• Nenhum resultado encontrado

Governança de recuperação e/ou reflorestamento

3. GOVERNANÇA

3.3. Governança de recuperação e/ou reflorestamento

O Planaveg (MMA, 2014b) aponta que o sucesso do processo de recuperação da

vegetação nativa está baseado em três eixos: motivar, facilitar e implementar, como visto na Tabela 3. Como essa solução já existente demonstra um cenário de governança referente à recuperação de vegetação nativa, pode-se tomar por base tal instrumento. O eixo motivar apresenta os fatores necessários para inspirar e motivar os tomadores de decisão, proprietários de terra e/ou cidadãos a recuperar e reflorestar. O eixo facilitar apresenta fatores necessários para criar condições (ecológicas, de mercado, políticas, sociais e/ou institucionais presentes) necessárias para favorecer a recuperação de vegetação nativa. E, por fim, o eixo implementar, em que são apresentados os fatores necessários para viabilizar a implementação da recuperação no campo de maneira sustentada, como recursos e capacitação, monitoramento etc. Sendo assim, a governança perpassa por cada um desses eixos, com a finalidade de assegurar que a restauração e/ou reflorestamento sejam realizados e que depois de tal restauração ocorra o controle e monitoramento das áreas.

No eixo motivar, a governança se apresenta nos aspectos dos benefícios, sensibilização, mecanismos legais e cultura. Na parte dos benefícios, são apontados benefícios sociais e ambientais provenientes da recuperação, os quais já foram apresentados com maiores detalhes na Tabela 3. São eles os responsáveis por impactar a sociedade e fazer com que ela se mobilize

a favor da recuperação. Já na sensibilização, a governança é vista na comunicação desses benefícios, o que é fundamental para a comoção da sociedade. Para isso, por exemplo, a grande mídia pode ter um papel central e os órgãos envolvidos devem investir em campanhas de sensibilização. Os mecanismos legais estão diretamente relacionados ao termo governança. A existência de uma legislação para a recuperação e sua devida compreensão são essenciais. No aspecto cultura, existe a ligação cultural da sociedade com os diferentes tipos de vegetação e, com isso, o apoio da sociedade no processo de recuperação.

No eixo facilitar, a governança se faz presente nos aspectos das condições de políticas públicas, condições sociais e, principalmente, nas condições institucionais. Nas políticas públicas, os processos de governança se apresentam na garantia da posse da terra e dos seus recursos naturais pelos proprietários, no alinhamento e coerência entre as políticas públicas que influenciam a recuperação da vegetação nativa, na existência de restrições à conversão e degradação da vegetação nativa e na aplicação das restrições e penalidades aos causadores da conversão ilegal da vegetação nativa. As políticas públicas são as principais reguladoras no processo de recuperação. Nas condições sociais, há o engajamento e empoderamento das comunidades locais na tomada de decisões acerca da recuperação, enfatizando o fato de a população local ser beneficiada pela recuperação da vegetação nativa. Na governança é importante que haja pessoas engajadas nas esferas local, nacional e internacional; por isso, o empoderamento das comunidades locais é tão rico para o procedimento. E, nas condições institucionais, aparece o termo governança pela primeira vez no Planaveg, em que há clareza na definição dos papéis e responsabilidade dos atores-chave pela recuperação e é reconhecida a existência de um arranjo e articulação institucional eficaz (governança), que são indispensáveis para o sucesso da meta.

Por fim, no eixo monitorar, destacam-se os aspectos relacionados a lideranças, conhecimento, técnicas e metodologias, financiamento e incentivos e monitoramento. Nesse eixo, de forma não explícita, o processo de governança se faz presente. A existência de lideranças em nível nacional e/ou local e a existência de compromisso político de longo prazo são imprescindíveis para o sucesso da recuperação florestal. Por meio da governança e da gestão do conhecimento, existirá a geração de saberes sobre a recuperação de ecossistemas e a transferência desse conhecimento sobre a recuperação por meio de redes de especialistas e serviços de assistência técnica e extensão rural. Também se faz necessária uma boa gestão para implementar técnicas e metodologias de recuperação baseadas no conhecimento científico e que levam em conta as mudanças climáticas. As políticas de financiamento e apoio financeiro são importantes, pois os incentivos positivos e recursos à recuperação devem superar os

negativos. São também necessários incentivos e recursos financeiros prontamente acessíveis. Para o angariamento desses recursos financeiros, é necessária uma boa administração. Por fim, a existência de um sistema efetivo de monitoramento e avaliação dos resultados e a ampla divulgação dos bons exemplos e reconhecimento deles pela sociedade se fazem fundamentais para o sucesso de recuperação de florestas.

Como a governança está presente em todas as dimensões-chave para o sucesso da recuperação florestal, ela deverá ser um arranjo de leis, regramentos e políticas públicos, sempre sendo geridos por pessoas e instituições, desde o nível local até o internacional. Isso porque os problemas ambientais são problemas transfronteiriços e de interesse local e global.

A governança multinível é indicada para esse contexto uma vez que o processo sugere a integração de políticas regionais, nacionais e comunitárias, incluindo múltiplas redes de relações horizontais e verticais em um processo articulado e coletivo de aprendizagem. A governança multinível é uma das alternativas que pode contribuir para a aprendizagem e adaptação em sistemas complexos, como os socioambientais (ARMITAGE, 2008; BALL et al.,

2014). Para Armitage (2008), esse arranjo deve conectar a comunidade a gestores nacionais e internacionais, ligados a uma gestão mais científica ou tradicional, com capacidade de compartilhar informação e conhecimento, além de promover a cooperação e o diálogo em torno dos objetivos. Ball et al. (2014) reiteram que a sociedade civil pode desempenhar papéis cruciais na resolução de problemas ambientais e na melhoria da participação democrática, beneficiando a boa governança dos recursos.

Sendo assim, a governança multinível pode partir de uma gestão local para uma nacional e até internacional (ARMITAGE, 2008; ANDONOVA, 2013). Isso faz com que os conhecimentos

enraizados na cultura local possam beneficiar os processos de criação de regras e sua implementação. Ao invés de organizações que possuem poucos conhecimentos e que muitas vezes podem demandar um tempo maior além de mais recursos financeiros e humanos para essa regulamentação, organizações locais com vastos conhecimentos a respeito do propósito são mais eficientes e eficazes.

O contrário também pode acontecer. Se um órgão internacional mais capacitado tomar a frente das negociações, ele poderá regulamentar e dirigir com mais efetividade. Um exemplo é o Programa Áreas Protegidas Regionais da Amazônia (ARPA)15, que envolve múltiplos

15 O ARPA (Programa Áreas Protegidas Regionais da Amazônia) é um programa do Governo Federal, coordenado

pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), gerenciado financeiramente pelo Funbio (Fundo Brasileiro para a Biodiversidade) e financiado com recursos do Global Environment Facility (GEF) (por meio do Banco Mundial), do governo da Alemanha (por meio do Banco de Desenvolvimento da Alemanha, o KfW), da Rede WWF (por

agentes para uma governança efetiva da floresta. Esse projeto é estudado por Andonova (2013) em seu texto acerca de como o desenvolvimento de mecanismos de governança pode proteger a Amazônia. Essa governança envolve não apenas autoridades locais e nacionais, mas também organizações internacionais, a sociedade civil e ONGs internacionais.

Como visto no exemplo citado acima, são os mais diversos agentes que estão envolvidos na governança multinível. Os agentes envolvidos nesse processo podem ser, além dos já mencionados por Andonova, também os especialistas na recuperação florestal, tais como ecologistas, biólogos, engenheiros florestais e técnicos, representantes de governo (esferas local, nacional e internacional), lideranças da sociedade (que podem ser representadas por ONGs, instituições locais e cooperativas) e dirigentes dos setores privados e industriais.

Sintetizando, Wilson e Cagalanan (2016) sustentam que a “restauração da paisagem florestal” se propõe a ser um processo colaborativo, envolvendo múltiplos grupos de agentes das partes interessadas e, idealmente, originando uma tomada de decisão consensual.

Para Guariguata e Brancalion (2014), a governança da “restauração da paisagem florestal” ainda é um campo novo com desafios metodológicos, conceituais e práticos. Para os autores, encontrar um equilíbrio de comando e controle na restauração florestal versus a governança ambiental, que inclui atores não estatais, flexibilidade regulatória e instrumentos baseados no mercado, está no centro dos desafios. Os sistemas de governança devem estar adaptados para incluir uma ampla gama de partes interessadas, instrumentos jurídicos, políticas intersetorias e administrações governamentais de vários níveis.

Nesse sentido, Wilson e Cagalanan (2016) afirmam que, em geral, para que o processo de recuperação funcione, as abordagens de governança devem ser centradas nas pessoas, ser adaptáveis, dependentes do contexto e envolver as motivações, as ideias, as normas culturais e os valores das pessoas.

O estabelecimento de uma governança multinível, determina o papel de cada agente, para que não haja retrabalho e gastos excessivos. Essa alternativa de governança inclui atores locais, nacionais e internacionais, com agentes do governo, sociedade civil, ONGs e setor privado. Por incluir agentes locais, essa alternativa de governança pode ser o primeiro passo para o cumprimento da intenção de recuperação e/ou reflorestamento estabelecidos em Paris durante a COP21, no Planaveg e Desafio de Bonn.

Trata-se de uma articulação complexa, envolvendo diferentes áreas de recuperação, com diversas metodologias, estratégias e técnicas, além de recursos humanos capacitados e

meio do WWF-Brasil) e do Fundo Amazônia (por meio do BNDES). Fonte: http://programaarpa.gov.br/oquee/, acesso em: 1 ago. 2017.

disponíveis não só para a execução do trabalho, mas para mensurar, verificar e reportar os resultados. É um grande desafio por ser de natureza transfronteiriça, com o objetivo de resguardar um bem comum que pode influenciar a qualidade de vida de um determinado local e simultaneamente a sobrevivência do planeta como um todo.