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Em sua obra, Jorge Ávila de Lima (2002) traça um retrato sistemático da dimensão relacional do trabalho dos professores, olhando-se o isolamento profissional dos docentes como um fenômeno social que prevalece nas instituições de ensino. O autor discute o conceito de se ter parceiros significativos, como solução ideal para o desenvolvimento dos docentes, a aprendizagem de qualidade dos educandos e a transformação das escolas. Ele aponta uma preocupação conceptual quanto à palavra colaboração, visto que não sendo compreendida sua significação, pode-se transformar numa palavra oca, inútil ou descontextualizada.

Para que a ideia não se perca, já na introdução de sua obra, o autor traz como objetivo, mostrar se a colaboração se concretiza (ou não) nas escolas e discute “a forma como ela poderia transformar estas instituições em locais mais aprazíveis e positivos para os professores, para os alunos e para as suas famílias” (p. 7).

No capítulo I, cujo título é “Questões centrais no estudo das culturas profissionais dos professores: Uma síntese crítica da bibliografia”, Lima faz uma análise crítica da bibliografia que trata as culturas ocupacionais de ensino, buscando nos autores, o que se diz da cultura das escolas e seus respectivos corpos docentes. Ele discute, conforme apresenta, “diversos contextos nos quais a

diversidade e o consenso cultural são construídos e sustentados pelos professores nas suas relações com os outros”. (p. 49)

No decorrer do capítulo, Lima aponta ser um problema os estudos que tratam o conceito de cultura do trabalho docente como culturas personalizadas, ou seja, que cada professor possui sua própria cultura. Nesta análise é perceptível a defesa que o autor faz quanto à importância de se refletir sobre a homogeneidade ou heterogeneidade para compreender a cultura dos docentes, referenciando os autores que tratam a cultura organizacional, bem como, Vala, Monteiro e Lima (1988) e Rui Gomes (1993), como importantes campos de pesquisa a esse estudo.

O autor apresenta a problemática de tratar a cultura individualmente, pelo fato destas perspectivas ignorarem as práticas.

Quase todas as principais concepções existentes sobre a cultura das escolas são essencialmente idealistas, no sentido em que representam cultura como quadros interpretativos que permitem conferir significados aos comportamentos dos actores, em vez de comportamentos propriamente ditos (p.18).

Lima considera que as culturas dos professores será mais desfrutada à medida que deixarem de ser utilizadas ou perspectivadas apenas em termos de conhecimento, valores e crenças, mas também de comportamentos e práticas que os professores interiorizarem, produzirem e reproduzirem em suas experiências de trabalho coletivo.

Outro fator relevante apresentado neste capítulo vem dizer das organizações escolares parecerem ser tipicamente multiculturais, o que significa dizer que englobam em seu interior múltiplas subculturas.

O autor afirma que a cultura de colaboração da escola, depende de um currículo flexível, caso contrário não se efetiva.

Lima coloca como problema teórico a falta de clareza conceptual, acompanhada por um problema metodológico, que segundo ele, é decorrente da ausência de uma operacionalização dos conceitos utilizados na investigação de campo, o que permite que este tema prevaleça sob um vago discurso. Sendo assim, o autor, quer neste livro, apresentar propostas que superem esta problemática, permitindo que o tema seja mais focalizado e perca este “tom” de discurso vago, como o próprio autor apresenta.

Sua preocupação a esse respeito é evidente no capítulo II, intitulado “Isolamento profissional e colegialidade no ensino”, momento em que o autor discute o isolamento dos professores e o trabalho em grupo, que ele denomina colegialidade, trazendo alguns dados empíricos que corroboram com sua preocupação, atentando-nos quanto a diferença existente entre as conversas entre colegas, os meros contatos irregulares e as práticas conjuntas e a efetiva colaboração entre professores. Para ele, “as culturas profissionais dos professores representam mais do que simples agregados de conhecimentos e concepções: elas integram, igualmente, comportamentos e práticas, modos de agir nas escolas e de interagir com os colegas.” (p. 51)

Sua pesquisa empírica aponta, neste capítulo, uma grande falta de contato entre colegas no que diz respeito aos assuntos profissionais, prevalecendo muito mais as percepções que os professores têm do seu trabalho, como por exemplo, “no que se refere à disponibilidade dos colegas para se ajudarem e, [...] os sentimentos de proximidade e cordialidade” (p. 56). Lima aponta tipos de interação mais complexos, bem como a troca de materiais de ensino, o desenvolvimento conjunto de materiais, a planificação em grupo ou trabalho em equipe, dizendo dessas interações ser “notória a raridade das situações de colaboração profissional, sendo possível, por isso, estabelecer uma distinção básica entre dois tipos de interacção profissional no ensino: as conversas entre colegas, mais comuns e frequentes e as atividades práticas conjuntas” (p.10)

O autor aponta que uma das dificuldades presentes no campo de investigação é referente à ausência de critérios claros para definir a colegialidade no ensino e os níveis de intensidade que ela pode assumir. Com base em sua investigação empírica, o autor diz perceber que “os professores estabelecem um conjunto relativamente diminuto de relações profissionais informais com seus colegas” (p. 66), confirmando assim, a tese do “isolamento” profissional.

[...] nas relações profissionais orientadas para a acção conjunta, as relações que produziam contactos mais frequentes representavam uma clara minoria de todas as relações existentes, o que atesta a raridade, nestas escolas, dos modos de interacção colegial com uma componente de atividade conjunta.(p. 67)

No Capítulo III, denominado “A dimensão relacional das culturas de escola: uma perspectiva cultural”, o autor apresenta a instituição de ensino como unidade de

análise, onde vai aprofundar, por meio desta, o conhecimento das culturas profissionais dos professores, visto que, como o autor coloca, a atenção às culturas profissionais dos professores nunca foi tão evidente como na atualidade.

Neste momento, o autor deixa claro que defende um olhar mais global sobre as culturas apresentadas, ao invés de enfatizar as singularidades. Ele coloca seu olhar sobre as redes sociais, dizendo da possibilidade destas serem um campo para explorar as formas das culturas profissionais de professores.

Olhar para o envolvimento interpessoal em temos de redes de relações constitui uma forma interessante de retratar estas situações relacionais diversas e socialmente significativas. Permite, também, um modo fascinante de representar a vida relacional dos professores nas escolas. (p. 73)

Para analisar a complexidade das culturas docentes nas escolas, Lima tem como ferramenta fundamental o estudo sobre as redes sociais que segundo ele, “oferece um conjunto rico e metodologicamente profícuo de técnicas que permitem abordar as três dimensões das culturas profissionais dos professores” (pg. 77). Essas três dimensões principais, Lima vai chamar de densidade, centralização e fragmentação.

A fragmentação das redes sociais visa investigar as suas propriedades estruturais, tendo em vista descobrir os subgrupos em que pode ser dividida, trazendo questionamentos que buscam compreender se os subgrupos formados no interior das escolas são de tal modo fragmentados que muitos docentes não conseguem se comunicar facilmente com os seus colegas, direta ou indiretamente e, se as culturas ditas colaborativas, são estruturalmente menos fragmentadas do que as individualistas.

O autor vai dizer ser possível ir além do estudo do isolamento ou fragmentação, que são características das culturas profissionais existentes. Ele vai identificar outros níveis de fragmentação mais profundos, que vai chamar de cliques profissionais de ensino, onde se incide sua atenção no desenrolar do próximo capítulo.

No capítulo IV, “Atomização e fragmentação das culturas profissionais no ensino”, Lima discorre mais profundamente sobre a questão da fragmentação das culturas, enfatizando que mais do que uma caracterização de personalidades, de características pessoais dos indivíduos, a fragmentação é uma situação que pode,

inclusive, estar associada a estruturas de comunicação da escola que coíbem atitudes dos professores de se aproximarem e aprenderem num espírito colaborativo. O autor vai se embasar em dados empíricos recolhidos das escolas que estudou para apresentar formas de fragmentação das culturas profissionais de professores, fundamentando-se nos conceitos de componente, que consiste em subgrupos de colegas conectados numa rede desconectada de laços colegiais e de clique que “inspira, desde há muito, o estudo dos subgrupos coesos existentes nas redes sociais” (p. 112), ambos conceitos representam importantes modalidades de fragmentação no ensino e, segundo o autor, “ajudam a perceber que o isolamento profissional no ensino não se resume a uma experiência meramente individual dos professores: as culturas das escolas caracterizam-se por outros níveis significativos de segmentação.” (p. 102)

Nestes capítulos, o autor vem caracterizando e discutindo as estruturas e os processos de trabalho que predominam nas culturas profissionais dos professores, tendo por base a informação quantitativa sobre o numero de contato que são estabelecidos entre os docentes, identificando assim as formas de relação ou isolamento destes profissionais, o que vai permitindo o arcabouço de suas conclusões em relação às escolas, enquanto culturas colaborativas.

No V e último capítulo “A experiência da colegialidade”, o autor apresenta uma análise da colegialidade com base no ponto de vista, das falas dos próprios autores (professores), enfocando as variações de contextos a que os profissionais estão inseridos e os significados que são dados à experiência dos docentes. No decorrer deste, o autor traz questionamentos entorno das mudanças bruscas que existem, quanto às práticas dos professores que já têm suas experiências de colegialidade, mas que ao mudarem o ano letivo, mudam suas práticas, tornando-as isoladas e ainda, traz os docentes estagiários que ainda não possuem experiência cumulativa que lhes permita contradizer a estrutura em que estão inseridos.

Combinando uma análise das redes sociais com os procedimentos qualitativos por meio da realização de entrevistas, Lima buscou desenvolver uma forma de abordar as culturas profissionais das escolas, de modo a descrevê-las como realmente são.

A leitura desta obra nos faz pensar sobre a importância do trabalho colaborativo nas escolas com vistas a obter um trabalho mais gratificante, positivo e efetivo aos professores, com consequências significativas aos seus alunos, como

coloca Lima. Portanto, a questão central abordada aqui, segundo o próprio autor, não é identificar o que falta aos professores para colaborarem mais, mas sim o que pode ser feito, ao que o autor destaca,

Um alargamento mais significativo das áreas do currículo em que os docentes possam exercer a sua competência profissional; [...] a concessão de mais tempo e espaço para que este trabalho de colaboração se possa efetuar; e, a contratação de mais pessoal docente para as escolas, para substituir os colegas nas turmas, quando estes desenvolvem o trabalho colaborativo em interação com seus pares” (p. 184)

O autor nos faz refletir sobre as relações reais que existem nas escolas, enfatizando o “isolamento” profissional, de modo a pensar possibilidades de se fazer a escola espaços que ofereçam oportunidades para a interação colegial, permitindo que o trabalho seja eficaz, ajudando professores e alunos a desenvolverem-se e a atingirem as expectativas de um trabalho satisfatório.