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1. INTRODUÇÃO

1.8. Hipovitaminose A e morbi-mortalidade

Embora a atenção maior tenha sido dada às manifestações oculares, muitos estudos vêm observando, desde os anos 80, uma relação entre a deficiência de vitamina A e a morbi-mortalidade em crianças jovens nos países em desenvolvimento (SOMMER et al.,1983; COHEN et al.,1986; De SOLE et al.,1987; ROSS et al.,1993). Atualmente, cerca de 230 milhões de crianças estão em risco clínico/subclínico de hipovitaminose A e mais de 1 milhão de mortes infantis, atribuídos a essa deficiência, ocorrem anualmente (SOMMER,1995).

A deficiência de vitamina A, mesmo na sua forma moderada aumenta a severidade de doenças infecciosas, exacerba a anemia ferropriva, e retarda o crescimento pondo- estatural (SOMMER, 1998).

Julien e colaboradores (1999) encontraram uma redução estatisticamente significante na duração do internamento das crianças, com infecção respiratória aguda,

suplementadas com vitamina A. Fato semelhante foi verificado por Humprey e colaboradores (1996) que observaram redução na prevalência da severidade de infecção respiratória em crianças jovens que receberam suplementação desta vitamina. Para Sommer (1995), existe uma associação entre a hipovitaminose A e o aumento na severidade das infecções, particularmente do sarampo e da diarréia; esse sinergismo, entre o sarampo e a deficiência de vitamina A, contribui na estimativa de 1,1 milhões de mortes infantis devido ao sarampo todo ano; metade de toda cegueira corneal em crianças nos países em desenvolvimento é causada pela hipovitaminose A, e metade destas está associada às infecções por sarampo.

Estudos realizados em Gana (ROSS et al., 1993) e no Brasil (BARRETO et al., 1994) têm indicado que a suplementação de vitamina A está associada com a diminuição na severidade das infecções. Em três estudos com crianças hospitalizadas com sarampo, que receberam suplementação com vitamina A, houve redução na taxa de mortalidade em até 60% (WHO,1988).

Fawzi e colaboradores (1994) relataram que o consumo de vitamina A está forte e inversamente associado com o risco de mortalidade e que o componente dietético mostrou-se especialmente protetor nas crianças com desnutrição aguda e/ou crônica, ou que apresentavam diarréia ou tosse. Entretanto, Guilermo-Herrera e colaboradores (1992) observaram que a suplementação de vitamina A em crianças sudanesas não diminuiu o risco de mortalidade. Situação inversa foi encontrada por Humprey e colaboradores (1996), avaliando o impacto da suplementação de vitamina A neonatal. Em virtude das controvérsias, quatro meta-análises foram desenvolvidas nos últimos anos e apontaram para um efeito protetor da vitamina A, com relação a mortalidade infantil. Para Beaton e colaboradores (1994), a suplementação com vitamina A reduziu a mortalidade infantil em 23%; a redução foi de 30% para Fawzi e colaboradores (1993) e Glasziou e Mackerias (1993), e 34% para Tonascia (1993).

Algumas pesquisas em adultos têm demonstrado uma associação consistente entre a Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (SIDA) e deficiência de vitamina A. Estudo de coorte realizado em Baltimore, Estados Unidos, com usuários de drogas mostraram que a mortalidade foi maior no grupo de soropositivos que tinha concentração de retinol sérico < 1,05µmol/L, depois de ajustado por uma série de potenciais variáreis de confusão (SEMBA et al., 1993). Situação semelhante foi verificado num estudo realizado em Ribeirão Preto, onde 25% dos pacientes com SIDA e 17,3% dos infectados pelo HIV apresentaram valores de retinol abaixo de 1,05µmol/L (SILVEIRA et al., 1999). Semba e colaboradores (1998) determinaram o impacto da suplementação com dose única de 60mg equivalentes de retinol em usuários de drogas infectados pelo HIV e não encontraram influência na diminuição da carga viral mas, uma possível estabilização do declínio dos linfócitos CD4 circulantes.

Mães soropositivas de Malawi, que transmitiram a infecção para seus filhos, tinham baixo nível de vitamina A sérico (0,86µmol/L), quando comparadas às mães infectadas que não transmitiam o vírus (1,07µmol/L). O mais importante é que as taxas de transmissão mãe para filho (32% a 7%) foram inversamente associadas com ganho de 0,35µmol/L de retinol no nível de sangue do grupo, aumentando de 0,70 a 1,40µmol/L (SEMBA et al., 1994). Além disso, Nduati e colaboradores (1995), também estudando mães infectadas pelo HIV, verificaram que a deficiência deste micronutriente, tinha associação com maior carga viral no leite materno. Isto sugere que a suplementação de vitamina A na lactação pode reduzir a carga viral do leite materno assim como a transmissão do HIV da mãe para o filho (SEMBA et al., 1998).

A deficiência de vitamina A materna pode predispor as mulheres e seus filhos a diversos problemas de saúde. Mulheres gestantes do sul da Ásia rural estão em alto risco de hipovitaminose A, refletida pelo baixo nível de retinol sérico e freqüente cegueira noturna. Nessas culturas, a perda fetal pode exceder 8% e a mortalidade infantil e materna cerca de 10% e 1%, respectivamente (WEST et al.,1997).

Estudo duplo cego realizado no Sudeste rural do Nepal, envolvendo 44.646 mulheres que foram suplementadas semanalmente com vitamina A pré-formada e/ou β-caroteno, durante três anos, mostrou uma redução significativa na mortalidade das gestantes, sendo de 40% nas mulheres que receberam retinol, 49% nas que receberam β-caroteno e 44% nas que receberam suplementação combinada (WEST et al., 1999).

Recentemente, Saunders e colaboradores (2001) realizaram uma revisão de literatura sobre o estado nutricional de vitamina A no grupo materno-infantil e verificaram que a carência deste nutriente traz profundas repercussões no processo reprodutivo, podendo acarretar conseqüências passíveis de ocorrer sem sinais clínicos detectáveis na mãe, mas com conseqüências múltiplas sobre o binômio mãe-filho.

Portanto, é de primordial importância informações atualizadas sobre o perfil desta carência, visto que tal informação poderá se constituir numa base de referência a ser utilizada na avaliação de futuros programas de intervenção. Além disso, a validação de indicadores menos onerosos e não invasivos, a exemplo do inquérito de consumo alimentar, facilitaria o mapeamento das áreas de risco e de grupos populacionais vulneráveis, contribuindo não só para o diagnóstico do problema, como também no planejamento de ações para a prevenção e o controle desta carência nutricional específica.

2. OBJETIVOS

2.1. Objetivo geral

Traçar o perfil da hipovitaminose A em pré-escolares de creches públicas da cidade do Recife, Estado de Pernambuco.

2.2. Objetivos específicos

Estimar a prevalência de hipovitaminose A, através das concentrações do retinol sérico, e do inquérito de consumo de alimentos.

Descrever a carência de vitamina A considerando as variáveis demográficas sexo e idade.

Correlacionar os níveis séricos de retinol com o consumo alimentar de vitamina A.

Validar o inquérito de consumo alimentar de vitamina A adotando-se, como padrão ouro, os níveis séricos de retinol.

Avaliar o estado nutricional pondo-estatural utilizando indicadores antropométricos: peso /idade, altura /idade, peso /altura.

Estabelecer eventuais associações da carência de vitamina A com a desnutrição energético-protéica.

3. METODOLOGIA

3.1. Desenvolvimento da pesquisa

A investigação foi desenvolvida utilizando o banco de dados da pesquisa Carências de

Vitaminas e Minerais em Pré-escolares dos Municípios de João Pessoa e Recife 1997 – 1999, realizado através de convênio entre o Centro de Investigação em Micronutrientes

da Universidade Federal da Paraíba (CIMICRON/UFPB), Ministério da Saúde (MS), Instituto Materno Infantil de Pernambuco (IMIP), Prince Leopold Institute of Tropical Medicine – Antuérpia, Bélgica (IMT – BELGICA) e o Departamento de Nutrição da Universidade Federal de Pernambuco (DN/UFPE).

3.2. Desenho do estudo

Foi desenvolvido um estudo de corte transversal, em crianças menores de 5 anos, para a avaliação da carência nutricional em vitamina A, utilizando indicadores bioquímico (retinol sérico) e dietético (inquérito do consumo alimentar).

Este tipo de estudo exige um menor complexo operacional quando comparados aos de caso-controle e de coorte, apresenta baixo custo e possibilita maior rapidez na obtenção dos resultados, sendo, portanto, o mais amplamente difundido em epidemiologia. No entanto, seus resultados não são indicativos de seqüência temporal, não fornecendo dados de incidências e as únicas conclusões derivadas da análise desse tipo de estudo, restringem-se às relações de associações e não de causalidade (ROUQUAYROL & ALMEIDA FILHO, 1999).

3.3. População do estudo

Constituíram a população de estudo, crianças na idade pré-escolar (6 – 59 meses), de ambos sexos, matriculadas em creches da Prefeitura Municipal da Cidade do Recife, Pernambuco, no ano 1999.

Foram considerados os seguintes critérios de exclusão:

• Crianças que referiram a ingestão de suplementos vitamínicos e/ou minerais, 30 dias antes da coleta de dados.

• Crianças que não obtiveram o consentimento por escrito dos pais ou responsáveis para a participação na pesquisa.

A população de estudo elegível foi de 2.500 crianças, distribuídas em 34 creches. 3.4. Amostragem

A amostra foi do tipo aleatório sistemático. Foi calculado o tamanho da amostra a partir da estimativa da prevalência de 19,3% de deficiência de vitamina A no Estado de Pernambuco, segundo níveis séricos de retinol (Ministério da Saúde, 1998), com precisão de 4,5%. Adotou-se uma confiabilidade de 95%. O tamanho amostral determinado foi de 265 crianças para a dosagem de retinol sérico. Para corrigir eventuais perdas, procedeu-se a adição de 20% ao tamanho amostral (N = 318). Para o inquérito do consumo de alimentos, estimou-se uma prevalência de 50% de ingestão abaixo das recomendações, com uma precisão de 6,5%. O tamanho amostral previsto para o estudo foi de 209 inquéritos do consumo de alimentos. Para corrigir as perdas, adicionou-se 20% ao tamanho amostral (N = 251). As crianças foram selecionadas de forma aleatória, segundo a técnica de amostragem sistemática (BERQUÓ et al., 1981).

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