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3 C OMPARTILHAMENTO DA I NFORMAÇÃO

4.2 I NOVAÇÃO E L OCALIZAÇÃO

A partir da década de 1980, o caráter localizado da inovação e do conhecimento começa a ganhar destaque. As assimetrias na capacidade de geração e de difusão de inovações comprovam que a interação entre tecnologia e contextos locais desempenha papel fundamental na geração das inovações, através dos mecanismos de aprendizado que surgem no quadro institucional local específico, levando à processos inovativos qualitativamente diversos. Constata-se que o conhecimento e a mudança tecnológica são localizados, tendo em vista que, para cada firma, a geração, implementação, seleção e adoção de novas tecnologias são influenciadas pelas características das tecnologias que estão sendo utilizadas no âmbito da própria firma, bem como por sua experiência acumulada. A geração do conhecimento é tomada como o resultado de um processo conjunto que envolve tanto a atividade formal de ensino e de P&D, quanto as atividades da empresa e sua interação com o ambiente no qual atua. (LASTRES; CASSIOLATO, 2003)

Analisando a aprendizagem em arranjos de empresas Kerr Pinheiro, Carvalho e Kroeff (2005) também ligam os conceitos de compartilhamento de conhecimento, aprendizagem e inovação afirmando que a interação existente entre estes atores tem potencial de gerar inovação, garantir a competitividade das empresas e de sustentar o desenvolvimento, através da presença dos conhecimentos tácitos e específicos de natureza local e que conduzem a processos de aprendizado coletivo e capacitação inovativa.

Estes arranjos produtivos locais são o locus privilegiado para se observar a efetivação dessas interações, no que tange à criação e ao compartilhamento de conhecimento, criando condições para a inovação, esta última entendida como resultado de um processo de aprendizado organizacional, inter-organizacional, local e nacional.

Citando Johnson e Lundvall (2005), afirmam que o aprendizado por interação é uma das poucas chances para as economias em desenvolvimento, pois entendem que a formação de competências e a inovação são os ingredientes essenciais para todos os atores nos mercados globais. (KERR PINHEIRO; CARVALHO; KROEFF, 2005)

Interessante destacar, considerando o problema do compartilhamento e da inovação, objeto desta pesquisa, a atenção que o Manual de Oslo dá à dimensão sistêmica da inovação, através do que chamou de innovation linkages que seriam as conexões, relacionamentos e interações entre os diversos atores (empresas e outras organizações) e a relevância do fluxo de informação e conhecimento existente, para que haja o desenvolvimento e a difusão da inovação. Classifica estas conexões por tipos, conforme sejam de fontes abertas de informação, para aquisição de conhecimento e tecnologia ou conexões de cooperação inovativa.

Em contraponto à ideia sequencial da inovação baseada exclusivamente em P&D, o enfoque sistêmico reconhece que a capacidade da pesquisa em gerar inovação está limitada às estratégias de longo prazo. No intuito de também atender às demandas mais imediatas por inovação, esta visão considera que deva haver um balanceamento entre os projetos de pesquisa, próprios ou em parceria com as universidades ou institutos de pesquisa, e outros esforços que enfoquem a comunicação com outras audiências, muitas vezes não científicas e tecnológicas.

O próprio Manual Frascati (2002), outra publicação da mesma OCDE, cuja primeira edição data do ano de 1963, e que tem em seu título o objetivo de propor padrões práticos para estudos sobre pesquisa e desenvolvimento, originalmente reconhece que P&D é apenas uma das atividades do processo de inovação tecnológica e pode ser executada em diferentes fases desse processo. Ela pode atuar não apenas como a fonte das invenções, mas também como um meio para solução de problemas que podem surgir em qualquer ponto desse processo de implementação.

Conforme definido nesse manual as atividades de inovação tecnológica são todas as etapas científicas, tecnológicas, organizacionais, financeiras e comerciais, incluindo os investimentos em novos conhecimentos que têm o objetivo de levar à implementação de produtos e processos melhorados ou tecnologicamente novos.

As primeiras duas versões do Manual Frascati, que tem este nome por ter resultado de reuniões de cientistas dos países membros na cidade de Frascati, na Itália, dirigia-se a tratar P&D apenas nas ciências naturais e na Engenharia. Apenas a partir de 1974 as ciências sociais e humanas foram incorporadas nas novas versões.

O próprio manual também reconhece sua limitação em mensurar apenas os fatores de entrada das pesquisas, tais como os gastos financeiros e a medição e classificação dos recursos humanos envolvidos em P&D. Afirma a dificuldade em definir e em medir os fatores de saída, os resultados obtidos com as pesquisas, deixando ao Manual Oslo esta tarefa.

O manual de Oslo, porém não pretende estudar ou medir os fatores que influenciam a inovação, apenas reforçando o entendimento geral da necessidade e dos impactos de sua adoção pelas organizações, em termos da competitividade, produtividade, transbordo do conhecimento e incremento do fluxo informacional através das redes, tornando- se nova fonte para novas inovações.

Importante citar a iniciativa da OEA - Organização dos Estados Americanos e de diversas outras instituições latino-americanas, no sentido de criar um padrão para os indicadores de inovação tecnológica na América Latina e no Caribe, através do Manual de Bogotá (2001). Este manual demonstra a preocupação em seguir os indicadores e os critérios traçados anteriormente pela OCDE, de modo a garantir sua compatibilidade, a nível regional e internacional. Entretanto, os resultados das pesquisas na região mostram que, a parte de se basear nos conceitos e metodologias dos manuais Oslo e Frascati, no Manual de Bogotá foi necessário levar em consideração as características específicas das empresas e dos sistemas de inovação na América Latina.

O sucesso japonês dos anos 80 mostrou que a inovação é cada vez mais distribuída entre as empresas e outras organizações, e não mais localizada em uma única grande empresa. Este entendimento ressalta a estratégica integrativa da visão sistêmica para a inovação, que observa a crescente importância da integração entre os vários setores dentro das empresas, em combinação com as inter-relações com fornecedores, clientes ou usuários, além de parceiros comerciais e outras fontes de conhecimento tecnológico, tais como, as universidades e os institutos de pesquisa financiados pelo governo. (ROSENBERG, 1982; ROTHWELL, 1992; TEECE, 1986)

As luzes do estudo se voltam para a estrutura organizacional e para as práticas utilizadas para promover o compartilhamento de informações e do conhecimento gerado através da interação, seja internamente ou com outras empresas e instituições públicas de pesquisa, bem como com toda a gama de relações que as organizações podem estabelecer para a troca de informações na participação em projetos de inovação.

Dougherty (1992), ao estudar as barreiras para o sucesso das inovações de produto em grandes empresas, ressalta dois pontos que reforçam a necessidade do compartilhamento da informação e do conhecimento para que as inovações ocorram. O primeiro ponto, bastante

óbvio do ponto de vista mercadológico, é o respeito ao desejo do cliente. Isto significa que a organização deve fazer a ligação mercado-tecnológica de modo a traduzir adequadamente no produto a demanda que o mercado explicita. Já Freeman (1982) havia descrito a inovação de produto como o complexo casamento entre as demandas de mercado e a tecnologia. Deborah Dougherty relembra também a teoria de aprendizagem em dupla passagem de Argyris e Schon (1978), na qual as novas informações são incorporadas e as próprias premissas reconsideradas no desenvolvimento de produtos inovadores.

O segundo ponto de destaque é relativo à integração interna nas organizações, isto é, entre os departamentos técnico, de marketing, de manufatura e de comercialização. Para a autora as barreiras são que estes departamentos muitas vezes podem ser vistos como feudos ou mundos independentes, cada qual com sua perspectiva do produto, focando em diferentes aspectos do conhecimento técnico-mercadológico. Outra questão que impede a inovação são as rotinas organizacionais que, de tão formalizadas, impedem o comportamento inovador.

Nestes dois pontos de destaque da pesquisa de Dougherty está explícita a ligação do compartilhamento, seja interno, no universo da empresa, quanto externo, no mercado, com a possibilidade da inovação, como quer demonstrar esta pesquisa.

Já Granovetter (1973) destacava a força das ligações fracas, assim chamadas na análise das redes sociais, quando observa a importância em se obter novas informações fora dos limites da rede, do grupo tradicional, por extensão, fora dos setores ou fora das empresas, para que seja possível gerar novos conhecimentos.

Não é por acaso que Kline e Rosenberg (1986) destacam o contexto social da organização inovadora, afirmando a urgência em se enxergar o processo como uma mudança do sistema completo, não apenas da parte física do produto, mas também no ambiente mercadológico, nas estruturas de produção e no conhecimento.

Albagli (2002) apud Costa (2007) reafirma a necessidade desse “colégio invisível”, formado a partir da cooperação entre as empresas, para ampliação das condições de obter e renovar as competências básicas à sobrevivência e competitividade, possibilitadas pelo compartilhamento da informação e conhecimento sobre tecnologia, práticas organizacionais e mercados, dentre outros temas. Como já se destacou, na visão evolutiva dos neoschumpterianos, esta competência básica à sobrevivência é a capacidade em inovar sempre e ser mais capaz para diferenciar-se de seus competidores.

Também assim entende Lemos (1999) quando lembra que uma empresa não inova sozinha, devido às fontes de informação, conhecimento e inovação poderem estar tanto dentro quanto fora dela. E o arranjo dessas várias fontes de informação e conhecimento passa a ser

considerado como condição necessária para que ela seja capaz de enfrentar mudanças e inovar. Afirma ainda que os novos formatos organizacionais que promovem a interação dos diferentes agentes, dentro e fora da empresa, são elementos de influência no desenvolvimento econômico e na capacidade de inovar. A constatação de que o processo inovativo é localizado, destaca sua dependência dos contextos empresarial, setorial, organizacional e institucional, nos quais a empresa está imersa.