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Capítulo 2. O Processo de Folclorização em Penha Garcia

2.4 Grupo Etnográfico “Os Garcias”

O Grupo Etnográfico ―Os Garcias‖ foi outro dos grupos institucionalizados do folclore em Penha Garcia. Formado por Américo André, presidente da Associação de Defesa do Património Natural e Cultural de Penha Garcia e pela professora Maria Nunes Sargento, constituiu-se como grupo em 1985 e manteve actividade simultânea com o Rancho Folclórico de Penha Garcia. Este grupo surgiu do Departamento de Etnografia da já referida Associação e procurou distinguir-se dos ranchos folclóricos, dando continuidade às dramatizações históricas que a associação vinha fazendo (ceifa, malha, alfaias agrícolas). A designação ―etnográfico‖ visa essa distinção (entr. André 2016). Esta associação surgiu através da formação de uma escola de adultos em Penha Garcia. Américo André candidatou-se a uma bolsa de cursos de alfabetização de modo a responder à ―ânsia que as pessoas tinham de marcar o número telefónico dos filhos e ler as suas cartas‖ do Curso de Educação Básica de Adultos (entr. André 2016). O curso formou tecedeiras, cadeireiros e costureiras, no sentido de

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dinamizar a aldeia de Penha Garcia, que se encontrava a ficar desertificada dada a falta de trabalho. Assim, a Associação teve ―as raízes‖ nessa escola de adultos e numa intenção de preservar o património. O Grupo Etnográfico surgiu em consequência dessa instituição.

Aquando da sua formação o grupo tinha aproximadamente 50 pessoas que em palco demonstravam os ambientes e contextos de trabalhos antigos, com o vestuário e utensílios próprios. Exibia também a gastronomia local, nomeadamente aquela que fazia parte da merenda, constituída por mel, chouriços, enchidos. Uma atuação ―tipo‖ do Grupo Etnográfico consistia, segundo Américo André,

num primeiro momento, demonstrar através de teatros ou dramatizações um dia de uma jornada de trabalho agrícola, depois haveria uma pausa para cantar e dançar, e depois merendavam, momento no qual os intervenientes interagiam com o público oferecendo produtos próprios da gastronomia da aldeia. O único elemento que recebia pagamento era o acordeonista José Pires, conhecido por ―gafanhoto‖ (entr. André 2016).

A ensaiadora foi a adufeira Maria Nabais, conhecida localmente por ―ti‖ Nabais (Cf. Capítulo 3). Nesse âmbito dava as orientações das músicas e do vestuário.

Segundo o seu Presidente, Américo André, o grupo procurou distinguir-se dos outros ranchos que, na sua perspectiva, se limitavam a representar as músicas e as danças, não fazendo as dramatizações e teatros que caracterizavam as atuações do Grupo Etnográfico ―Os Garcias‖. A primeira apresentação pública do grupo aconteceu no ano de 1987 numa exposição de arte sacra, organizada pela Associação de Defesa do Património Cultural e Natural de Penha Garcia, denominada ―O Sagrado e o Profano do Tempo dos Nossos Avós‖. Para esse efeito, Américo André realizou uma recolha de quadros religiosos que foi exposta no café ―A Frágua‖: ―500 ou 600 quadros retirados do lixo pois as pessoas morriam e os filhos deitavam esses quadros fora‖ (entr. André 2016).

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Contou com o apoio de instituições locais, que contribuíram para a sua divulgação como o periódico Aldeia Viva e a rádio Amizade, um emissor local livre constituído inteiramente por jovens que funcionou entre 1984 e 1988.

Na luta pelo progresso e na defesa dos valores locais salientam-se os esforços da Rádio Amizade, do Jornal Aldeia Viva e da Associação de Defesa do Património Cultural e Natural de Penha Garcia, na divulgação, preservação, reconstrução e valorização do património local (André 2012 49).

Estes grupos, que funcionavam sob a alçada da Associação de Defesa do Património Cultural e Natural, começaram a ter maior proeminência, nomeadamente a partir de 1988, como é patente nos registos do jornal Aldeia Viva de 1987 a 1991. As páginas do jornal evidenciam uma relação particular entre o periódico Aldeia Viva e a Associação de Defesa do Património Cultural e Natural de Penha Garcia, expressa no destaque noticioso que é dado aos seus ranchos folclóricos.

Esta associação criou, para além do Grupo Etnográfico ―Os Garcias‖ e do seu grupo de adufes, o Rancho Folclórico Juvenil, que teve a sua primeira atuação precisamente no 3º aniversário do Jornal Aldeia Viva no ano de 1988. Esta aparição espelha a importância dos órgãos locais na preservação e divulgação das manifestações culturais da aldeia:

Estreou-se em Fevereiro de 1988 na festa do 3º aniversário do nosso jornal (...) o Rancho Folclórico Juvenil da Associação de Defesa do património Cultural e natural de Penha Garcia, tem como preocupação preservar e divulgar todas as riquezas culturais e etnográficas deste laborioso povo de Penha Garcia (Aldeia Viva Março 1990 4)

Apesar do esforço de transmissão de saber colocado na criação do rancho infantil, o Grupo ‗Os Garcias‘ extinguiu-se porque não conseguiu transmitir os conhecimentos que pretendia exibir em palco aos jovens da aldeia. Segundo Américo André ―não conseguimos passar essa aprendizagem, só as pessoas de idade é que o conseguiam fazer‖ (entr. André 2016).

O grupo teve apoios financeiros de vários organismos, INATEL, Câmara Municipal de Idanha-a-Nova, Instituto Português da Juventude, Governo Civil e

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Instituto do Ambiente (INAM, IPAM). Os subsídios serviram para adquirir instrumentos musicais (viola beiroa e adufe) e para comprar casas, edifícios de valor histórico da aldeia, com o objetivo de serem requalificados e musealizados. Essas casas foram posteriormente doadas à Junta de Freguesia com o objetivo de organizar um Museu Etnografico, uma ―casa de cultura local‖, o que não aconteceu (Ibid.).

A atividade do Grupo desenvolveu-se até 2010, ano que se extinguiu, transitando alguns elementos para o Rancho Folclórico de Penha Garcia. Nesse processo o Rancho integrou nas suas performances algumas características do Grupo Etnográfico, nomeadamente as dramatizações que costumava realizar nas suas apresentações públicas.