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Grágico 2 Índices dos Indicadores Renda Bruta Familiar – E2

4.2 HISTÓRICO DO CONTEXTO TERRITORIAL

4.2.2 Histórico do processo organizacional

Conforme os comentários anteriores, os fatos ligados à “luta pela terra” favoreceram o sentimento mútuo de pertencimento dos agricultores ao coletivo articulado pelo Pólo Sindical e, por conseguinte a cooperação e a reciprocidade foram vivenciadas, indicando a existência de capital social. Por outro lado, no entanto, o novo cenário de retorno à produção agrícola dos agricultores foi revestido de elementos contrários à participação autônoma destes na perspectiva de constituição de suas próprias organizações.

Segundo Albuquerque (1999), o histórico do processo organizacional para encaminhar as questões da produção e comercialização no território Pedra Branca guarda a forte influência dos agentes externos para enquadrar os agricultores em modelos preconcebidos de organização, sem que os aspectos culturais, implícitos na subjetividade dos indivíduos fossem considerados15, em prejuízo ao exercício do diálogo para negociação de regras para controle e partilha de poder, internos às organizações.

Segundo o mesmo autor, esse cenário ocorreu antes mesmo da constituição da primeira entidade: Associação dos Produtores Irrigantes e Pecuaristas do Projeto Pedra Branca – APRIPB, criada em 1990, ainda colhendo frutos da “luta pela terra” na qual os consensos ocorriam em torno de objetivos nítidos.

O retorno à produção, no entanto, fez surgir um conjunto de novos elementos que passou a demandar não apenas estratégias e táticas políticas, mas também capacidades para lidar com procedimentos para gestão coletiva de empreendimentos e inserção em mercados, questões essas até então pouco conhecidas pelos agricultores.

Se de um lado a assessoria do movimento sindical buscou através da APRIPB a homogeneização do discurso mantenedor do potencial político para enfrentamento das questões existentes, de outro lado, os agentes da assistência técnica – ATER (prepostos da CODEVASF), bem como de outras entidades, realizaram suas intervenções adotando princípios fundamentados num associativismo compulsório e na difusão de conhecimentos, reproduzindo um antigo sistema de valores, baseado na dominação, o qual influenciou negativamente no reconhecimento da realidade objetiva dos agricultores.

Os conflitos que passaram a ocorrer por conta desse cenário impróprio ao início do processo organizacional fez surgir, com o passar do tempo, segundo Albuquerque (1999), reações contrárias às empresas contratadas pela CODEVASF para a assistência técnica -

15 Sobretudo, a herança do processo de subordinação ao poder de mando dos antigos proprietários dos meios de

ATER, cujas ações cotidianas voltaram-se sempre para busca da eficiência produtiva das unidades agrícolas e para a emancipação do perímetro de irrigação, seguindo os moldes de ações já desenvolvidas nos demais perímetros do Vale do São Francisco pela da CODEVASF16.

Com isso, novos atores sociais coletivos e instituições foram dialeticamente sendo construídos evidenciando reformulações de práticas e objetivos, tanto internamente ao Movimento Sindical e associações, como externamente em relação às entidades governamentais, explicitando conflitos os quais resultaram na criação de um número maior de associações, menos abrangentes (quadro 3); no fortalecimento do Pólo Sindical como mediador político junto às entidades externas e; em pactos para avaliação interorganizacional dos objetivos e práticas das empresas de ATER, contratadas pela CODEVASF.

Quadro 3. Organizações de Agricultores Familiares do Projeto Pedra Branca

NOME SIGLA FUNDAÇÃO ABRANGÊNCIA Nº Sócios

Associação dos Produtores Irrigantes e Pecuaristas do Projeto Pedra Branca

APRIPB 1990 Pedra Branca 211

Associação dos Produtores Irrigantes do P. Pedra Branca

APIPB 1991 Agrovilas 13 e

14

51

Associação Agropecuária AG 17 AAA-17 1993 Agrovila 17 36

Associação dos Pequenos Produtores e Pecuaristas do Projeto Pedra Branca – AG 19

APAPB 1993 Agrovila 19 34

Associação dos Produtores Pecuaristas Rurais - AG 16

APRA 1996 Agrovila 16 25

Associação dos Pequenos Agricultores Rurais do Projeto Pedra Branca

APEARPB 1997 Agrovila 06 30

16 Segundo Martins e Zats (1990), as ações desenvolvidas pela CODEVASF para a “emancipação” dos

perímetros podem ser consideradas como metas primordiais, buscadas mediante o enquadramento compulsório dos agricultores, com vistas ao alcance da eficiência econômica, como se a simples troca de modelos de organização oferecesse soluções para realização desse objetivo.

Associação dos Produtores da AG 18 Circunvizinhas APRAC 1997 Agrovilas 14, 15, 16, 18 e 19 33 Fonte: Albuquerque (1999) Nota: AG - agrovila

O papel da ATER para potencialização do capital social, nesse contexto, deveria se configurar como fundamental, na medida em que lidava com o assessoramento ao exercício de práticas coletivas dos agricultores para tratamento de questões objetivas em seu cotidiano, as quais demandavam sobretudo, o aprimoramento da capacidade dialógica interpessoal e a percepção dos atores acerca das relações de poder existentes na sua realidade.

Isso não ocorrendo, um conjunto de novos fatos relacionados à construção e desconstrução de “atmosferas institucionais” passou a ser vivenciado, conforme o quadro 4, os quais foram marcados por sucessivas tentativas de pactos entre a CHESF, CODEVASF e Pólo Sindical em nível de território de Itaparica, contando porém, com a participação de outras entidades Governamentais e Não Governamentais.

Quadro 4. Resumo dos Fatos Históricos do Processo Organizacional e Institucional do Território de Itaparica: 1994 – 2012

DATA FATOS

1994 a 1995

Negociação entre CHESF, CODEVASF e Pólo Sindical para estabelecer as fases do processo de transição para a futura emancipação dos perímetros de irrigação (territórios) contemplando: conclusão de obras de infraestrutura pendentes; melhoria e complementação dos sistemas de irrigação e capacitação dos agricultores nas questões técnicas de produção e comercialização agrícolas, de gestão coletiva das infraestruturas de uso comum e cobrança pelo uso da água de irrigação (com base no que dispõe a Política Nacional de Irrigação e o Acordo de 1986);

Uma proposta do Pólo Sindical é aceita, implicando na participação de representações dos agricultores nas decisões estratégicas em nível de cada território específico (incluindo o do Pedra Branca) e do território de Itaparica como um todo;

1996 Representações dos agricultores questionam a forma de intervenção adotada pelas empresas de ATER (prepostos da CODEVASF) considerando-a insipiente em termos de assessoramento organizacional (formação de capital social) bem como nas questões pedagógicas para apreensão de tecnologias, dados os acordos estratégicos já pactuados; Realização de avaliações sistemáticas dos serviços de ATER realizados, por parte da CHESF, Pólo Sindical e CODEVASF, resultando na confirmação das falhas apontadas pelos agricultores;

A partir das avaliações da ATER, se deu a saída das referidas empresas e a redefinição de objetivos da CODEVASF dentro do processo pactuado para emancipação dos

1997

perímetros de irrigação (a essa altura já vislumbrado como uma estratégia para desenvolvimento dos territórios). Mudança nos termos do convênio com a CHESF); Entrada Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura – IICA como parceiro institucional para encaminhar uma cogestão da ATE com as cooperativas de agricultores com recursos financeiros da CHESF e interveniência do Banco do Nordeste; Ação da ATER é definida como primordial para apoio ao cooperativismo e à sensibilização dos agricultores para emprego de práticas agrícolas com menor uso de

agroquímicos (ações estratégicas de ATER para o processo de emancipação); Na contramão, foi criado (pelo Governo Federal) o Grupo Executivo para Conclusão do

Reassentamento de Itaparica – GERPI, com o claro objetivo de antecipar o processo de emancipação dos perímetros de irrigação de Itaparica, considerando a possibilidade de privatização do Setor Elétrico Brasileiro, incluindo a CHESF;

1998 a 1999

Intensificado o processo de criação de mais cooperativas (imposição do GERPI) inclusive no território do Pedra Branca, culminando na fundação da Cooperativa

continua... conclusão Agropecuária do Projeto Pedra Branca - COOPEBRAN a qual assumiu os serviços de ATER, em parceria com o IICA, CHESF, BNB e interveniência do Pólo Sindical; Interferência do GERPI, na direção contrária ao processo de transição já negociado e, implementação de um amplo processo de indenização como incentivo à desistência do reassentamento por agricultores menos capitalizados e com pendências de obras em seus lotes;

Várias cooperativas são criadas a partir do “enquadramento ao modelo de organização” e participam das negociações com o GERPI, sendo a representatividade do Pólo Sindical questionada pelo Governo. O GERPI exerce forte influência nas decisões da CHESF e pactos já estabelecidos são rompidos;

2000 a 2003

Estímulo financeiro autorizado pelo GERPI para criação de mais cooperativas inclusive do território do Pedra Branca17 e consequente estimulo ao conflito entre entidades por

recursos financeiros destinados à gestão compartilhada da ATER;

Exacerbação de conflitos entre IICA e as cooperativas de agricultores. Conflitos internos nas cooperativas de forma geral e, também, na COOPEBRAN a qual passa a conviver com problemas ligados à redução do quadro de cooperados e consequente problemas na comercialização de produtos;

17 Foram criadas sob influência do GERPI: Cooperativa Agropecuária dos Reassentados de Abaré-BA –

O Pólo Sindical tem representatividade enfraquecida junto à sua base;

Obras tocadas à revelia dos pactos firmados para o processo de transição para a emancipação dos perímetros de irrigação;

Polo Sindical realiza ocupação do complexo de hidrelétricas de Paulo Afonso com participação de centenas de agricultores, como forma de pressionar a retomada das negociações junto ao Governo Federal, culminando com a Extinção do GERPI; 2004 a

2007

Fim da parceria institucional para gestão da ATER (cooperativas/IICA/ CHESF/BNB e Pólo Sindical) e retorno da CODEVASF para as funções anteriores, através de novo convênio com a CHESF implicando em contratação de novas empresas para prestação de serviços de ATER aos agricultores;

2007 a 2010

Desativação de várias cooperativas devido a interrupção dos repasses de recursos para os serviços de ATER (estratégia deliberada pelo extinto GERPI);

CHESF, CODEVASF e Pólo Sindical retomam as discussões acerca das novas fases de preparação para a emancipação dos perímetros de irrigação com base no Programa de Transferência de Gestão18 e no “Acordo de 1986”

2011 a 2012

Retomada do processo de mobilização da base pelo Pólo Sindical, face às indefinições sobre os acordos já firmados com a CHESF e a CODEVASF;

Pólo Sindical realiza protesto e ocupação da 3ª Superintendência Regional da CODEVASF19 e resgata agenda de compromissos junto ao Ministério da Integração

Nacional e busca ampliação de parcerias com o Ministério do Desenvolvimento Agrário - MDA

Primeiras negociações em torno de um “novo modelo de ATER”, conjuntamente, entre CHESF, Pólo Sindical e CODEVASF, com base na Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural- PNATER;

Constituição de um comitê tripartite para acompanhamento das ações do Programa de Transferência de Gestão.

Fonte: Albuquerque (1999); atas, cartas, relatórios pesquisados (2012).

Esses fatos revelam que alguns avanços foram obtidos no exercício de constituição de um tecido institucional denso, no âmbito do território de Itaparica como um todo e, por conseguinte, no território Pedra Branca.

Porém, dado o predomínio dos fatos contrários ao estabelecimento de consensos negociados, o saldo histórico restringiu o potencial de participação dos atores sociais primordiais ao intento do desenvolvimento territorial: os agricultores familiares.

O protagonista desse episódio negativo pode-se dizer, foi o próprio Estado mediante manobras políticas centralizadas que sufocaram o vivenciamento salutar de uma governança

18 Comentado adiante

gradativa por entes da sociedade civil e também restringiram a possibilidade de envolvimento de outras parcerias com entidades governamentais da esfera territorial.

A atmosfera institucional, portanto, em função desse histórico, apresenta-se como um conjunto de intenções e pactos, sempre levando em consideração o marco legal da Política Nacional de Irrigação e o “acordo de 1986” mediante parceria estratégica entre três entidades: CHESF, CODEVASF e o Pólo Sindical.

Quadro 5 - Organizações de agricultores existentes no território Pedra Branca

NOME DA ENTIDADE ABRANGÊNCIA

Associação Agropecuária de Jovens Piscicultores e Horticultores Familiares dos Municípios de Abaré/Curaçá- BA – HORTPEIXE

Agrovila 19

Associação Agrop. e Artesanal de Abaré-BA – FLORIMEL Agrovilas 16, 17 18 e 19 Cooperativa Agropecuária de Jovens do Perímetro de

Irrigação Pedra Branca – COAJ/DKM

Pedra Branca

Cooperativa Agropecuária do Projeto Pedra Branca - COOPEBRAN

Pedra Branca

Fonte: Dados de 2012 levantados in loco

No que tange especificamente ao território Pedra Branca, atualmente, um conjunto de quatro entidades compõem o elenco de organizações de agricultores, conforme o quadro 5 as quais estão efetivamente funcionando, apesar de existirem outras nove entidades formalmente constituídas, porém desativadas.

Registra-se que as referidas organizações, com quadros de associados contando com considerável número de jovens, filhos de agricultores, desenvolvem atividades ligadas à comercialização de parte de seus associados, mas, apresentando evidente fragilidade nos aspectos relativos à gestão dos capitais financeiro, humano e social. fato que tem limitado o cumprimento de seus objetivos, apesar terem sido capazes de estabelecer algumas parcerias pontuais para o fornecimento de produtos a escolas municipais, através do Programa de Aquisição Alimentar da CONAB em 2010 e 2011, conforme será visto adiante.