• Nenhum resultado encontrado

Há limites quantitativos aplicáveis às multas tributárias?

No documento MESTRADO EM DIREITO SÃO PAULO (páginas 161-164)

A Constituição Federal estabelece limites à pata feroz do leão quando garante o direito à propriedade e veda o não-confisco.

O interesse público deve visar tão-somente o recolhimento dos tributos que lhes são devidos e não utilizar a imposição de penalidade como fonte de receita. Deve procurar o meio mais adequado para solucionar os conflitos e para se atingir a finalidade que a norma pretende alcançar, caso contrário, estaríamos diante de práticas abusivas, desproporcionais e injustas.

Até mesmo no direito penal, onde se protegem os bens mais preciosos para a coletividade, não se admite que a punição acarrete mais ônus, mais limitação social do que beneficio à coletividade.168 Não se pode conceber que uma penalidade de natureza tributária tenha maior rigor que uma penalidade de natureza penal.

Sacha Calmon Navarro Coêlho aponta a realidade das multas elevadíssimas que superam e muito o valor do imposto devido.

Sabe-se que a fixação das penalidades é atribuição do legislador infraconstitucional. Sabe-se ainda que inexiste de forma explícita na Constituição Federal princípios que estabeleçam limites objetivos a essas penalidades tributárias. Ocorre que o legislador deve se deter à unicidade do sistema jurídico e perceber que não se pode violar o direito à propriedade confiscando o patrimônio do contribuinte.

Difícil é estabelecer a percentagem adequada. Mas sabemos que ela depende do bom senso do legislador, que deve estar assentado num estudo do quadro sociológico, econômico e político do País. Sem dúvidas de que o legislador precisa observar qual seria o percentual que puniria e inibiria o contribuinte infrator sem que com isso o tenha de levar à ruína patrimonial.

168

CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal – Parte geral. VI. 1. 8ª ed. rev. atual. de acordo com as Leis n. 10.741/2004, 10.763/2003, 10.826/2003, 10.886/2004. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 22-23.

O legislador precisa atentar para o fato de que a multa deve superar a rentabilidade do contribuinte frente à inadimplência. Ou seja, é preciso considerar que a multa tem de ser realmente punitiva a ponto de não ser mais rentável ao contribuinte descumprir com seu dever de pagar o tributo devido e investir aquele capital em outras atividades.

Imaginemos que os empresários, ao fazerem seus planejamentos tributários e contábeis, constatem que é mais vantajoso não pagar tributos por 5 anos e investir aquele capital em outra atividade econômica. A constatação de que o lucro advindo com a inadimplência compensaria ao contribuinte, levaria o Fisco à ruína e a sociedade estaria consequentemente prejudicada com o déficit arrecadatório.

É certo que a inadimplência precisa ser aniquilada. É preciso estabelecer uma multa tributária justa e eficaz que coíba a inadimplência. Acreditamos que as multas punitivas exorbitantes não são eficazes, não diminuiria essa tendência ao inadimplemento, ao contrário, cremos que a solução está nas políticas de incentivos fiscais.

Não podemos negar que um contribuinte que cometeu determinada infração com dolo, simulando, fraudando situações para inadimplir com suas obrigações, deve assumir uma penalidade mais severa, tanto que sua infração passa a ser regulada também pela lei penal, pois se torna crime ou contravenção penal. Do mesmo modo que aquele que age pautado na boa-fé, sem o intuito malicioso de ludibriar o Fisco, deve arcar com uma penalidade menos severa ou até mesmo ser dispensado do pagamento da penalidade. Isso estampa a importância da análise da culpabilidade na graduação da pena.

Na quantificação da multa é preciso ter prudência para não majorar de forma exorbitante causando danos morais e materiais ao contribuinte. Oportunos os ensinamentos do professor Fábio Medina Osório:169

“A apuração da gravidade não pode tornar-se um desafio para cada caso concreto, sem mínimos parâmetros prévios de normatividade.

169

MEDINA OSÓRIO, Fábio. Devido processo administrativo sancionador no sistema financeiro nacional. In: MEDINA OSÓRIO, Fábio (Coord.). Direito sancionador:

sistema financeiro nacional. Belo Horizonte: Fórum, 2007. p. 13-39. ISBN 978-85-7700-

Assim, distorção séria haveria se admitíssemos que a autoridade pública pudesse, a seu bel-prazer, definir o conteúdo típico de uma infração grave tão-somente na peça acusatória, sem lastro em normas jurídicas prévias, sem fundamentação no ordenamento jurídico passivo, nos dispositivos constitucionais ou legais, na estruturação e descrição dos deveres jurídicos violados.”

Vejamos um julgado bastante contundente a respeito da exacerbação do

quantum.

ADI 1075 MC-DF

MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

Ementa

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – LEI 8.846/94 EDITADA PELA UNIÃO FEDERAL – ALEGAÇÃO DE OFENSA AOS POSTULADOS CONSTITUCIONAIS DA FEDERAÇÃO E DA SEPARAÇÃO DE PODERES – INOCORRÊNCIA – EXERCÍCIO, PELA UNIÃO FEDERAL, DE SUA COMPETÊNCIA IMPOSITIVA, COM ESTRITA OBSERVÂNCIA DOS LIMITES QUE DEFINEM ESSA ATRIBUIÇÃO NORMATIVA – DIPLOMA LEGISLATIVO QUE NÃO USURPA A ESFERA DE COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA DOS ESTADOS-MEMBROS E DOS MUNICÍPIOS – LEGITIMIDADE DO PODER REGULAMENTAR DEFERIDO AOS MINISTROS DE ESTADO- ATRIBUIÇÃO REGULAMENTAR DE SEGUNDO GRAU QUE POSSUI EXTRAÇÃO CONSTITUCIONAL (CF, ART. 87, PARÁGRAFO ÚNICO, II) – INOCORRÊNCIA DE OUTORGA, PELA LEI 8.846/94, DE DELEGAÇÃO LEGISLATIVA AO MINISTRO DA FAZENDA – PODER REGULAMENTAR SECUNDÁRIO DESVESTIDO DE CONTEÚDO NORMATIVO PRIMÁRIO – TRANSGRESSÃO, NO ENTANTO, PELA LEI 8.846/94 (ART. 3º E SEU PARÁGRAFO ÚNICO), AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA NÃO-CONFISCATORIEDADE TRIBUTÁRIA – SUSPENSÃO CAUTELAR DA EFICÁCIA DE TAL PRECEITO LEGAL – MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA, EM PARTE. A TRIBUTAÇÃO CONFISCATÓRIA É VEDADA PELA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. – É cabível, em sede de controle normativo abstrato, a possibilidade de o Supremo Tribunal Federal examinar se determinado tributo ofende, ou não, o princípio constitucional da não-confiscatoriedade consagrado no art. 150, IV, da Constituição da República. Hipótese que versa o exame de diploma legislativo (Lei 8.846/94, art. 3º e seu parágrafo único) que instituiu multa fiscal de 300% (trezentos por cento). – A proibição constitucional do confisco em matéria tributária – ainda que se trate de multa fiscal resultante do inadimplemento, pelo contribuinte, de suas obrigações tributárias – nada mais representa senão a interdição, pela Carta Política, de qualquer pretensão governamental que possa conduzir, no campo da fiscalidade, à injusta apropriação estatal, no

todo ou em parte, do patrimônio ou dos rendimentos dos contribuintes, comprometendo-lhes, pela insuportabilidade da carga tributária, o exercício do direito a uma existência digna, ou a prática de atividade profissional lícita ou, ainda, a regular satisfação de suas necessidades vitais básicas. – O Poder Público, especialmente em sede de tributação (mesmo tratando-se da definição do "quantum" pertinente ao valor das multas fiscais), não pode agir imoderadamente, pois a atividade governamental acha-se essencialmente condicionada pelo princípio da razoabilidade que se qualifica como verdadeiro parâmetro de aferição da constitucionalidade material dos atos estatais. (...). Grifos nossos.

8. Poder-dever estatal de punir versus as garantias constitucionais dos cidadãos

No documento MESTRADO EM DIREITO SÃO PAULO (páginas 161-164)