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CAPÍTULO I – ORGANIZAÇÃO ESCOLAR E GESTÃO DEMOCRÁTICA

1.3. GESTÃO ESCOLAR PARTICIPATIVA

A gestão escolar é marcada na atualidade por vários desafios. Lück (2011) chama atenção para esse fato ao assinalar o desenho do contexto contemporâneo, no qual a escola está inserida em uma sociedade complexa. Portanto, não se pode pensar a organização escolar a partir de um enfoque meramente administrativo, porque as estratégias, diretrizes, práticas vigentes e relação da instituição escolar com o meio externo repercutem diretamente no ensino e, consequentemente, na qualidade educacional.

Na atual conjuntura, a gestão escolar é chamada a se consolidar a partir de uma prática inspiradora e mobilizadora de energia e competência para a efetivação que é a realização de objetivos avançados para responder a novas

necessidades de transformação sócio-econômica-cultural e desenvolvimento criativo e aberto de competências humanas “mediante a dinamização do talento humano, sinergicamente organizado, e a organização competente do trabalho e emprego criativo de recursos os mais diversos” (Luck, 2011, p. 24).

O porquê dessa efetivação se explica pelas demandas de aprendizagem e educação no cenário de uma sociedade regida cada vez mais pela inovação tecnológica e relações sociais complexas, na qual não há mais o ser humano desprovido de saberes diversos. Atuar e viver nesse contexto social pressupõe seres humanos dotados de criatividade e um repertório cognitivo que lhe possibilite inserção na vida social. Por exemplo, os postos de trabalho requerem pessoas qualificadas, criativas, proativas, experientes e competentes.

A efetivação também se relaciona com a necessidade de preparar o educando para conviver e contribuir para a solução de problemas ambientais. Sem uma educação de qualidade promovida pela gestão escolar democrática, a conquista dessas prerrogativas não se consolida.

A gestão participativa é indispensável nesse contexto, porque, segundo Lück (2011) além de envolver as pessoas no processo de planejamento, especialmente na tomada de decisão, as orienta para o cumprimento de objetivos comuns.

Com efeito, a gestão democrática configura um paradigma em ascensão na atualidade, porque o autoritarismo, o conservadorismo, a centralização, a fragmentação, características da gestão escolar tradicional tem resultado no desperdício, imobilismo, ao acirramento de conflitos entre os membros da instituição, circunstâncias incompatíveis com a proposta de um ensino de qualidade dedicado à busca da efetivação.

Ao refletir sobre participação na gestão escolar, Lima (2003) chama atenção para o fato de se distinguir a “participação imposta”, representada pela realização de atividades como ministrar aula, avaliar e ser avaliado, ensinar e aprender; da participação no governo, nas decisões, organização e administração da escola.

A participação praticada, no entender de Lima (2003), tem por pressuposto a democraticidade, ou seja, contribui para limitar certos poderes e de superar determinadas formas de governo. Assim, garante a expressividade de distintos interesses e projetos na escola, interferindo no processo de tomada de decisão.

Como já explicitado nesta dissertação, a escola possui em sua gestão o aspecto formal-legal, o qual pode ser útil à legitimação da participação quando usado para regulamentá-la, conforme esclarece Lima (2003):

Nas organizações formais, a participação é, geralmente, uma participação organizada que carece de regulamentação. A existência de regras de participação constitui, de resto, não só um requisito organizacional, justificável em termos operativos, mas também uma base de legitimação importante, um recurso e uma salvaguarda de que os atores, particularmente os subordinados, podem lançar mão para reivindicar, ou simplesmente para assumir, determinadas formas de intervenção [...] (2003, p. 74).

Do ponto de vista da regulamentação distingue participação formal, de participação não formal e de participação informal. A primeira é regida por um corpo de regras formais legais relativamente estáveis, geralmente prescritas em um estatuto, regulamento, tendo fundamento legal. Caracteriza-se pela precisão e imposição de orientações e limitações. Tendem a legitimar determinadas formas de intervenção e impedir formalmente outras.

A participação não formal ocorre mediante a orientação de regras menos estruturadas formalmente, geralmente presentes nos documentos produzidos na própria organização escolar. Nesse caso, a participação pode ser maior em decorrência da possibilidade dos atores produzirem tais normas, incluindo na estrutura formal o desenvolvimento de práticas que espelhem os interesses peculiares.

Quanto à participação informal, Lima (2003) esclarece que a mesma tem por referência as regras informais partilhadas pelos grupos presentes na escola. De certa maneira contribuem para atualizar as regras formais. É um tipo de participação com a propriedade de acrescentar algo à participação formal e não formal. Por meio dela, os atores elegem objetivos e interesses específicos, orientam-se, em determinados momentos, opondo-se ou complementando as regras formais.

A gestão participativa ou democrática tem o mérito de considerar as pessoas como entes responsáveis, autônomos e criativos, com potencial de contribuir para o sucesso dos fins estabelecidos na organização. Caracteriza- se pelo princípio da participação, como explica Bravo:

É preciso criar a cultura da participação e passar as informações necessárias a todas as pessoas envolvidas nos processos de organização. A participação fortalece decisões, mobiliza forças e gera o compromisso de todos com os resultados. Ou seja: assume responsabilidades. O principal objetivo é conseguir o ‘efeito sinergia’, onde o todo é maior que a soma das partes. (Bravo, 2003, p. 39)

Em consonância com essa visão, Houaiss (2001) assinala que toda organização constitui um arranjo ordenado por partes, constituindo uma totalidade, onde as pessoas possuem um papel fundamental na solução de problemas, tomar decisões, por em prática suas ideias, criatividade e habilidades. Por isso, a gestão orientada no sentido de aproveitar a contribuição das pessoas é vantajosa ao desempenho organizacional, porque cria sinergias, isto é, uma força maior, definida a partir da união de vários talentos.

Portanto, segundo Cruz (2005), a participação está estreitamente vinculada ao conjunto de objetivos e atitudes pessoas que favorecem, ou não, as ações participativas, assim como os procedimentos concretos que fazem valer o que está institucionalizado nas regras, por meio de relações humanas, também, concretas. Assim, participar também é relacionar-se. Relacionar-se é aprender a estar, decidir, fazer e verificar com o outro sobre o que e como está sendo feito, para que a ação prevista seja realizada a favor de quem e quais finalidades e propósitos. O diálogo é insumo e meio dessas interações.

Cruz (2005) evidencia dois sentidos de participação articulados entre si: participação abrange os próprios objetivos da escola e da educação. Nesta perspectiva, a escola é um lugar de aprendizado de conhecimentos, de desenvolvimentos de capacidades intelectuais, sociais, afetivas, éticas e estéticas e também de formação de competências para a participação da vida social, econômica e cultural. Essa compreensão mais restrita de participação

identifica a escola como espaço de aprendizagem, isto é, como comunidade democrática de aprendizagem.

No segundo sentido, por meio de canais de participação da comunidade, a escola conquista o status de comunidade educativa que interage com a sociedade civil, deixando de ser uma redoma, um lugar fechado e separado da realidade. Se a participação for vivenciada nos órgãos deliberativos da escola, a probabilidade dos pais, os professores e alunos se sentirem responsáveis pelas decisões que os afeta em um âmbito mais amplo da sociedade é maior. Quando há participação da comunidade, isto possibilita aos participantes conhecer e avaliar os serviços oferecidos e a intervenção organizada na vida escolar.

Na escola, a participação também busca bons resultados, mas não há nelas um sentido mais forte de prática da democracia, de experimentação de formas não autoritárias de exercícios do poder, dando oportunidades ao grupo de profissionais para intervir nas decisões da organização, definindo coletivamente o rumo dos trabalhos, como podemos ver através de Libâneo quando escreve que “O conceito de participação fundamenta-se no princípio da autonomia, que significa a capacidade das pessoas e dos grupos para a livre determinação de si próprios, isto é, para a condução da própria vida” (Libâneo,2001, p. 329). A participação nada mais é do que a intervenção dos profissionais da educação e dos usuários (alunos e pais) na gestão da escola.

A escola precisa de uma gestão para beneficiar dos resultados do processo de tomada de decisão estratégica amparado na participação. Porque a gestão escolar tem necessidade de trabalhar com previsões e organizar a atuação conjunta dos distintos atores sociais envolvidos, um trabalho a ser realizado como forma de aprendizagem a exercer a participação e a profissionalização, conforme a seguir:

A concepção democrática-participativa de gestão valoriza o desenvolvimento pessoal, a qualificação profissional e a competência técnica. A escola é um espaço educativo, lugar de aprendizagem em que todos aprendem a participar dos processos decisórios, mas é também local em que os profissionais desenvolvem sua profissionalidade. ( Libâneo. 2001, p. 119)

Esta ideia permite compreender o quanto é importante a gestão democrática na escola, porque ela abre espaço para uma forma específica de aprendizagem: a participação, ou seja, contribui para o exercício deste viés da cidadania, ainda limitado na cultura das organizações brasileiras. Constitui uma maneira de motivar as pessoas a desenvolver suas potencialidades, torná-las satisfeitas ao se sentirem úteis no seio institucional.

Segundo Chiavenato (1999), estar satisfeito é estar em equilíbrio. Para se obter um nível de equilíbrio psicológico, todo indivíduo passa pelo ciclo motivacional conforme figura 4. Ou seja, o organismo humano permanece em estado de equilíbrio psicológico, até que um estímulo o rompa e crie uma necessidade. A necessidade provoca um estado de tensão, conduzindo a um comportamento ou ação capaz de atingir alguma forma de satisfação daquela necessidade. Para o autor quando o comportamento ou ação do indivíduo encontra uma barreira, esta gera frustração, que por sua vez se reflete em desorganização do comportamento; agressividade; reações emocionais; alienação e apatia.

  Figura 4 – O ciclo motivacional

Se o indivíduo estiver constantemente frustrado, geralmente ele repassa para outras pessoas em seu entorno, tornasse menos interessado em contribuir com suas potencialidades ou aperfeiçoa-las, afetando o desempenho e a imagem da instituição.

Segundo Chiavenato (1999), a motivação pode ser externa e interna. Por exemplo, sendo externa a remuneração, as condições de trabalho (iluminação, equipamentos, etc.); e interna a valorização e o reconhecimento profissional. Tais incentivos podem ser promovidos mediante a gestão democrática, pois esta assenta, no princípio das relações humanas produtivas e criativas, no qual está implícita a satisfação dos envolvidos. Na verdade,

Esse princípio indica a importância do sistema de relações interpessoais em função da qualidade do trabalho de cada educador, da valorização da experiência individual, do clima amistoso de trabalho. A equipe da escola precisa investir sistematicamente na mudança das relações autoritárias para relações baseadas no diálogo e no consenso. Nas relações mútuas entre direção e professores, entre professores e alunos, entre direção e funcionários técnicos e administrativos, há que combinar exigência e respeito, severidade e tato humano. (Libâneo, 2001, p. 120)

Um aspecto importante da gestão democrática é a sua possibilidade de ao motivar as pessoas, promover, concomitantemente, um ambiente de qualidade nas relações entre os próprios servidores. Daí a necessidade da instituição em se preocupar com o desempenho dos servidores e com suas atitudes em relação à qualidade, porque a qualidade pessoal significa a capacidade e o compromisso com o melhor e de um bom nível de relação interpessoal entre os mesmos. Fazer o melhor possível todos os dias e melhorar sempre. Por isso, é relevante que as pessoaos precisam ser motivadas para produzirem o melhor, como refere Crosby:

Garantir a qualidade de vida no ambiente de trabalho seria “induzir as pessoas a fazer melhor tudo àquilo que devem fazer”, porém o total envolvimento das pessoas implica em uma revisão dos valores, gerando mudanças de comportamento. (1992 p. 17).

Todavia, deve-se levar em conta que no âmbito institucional há indivíduos em busca da auto realização e objetivos pessoais, os quais nem sempre estão vinculados às propostas institucionais. Por outro lado, as pessoas não fazem as mesmas coisas pelos mesmos motivos na organização.

Nesse contexto diversificado, a motivação representa uma força relevante para incentivar comportamentos favoráveis ao desempenho organizacional.

A motivação das pessoas, juntamente com sua capacidade individual, a natureza da tecnologia disponível, a tarefa a ser executada, entre outros fatores, determinam o desempenho das instituições. Portanto a compreensão das variáveis que interferem nos motivos das pessoas pode auxiliar a canalizar seus esforços no sentido dos objetivos da instituição.

Chiavenato descreve que as instituições mais reverenciadas do planeta possuem um elo em comum: a valorização do patrimônio humano que possuem como a chave do sucesso. O autor destaca seis características comuns nestas instituições:

a missão, os valores e a cultura dessas instituições são conhecidos e levados a sério por todos (sobretudo pelas chefias do executivo); o sucesso atrai as melhores pessoas, porque as pessoas gostam e querem trabalhar em instituições bem reconhecidas; as instituições possuem claro perfil dos servidores que atuam em diferentes setores; sempre que possível aproveitam e promovem seus próprios talentos em vez de buscá-los fora; premiam o desempenho; sempre medem o grau de satisfação de sua força de trabalho, por este estar diretamente ligado aos resultados pretendidos na instituição em seu diversos setores. (Chiavento, 1999, p.210)

Na análise da qualidade de vida no trabalho, precisamos de compreender o homem como um ser biopsicossocial para que possamos compreender a motivação. É necessário que os trabalhadores sintam prazer e orgulho com o trabalho que executam no órgão onde trabalham, sejam estimulados com desafios contínuos, convivam em um ambiente propício à participação e sugestões, e sejam reconhecidos pelo trabalho bem realizado, uma vez que a busca da realização pessoal é a fonte do comportamento motivacional, pois o ser humano procura fazer aquilo que o realizará.

Segundo Gil (2002) a motivação nas pessoas é exigida cada vez mais devido ao nível de competição dos negócios. Para o autor a motivação pode ser o principal combustível para a produtividade da organização, gerando, assim, comprometimento dos funcionários com os objetivos, metas e projetos da organização.

Para Bérgamo (1992), poucas organizações percebem o potencial profissional e a criatividade dos seus colaboradores, pois a gestão realizada

ainda se orienta pela rigidez nos processos decisórios. Quando a gestão se torna democrática é mais fácil as pessoas exporem suas habilidades e competências, principalmente quando se sentem valorizadas.

Embora a gestão democrática não possa resolver todos os problemas da escola, ela é uma exigência para se democratizar o poder. Para Paro (2001), ela é um processo construído a longo prazo, orientado para modificar comportamentos, oportunizar a participação das pessoas nas decisões e para a construção de um clima organizacional harmonioso. Inspira-se na cooperação, reciprocidade, solidariedade, princípios fundamentais ao bom desempenho da instituição escolar.

1.4. EDUCAÇÃO BRASILEIRA: AVANÇOS E CONQUISTAS NO CAMINHO

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