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GOVERNO LULA: CONTEXTO INTERNACIONAL FAVORÁVEL, MODELO LIBERAL PERIFÉRICO E A ESPECIALIZAÇÃO RETRÓGRADA

GRÁFICO 13 – IMPORTAÇÕES BRASILEIRAS POR CATEGORIA DE USO TAXA DE PARTICIPAÇÃO (%) 1999-

5 GOVERNO LULA: CONTEXTO INTERNACIONAL FAVORÁVEL, MODELO LIBERAL PERIFÉRICO E A ESPECIALIZAÇÃO RETRÓGRADA

Em 2002, com o crescimento do candidato Lula nas pesquisas de opinião, ocorreram questionamentos do mercado sobre os rumos da política econômica vigente (mais especificamente sobre a continuidade), associado ao medo de uma moratória por parte do novo Governo17.

A partir deste contexto, ocorreu uma intensa fuga de capitais do país, provocando uma desvalorização na taxa de câmbio e ampliando o déficit na conta capital e financeira do balanço de pagamentos (relatada no capítulo anterior).

Assim, após assumir a presidência, em 2003, e diante dos impactos desta crise de confiança, o Governo Lula anunciou medidas de caráter ortodoxo na esfera econômica com o objetivo de reveter a instabilidade causada no período eleitoral, sobretudo no que concerne à estabilização da taxa de câmbio e dos índices de inflação

Neste sentido, foram anunciados o aumento das metas de inflação para 8,5% em 2003, a elevação da taxa de juros nas duas primeiras reuniões do Conselho de Política Monetária (0,5% em janeiro e 1% em fevereiro), o estabelecimento do reajuste do superávit primário para 4,25% do PIB entre 2003 e 2006, os cortes nos gastos públicos (que caíram 2,3% em 2003) e a proposição de duas reformas: tributária e previdência. Estas medidas sinalizaram a consolidação das reformas neoliberais, pós-crise de 1999, no segundo Governo FHC, mantendo a hegemonia do capital financeiro e a valorização do agrobusiness.

Os resultados desta escolha foram uma maior instabilidade macroeconômica com oscilações nas taxas de câmbio amenizadas por intervenções bilionárias do Banco Central. Além disso, assistiu-se ao desaquecimento do mercado interno como instrumento de combate à inflação sustentado pelos superávits primários e juros elevados, conforme mostra a tabela 15.

17 Em junho de 2001, o partido lançou um documento oficial intitulado: “Plano Econômico do PT – um

outro Brasil é possível”, que trazia reflexões sobre a renegociação da Dívida Externa e limitações de um percentual destinado ao pagamento de juros. Este programa foi revisto meses depois e rebatizado “A ruptura necessária”, evidenciado as motivações para o temor do mercado.

Tabela 14 - Finanças públicas, valores acumulados: 1995-2006 (R$ bilhões)

Governo FHC Governo Lula

Período (1995-98) (1999-02) (2003-06)

Juros 211,4 365,8 590,6

Superávit fiscal primário -6,5 165,4 330,9

Aumento da dívida pública 232,7 495,1 185,9

Total 437,6 1.026,3 1.107,4

*Valor médio

Fonte: Banco Central

Elaboração: Filgueiras e Gonçalves (2006).

Somente no período de 2003-2006 o Governo Lula ampliou as despesas com juros em 61,5% e com o superávit primário em 50%, se comparado com o segundo Governo FHC (1999-2002). Estes números evidenciam a escolha política do Governo que passou a despender um elevado volume de recursos para o capital financeiro.

No âmbito das políticas sociais, os dados da Receita Federal informam que estes investimentos foram reduzidos de 43,8% (2000) para a 39,4% (2006) do orçamento executado pela União. Quanto à estrutura destes gastos, observa-se a redução das despesas em Saúde (passando de 45,2% em 2000 para 38,6% em 2006) e Educação (de 23,7% para 18,7% em 2006) em contraposição à elevação expressiva das despesas em Assistência Social (de 9,9% em 2000 para 20,5 em 2006). Vale observar que a elevação de despesas na esfera social ocorreu devido à continuidade na adoção de políticas focalizadas.

Esta acomodação de interesses foi caracterizada por Oliveira (apud Filgueiras e Gonçalves, 2007. p. 167) como “hegemonia às avessas”, onde o bloco dominante aceita ser direcionado pela parcela dita dominada, desde que os conflitos distributivos não sejam questionados.

Este modelo (iniciado no Governo Collor e consolidado durante o Governo Fernando Henrique) foi definido por Filgueiras e Gonçalves (2006) como “modelo liberal periférico”, portador de três conjuntos de características marcantes: liberalização, privatização e desregulação; subordinação e vulnerabilidade externa estrutural; e dinâmica do capital financeiro. Segundo os autores:

“O modelo é liberal porque se estrutura a partir da liberalização das relações econômicas internacionais nas esferas comercial, produtiva, tecnológica e monetário financeira; da implementação de reformas no âmbito do Estado (em especial na área da Previdência Social) e da privatização de empresas estatais, que implicam a reconfiguração da intervenção estatal na economia e na sociedade; e de um processo de desregulação do mercado de trabalho, que força a exploração da força de trabalho. O modelo é periférico porque é uma forma específica de realização da doutrina neoliberal e da sua política econômica em um país que ocupa posição subalterna no sistema econômico internacional, ou seja, um país que não tem influência na arena internacional, ao mesmo tempo em que se caracteriza por significativa vulnerabilidade externa estrutural nas relações econômicas internacionais. Por fim, o modelo tem o capital financeiro e a lógica financeira como determinantes em sua dinâmica macroeconômica. (FILGUEIRAS; GONÇALVES, 2006. P. 96.).”

Assim, diante do novo patamar da taxa de câmbio, associada à nova conjuntura internacional favorável18, ocorreu uma nova configuração da contribuição dos componentes para o crescimento do PIB (tabela 16), sendo ampliada de maneira expressiva a participação das Exportações na variação do PIB.

Tabela 15 – Contribuição ao crescimento (1995-2006)

Variável 1995-98* 1999-02* 2003-2006 Consumo final 2,37 1,58 2,37 FBCF 1,00 -0,72 0,68 Exportações 0,21 0,88 1,53 Importações -1,13 0,40 -1,20 PIB 2,50 2,13 3,38 * Média no período Fonte: IPEADATA

Particularmente, o consumo final foi ampliado, devido ao aquecimento do mercado interno e às políticas sociais focalizadas que serviram de estímulo para o varejo.

18 O contexto internacional foi marcado pelo crescimento da economia da China e dos Estados Unidos,

A tabela também mostra a pequena contribuição dos investimentos para o crescimento do PIB, evidenciando a necessidade de uma nova postura neste componente para estimular a sua contribuição para a economia.

É diante deste contexto que, em 2006, o Presidente Luis Inácio Lula da Silva anuncia a candidatura à reeleição com a proposta de um novo programa econômico que retomasse os investimentos, trazendo uma melhoria da infra-estrutura e superando os empecilhos para o crescimento da economia brasileira, o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Na análise do balanço de pagamentos (tabela18), verifica-se que a expansão do saldo do Balanço de Pagamentos, passando de R$24,7 bilhões em 2003 para R$46,4 em 2006, devido ao elevado patamar do câmbio evidenciado no gráfico 14.

TABELA 16 – Balanço de Pagamentos (2003-08) – em mi US$

1995-98* 1999-02* 2003 2004 2005 2006 2007 2008

TRANSAÇÕES CORRENTES -26439 -20.103 4177 11679 13985 13643 1461 - 28 192

Balança comercial (FOB) -5598 3.469 24794 33641 44703 46457 40028 24 836

Exportação de bens 49597 55.421 73084 96475 118308 137807 160649 197 942 Importação de bens -55195 -51.951 -48290 -62835 -73606 -91351 -120621 -173 107

Serviços e Rendas -23178 -25.381 -23483 -25198 -34276 -37120 -42597 - 57 252

Serviços -9230 -6.714 -4931 -4678 -8309 -9640 -13355 - 16 690 Rendas -13948 -18.667 -18552 -20520 -25967 -27480 -29242 - 40 562

Transf. unil. correntes 2337 1.810 2867 3236 3558 4306 4029 4 224

CONTA CAPITAL E FIN. 29641 17.925 5111 -7523 -9464 16299 89155 29 352

Conta capital 380 252 498 372 663 869 756 1 055

Conta financeira 29262 17.673 4613 -7895 -10127 15430 88399 28 297

Investimento estrangeiro direto 15762 24.052 10144 18146 15066 18822 34585 45 058 Invest., em Carteira (líquido) 15394 1.429 5308 -4750 4885 9081 48390 1 133 Outros Investimentos (líquido) -561 -7.529 -10438 -10806 -27521 15688 13201 2875

FMI 1159 3.855 4769 -4363 -23271 0 0 0

* Média no período

Fonte: Banco Central do Brasil

Os valores referentes ao saldo da balança comercial foram influenciados pelo contexto internacional favorável, com o crescimento dos Estados Unidos, China e a recuperação da Argentina, Adicionalmente, a nova política de comércio exterior apresentada pelo

Governo Lula contemplou a diversificação dos parceiros comerciais, o que contribuiu também positivamente para a melhora destes indicadores.

GRÁFICO 14 – TAXA DE CÂMBIO R$/US$ COMERCIAL-COMPRA-MÉDIA (2003-2008)

FONTE: IPEADATA

Neste período, observa-se também o crescimento dos investimentos estrangeiros diretos que passaram de R$10,1 bilhões em 2003 para R$18,8 em 2006. Entretanto, estes fluxos não conseguiram recuperar a média de R$24 bilhões obtida entre 1999 e 2002

Com o novo pacto de confiança do mercado em relação aos projetos propostos a partir da reeleição de Lula, os Investimentos Estrangeiros apresentaram amplo crescimento neste período com taxa de crescimento anual de 83% em 2007.

Contudo, em 2008, como a crise internacional só foi percebida durante o segundo semestre, os investimentos estrangeiros ainda conseguiram apresentar uma taxa de crescimento expressiva (30%), passando a R$45 bilhões em 2008. No entanto, as expectativas para este indicador não se apresentam favoráveis para 2009.

Já o saldo da balança comercial foi reduzido no biênio 2007-08 devido à valorização cambial e à ocorrência de uma crise mundial provocada pelos subprimes no mercado imobiliário norte americano.

É a partir da análise dos principais acontecimentos que influenciaram o comportamento da economia entre 2003 e 2008 que se passa à análise dos seus efeitos sobre o comércio exterior brasileiro e suas conseqüências sobre o padrão tecnológico.

Ao analisar o gráfico 15, que evidencia a composição das exportações por grau de intensidade tecnológica, verifica-se que no período de 2003-2005, com uma taxa de câmbio média de R$2,81, ocorreu uma redução nos produtos de baixa intensidade tecnológica (-3,5 p.p) em detrimento dos produtos de média-alta (+1,6p.p), média baixa (+0,9p.p), alta-tecnologia (+0,4 p.p).

No que concerne ao setor de baixa tecnologia, os segmentos de maior contribuição para a redução de sua participação foram Têxteis, couro e calçados (-1,6p.p) e Madeira e seus produtos, papel e celulose (-1,5p.p).

Já o setor de média-alta tecnologia foi influenciado pelo crescimento de 1,2p.p dos veículos automotores, que passaram a ter maior expressão na balança comercial (conforme evidencia o gráfico 15), enquanto o setor de alta tecnologia teve seu incremento motivado pelo segmento aeronáutico/aeroespacial (+0,3p.p).

A partir de 2006, com a acentuada redução da taxa de câmbio motivada pelos sucessivos saldos na balança comercial e pelo retorno dos investimentos, houve uma valorização da moeda brasileira que passou a uma média de R$1,98 entre 2006 e 2008. Este resultado impactou no padrão de inserção externa, reduzindo as exportações de média-alta (-3,3p.p), alta (-1,0p.p) e baixa tecnologia (-1,9p.p). Estes setores perderam participação para os produtos não industriais (+6,4p.p).

Neste período, o segmento de veículos automotores foi fortemente impactado pelo câmbio, tendo sua participação reduzida de 10,5% em 2006 para 8,2% em 2008, motivando a perda de participação do setor de média-alta tecnologia.

GRÁFICO 15 – EXPORTAÇÕES BRASILEIRAS DOS SETORES INDUSTRIAIS

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