres, é ainda capaz de constatar que nos seus departamento e equipas se verificam situações que constituem constrangimentos no que respeita à promoção de oportunidades vantajosas para as mulheres – situação que o Women visa também minorar.

De facto, os problemas mais comuns que atualmente as mulheres enfrentam no local de trabalho, e que são citados na literatura – como os estereótipos, papel da mulher na sociedade ou dificuldade no acesso a cargos de liderança – são também identificados na Big4 quer quando analisada a perspectiva oficial como a perspectiva local. De facto, foram constrangimentos desta natureza que motivaram o aparecimento de um projeto como o Women e tal é visível sobretudo no objetivo do projeto que visa criar condições para estimular a mudança de mentalidades. Porém, a investigação efetuada ao nível local permitiu, de igual modo, captar que a generalidade dos colaboradores da organização, independentemente do departamento a que pertencem ou da categoria profissional que ocupam, tendem a identificar a existência destes constrangimentos ao nível da Big4.

“A mulher é muitas vezes discriminada sobretudo quando é bonita e arranjada.”

“Apesar de achar que não existem barreiras na Big4, admito que possa existir um subconsciente na escolha, na altura da promoção, baseado nas ideias pré concebidas de “e se ela casa ou resolve ter filhos?”.”

Colaborador 4, Auditoria, Gestão intermédia

De salientar ainda, que a literatura identifica como principal motivo para a atual tendência para o reduzido número de mulheres em cargos de gestão o facto de o poder de decisão ainda se encontrar centralizado nos homens, o que leva a que estes tendam a escolher os “seus semelhantes” para os cargos de liderança. Tal resulta da existência de grandes diferenças entre os estilos de gestão e trabalho de homens e mulheres pelo que, e de acordo com a Teoria da Similaridade – Atração de Byrne, os homens tendem a promover a constituição de grupos essencialmente masculinos, tendo em conta a sua identificação com as características dos indivíduos.

Ao longo da investigação desenvolvida, foi possível verificar que alguns colaboradores identificam esta situação como justificação possível para o reduzido número de mulheres a ocupar cargos de liderança na Big4.

“A firma tende a escolher homens para a posição de partner porque escolhe os seus semelhantes. Por isso o reduzido número de mulheres partners deriva da "seleção natural" e da existência de um "clube de cavalheiros".”

Colaboradora 13, Consultoria Financeira, Gestão de topo

“Os partners são um grupo restrito, com determinados hábitos e atitudes que não são compatíveis com a presença de mulheres.”

Colaboradora 15, Auditoria, Gestão intermédia

Assim, a Big4, e seguindo a tendência geral das organizações atuais apresentada por Ogbonna e Harris (2006), pretende com iniciativas como o Women, criar os mecanismos necessários para promover um ambiente de trabalho adequado para que os seus colaboradores manifestem o máximo do seu potencial. Assim, o Women surge enquadrado num conjunto mais vasto de iniciativas que visam tirar o máximo partido

possível das competências dos colaboradores – a política de Gestão de Talento da Big4 – que tem como principal objetivos promover a atração e retenção dos talentos.

O Women constitui, então, o primeiro mecanismo criado pela Big4 para gerir a diversidade existente na organização, assegurando a gestão mais eficaz possível dos recursos disponíveis (Friday & Friday, 2003). Tal significa que a Big4 constatou a existência de uma multiplicidade de recursos diversos (homens e mulheres) que apesar de igualmente capazes de contribuir positivamente para o desempenho da organização (Jabbour et al., 2011) e de apresentarem diferentes pontos de vista e experiências úteis para fomentar um ambiente de inovação e criatividade (Pless & Maak, 2004) , poderiam não estar a ser geridos de um modo eficiente.

De facto, e tal como foi apresentado ao longo da revisão literária efetuada, colaboradores mais motivados irão naturalmente apresentar melhores níveis de desempenho, o que trará, por um lado, vantagens competitivas para a organização e, por outro, assegurará a atração e retenção de talento. E tal acontece, e conforme apresentado por Mavin e Girling (2000) porque quando os colaboradores percecionam uma cultura organizacional mais aberta e inclusiva, tende a sentir-se mais encorajado e motivado e, consequentemente, mais produtivo. Por outro lado, ambientes de trabalho mais diversos e inclusivos, tendem a promover um maior nível de inovação e criatividade, uma vez que exploram as diversas capacidades oferecidas por cada indivíduo.

Ao longo da investigação efetuada verificou-se, ainda, que a Big4 se encontra devidamente alinhada com as recentes tendências verificadas ao nível da área de gestão da diversidade. Na Big4, tal como foi exposto, existe um esforço constante – ainda que não formalizado – para promover a igualdade no momento do recrutamento e seleção de novos colaboradores. Todavia, as dificuldades inerentes à gestão da diversidade surgem no quotidiano dos colaboradores experientes, nomeadamente no que respeita à gestão de carreiras, à manutenção do equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, às oportunidades existentes e ao grau de envolvimento com a organização.

No contexto das referências literárias analisadas sobre a temática da diversidade – e da sua associação com o caso de estudo da Big4 – importa salientar ainda as questões associadas a diferenças identificadas entre a gestão da diversidade e a promoção de igualdade de oportunidades. O objetivo principal do projeto Women consiste na criação de um clima de gestão da diversidade, desenvolvendo os mecanismos necessários para a

valorização da diferença e aproveitamento de todas as vantagens potenciadas pelos colaboradores. Porém, a reduzida divulgação e esclarecimento dos objetivos associados ao projeto conduziu a que muitos dos seus colaboradores o percecionassem como um conjunto de medidas que visa apenas a promoção da igualdade de oportunidades o que consideram uma ambição muito redutora e desligada da estratégia organizacional.

“O projeto deixou o sentimento de que somos uma minoria e que temos que lutar contra isso.”

Colaboradora 7, Consultoria de gestão, Operacional

“Acho que o Women é um pouco feminista. Parece que quer promover a igualdade. Mas isso não faz sentido porque a igualdade não existe.”

Colaboradora 13, Consultoria Financeira, Gestão de topo

Pelo que foi exposto, e tendo em conta os resultados obtidos ao longo da investigação realizada – quer ao nível oficial, como local – é possível concluir que a diversidade de género constitui um problema na Big4 que carece de análise e resolução, e que o Women constitui o primeiro instrumento formal desenvolvido para esse efeito. De facto, nem todos os colaboradores reconhecem a necessidade de refletir sobre esta problemática – e incentivar a sua gestão – por não identificarem a existência de episódios de discriminação e justificarem a reduzida representatividade atual das mulheres em cargos de topo como uma situação que tenderá a ser eliminada com a evolução natural do mercado de trabalho em termos demográficos. No entanto, muitos outros reconhecem a efetiva existência de um problema – com variadas motivações intrínsecas – ao mesmo tempo que as orientações internacionais ditam a necessidade de promover a mudança, assegurando o alinhamento da Big4 Portugal com as tendências mais modernas e sofisticadas ao nível da gestão.

Neste contexto, o Women constitui o primeiro instrumento de mudança cultural definido pela Big4 Portugal, tendo em vista o desenvolvimento de esforços para promover a mudança de mentalidades no que se refere à diversidade de género e ao modo como esta é gerida internamente.