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CONHECIMENTO LOCAL AOS SISTEMAS DE INFORMAÇÃO GEOGRÁFICA

4.1 Histórico de ocupação na Terra Indígena Las Casas

Segundo Brondízio (2014), nas duas últimas décadas, o estudo do uso da terra se tornou uma das áreas mais ativas na pesquisa interdisciplinar no Brasil em suas várias modalidades. E a abrangência destes estudos tenta responder a questões relacionadas com a maneira como a globalização e as pressões dos mercados afetam as decisões e práticas de uso da terra nos níveis local e regional. Também resulta de como as pessoas respondem a estas mudanças em diferentes escalas e de como eles impactam na qualidade de vida de diferentes grupos sociais.

O território atual da Terra Indígena (TI) Las Casas, tem sido alvo de distintos eventos de ocupação e uso da terra desde meados do século XIX. Sabe-se pela história contada pelos próprios Mẽbêngôkre que hoje habitam em Las Casas, e pela literatura que trata o histórico de ocupação da região, que é um território tradicional deste povo, sendo os Irã’a mraire um subgrupo extinto os primeiros em ocupar a região (SILVA, 2007; MELO, 2002; MOREIRA NETO, 1960 apud SILVA, 2007). Porém, Las Casas se insere numa região de conflitos, razão pela qual tem passado por uma dinâmica de uso e ocupação da terra até a década de 1960 que esteve e continua relacionada aos conflitos com as frentes de expansão nacional.

Destaca Melo (2002) que já no ano de 1824, Cunha Matos relata o primeiro contato com os Kayapó nos campos cerrados entre Tocantins e Araguaia. Depois, as frentes pioneiras de expansão da sociedade nacional chegaram às terras Kayapó em 1859, as quais penetraram pelos campos de Pau D’Arco, tradicionalmente ocupados pelos Irã’a mraire. Desde então tem acontecido um processo sistemático de invasão das terras Kayapó, sendo suas consequências mais visíveis o esbulho e a degradação ambiental das mesmas. A invasão dos territórios indígenas pelas frentes de expansão da sociedade nacional alterou não apenas a vida dos Kayapó, mas também a própria configuração geográfica regional, sendo que a reocupação da área pelos índios implicará em novas transformações sociais e espaciais.

Segundo Melo (2002), que em 1888 os Irã’a mraire passaram a ser reconhecidos como

os Kayapó de Pau D'Arco e estavam estabelecidos na área atual da aldeia Las Casas. Nesta época estavam distribuídos em quatro aldeias na beira do Rio Pau D'Arco contando com

Kayapó entre a atual TI Las Casas e a TIK, afirma também Silva (2007) que ao longo da última década do século XIX a área de campos naturais de Pau D'Arco foi transformada em fronteira camponesa; inicialmente com a utilização dos próprios índios na conversão de terras ocupadas tradicionalmente por eles em terras camponesas, e posteriormente, com a extinção dos mesmos, com a utilização pelos colonizadores da região. Desta maneira, toda a área ocupada pelos extintos Irã’a mraire foi convertida na época em pastagens, e as roças tradicionais dos indígenas nas matas ciliares dos Rios Arraias e Pau D'Arco foram ampliadas e postas em serviço da frente expansionista (MOREIRA NETO, 1960 apud SILVA, 2004). Os subgrupos Mẽbêngôkre que habitavam a região se viram obrigados a se movimentar, depois de ver a situação pela que passaram os Irã’a mraire, os quais foram dizimados por causa de doenças ocidentais. Finalmente em 1948 foi criado pelo Serviço de Proteção ao Índio (SPI) o posto de atração Padre Las Casas, mesmo assim a situação se tornou insustentável, pois, sem poder contar com remédios e com cuidados médicos adequados foram muitos os Kayapó que morreram no Posto de Atração Las Casas. Pois além dos problemas na área médica, havia ainda escassez de recursos, o que dificultava a continuação dos trabalhos de "pacificação". Por outro lado, em comunicação oficial escreveu Miguel Araújo10 que o Posto Las Casas carecia, inclusive, de

material para a “atração”, ou seja, machados, panelas, espelhos, espingardas, etc. (MELO, 2002).

Somava-se também a essa conjuntura, a não colaboração da população regional que constantemente divulgava notícias falsas sobre os ataques indígenas, alimentando o medo e a intolerância frente à presença dos indígenas na região, assim como também o aumento das mortes por doenças que se espalharam como epidemias, o que implicou em que os cemitérios de Las Casas ficassem repletos, razão pela qual os Kayapó que estavam no posto de atração voltaram em 1966 para a TIK, pois ainda nesta época os conflitos pela posse de terras foram intensificados (MELO, 2015). Finalmente, no ano de 1996, e objetivando reverter à situação de esbulho, um grupo Mẽbêngôkre-Kayapó, oriundos das aldeias Gorotire (TIK) e Xikrin, do Cateté (TI Xicrín do Cateté), migraram para Las Casas, onde se encontram desde então.

A partir desse momento, começaram a pressionar a FUNAI de Brasília para a regularização da área, sendo que a composição do Grupo Técnico (GT) com vistas à resolução desse impasse fundiário foi uma resultante direta da mobilização Kayapó. Nesse momento, um grupo de aproximadamente 20 Kayapó se deslocou para onde se encontra atualmente a aldeia

10 Miguel Araújo foi um sertanista que começou os contatos e processo de pacificação em Las Casas (MELO,

Las Casas denominada Tekrejarôti-re pelos Mẽbêngôkre que ocuparam a região. Ali eles abriram uma clareira e erigiram sua aldeia. Em 2001 o grupo havia aumentado em termos numéricos: eram 52 pessoas, dentre elas Xikrin, Kubenkrankeng e Gorotire, todos subgrupos Kayapó Setentrionais (MELO, 2015). Uma grande parte do grupo que voltou em 1996 mora em caráter permanente na aldeia Las Casas, que hoje conta com uma população de 189 habitantes, empreendendo expedições cotidianamente de caça, coleta, pesca e também de controle territorial que são realizadas individual ou coletivamente.