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Grau de Bilinguismo dos informantes, da sua comunidade e o reconhecimento da

4.1 ANÁLISE DOS DADOS METALINGUÍSTICOS DE VIRMOND

4.1.4 Grau de Bilinguismo dos informantes, da sua comunidade e o reconhecimento da

Para verificar o grau de bilinguismo dos descendentes de poloneses de Virmond e o reconhecimento da identidade dos mesmos a partir da afirmação de que são bilíngues foram aplicadas quatro questões no intuito de investigar se os contextos de usos do polonês se restringem a um determinado ambiente ou se a língua de imigração ainda é utilizada em outros contextos, como, por exemplo, estabelecimentos comerciais de Virmond.

O que se pode perceber a partir das respostas à primeira questão deste tópico (31)5 é que o uso da língua polonesa na comunidade de Virmond se restringe aos mais velhos e a contextos familiares e religiosos, já que ultimamente o grupo BRASPOL está organizando celebrações religiosas que são feitas somente na língua polonesa. Porém, de todos os informantes, apenas o CaGII M afirma utilizar o polonês fora do ambiente familiar, ou seja, no mercado.

Sabe minha filha que eu uso às vezes no mercado, eu faço a minha lista de compras e peço para o menino me ajudar, ele é muito amigo do meu filho, eu faço sacanagem com ele (risos). Eu pego e escrevo a lista de compras em polonês e mando pra ele ir fazendo as compras pra mim porque você vê né minha filha, eu já não consigo mais andar direito com esse meu pé torto e dai quando eu vou buscar ele tá lá todo apurado sem saber direito o que eu pedi, mas eu não falo nada e quando falo, falo em polonês, pois não há de ver que no apuro o bichinho dá um jeito? (CaGII M).

Já no que se refere às situações de uso do polonês no município de Virmond é possível afirmar que essas situações são bastante restritas, pois como citado anteriormente, não há um domínio da língua de imigração pela maioria dos descendentes. Assim, a língua polonesa é utilizada apenas em situações familiares e religiosas, sendo raras as situações que não condizem com esses ambientes como ocorreu com a visitante vinda da Polônia que é irmã do padre da comunidade e que veio conhecer a cidade de Virmond.

Apesar de o uso do polonês no município de Virmond ser bastante restrito a essas situações, ainda é possível verificar que um dos descendentes mistura ou misturava um pouco do polonês com o português no seu uso linguístico.

Hoje não faço tanto essa mistura, mas já fiz muito isso. Em casa, quando

conversava com a mãe ou com alguém da casa né, no dia a dia, misturava bastante tipo a gente não falava português quase, tem coisas que eu fui conhecer o nome em português depois de grande, tipo pedia sempre, por exemplo, me alcança o ręcznik que é o pano de prato ou senão vá na horta buscar pietruszka que é salsinha né... dai misturava. É dessa mistura que você tá falando né? (CaGI F).

Essa evidência demonstra um fato bastante curioso no que diz respeito aos informantes de Virmond, pois ao contrário do que se esperava, os informantes mais velhos disseram que não fazem essa mistura português/polonês na fala afirmando que sabem o momento exato de falar cada uma dessas línguas. Porém, diferentemente do que afirma, a informante CbGII F, enquanto participa da entrevista, acaba fazendo essa mistura quando fala com a filha agradecendo por ela ter feito o chimarrão com a palavra “dziękuję” que significa obrigado.

Dessa forma, essa mistura pode ser feita por muitos desses descendentes sem que eles mesmos a percebam, pois já estão habituados com algumas dessas palavras, principalmente as de cumprimento e agradecimento no seu português. Já à respeito da percepção do sotaque que os descendentes de poloneses de Virmond tem diferente verifica-se que seis dos informantes sabem e reconhecem essas diferenças, atribuindo a isso a identificação dos poloneses de Virmond.

Ah esse sotaque acho que fica sempre né, a gente... por mais que a gente queira corrigir e tudo, mas... tem algumas palavras em português que eu tenho que pensar bem pra dizer pra não falar errado (CaGII F).

Muita diferença. Aqui nós temos um tipo de sotaque diferente. Mas se for comparar com cidades mais de longe, também vai ter sotaque, é que nem as cidades do norte e São Paulo né, dá diferença (CbGII M).

Além desses informantes da GII, a informante CaGI F, a CbGI F e o CaGI M também identificam uma diferença significativa no sotaque dos descendentes de poloneses e, segundo eles, é por causa desse sotaque que eles são identificados nas cidades vizinhas como pertencentes à etnia polonesa. A informante CaGI repete a experiência que teve logo que começou a frequentar a faculdade em uma cidade vizinha onde todas as pessoas a reconheciam como “polaca” por causa do sotaque e da pronúncia de algumas palavras.

Diferença no sotaque? Sim, nossa, como percebo isso. Quem falô ou fala o polonês tem muita dificuldade, eu percebo assim nos “r” sabe, eu tenho muita pelo menos, eu percebo isso, até na escrita eu tenho que pará, pensá... dai que eu escrevo, já com algumas vogais eu sei escrever, sei o correto né,

mas dai na hora de falar, as vezes sai algumas mais abertas. Do [r] eu sempre percebi a minha pronúncia, mas das vogais eu fui perceber quando fui pra faculdade que todo mundo notava e dizia que a minha fala era aberta (risos) (CaGI F).

Já o informante CaGI M afirma que percebeu essa diferença quando viajou para o Rio de Janeiro na “Jornada Mundial Jovem” para recepção do papa Francisco e foi confundido com um estrangeiro em um restaurante. Segundo ele, quando pediu para o garçom qual era o valor do almoço, teve um resposta em inglês porque o garçom achou que ele estava tendo dificuldade de falar em português e por isso tinha o sotaque carregado.

Pois olha, tem diferença sim, eu sempre percebia isso, mas esses tempos que fomo lá pro Rio de Janeiro na recepção do papa eu percebi que meu sotaque é mais carregado do que eu achava porque eu cheguei em um restaurante né, dai sentamo e ficamo lá e nada e nada de vim ninguém atendê, dai eu vi que tinha um movimento atrás de uma outra porta de vidro dai levantei e fui e perguntei né pro garçom quanto que era o almoço e o lugar que eles serviam, eu não sei se foi porque eu não prestei atenção que tinha placa mostrando onde serviam e o valor ou se ele não me entendeu, sei que ficô me olhando, pensô um poco e respondeu em inglês, dai eu falei inglês também com ele né, mas achei que ele era inglês, dai passou um outro garçom e ele falou em português dai eu perguntei né, porque ele tava falando inglês comigo, dai ele disse, pois achei que era gringo com esse sotaque aí, dai fiquei reparando mais e vejo que temo mesmo um sotaque diferente (CaGI M).

Da mesma forma, a informante CbGI F diz perceber a diferença de sotaque principalmente quando sai do município para a cidade vizinha de Laranjeiras que fica a vinte e cinco quilômetros de Virmond, pois, segundo ela, dentro da cidade o jeito de falar das pessoas já é comum, todo mundo já está acostumado com esse uso linguístico, por isso nem percebem.

Sim, bastante. É como eu falei né, a maioria é, sei lá, um jeito mais simples assim de falá talvez, nós também pronunciamos algumas palavras diferente né. Eu percebo mais que eu falo diferente quando eu vou fazer minhas consulta em Laranjeiras né que dai as pessoa comentam que a gente fala bem carregado, bem puxado né (CbGI F).

Os informantes CbGI M, CaGII M e CbGII F acreditam que possuem um sotaque diferente, mas se forem comparar com as cidades mais longínquas como São Paulo, Minas Gerais que têm dialetos diferentes, mas se comparados com as cidades mais próximas, o sotaque praticamente nem é percebido, porém, eles sabem que existe uma pequena diferença.

Esse fato, mais uma vez, contribui para que a pergunta que orienta este estudo seja respondida, pois se comprova que os descendentes de poloneses de Virmond se identificam como poloneses e se autodenominam bilíngues, mas na prática quase não utilizam a variedade polonesa e se reconhecem como poloneses a partir de fenômenos linguísticos presentes no português falado pelos mesmos.

Com isso, é possível concluir que na comunidade de Virmond o uso da língua polonesa se restringe aos mais velhos e a contextos familiares e religiosos. Porém, apesar desse pouco uso do polonês, alguns descendentes misturam ou misturavam um pouco do polonês com o português no seu uso linguístico. Além disso, seis informantes sabem e reconhecem que possuem um sotaque diferente das demais pessoas e atribuem a essa diferença uma identificação dos poloneses de Virmond.

É possível também concluir que os descendentes de poloneses de Virmond podem ser classificados como bilíngues mas são, em sua maioria, bilíngues passivos, pois a língua polonesa praticamente não é falada e os poucos que ainda dominam essa variedade são os descendentes mais velhos. O que se percebe também é que, diferentemente da informante CaGI F, os descendentes mais jovens compreendem razoavelmente a linguagem polonesa, mas praticamente não a falam.

Por esse motivo, os bilíngues de Virmond são bilíngues passivos, “modelo” de bilinguismo que é conceituado por Dàbene (1998) como o indivíduo que domina uma das línguas apenas no nível da compreensão, mas que não a utiliza em outras modalidades como a escrita, leitura e fala. Com isso, um bilíngue passivo é aquele que foi exposto à segunda língua de uma forma suficiente para compreendê-la, mas não para usá-la ativamente como é o caso da maioria dos descendentes de poloneses de Virmond.