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Na química do cimento a hidratação é definida como a reação de um cimento não hidratado ou qualquer um de seus constituintes com a água. Ao combinar os componentes a mistura adquire a consistência de uma pasta, sendo conhecido como estado fresco.

À medida que o tempo passa, há uma perda repentina da plasticidade da pasta original e a mistura começa a obter uma consistência mais próxima do estado sólido. Essa fase é conhecida como estado de pega da argamassa, onde a mistura passa a ser não trabalhável e é possível realizar uma leve medição de resistência. Após a pega, a mistura inicia um estágio de desenvolvimento da dureza e da resistência mecânica conhecida como endurecimento. Nesse estágio a argamassa atingiu o estado endurecido, porém as mudanças nas propriedades mecânicas podem durar por vários anos (ODLER, 2003).

Essas etapas surgem com o tempo de cura da mistura (tempo após o início da hidratação) devido às complexas reações provocadas pelos variados constituintes do cimento em contato com a água. Para Brunauer (1964 apud Mehta e Monteiro, 2006, pg. 216), “Em qualquer reação química, as principais características de interesse são as alterações na matéria, as variações de energia e a velocidade da reação”.

Cada constituinte do cimento possui sua peculiaridade durante a hidratação, formando compostos variados, com diferentes quantidades de energia sendo liberadas (reações exotérmicas) e com distintas velocidades de reações, portanto é importante o entendimento das principais reações.

2.3.1 Hidratação dos silicatos de cálcio Alita (C3S);

A alita, também conhecida como silicato tricálcico, é o constituinte mais importante do cimento Portland durante a hidratação, tendo pouca influência no tempo de pega, mas muita responsabilidade no desenvolvimento da fase do endurecimento, principalmente nos primeiros 28 dias. É também encontrado em maior quantidade no clínquer, representando de 50% a 70% da composição (TAYLOR, 1997; BULLARD, 2008).

Ao entrar em contato com a água, a alita reage relativamente rápida e libera média quantidade de calor, comparado a outros constituintes. Com isso, há a formação de compostos cristalinos, como o hidróxido de cálcio (portlandita), e também géis complexos de estrutura amorfa, como os silicatos de cálcio hidratado (C-S-H), principal responsável pelo endurecimento da pasta (BULLARD et al., 2011).

Da hidratação da alita, cerca de 61% dos produtos hidratados são constituídos de silicatos de cálcio hidratados, enquanto que 39% são hidróxidos de cálcio (CASCUDO; CARASEK; HASPARYK, 2007).

Belita (C2S);

A belita, ou silicato dicálssico, constitui cerca de 15% a 30% do clínquer e reage lentamente quando em contato com a água. Sua principal contribuição para a fase de endurecimento é após 28 dias de realização da mistura, sendo grande responsável pela resistência ganha em um ano ou mais. Além disso, a baixa velocidade de reação e a baixa liberação de calor fazem com que a belita não tenha influência significativa na fase de pega da argamassa (TAYLOR, 1997).

Assim como a alita, os produtos da hidratação da belita são formados por compostos cristalinos (portlandita) e géis complexos de fase amorfa (C-S-H), porém aproximadamente 82% do total desses produtos são silicatos de cálcio hidratados e os outros 18% são hidróxidos de cálcio (CH) ou portlandita (CASCUDO; CARASEK; HASPARYK, 2007).

Produtos da hidratação da Alita e da Belita;

Os produtos da hidratação da alita e da belita são semelhantes estruturalmente, porém existem variações na relação cálcio/sílica e no teor de água quimicamente combinado. De fato, ambos individualmente formam uma variedade de silicatos de cálcio hidratados com diferentes estequiometrias e, por essa razão, é comum se referir a eles como C-S-H, sem representar uma composição química fixa. No entanto, essa variação surte pouco efeito nas características físicas, já que essas são determinadas pela estrutura e não pelas diferentes composições estequiométricas (MEHTA e MONTEIRO, 2006).

O silicato de cálcio hidratado é o grande responsável pelo ganho de resistência da pasta de cimento, representando entre 50% e 60% dos sólidos formados nas reações. Sua estrutura é levemente cristalina, mas geralmente considerada amorfa. Já a portlandita é responsável pela manutenção do pH da pasta, onde um maior teor de CH produz um pH mais elevado, aumentando a possibilidade de ataques químicos de agentes ácidos ou sulfatados, reduzindo então sua durabilidade. O CH é uma fase puramente cristalina e seus grãos geralmente são encontrados na forma de cristais hexagonal (CASCUDO; CARASEK; HASPARYK, 2007).

Os autores Mehta e Monteiro (2006) fizeram uma comparação entre a hidratação do C3S e do C2S, considerando a mesma composição estequiométrica para o silicato de cálcio hidratado (C3S2H3), sendo as equações 5 e 6 apresentadas abaixo respectivamente:

2 3CaO. SiO + 6H O → 3CaO. 2SiO . 3H O + 3[Ca OH ]

2C S 6H C S H 3CH (5) 2 2CaO. SiO + 4H O → 3CaO. 2SiO . 3H O + [Ca OH ]

2C S 4H C S H CH (6) 2.3.2 Hidratação dos aluminatos e ferroaluminatos

Celita (C3A);

A celita consiste em um aluminato tricálcio (C3A) de fase intersticial. Ela abrange cerca de 5% a 10% do clínquer e reage instantaneamente quando entra em contato com a água, formando aluminatos de cálcio hidratados com composição C4AH19, C2AH8 e também C3AH6 (hidrogarneto), liberando uma grande quantidade de calor (MEHTA e MONTEIRO, 2006).

O autor Taylor (1997) afirma que pela alta velocidade de reação, as fases cristalinas formadas a partir da hidratação desse composto surgem rapidamente, reduzindo o tempo de pega e, consequentemente, a trabalhabilidade no estado fresco da mistura, inviabilizando seu uso para a maioria das aplicações da construção civil.

Para controlar a velocidade dessa reação, o sulfato de cálcio (gipsita) é adicionado ao processo de moagem juntamente com o clínquer do cimento. Nesse caso, ao ser hidratado a celita reage juntamente com o sulfato de cálcio (CS(H2) e com a água para formar outros compostos cristalinos, como a etringita (C6AS(3H32) e o monossulfato (C4AS(H12), porém em um tempo mais prolongado (ODLE, 2003; MEHTA e MONTEIRO, 2006).

Contudo, a gipsita pode ter uma reação inversa caso reaja em demasia com a alita. Estudos feitos por Mehta, Pirtz e Polivka (1979) mostram que a velocidade das reações do C3S com a água e gipsita aumentaram consideravelmente, reduzindo o tempo de pega.

Ferrita (C4AF);

O clínquer possui de 5% a 15% de ferrita ou ferroaluminato tetracálcico. Ao ser hidratado, esse composto não possui uma velocidade específica de reação, pois essa depende de sua composição, que varia conforme a taxa de Al/Fe. De um modo geral, as reações que ocorrem com a hidratação do C4AF são rápidas no início da hidratação, mas bastante lentas em períodos mais longos (TAYLOR, 1997).

Diversos autores procuram sempre analisar a química das reações de hidratação da ferrita juntamente com a celita, pois seus produtos são bastante semelhantes. Somente na presença de água, o C4AF formará produtos cristalinos como C4AH19, C2AH8 e hidrogarneto, além do hidróxido de cálcio e hidróxido de ferro. Já na presença do sulfato de cálcio a

hidratação do C4AF produzirá além dos compostos anteriormente citados, etringita e monossulfato em quantidades maiores (CHRISTENSEN; JENSEN; HANSON, 2004).

Produtos da hidratação da Celita e da Ferrita;

Durante a hidratação, o aluminato ou ferroaluminato reage com o sulfato na presença da água para formar inicialmente a etringita. Com isso, o sulfato consumido atinge certo ponto onde a razão aluminato/sulfato provoca a dissolução da etringita e a formação do monossulfato. A dissolução inicia entre aproximadamente 8h e 16h após a hidratação, porém a transformação em monossulfato pode durar de 8 a 11 dias (CHRISTENSEN; JENSEN; HANSON, 2004).

As equações 7 e 8 apresentam a formação da etringita e do monossulfato respectivamente.

3CaO. Al O + 3[CaO. SO . 2H O] + 26H O → 6CaO. Al O . 3SO . 32H O

C A 3CS(H 26H C*AS( H (7)

6CaO. Al O . 3SO . 32H O + 2[3CaO. Al O ] + 4H O → 3[4 . +, . - . 12 ]

C*AS( H 2C A 4H 3C/AS(H0 (8) A etringita possui a morfologia de cristais do tipo agulha e contribui com o endurecimento e com a resistência mecânica nos primeiros dias. Já o monossulfato encontra- se na forma de placas, auxiliando nas propriedades mecânicas apenas alguns dias após a mistura. Porém, de um modo geral, a velocidade das reações durante a hidratação dos aluminatos e ferroaluminatos, mesmo na presença de sulfato de cálcio, são mais rápidas e liberam maiores quantidades de calor que as reações dos silicatos de cálcio (TAYLOR, 1997).

2.3.3 Hidratação de outros compostos

Outros óxidos como de sódio e potássio, também conhecidos por álcalis, se dissolvem rapidamente na pasta líquida durante a hidratação, contribuindo para a formação de íons como K+ e Na+. Algumas substituições podem ocorrer durante as reações de hidratação do ferroaluminato, principalmente na presença de carbonatos. Essas por sua vez, liberam o íon sulfato, que em quantidade maiores reagem novamente com o monossulfato voltando a formar a etringita (ODLER, 2003).

Além disso, outros compostos tendem a expandir quando hidratados, assim como o óxido de cálcio (CaO) e o óxido de magnésio (MgO). No entanto, geralmente essa expansão ocorre no instante em que a pasta se encontra no estado já endurecido. Isso faz com que tensões internas apareçam no interior da pasta, podendo provocar o aparecimento de trincas e sua propagação pelo material (BAUER, 2008).

2.3.4 Zona de transição (ZT) agregado - pasta de cimento

A zona de transição representa uma região onde há a ligação entre o material inerte e os outros compostos da mistura. Essa região geralmente é muito porosa e consequentemente menos resistente que o restante do material mais distante do agregado. Ela é o ponto fraco das misturas de argamassas e concretos e, por esse motivo, deve ser entendida.

O autor Odler (2003) cita que durante o estado fresco, no início da hidratação, uma fina camada de água se adere ao agregado, porém com uma baixa densidade de partículas de cimento para a hidratação.

Já os autores Neville e Brooks (2010) comentam que o agregado está recoberto por uma fina camada de Ca(OH)2, seguida por uma fina camada de C-S-H e novamente ambas as camadas, porém mais espessas que as anteriores.

Com isso, essa zona permanece com uma alta concentração de hidróxido de cálcio e etringita devido à migração de alguns íons (cálcio, sulfato, hidroxila e aluminato) para a vizinhança do agregado. Com o tempo de hidratação o gel de C-S-H ocupa parte dos espaços vazios, mas há também a formação de mais cristais de Ca(OH)2, mantendo a elevada porosidade dessa zona.

A Figura 6 apresenta um esquema da ZT agregado - pasta cimentícia. Figura 6 -Representação da zona de transição entre agregado e pasta de cimento

Fonte: MEHTA e MONTEIRO (2006)

Os autores Liao et al. (2004) afirmam que em poucos dias após a hidratação há a formação de monossulfato a partir da etringita e também o desenvolvimento do C-S-H na zona de transição. Além disso, adicionam também que a presença de material pozolânico é importante para essa região, pois após 28 dias de cura, ele reage com o CH presente nesse local, formando mais C-S-H e reduzindo a porosidade.

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