• Nenhum resultado encontrado

Percebe-se que, como regra geral, esses atores citados estão constantemente buscando maximizar o ganho individual em detrimento do coletivo, com prejuízo para toda a socie- dade brasileira. Essa postura dos diversos agentes dos sistemas público e privado (finan- ciadores, prestadores de serviços e indústrias de insumos, entre outros) vem decisivamente contribuindo para agravar o atual quadro da saúde no país.

Por apresentarem interesses próprios e muitas vezes conflitantes, cabe ao governo pro- mover o equilíbrio dessas forças por meio de legislações específicas e da atuação eficaz de agências reguladoras.

2.8.1 Papel Regulador do Estado

Em todo o mundo, os sistemas que ofertam cuidados de saúde operam com algum nível de intervenção governamental. Alguns países intervêm um pouco mais, outros menos, mas, em essência, constata-se que a tese dos mercados livres não representa a melhor maneira de alcançar níveis adequados de eficiência e resultados satisfatórios no campo dos cuidados em saúde.

O Estado, de alguma maneira, sempre interferiu nas relações econômicas. Inicialmente o fazia editando leis para disciplinar genericamente a ação dos agentes privados. Poste- riormente, essa intervenção se intensifica, e a interferência estatal no domínio econômico passa a envolver a própria exploração da atividade econômica por ente estatal (empresas públicas, sociedades de economia mista).

A lógica da intervenção estatal prevalecente há pouco tempo era centrada na supre- macia do interesse público (entendido como interesse do Estado-nação) sobre os interesses privados. Ao governante de turno, competia decidir, a partir de sua leitura política dos interesses gerais da sociedade, quanto, de que modo e em favor de quem se daria sua ação na ordem econômica.

A atividade econômica acabava por padecer de uma enorme instabilidade, pois as decisões políticas são necessariamente cambiantes (fruto da natural necessidade de aco- modação dos interesses políticos e das premências da alternância de poder) e buscam responder às demandas mais imediatas (próprias do ambiente político). Além disso, num contexto de intervenção predominantemente direta na economia, os objetivos perseguidos pelo Estado são de natureza geral, sobretudo sem grande preocupação com o equilíbrio específico do setor onde recai essa intervenção (MARQUES NETO, 2003).

O que é relevante para o advento da atividade regulatória estatal não é a supressão da intervenção estatal direta na ordem econômica, mas basicamente a separação entre o operador estatal e o ente encarregado da regulação do respectivo setor.

A partir do exercício da atividade regulatória pelas agências, a ação estatal passa a depender do equilíbrio entre os interesses privados (competição, respeito aos direitos dos

usuários, admissão da exploração lucrativa de atividade econômica) com as metas e os objetivos de interesse público (universalização, redução de desigualdades, modicidade de preços e tarifas, maiores investimentos, etc.). A intervenção regulatória é muito mais pautada pelo caráter de mediação do que pela imposição de objetivos e comportamentos ditados pela autoridade.

Ademais, a atividade de regulação estatal envolve funções muito mais amplas que a função regulamentar, pois abrange atividades coercitivas, adjudicatórias, de coordenação e organização, funções de fiscalização, sancionatórias e de conciliação. Sem essa plenitude de funções, não se pode falar em atividade regulatória. Vale salientar que regular não é sinônimo de regulamentar, pois, como visto, seu escopo é muito mais abrangente que o simples ato de regulamentar (MARQUES NETO, 2003).

É essencial à noção de moderna regulação que o ente regulador estatal dialogue e intereja com os agentes sujeitos à atividade regulatória, buscando não apenas legitimar sua atividade, como também tornar a regulação mais qualificada e aderente às necessidades e perspectivas da sociedade.

2.8.2 Agências Reguladoras no Brasil

A mudança significativa da forma como o Estado intervém na ordem econômica torna necessário o surgimento de instrumentos aptos a viabilizar essa nova forma de intervenção; dentre estes mecanismos, as agências reguladoras despontam como um dos aparatos mais eficazes.

As agências tomaram no direito brasileiro a configuração de autarquias em regime especial, às quais o legislador conferiu autonomia financeira, estabilidade dos dirigentes, ausência de subordinação hierárquica com o órgão vinculado, enfim, privilégios específicos a tal ponto que ela possa ser considerada dotada de independência administrativa.

Uma característica importantíssima desses organismos é o fato de não estarem sujeitos a orientações ou a controle governamental quanto à condução de sua atividade. Devem primordialmente conduzir suas decisões na busca do equilíbrio do sistema, atuando sem- pre que possível com transparência, permeabilidade e neutralidade, de modo a receber e processar demandas e interesses dos regulados, dos consumidores e do próprio poder político (MARQUES NETO, 2003).

ras vêm sendo criadas no Brasil para a supervisão das atividades de diversos setores do mercado. O surgimento das agências é fruto de uma profunda mudança na relação do aparelho estatal com a sociedade, particularmente com a ordem econômica. Seu papel na economia de um setor diz respeito à: correção das falhas de mercado relacionadas com as externalidades; correção de assimetrias de informação e poder; maximização da eficiência em mercados caracterizados pela concentração de poder econômico e naqueles onde as barreiras à entrada são significativas.

2.8.3 Regime Regulatório em Saúde Suplementar

No Brasil, até fins da década de 1990, o mercado de planos e seguros de saúde desenvolveu-se em um contexto institucional de baixa regulação. Parte do setor referente às seguradoras de saúde obedecia à legislação geral de seguros privados, submetendo-se à regulamentação da Superintendência de Seguros Privados (Susep), autarquia federal vin- culada ao Ministério da Fazenda, responsável pela regulamentação da atividade de seguro (ARANTES, 2004).

A constituição do marco regulatório pela Lei n.o 9.656/98, que dispõe sobre os planos

e seguros privados de assistência à saúde, e a criação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) em 2000, por meio da Lei n.o 9.961, alteraram expressivamente esse

cenário, a partir da definição de novas regras de entrada no mercado das operadoras e da saída de empresas do setor, protegendo, assim, os consumidores (COSTA, 2004).

A Agência Nacional de Saúde Suplementar, autarquia especial do Ministério da Saúde, é o órgão de regulação, normatização, controle e fiscalização das atividades que garan- tam, em todo o território nacional, assistência suplementar à saúde. Possui autonomia administrativa, financeira, patrimonial e de gestão dos próprios recursos humanos.

A ANS pretende dar segurança ao consumidor, garantindo a capacidade econômico- financeira das operadoras para cumprir os contratos firmados, além de assegurar a trans- parência e a competitividade do setor (CONASS, 2005). Na dimensão econômico-financeira,

a regulação pela ANS tem como escopo definir as condições de entrada, de permanência e de saída do setor e exigir a constituição de reservas e garantias das operadoras de seguro. A ação da ANS deve promover o equilíbrio entre os consumidores, agentes econômicos e o Estado, buscando que os poderes normatizador, regulador e fiscalizador da Agência sejam exercidos com independência.

Sua atuação visa a assegurar a sustentabilidade econômica e social das atividades de- sempenhadas por agentes do mercado e se faz presente no gerenciamento das informações que são coletadas tanto junto a esse mercado (operadoras e prestadores de serviço), quanto junto aos consumidores. A qualidade da regulação produzida associa-se à qualidade do fluxo de informações processadas no interior da Agência e ao grau de representatividade dos interesses que consegue alcançar (ARAUJO, 2004).

No momento, o país precisa de uma reformulação institucional da ANS e do próprio marco regulatório, para que sejam preservados os interesses de usuários, operadoras, pres- tadores de serviço e para viabilizar uma melhor regulamentação do mercado pela Agência.