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I parece excluir não somente a pregação e o ensino da parte da

mulher na igreja local, como também parece proibi-la de: escrever livros sobre assuntos bíblicos que os homens talvez leiam; ensinar a Bíblia ou assuntos afins (inclusive a educação cristã) nas faculdades cristãs ou nos institutos bíblicos em que há homens nas suas classes; ensinar homens em situações missionárias. Contudo, aqueles que argumentam contra o ensino transmitido por mulheres na igreja contemporânea raras vezes levam a interpretação tão longe assim.

Quase sempre fazem com que as questões acerca do vestuário no versículo anterior (lTm 2.9) sejam culturalmente relativas.

Por outro lado, o fato de que lTim óteo 2.11,12 pode ser cul­ turalmente relativo pode ser apoiado em primeiro lugar pela exegese de todas as três epístolas pastorais. Certas mulheres estavam dando trabalho na igreja em Efeso (lT m 5.11-15; 2Tm 3.6-9) e elas po­ dem ter tido uma grande parcela de culpa no fato de os falsos mes­ tres terem conseguido tantos sucessos ali. Uma vez que as mulheres são achadas ensinando (At 18.26) e profetizando (At 21.9; lC o 11.5) em outras partes do Novo Testamento, é totalmente provável que lTim óteo 2.11,12 fale sobre um problema local. De qualquer maneira, as diretrizes acima citadas apoiam a possibilidade de a proi­ bição, registrada em lTim óteo 2.11,12, ser culturalmente relativa.

N o entanto, a questão da homossexualidade é consideravelmente diferente. Nesse caso, as diretrizes posicionam-se contra sua relativi­ dade cultural. A Bíblia inteira dá testemunho consistente contra a atividade homossexual, identificando-a como moralmente errada.

Nos anos recentes, algumas pessoas têm argumentado que o homossexualismo contra o qual o Novo Testamento fala é aquele em que as pessoas abusam de outras, e que o homossexualismo monogâmico particular entre adultos que estejam em acordo com tal prática é uma questão diferente. Argumentam que não pode ser comprovado, com bases exegéticas, que semelhante atividade homossexual é proibida. Além disso, argumenta-se que essas são opções culturais do século xxi que não estavam disponíveis no século i. Portanto, eles afirmariam que algumas das nossas diretrizes (e.g., 5 e 6) abrem a possibilidade de as proibições neotestamentárias contra o homossexualismo tam­ bém serem culturalmente relativas, e afirmariam, ainda mais, que al­ gumas das diretrizes são falsas ou irrelevantes.

O problema desse argumento, no entanto, é que ele não tem respaldo exegético nem histórico. O homossexualismo que Paulo tinha em mente em Romanos 1.24-28 claramente não é do tipo “abusivo”; é homossexualismo deliberado entre homens e entre mu­ lheres. Além disso, a palavra usada por Paulo “homossexuais” (“sodomitas”, a r a) em ICoríntios 6.9 literalmente significa homosse­ xualismo entre homens. Uma vez que a Bíblia como um todo testifica

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contra o homossexualismo, e que invariavelmente o inclui em con­ textos morais, e uma vez que simplesmente não tem sido Comprova­ do que as opções para o homossexualismo hoje são diferentes daquelas do século i, parece não haver motivo para considerá-lo um assunto culturalmente relativo.

Problema da teologia

Notamos no capítulo anterior que boa parte da teologia nas epístolas é orientada para a realização de tarefas e, portanto, não é apresentada de modo sistemático. No entanto, com base nisso, não se deve entender que não podemos realmente apresentar de modo sistemático a teologia que se expressa nas declarações das epístolas ou que provém delas. Pelo contrário, essa é uma das obrigações do estudante da Bíblia. Este sempre deve estar formando — e “refor­ mando” — uma teologia bíblica com base numa exegese sadia. Com bastante frequência, reconhecemos sem hesitar que a teologia de um determinado escritor bíblico se encontra em suas pressuposições e implicações, bem como em suas declarações explícitas.

Tudo quanto queremos fazer aqui é levantar algumas precau­ ções para os momentos em que nos dedicamos à tarefa da teologia, precauções estas que são o resultado direto da natureza ocasional

das epístolas. 1

1. Por causa da sua natureza ocasional das epístolas, às vezes, de­

vemos contentar-nos com algumas limitações da nossa compreensão teológica. Por exemplo, para levar os coríntios a perceber quão absur­ do era deixarem dois irmãos comparecerem diante dos tribunais pa­ gãos para receberem o julgamento, Paulo declara que, um dia, os cristãos julgarão tanto o mundo quanto os anjos (lC o 6.2,3). Contudo, nada além disso é dito no texto. Logo, podemos afirmar, como parte da escatologia cristã (nosso modo de entender os eventos finais), que os cristãos de fato exercerão julgamentos no último Dia. No entanto, simplesmente não sabemos o que isso significa, nem como será feito.

Além da p róp ria afirm ação, tudo mais é m era especulação.

Do mesmo modo, em ICoríntios 10.16-17, a partir da natureza da participação dos próprios coríntios na ceia do Senhor, Paulo argu­ menta que não podem participar de modo semelhante das refeições

no templo dos ídolos. O que Paulo diz acerca de tal participação realmente parece ir além da teologia da ceia achada na maior parte do protestantismo evangélico. Aqui não há nenhuma mera lembrança, mas sim a participação real do próprio Senhor. Com base em outros textos do Novo Testamento, poderemos ainda argumentar que a participação se dava por meio do Espírito e que os benefícios vi­ nham pela fé. Contudo, mesmo nesse caso, vamos além dos textos imediatos para expressar de modo teológico a compreensão de Pau­ lo, e muitas pessoas não concordariam com nossa escolha de textos adicionais. O que queremos dizer é que simplesmente não somos informados sobre qual era a natureza exata daquela participação e nem sobre como os benefícios advêm ao cristão. Todos nós desejam os saber tais informações, mas nosso conhecimento é defeituoso, exata­ mente por causa da natureza ocasional das declarações. O que é dito além daquilo que os próprios textos revelam não pode ter o mesmo peso bíblico ou hermenêutico daquilo que pode ser dito com base em exegese sólida. Portanto, estamos meramente afirmando que, nas Escrituras, Deus nos deu tudo quanto nos é necessário, mas não ne­ cessariamente tudo quanto queremos.

2. Às vezes, nossos problemas teológicos com as epístolas deri­

vam do fato de dirigirmos nossas perguntas a textos que, pela sua natureza ocasional, apenas respondem às perguntas referentes a eles. Quando pedimos que esses textos falem diretamente à questão do aborto, ou do novo casamento, ou do batismo infantil, nosso desejo é que eles respondam às perguntas de um período posterior. As ve­ zes, podem até fazê-lo, mas frequentemente não o farão, porque a questão não fora levantada naqueles tempos.

H á um exemplo claro disso no próprio Novo Testamento. So­ bre a questão do divórcio, Paulo diz: “não eu, mas o Senhor” (lC o 7.10). Em outras palavras, ele quer dizer que o próprio Jesus dera uma resposta àquela pergunta. No entanto, quanto à pergunta le­ vantada no ambiente grego sobre se o cristão deve divorciar-se de um cônjuge pagão, Jesus aparentemente não tivera oportunidade de falar sobre o assunto. O problema simplesmente ficava fora da cul­ tura judaica em que Jesus vivia. Paulo, porém, tinha de responder à pergunta, de modo que disse: “M as eu, não o Senhor” (v. 12). Natu­

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ralmente, um dos problemas é que nós mesmos não possuímos a autoridade apostólica de Paulo, nem sua inspiração. A única maneira segundo a qual podemos nos dirigir a tais perguntas é com base em uma teologia bíblica total, que inclui nosso modo de entender a cria­ ção, a queda, a redenção e a consumação final. Ou seja, devemos pro­ curar trazer ao problema uma cosmovisão bíblica. M as nada de usar textos como prova, quando não há textos imediatamente relevantes!

Essas, pois, são algumas das nossas sugestões hermenêuticas para ler e interpretar as epístolas. Nosso alvo imediato é obter maior exa­ tidão e consistência; nosso alvo maior é conclamar todos nós a ser­ mos mais obedientes às coisas que realmente escutamos e entendemos — e para demonstrarmos um comportamento aberto e caridoso para com aqueles que divergem de nós.

Narrativas do Antigo Testamento: