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Hemorragia Puerperal

No documento anabeatrizquerinosouza (páginas 51-56)

1.2 Assistência à Mulher no Ciclo Gravídico Puerperal

1.2.8 Hemorragia Puerperal

A hemorragia puerperal é uma das principais causas de mortalidade materna no mundo, sendo responsável por um terço destas mortes, e incide em 4% dos partos. Apesar de a razão de morte materna nos EUA ser baixa, a hemorragia puerperal é a maior causa de morte de mulheres no ciclo gravídico puerperal naquele país (BAXLEY et al, 2011; REZENDE, 2006; RICCI, 2008).

No Brasil, em 2006, ocorreram 1.623 casos de morte materna, tendo a hipertensão, hemorragia, infecção puerperal e aborto como as principais causas (GALLI, 2007). A maioria dos autores conceitua a hemorragia no puerpério como a perda de sangue superior a 500 mL após um parto vaginal ou superior a 1.000mL após uma cesariana. No entanto esta definição pode ser considerada arbitrária por outros estudiosos porque as estimativas da perda de sangue podem ser subjetivas e, geralmente, são subestimadas por causa do seu acúmulo no útero, em absorventes higiênicos, no colchão e assoalho (REZENDE, 2006; RICCI, 2008).

Uma definição mais objetiva pode ser a perda sanguínea suficiente para causar instabilidade e colocar a puérpera em risco hemodinâmico (BAXLEY et al, 2011; REZENDE, 2006; RICCI, 2008). O diagnóstico ou a confirmação de uma possível hemorragia puerperal podem ser fornecidos através da diminuição em dez pontos no hematócrito e ou a necessidade de transfusão. É importante a habilidade para diagnosticar e conduzir adequadamente o sangramento não fisiológico no puerpério para evitar complicações que podem facilmente levar à morte (BAXLEY et al, 2011).

Os fatores de risco para a hemorragia puerperal são pré-eclâmpsia, nuliparidade, gestação múltipla, hemorragia no puerpério anterior, cesárea anterior, terceiro estágio prolongado, episiotomia mediolateral, parada da descida, lacerações, perineotomia, parto assistido por fórceps ou vácuo extrator e trabalho de parto com uso de ocitocina (BAXLEY et al, 2011). Outros fatores de risco podem também ser considerados como: infecção uterina, extração manual da placenta, exaustão, desnutrição, anemia materna, parto precipitado, hipotensão materna, placenta prévia pregressa, coagulopatias, grande multiparidade e polidrâmnio (RICCI, 2008).

A principal causa da hemorragia puerperal é a atonia uterina, sendo responsável por 70% dos casos. Os outros 30% estão assim distribuídos: 20% por traumas (decorridos das lacerações cervicais, vaginais e perineais; hematomas pélvicos, inversão uterina e ruptura do útero), 10% por tecidos retidos (retenção placentária e de membranas) e 1% por coagulopatias (BAXLEY et al, 2011).

A atonia uterina é a incapacidade do útero de contrair e retrair (hipocontratilidade da fibra miometrial) após o parto. Qualquer fator que leve o útero a relaxar após o parto causará sangramento. Frequentemente, conduz a quadros de sangramento agudo, não raros choque hipovolêmico e morte materna (BAXLEY et al, 2011; REZENDE, 2006).

O tratamento consiste na seguinte sequência: esvaziamento imediato da bexiga, massagem uterina, infusão de ocitocina e metilergonovina se necessário. Se, apesar das condutas citadas e depois de afastadas outras possíveis causas de sangramento, não houver sucesso, procedimentos cirúrgicos estão indicados, como ligadura da artéria ilíaca interna, que é eficaz em 40% dos casos, ligadura da artéria uterina, ligadura da artéria útero-ovárica e a histerectomia, que é a última opção em caso de hemorragia no puerpério de causa uterina (BAXLEY et al, 2011; REZENDE, 2006; RICCI, 2008). As hemorragias severas requerem medidas ressuscitativas gerais imediatas, correção choque hipovolêmico, administração de oxigênio, exames laboratoriais e transfusão sanguínea (BAXLEY et al, 2011).

As hemorragias que ocorrem no puerpério podem ser classificadas como precoces, quando incidem nas primeiras 24 horas, e tardias, quando ocorrem a partir desse período até seis semanas após o parto. A maioria das mortes por hemorragia puerperal ocorre nas primeiras quatro horas e decorrem de problemas durante o terceiro estágio do trabalho de parto (REZENDE, 2006).

A maioria dos casos de hemorragias puerperais precoces é causada por atonia uterina, 80% a 90% e os demais casos, por lacerações de trajeto durante o parto. A hemorragia tardia, no entanto, tem como causas mais importantes restos ovulares, infecção puerperal, sobredistenção uterina, subinvolução uterina e hematoma puerperal (vulvoperineais, vaginais, pós-episiotomia) e subperitoneais (Idem).

Apesar de a maior incidência da hemorragia puerperal ser nas primeiras horas após o parto, é relevante considerar que as hemorragias tardias tornam-se graves, pois, em muitos destes casos, a mulher não terá intervenções imediatas por estar no domicílio. O contato imediato com a puérpera e a avaliação da enfermeira que atua na atenção primária à saúde após alta hospitalar, seja no domicílio e ou na Unidade de saúde, representam uma ação capaz de identificar precocemente e conduzir adequadamente as puérperas com hemorragias puerperais tardias (RICCI, 2008).

Vale destacar que a enfermeira deve estar atenta aos fatores de risco para a hemorragia puerperal e procurar atuar nestes na medida do possível. Apesar da gravidade, a morbidade da hemorragia no puerpério pode ser reduzida seguindo algumas recomendações baseadas em evidências (BAXLEY et al, 2011).

A conduta ativa, em vez da conduta expectante no terceiro estágio, do parto é uma prática que deve ser estimulada e há evidências que comprovam sua utilização. Os componentes da “conduta ativa” incluem: uso profilático de drogas ocitócicas e tração controlada do cordão para desprendimento da placenta. Outras práticas são recomendadas no ciclo gravídico puerperal, visando prevenir a hemorragia, apesar de necessitarem de mais evidências para sua utilização: verificação da hemoglobina pré-parto e correção da anemia antes do parto; realização da episiotomia somente se ocorrer traçado da frequência cardíaco fetal não tranquilizador, ou se o períneo é resistente e atrasa excessivamente o parto; reavaliação dos sinais vitais da paciente com sangramento vaginal depois de preencher os formulários do parto, para detectar sangramento lento e contínuo que pode passar despercebido ao final do terceiro estágio de parto (Idem).

2 JUSTIFICATIVA

A atenção puerperal ainda não está consolidada nos serviços de saúde do Brasil. Na maioria das vezes, não é feito busca ativa destas puérperas pelos profissionais de saúde e muitas mulheres não retornam para a assistência puerperal. É comum que mãe e filho regressem exclusivamente com a finalidade de acompanhar o crescimento, desenvolvimento e imunização do bebê. Quando retornam para a consulta puerperal, a abordagem feita pelos profissionais privilegia, na maioria das vezes, os aspectos biológicos. Também não há continuidade deste atendimento até o final do puerpério, como acontece com a assistência à criança na puericultura e com a gestante no pré- natal (BRASIL, 2009a; BARBASTEFANO, VARGENS, 2009; VIEIRA et al, 2010).

Observamos, no cotidiano dos serviços de saúde, que a ênfase da assistência é no período da gestação, ficando o puerpério em segundo plano. Durante o pré-natal, a gestante tem oportunidade de realizar várias consultas, enquanto, no puerpério, são oferecidos apenas um ou dois atendimentos (VIEIRA et al, 2010).

Acreditamos que uma visita domiciliar e uma consulta puerperal, como tem sido realizado atualmente, não são suficientes para suprir as demandas, acompanhar, avaliar as intercorrências das puérperas e minimizar os principais problemas como: desmame precoce, gravidez não planejada no período puerperal, depressão, anemia, infecção e hemorragia puerperal, baixa cobertura de vacinas e não realização de exames de Papanicolau.

Concordamos com Stefanello (2005) ao afirmar que, apesar do puerpério ser um período de maior vulnerabilidade e intercorrências, tais como infecções, hemorragias, alterações mamárias da lactação e depressão puerperal, quando comparado a outras etapas do ciclo gravídico-puerperal, é a fase em que a mulher fica totalmente desassistida pela equipe de saúde.

A assistência de enfermagem coerente com as reais necessidades das puérperas poderá resultar em uma atuação mais assertiva e, consequentemente, apontar a participação da enfermeira para contribuir na prevenção da mortalidade materna como vem sendo preconizado nas políticas nacionais de saúde da mulher (BRASIL, 2004b; BARBASTEFANO e VARGENS, 2009; VIEIRA et al, 2010).

A escassez de estudos, que enfatizem a assistência no puerpério na atenção primária à saúde, também justifica a realização desta pesquisa. Ao explorar a literatura em busca de estudos sobre aplicação de diretrizes ou, estudos randomizados sobre a assistência puerperal

publicados nos últimos dez anos, nas bases de dados LILACS e MEDLINE, foi encontrado somente um estudo experimental em São Paulo sobre a relação da visita domiciliar de enfermagem na redução de ansiedade em puérperas (SOUZA, T., 2001). Também foram encontrados somente quatro estudos internacionais de acompanhamento de puérperas através de programas de visitas ou, atendimentos por enfermeira/ parteiras: no Reino Unido (MACARTHUR et al, 2002), na Síria (BASHOUR et al, 2008) e os mais recentes na Austrália (FISHER, WYNTER e ROWE, 2010) e Estados Unidos (TSAI, et al, 2011).

Ao realizar a busca e a análise de documentos ministeriais referentes à assistência no ciclo gravídico puerperal, nos deparamos com a inexistência de instrumentos ou ficha clínica específica, para o desenvolvimento da assistência à puérpera na APS de acordo com as fases do puerpério e com a ausência de ações propostas para o puerpério remoto.

Observamos que, na ficha perinatal e no cartão da gestante, instrumentos para registro e sistematização das ações da consulta pré-natal, há campos que devem ser preenchidos com informações do puerpério, porém privilegiam o puerpério imediato, mais especificamente nas primeiras horas de assistência hospitalar. Encontramos apenas algumas recomendações de ações de saúde a serem realizadas até o 42º dia de puerpério.

Fica evidenciada a necessidade de realizar no país estudos quantitativos que comprovem a eficácia da assistência puerperal contínua e que contribuam para a sistematização, consolidação e valorização da assistência no puerpério pelos profissionais de saúde. Almejamos que além da assistência, o estudo contribua para preencher a lacuna de pesquisas com foco no nível primário de atenção, colaborando com núcleos de pesquisas, graduação e pós-graduação em enfermagem e em outras áreas da saúde. Esperamos ainda que minimizarão o fenômeno da invisibilidade que tem atingido as mulheres no puerpério, consolidação da assistência puerperal na atenção primária e consequentemente redução da morbidade e mortalidade das mulheres durante o período puerperal.

No documento anabeatrizquerinosouza (páginas 51-56)