• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO II – NOVAS PROPOSTAS PARA A ACELERAÇÃO DA

1. Contributos teóricos na forma de medir e mediar o tempo

1.1 Historiografia: a sua instrumentalização política e social

1.1.2 Historiografia de fundo positivista

O estádio de desenvolvimento da sociedade portuguesa potenciará o surgimento de uma nova geração, a partir da década de 70 do século XIX, no papel de pensadores dos problemas de ordem política e cultural. Na esteira da geração anterior, continuarão a reivindicar para os intelectuais o profetismo do sentido da história e dos caminhos que o país deveria trilhar.

Nesta lógica, é comumente aceite que a Questão Coimbrã de 1865 marca o início da afirmação desse grupo de intelectuais.36 Os envolvidos eram literatos, ultrapassando em larga medida os seus limites académicos e propunham uma visão filosófica da história na vertente metafísica, tendência inexorável tida por científica (Catroga, 1982, pp. 75-85).37

A querela coimbrã foi catapultada por motivos de ordem estética;38 contudo, evoluiu para o patamar político, devido ao entendimento de que a Literatura, a Ciência e a Arte seriam

36 Nomes como Antero de Quental (1842-1891), Teófilo Braga (1843-1924), Guerra Junqueiro (1850-

1923), Eça de Queirós (1845-1900), entre outros, fizeram parte desse grupo.

37

No caso de Quental (2009), embora sendo poeta, as suas preocupações sociais foram uma constante. À maneira de Hegel e de Proudhon, perspetivava a história como uma forma superior de objetivação do espírito, ou seja, a historiografia era um meio coadjuvante para que o filósofo da história encontrasse a base concreta daquele percurso. Teófilo Braga quedou-se no quadrante científico-positivista, corrente que haveria de ser prevalente. Autor de livros de referência na época (1879a, 1892, 1885), que dele fizeram um dos nomes sonantes da nossa vida cultural nos finais de Oitocentos e inícios de Novecentos.

38 A Questão Coimbrã monopolizou o debate entre duas correntes estéticas: a ultrarromântica, mais

conservadora, e a corrente de uma geração mais nova, aberta às recentes correntes europeias, onde pontificavam Antero de Quental e Teófilo Braga. Estes afrontamentos darão início a uma das controvérsias que maiores repercussões tiveram na vida cultural portuguesa, multiplicando-se os artigos,

51 a voz dos imperativos da História, estando ao serviço da revolução para estes intelectuais. Conclui-se que havia uma estratégia gizada, na tentativa de combater valores e padrões em crise, cujo expoente máximo era o regime monárquico constitucional em Portugal.39

Se a Questão Coimbrã, sob a bandeira da renovação estética, fora um projeto emancipador, as célebres Conferências Democráticas do Casino40 são um momento posterior bem mais audacioso, com intenções políticas explícitas, numa conjuntura de crise política e social. No cenário internacional, os ventos favoráveis dos acontecimentos (Comuna de Paris) são inseparáveis e anunciadores de uma iminente revolução que em breve traria a emergência de um tempo novo, consubstanciando um “homem novo”.

A ebulição cultural e política nos meios académicos da altura em Portugal (e a fase mais madura destes intelectuais) era plenamente justificada, em virtude dos acontecimentos recentes ao nível europeu e das suas correntes filosóficas desafiadoras que atestavam, de alguma maneira, um sentido evolutivo do cosmos, realizando-se e consubstanciando-se na história. Por isso, Teófilo Braga (1871) não hesita em afirmar que:

Nada há mais eloquente do que as Causas da Decadência dos Povos Peninsulares, pelo nosso Antero de Quental, o homem que melhor escreve a língua portuguesa e que relançou a nossa história na mesma altura que Edgar Quinet pensou a Filosofia de França. (p. 377).

Pode verificar-se uma espécie de consenso entre os elementos em evidência nas referidas Conferências, sobretudo na posse do tema da decadência enquanto polo antitético das esperanças regeneradoras. A ideia dominante passa a ser a de um devir, qualificando ritmos sociais específicos, nos quais a leitura da história apontava para o decifrar do destino da humanidade e, dentro desta, do país.

Essa espécie de conspiração consensualizante abarcava as ideias de Darwin na sua Teoria da Evolução das Espécies de 1859, e as de Herbert Spencer na Estatística Social de 1850, que se conjugavam com as filosofias otimistas da história, pelas quais tanto labutaram

folhetins e opúsculos em apoio de uma e de outra partes. Vide: Quental (1865a, 1865b), T. Braga (1865) e P. Chagas (1901).

39 Consultar: Quental (1973). Para tais influências nestas matérias, nos meios académicos da altura,

convém ver J. Carvalho (1955, pp. 50-55).

40 Iniciadas em 22 de maio de 1871. Antero de Quental, depois da conferência de apresentação, na qual

falou sobre “O Espírito das Conferências”, vai proferir uma outra intitulada “Causas da Decadência dos Povos Peninsulares”; em seguida, Augusto Soromenho dirá uma outra sobre “A Literatura Portuguesa”; quanto a Eça de Queirós, falará sobre “A Literatura Nova” e Adolfo Coelho sobre “A Questão do Ensino”. Vide: Reis (2009).

52 Hegel, Vico, Edgar Quinet e demais representantes. Numa evidente correlação com estas tendências florescia igualmente uma confiança apoteótica no futuro triunfo da ciência, assente numa filosofia positivista multifacetada.41

Entre os vários quadrantes então em voga, tornava-se dominante a corrente que defendia acerrimamente o valor das ciências naturais e sociais.42 Nesse complexo tabuleiro de ideias articulava-se a Lei dos Três Estados, defendida por Auguste Comte, que não raro carreava em conjunto com a lei da evolução (Herbert Spencer) e com a apropriação ideológica do evolucionismo de Lamarck e a vertente transformista de Darwin.43 Perante estes constrangimentos, parecerá normal introduzirem-se modificações nos vários elementos sociais “organicistas”, como o calendário, sem que isso vá levantar qualquer celeuma.

Antes de ponderarmos de que forma o movimento positivista se impôs, cientificando por completo os fenómenos sociais, importa percebermos a sua origem primeira e implantação entre nós, fomentando práticas que mais tarde terão o seu apogeu no calendário evocador dos feriados.

O movimento positivista surgiu no espaço epistemológico francês como uma consequência direta das proporções das contradições geradas no seio da sociedade pós- revolucionária do século XIX.44 Os vários antagonismos sociais que derivaram dos desenvolvimentos das forças produtivas em termos industriais puseram a nu uma realidade social nova, logo mutável, autónoma, diametralmente oposta à fenomenalidade natural.45

41 Os seus elementos mais representativos foram Auguste Comte e Émile Littré. Em Portugal, a

tendência que prevaleceu com maior implantação foi a corrente de Littré (Catroga, 1977).

42 O positivismo pode ser definido como a filosofia ao serviço das ciências da natureza; todavia, os

positivistas possuíam uma noção muito própria de ciências da natureza, uma vez que também aplicaram o conceito à sua filosofia da história. Julgavam que estas consistiam em dois fatores: determinar os factos e estabelecer as leis. Os factos eram determinados imediatamente pela perceção sensorial. As leis eram estabelecidas através de generalizações feitas a partir destes factos, por indução. Sob esta influência, surgiu uma nova espécie de historiografia, que pode ser chamada historiografia positivista (Collingwood, 1986, pp. 203-212).

43

Os positivistas acreditavam que a humanidade teria chegado à sua última fase de maturação intelectual e moral, isto é, a um período em que seria anacrónico recorrer a explicações de índole religiosa acerca do mundo e da vida. O futuro neste sentido pertencia inevitavelmente às ciências (Catroga, 1988a).

44

Auguste Comte sistematiza na sua filosofia todo o saber científico, sendo a sociologia dinâmica a responsável por definir as leis dessa sistematização. Vide as principais obras dele: Système de politique

positive, Tomos I-IV (1851-1854); Cours de philosophie positive (1830-1842); Traité Élémentaire de géométrie analytique (1843); Traité philosophique d’astronomie populaire (1844); Discours sur l’esprit positif (1844); Discours sur l’ensemble du positivisme (1847); Système de politique positive ou traite de sociologie, instituant la religion de l’hummanitè (1851-1854); Catéchisme positiviste (1852); Appel aux conservateurs (1855); Synthèse, ou Système universel des conceptions propres à l’état normal de l’humanité (1856).

45

A emergência desse paradigma social levou a que se construísse uma ciência sociológica, onde surge o nome de Saint-Simon, um dos pais da sociologia, senão mesmo o pai. Na esteira dos acontecimentos,

53 Trata-se de uma realidade passível de observação e proficuamente experiencial, transformada numa realidade completamente moldada, de modo que vai reconfigurar o homem no cosmos natural e político.

Reportando-se a esse universo mental, Duvignaud (1982) expõe que “é preciso, portanto, que a sociedade, na sua imagem coletiva, deixe de ser passiva para se tornar ativa, criadora, para dizer tudo, histórica” (p. 17). Sem querermos parecer algo precipitados ao tomar algumas destas noções, somos levados a concluir que todo este processo vai gradativamente gerar não só uma forma de contar, mas também de estruturar e de experienciar o tempo, com claros indícios de uma tendência precursora que dará mais tarde frutos nas datas e efemérides no calendário dos feriados na Primeira República. Não será apenas o poder político o agente que patenteou o futuro surto de dias festivos, mas toda a sociedade, mediando a chegada dos dias feriados, participando e fazendo história.

A permanente mudança social ocorrida em França, que resultava das relações próprias das produções capitalistas, muda drasticamente as mediações tradicionais entre o indivíduo e a sociedade (família, instituições e Igreja), ao trazer para a ribalta um racionalismo cientista que vai não só questionar, mas também responder de forma autónoma com um modelo sociológico com novas normas, estrutura e funcionamento. A imposição desse modelo capitalista hegemónico implicou a rutura total com as antigas estruturas económicas, políticas e ideológicas do Antigo Regime (Gusdorf, 1974, pp. 349-371).

O positivismo surge como resposta sociológica às contradições desse novo paradigma industrial, ao explicar a totalidade social segundo critérios positivistas, com o intuito de exercer um controlo racional da humanidade sobre o seu próprio destino, seja ele individual ou coletivo (Gusdorf, 1974). Essa ciência nova recorria às ciências da natureza, fazendo uso do método comparativo e do método histórico, num edifício epistemológico hierárquico ôntico em que os vários graus do ser estavam escalonados numa ordem evolutiva. Correspondia a uma evolução do espírito no sentido de se apropriar da realidade de uma forma cognitiva. Por conseguinte, havia uma adequação entre a ontologia, a lógica e a história.

entre as várias correntes sociológicas que tentam explicar as diversas sequelas da Revolução Francesa, a de Auguste Comte situou-se e acomodou-se melhor a uma toada de classe, a burguesia conservadora, a qual depreendeu que para obter hegemonia aos níveis económico, político e ideológico necessitava de instrumentos ideológicos/científicos capazes de justificar e legitimar o exercício do poder.

54 O programa positivista da historiografia assentava em primeiro lugar em determinar factos; nesta premissa os historiadores conformados com essa filosofia, inclusive os portugueses, procuraram determinar todos os factos que pudessem, resultando num considerável aumento de conhecimento histórico em grandes proporções, sem precedentes. Quanto ao estabelecer as leis, que seria o segundo passo, a historiografia determinava os factos recolhidos através de uma perceção sensorial. Por outras palavras, as leis eram estabelecidas através de generalizações, muitas delas feitas a partir desses factos, por indução, o que justifica algumas reinterpretações de factos e personagens do nosso passado histórico. O paradigma histórico passado servia de precedente a um facto histórico subsequentemente superior. Sob esta influência, surge um novo género historiográfico denominado historiografia positivista que, em países como o nosso, fará com que o processo histórico geral e particular seja idêntico ao natural, ou seja, passível de evolução (Collingwood, 1986). Por tal motivo, os métodos das ciências da natureza eram cabalmente aplicáveis à interpretação da história. Portanto, o positivismo, foi uma filosofia ao serviço das ciências da natureza (Collingwood, 1986).

Assistimos, neste exercício aparentemente desconexo, a um alinhamento dos tempos da natureza, agora reenquadrados, justificando reajustes temporais fraturantes e estruturantes. A evolução natural do pensamento e as filosofias que influenciaram sectores como a história e as ciências deram argumentos legitimadores para se construírem determinados edificados ideológicos, que só um calendário poderia manter intactos.

Os contributos de Darwin e de Spencer fizeram com que os dois campos – ciência e história – se unificassem, ao fazer crer que o objetivo progressivo da história também era o das ciências. Nestes moldes, a evolução seria vista como um termo genérico que abarcava os campos progressivos quer da história, quer das ciências. A suposição de que a evolução natural era automaticamente progressiva e criadora fez muitos crerem que a evolução da história dependia dessa mesma lei da natureza. Os métodos empregues nas ciências da natureza, na sua nova fórmula evolutiva, coadunavam-se com os estudos dos processos históricos, o que levou a equívocos.

O positivismo da nossa história, com os seus excessos e exageros, elevou acontecimentos e pessoas que foram usados como matéria-prima para algo mais importante.

55 Compreende-se, com facilidade, que esta filosofia da história resvalará para os domínios da religião.46 Esses preceitos sofrem adequações segundo uma ética altruísta e laica, veiculados a toda uma dogmatização e ritualização, expressas numa cultura de sentimento e moral.

Do ponto de vista formal e funcional, a filosofia da história decalca o seu edifício ideológico do catolicismo medieval, distanciando-se apenas no conteúdo. Nesse sentido, o que se deificava era a humanidade. A hagiografia era constituída pelos grandes homens que em função do seu pensamento e contributos carrearam para o aperfeiçoamento civilizacional. No término desse processo surge o calendário que assinalará os grandes momentos da história, com toda a paideia que encerram. Portanto, a proposta social em que assentava a história de fundo positivista teve um efeito precursor no futuro enquadramento dos feriados no calendário.

A filosofia da história e o seu racionalismo laico, segundo o positivismo dogmático taxinómico, adequaram-se às necessidades da luta quer contra a Monarquia Constitucional, quer contra o clericalismo em Portugal, cuja penetração se deveu à importação cultural, na tentativa de encontrar um húmus social que o exigia.47

Deste modo, a sociedade surgia como uma totalidade organicista que, no horizonte positivista, foi levada às últimas consequências. Veja-se que o mesmo sentido invade pensadores de inspiração proudhoniana, como Quental (1973), que embora defendesse um evolucionismo fundamentado em termos metafísicos escreveu que “a sociedade é um organismo, e os organismos transformam-se, não se revolucionam” (p. 187). Há toda uma expressividade sentimental e moral desse desiderato de dimensão social, incorporando-se na ideia de humanidade, irrompendo como uma temática dominante. Assim, compreende-se as palavras de Eça de Queirós (1896):

46

Comte teoriza nesse sentido de um ideal religioso, encontrando-se sobretudo no Système (Tomos II, III e IV), enquanto em Cathéchisme Positiviste assume uma feitura que gira na dicotomia entre diálogo e catequização. É fabuloso quando notamos que, em muitos teóricos oitocentistas, a consciência da inadequação da ideologia católico-feudal às necessidades decorrentes das contradições nascidas no seio da sociedade industrial foi pensada em termos ainda religiosos. O problema dessa realidade sociológica fora divinizar o homem, algo sobretudo visto em Marx e Feuerbach.

47 A nossa necessidade quanto ao estudo dos fenómenos sociais onde coubesse a filosofia positivista,

inclusive da história, deriva da necessidade de responder em termos doutrinais aos interesses das classes sociais emergentes e intermédias, em face do bloco social existente, composto pela alta burguesia bancária e comercial e pelos grandes senhores agrários de então. Vide: Castro (1978).

56

A nossa descoberta suprema foi a humanidade. Coimbra de repente teve a visão e a consciência adorável da humanidade. Que encanto e que orgulho! Começamos logo a amar a humanidade, como há pouco, no ultra romantismo, se amara Elvira, vestida de cassa branca ao luar. Por todos os botequins de Coimbra não se celebrou mais senão essa rainha de força e graça, a humanidade. (p. 485)

A consensualidade gerada pela corrente positivista foi indesmentivelmente voltada para um projeto histórico-político que se adequasse aos interesses vigentes e foi precursora nas suas propostas concretas de fundamentação regeneradora.

A irrupção do positivismo em Portugal assentou nalgumas nuances já referidas, beneficiando dos condicionalismos económico-sociais e ideológicos, bem como do incremento de desenvolvimentos científicos razoáveis, nomeadamente das ciências naturais, que permitiram uma ideologia suficientemente desenvolvida.48 Convenhamos que toda esta proposta de âmbito alargado dos fenómenos sociais tendeu a grassar em diversos domínios, ao emergir no calendário dos feriados.

O movimento positivista português teve diversos rostos, contudo Teófilo Braga surge como o seu paladino.49 Este autor foi responsável pela transformação do movimento positivista numa corrente de opinião com impacto doutrinal. E esse facto não nos causa admiração se levarmos em linha de conta a sua vocação eminentemente política e as suas características de pendor republicano e anticlerical. A agudização política deriva da vertente histórica que recentra a sua doutrinação positivista numa prioridade latente da queda da monarquia e da laicização das consciências, relegando também para as calendas as reformas que implicassem mudanças sociais de dimensão estrutural.

Não será pequeno o contributo do positivismo para a visão da ciência histórica em Portugal, fomentadora de coesão doutrinal quer do Partido Republicano, quer da Primeira República. Deste modo, a ligação entre o positivismo e a história será integradora e consentânea relativamente a uma vaga de fundo laicista, que procurava sedimentar-se.

O avanço da filosofia positivista é tal que encontramos intelectuais de craveira integrados nesse movimento, inundando gradualmente todos os domínios da ciência e da cultura em Portugal.50 A espinha dorsal desse corpo de preceitos elencado não era exclusiva e

48 Consultar: J. S. Ribeiro (1878, pp. 122-142, 225-295).

49 Veja-se: T. Braga (1880a, pp. 201-319, 1880b, p. 514, 1877, 1879a, 1884b). 50

A fina nata do saber académico integrava essas fileiras, fosse da literatura, da antropologia, da psiquiatria, do direito, da história, ou da política. Nomes como José Falcão, Emídio Garcia, Rodrigues

57 rigidamente comteana na formulação histórica ou noutros campos do saber. Com efeito, era uma corrente que apensava ao essencial da doutrina o que de fundamental se ia desenvolvendo nos campos das ciências da natureza e no campo das doutrinas demo- republicanas, aderindo ao já referido organicismo evolucionista spenceriano e aos contributos antropológicos de Darwin e de outros eminentes autores.

Corporiza-se um movimento que saberá traduzir-se numa corrente de opinião, maturada pelo plasmar das suas ideias em jornais e revistas.

Esses intelectuais, embora não tivessem poder decisivo, encabeçam no processo precursor um lugar de destaque no ensaiar e no veicular de ideias de claro pendor positivo histórico, tendo um papel promotor nas futuras decisões e ações, algumas com força de lei, como os feriados para posteridade. A propósito destas asseverações, Teixeira Bastos (1882) referiu:

Livros, jornais e revistas aparecem necessariamente, tendo um mérito mais ou menos real e uma vida mais ou menos próspera mas sempre úteis, desde que se submeteram ao critério das ciências positivas. A filosofia de Auguste Comte e a filosofia de Herbert Spencer, as obras de Darwin e os estudos de Littré, os trabalhos de Huxley e de Haeckeliana e as vulgarizações de Drapear e de Becker encontram de dia para dia maior número de adeptos e de verdadeiros crentes no meio da sociedade portuguesa. (p. 313)

Verifica-se, de forma pertinente, um ideologizo cientista radicado numa história que visava dar cobertura objetiva e neutral às propostas sociopolíticas que, à sua luz, apareciam aureoladas de um carisma científico. Isto traduzia-se no serem capazes de agregar iniciativas várias, tendo todo o cabimento evocações históricas em feriados futuros. Tal dava azo a que todas as conceções do mundo e da vida, incluindo as festivas, radicassem numa atitude histórico-sentimentalista, sem os resquícios do passado teológico e anticientista.

Perante o exposto, percebemos como o determinismo histórico galgará território, ao surgir como consequência lógica de uma unidade do universo, espelhada numa ideia de inexistência de diferenças entre as realidades naturais e biológicas e as sociedades humanas. No que à identidade dizia respeito, a definição emergia como ponto de ordem, se bem que

de Freitas, Alves da Veiga, Teixeira Bastos, Ramalho Ortigão, Bernardino Machado, Consiglieri Pedroso, etc. Vide: T. Braga (1880a, p. 195).

58 para outros representava uma mera analogia com os organismos, em superioridade em relação às partes que os constituíam.

A filosofia em questão convidava a interpretar a história e a sociedade a partir da legalidade consubstanciada nas leis da evolução, da hereditariedade e do transformismo. Nasce a necessidade de se estudar a fundo as sociedades, revendo a sua hereditariedade étnica