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2 (DES)MARCAÇÕES TEÓRICAS

3.3 Idas e vindas, chegadas e partidas

Não demorou muito para que o balaio de atribuições do então LABSHEX começasse a abarrotar. Para além do que foi sendo desenhado mesmo antes da

abertura do curso, esse espaço pedagógico virou depositário de toda e qualquer necessidade pedagógica que assim fosse entendida pela comunidade acadêmica e que não estivesse claramente contemplada em outro lugar no currículo.

Havia claro naquele momento que a formação era o principal nó a ser pensado, mas a quantidade de atribuições, facetas e possibilidades que o LABSHEX poderia assumir variava conforme aumentavam o número de pessoas em contato com a proposta. Havia um LABSHEX na percepção de cada pessoa daquele curso, o que aumentava em muito as possiblidades, mas também as expectativas. E essas expectativas, com tantas formas e tamanhos acabaram por construir diferentes percepções e lugares para o laboratório. E uma exigência cada vez maior quanto à precisão de chegada do egresso quando finalizado o curso.

Foi aprovada em meados de 2014 proposta levantada pelo colegiado do curso de que o LABSHEX incorporasse dentre suas atividades elementos de semiologia médica. Tal feito além de povoar a boa parte das atividades, tomou boa parte da carga horária disponível para o laboratório. Além disso, diminuiu em alguma medida a rejeição por parte de alunos e professores, que a partir de então viam utilidade e sentido para esse espaço. A mesma relação utilitária tão defendida pela razão instrumental, agora tomava forma dentro do espaço que deveria criticá-la.11

Nesse momento paira a lembrança de um antigo escrito de um professor risonho que surge nessa tarde quente do Agreste. O próprio chega afinal e se acomada num banco no canto da mesa, no caminho da brisa. Professor Ceccin pára de súbito um sorriso para esse duro aviso: era preciso fazer uma difícil escolha daqui para frente. Teríamos com isso:

“uma formação com precisão de chegada, não uma formação para a produção inventiva de territórios de operação do conhecimento. Se for uma educação tradicional, como ela formará egressos “transformados em seus imaginários”? Ela informará domínios do conhecimento, mantendo posturas práticas, ou claramente conformará condutas do conhecimento em forma de treinamento das novas gerações.”12

O que realmente a equipe pedagógica vinha traçando nessas idas e vindas?

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Bezerra, F. 2015 12

Para além de onde se quer chegar, qual o melhor caminho para essa tal transformação de imaginários?

A “semiologização” do Laboratório de Sensibilidades havia sido apontada por professor Emerson Merhy em apresentação realizada por parte da equipe pedagógica do LABSHEX em reunião ordinária de seu grupo de pesquisa, à época situado na UFRJ13. O mesmo referiu-se a essa “semiologização” como sendo parte de um processo maior, que o mesmo também nominou: a biomedicalização do LABSHEX. Era preciso proteger essa incubadora de saber sensível da própria medicina biomédica ocidental! Pessoas sábias dando nomes aos incômodos. Era preciso aprofundar escolhas. E isso iria acontecer.

Nesse momento, em meio à fortes críticas ao laboratório por parte de alguns estudantes e professores, a coordenação do curso encampou proposta ainda mais ousada: mesmo após chegada de alguns professores e professoras no curso, algumas saídas por licença maternidade poderiam propiciar a entrada de novas integrantes especialmente para interferir no desenho desse espaço pedagógico. Professoras com perfil de arte foram selecionadas para vagas de professoras substitutas. Professoras de arte em um curso de medicina. A medicina-arte, tão presente nos convites e discursos de formatura era difícil de ser propiciada. Algumas pessoas simplesmente não concordavam com essa necessidade, imaginavam que as competências específicas das formações de artes poderiam ser garantidas pelo então corpo técnico docente, mesmo havendo a negativa de boa parte desse próprio corpo técnico. E no meio dessa disputa de concepções, mudanças precisavam ocorrer, principalmente após boicote dos alunos às atividades do laboratório e abaixo-assinado contra a entrada das professoras de Artes (Dança e Artes Visuais). Chegadas e partidas de integrantes dessa equipe pedagógica foram moldando o que seriam as próximas transformações do LABSHEX. Foi proposto, em meio à reforma administrativa do curso, uma série de mudanças na distribuição de carga horária e no desenho metodológico as atividades. Foram descritas as possíveis linguagens abordadas e um redesenho do LABSHEX com separação de seus componentes em Laboratório de Sensibilidades (LabSensi) e Laboratório de

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O curso foi chamado a apresentar o que vinha sendo a proposta do LABSHEX com suas potências e desafios para a Linha de Linha de Pesquisa Micropolítica do Trabalho e o Cuidado em Saúde à época sediado na UFRJ. Esse foi um momento bastante importante para os rumos do que viria a ser esse espaço pedagógico. A equipe pôde mergulhar com mais profundidade em seus próprios propósitos e caminhos e pensar melhor o que viram a ser os próximos passos.

Habilidades foi proposto.

Importante frisar que a partir dessa definição toda a parte de habilidades estaria relocada a um outro ambiente pedagógico, outrora inserido (confundido?) com o que se propunha o ensino de sensibilidades dentro do curso. É bem verdade que deve haver saber sensível na ensinagem de habilidades, mas a “semiologização” apontada por professor Merhy vinha sim retirando potência desse espaço. O esgotamento da equipe por ter de criar espaços complexos, densos e uma obrigatoriedade auto-imposta em se promover a todo momento aprendizagens significativas além de todo o escopo de “habilidades semiológicas centradas na pessoa” era público e notório. O balaio do LABSHEX estava pesado demais.

A partir dessa formatação, a equipe do agora Labsensi pôde mergulhar mais a fundo no que seriam as suas competências e atribuições. A equipe tinha agora uma nova coordenadora que liderou importante trabalho de mergulho e descrição do que seriam as linguagens a serem trabalhadas nesse espaço. Um extenso trabalho foi realizado com todos os professores que de alguma maneira contribuem ou contribuíram com o Labsensi para a descrição das competências extraídas dos documentos oficiais que dialogam com o ensino de sensibilidades. As atividades relacionadas a essas competências foram distribuídas ao longo das séries e as linguagens melhor identificadas. São elas: linguagem cinestésica (que trabalham elementos das sensações e da corporeidade), linguagem visual e gráfica (trabalham elementos relacionados a novas formas de ver, sentir e expressar imagens), linguagem sincrética (trabalham de forma simultânea duas ou mais linguagens) e comunicação sutil no encontro clínico (trabalham elementos relacionados a comunicação, ao corpo na clínica, sentimentos na clínica e MCCP). As figuras demonstram o que seria a distribuição de cada uma dessas linguagens nos segmentos de reta que corresponderiam aos anos do curso:

Gráfico 3: Distribuição das linguagens do Labsensi no curso de medicina

Gráfico 4: Linguagens e temas do Labsensi

Essas eram terminologias até então desconhecidas pela comunidade acadêmica do NCV. Foi realizada apresentação específica para os grupos de cada

série do curso (a nova organização político-administrativa do curso) e para os estudantes. Um exemplo de distribuição de atividades conforme linguagens ao longo do segundo semestre do segundo ano está demonstrado na tabela 1:

2º Ano Temas Longitudinais/ Linhas avaliativas FEBRE, INFLAMAÇÃO E INFECÇÃO

DOR FADIGA, PERDA

DE PESO E