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Identificação de problemas

No documento ACALMA (páginas 61-67)

Parte II. Capacitação parental e aleitamento materno: Diagnóstico de necessidades e recursos

2.4. Análise de problemas

2.4.1. Identificação de problemas

Esta etapa possibilita aprofundar de forma sistemática a análise do problema central e foco da intervenção, tendo em conta que cada problema é causa e consequência de outros. Para tal, procedeu-se à elaboração de uma árvore de problemas29, cujos resultados se descrevem

sucintamente nos pontos seguintes.

.Problema central e efeitos.

Nesta fase está já bem presente a delimitação do problema central, expresso por “Dificuldades na adaptação à parentalidade”, que no âmbito do projeto tem como efeitos “Dificuldades nos cuidados ao bebé” e “Dificuldades no aleitamento materno”.

Estas dificuldades, são geradoras de “Níveis de stress elevados dos progenitores”, o que agrava ainda mais o processo e “Aumenta o recurso aos serviços de urgência hospitalar”, quer por insegurança, quer pela prestação de “Cuidados inadequados” ao bebé. Em ambos os casos “Aumenta o risco de morbilidade infantil”, sendo este incrementado também pelas “Dificuldades no aleitamento materno”, uma vez poderem conduzir ao “Abandono do projeto

29 A “árvore de problemas” é um instrumento de visualização caraterizado por uma estrutura gráfica que se

assemelha a uma árvore e resulta habitualmente da ordenação de problemas de acordo com a relação de causa/efeito existente entre esses problemas (Schiefer, et al., 2006). O tronco representa o ‘problema central’ e foco de atenção que reflete a inter-relação entre ‘Causa’: os problemas na raiz; e ‘Efeitos’ ou consequências destes: os problemas na copa.

de aleitamento materno” e ao “Desmame precoce”, com perda das vantagens nutricionais e imunitárias atribuídas ao leite materno.

.Causas.

O exercício para identificação das causas (problemas de raiz) é mais exigente, e no contexto do projeto, implica uma análise crítica à rede social de apoio identificada, uma vez que a qualquer um dos recursos sociais disponíveis na Região da Cova da Beira ou qualquer outro apoio a que os pais recorrem podem ser apontados alguns problemas e obstáculos passíveis de condicionar os resultados efetivos do apoio recebido.

Neste contexto, os informadores-chave identificaram como problemas relativos ao apoio informacional conseguido através de familiares, amigos e internet, o facto de frequentemente veicularem “informações erradas e pouco credíveis” (FGP6), sendo descrito pelas mães que

“em casa / família não foi fácil (cada um dá a sua opinião) o que ainda me stressou mais.”

(EM4); “E infelizmente há muita desinformação e as famílias (pais, tios, etc.) são as primeiras

a referir que o leite não é forte e não sei que mais (…) percebi que é muito fácil desistir-se e recorrer-se ao leite artificial se não tivermos apoio” (EM2). Os profissionais referem que o

mesmo se pode verificar com os GAM que não têm colaboração profissional. A existir, a principal lacuna é o desconhecimento da sua existência.

Um maior número de condicionantes especialmente relevantes identifica-se no principal recurso dos pais: o profissional. Se numa primeira análise, considerando os serviços existentes na região, parece não haver grande necessidade de novas ofertas, contudo numa análise mais profunda, comparando a oferta com os resultados, essas respostas não parecem produzir os efeitos desejados: “Há muito a fazer! (…) Nada está esgotado, pelo contrário: Há sempre algo

mais que pode ser feito para ajudar as mães” (EP1).

Efetivamente e com base nas entrevistas a ambos os grupos de informadores-chave, constatou- se alguma inconsistência na consideração de que os serviços existentes são insuficientes, parecendo que esse facto se prende mais com a adequabilidade e eficácia do que propriamente com o número de respostas disponíveis. Esta perspetiva é sustentada pela frequência com que é referida nas entrevistas e focus group, a falta de articulação inter e intrainstitucional, traduzida globalmente por um dos testemunhos recolhidos: “Não há verdadeira sinergia entre

os serviços e entre as instituições. (…) Cada um tem a sua forma de pensar e olha para ‘o seu próprio umbigo’… Enquanto não há uma visão sistémica para o importante: as mães (…) Parece- me que o problema é que cada um só olha para o próprio umbigo e para a sua árvore em vez de olhar para a floresta que é no fundo as mães, a amamentação e a autonomia dos pais”

(EP1).

A falta de articulação traduz-se numa deficiente comunicação intra e interinstitucional, que conduz à falta de eficácia no circuito de informações relativas ao utente e que condiciona a

continuidade de cuidados. Faz ainda emergir uma grave lacuna relativamente à uniformização dos ensinos e práticas, existindo diferenças e até contradições que dificultam ainda mais o processo de adaptação dos pais que perante um problema não conseguem discernir a melhor solução, ficando confusos e apreensivos.

A falta de comunicação e de articulação traduz-se igualmente no desconhecimento quer dos projetos existentes quer dos resultados por eles obtidos ou a ausência desses resultados pela falta de concretização dos objetivos das diversas iniciativas. Neste sentido é referido que muitas vezes o serviço existe “(…) está lá, é para se fazer, mas depois os objetivos e aquilo

que se pretende atingir não é totalmente atingido”(EP4) e “esse é o problema existem as "coisas " e teoricamente são ótimas mas do ponto de vista pratico não produzem efeitos, não envolve todos os profissionais que contactam com as utentes” (FGP5), e que por vezes nem

sequer têm conhecimento de supostos grupos de trabalho ou dos projetos que se estão a desenvolver: “Existem várias iniciativas mas o que acontece é que cada um faz o seu trabalho

e não se preocupa em envolver mais ninguém” (EM5).

Ainda assim ambos os grupos referem a insuficiência de respostas pela “Falta de serviços

públicos e inexistência de particulares (…)” (EM4), existindo lacunas no que se refere à

disponibilização de equipamentos de apoio ao aleitamento materno e de serviços de acompanhamento pós-natal presencial e com demonstração prática.

Neste contexto, o suporte informacional fornecido no pré e peri-parto, é considerado insuficiente, sendo referido que a “Teoria não é suficiente (…), depois do bebé nascer há

sempre coisas e dúvidas que surgem sobre assuntos que não foram abordados… Deveria haver mais acompanhamento no pós-natal” (EP1). Este problema é ainda agravado pela alta precoce

dado que “na maternidade o tempo é pouco para sairmos a saber lidar com tantos detalhes” (EM1) e “os internamentos são cada vez mais curtos e as duvidas, de facto, surgem em casa.” (FGP4).

De facto, são abordados muitos temas em teoria e praticados em bonecos, contudo após o nascimento, as coisas não são tão simples: o bebé chora, mexe-se, escorrega, não mama… As respostas não se obtêm apenas com a teoria: “tu podes ler e ouvir dos profissionais muita

teoria. Mas quando se leva um filho para casa essa teoria é insuficiente e precisas de alguém para te dar ajuda pratica, pois aí já tens o teu filho contigo, com as particularidades dele”

(EM5). Mães e profissionais consideram necessária demonstração prática e opções para cada problema particular e para cada família particular: “Falta um local, falta…algo…falta um

espaço onde as pessoas possam ir quando precisam e não quando nós achamos que elas precisam; onde possam estar à vontade, onde possam falar e tirar dúvidas e falar até mesmo com os mesmos pares onde possam praticar” (EP4); “falta um serviço adaptado a cada situação, a cada mãe, a cada bebe. Um serviço personalizado e com uma resposta rápida e eficaz” (EM4); “Um lugar onde me ensinasse a fazer melhor. No meu caso foi com a amamentação” (EM3),

referindo também “que deveria haver outros locais /instituições/associações que pudessem

dar apoio, tirar dúvidas, onde se realizaria workshops e que pudesse abranger toda a população” (FGP1).

Assim, importa referir outro obstáculo identificado pelos profissionais: a “Falta de recursos

económicos e de pessoal para implementar projetos que estão no papel.” (EP2), ou para

aumentar a capacidade de resposta às solicitações, nomeadamente as aulas de preparação para o parto que implicaria mais custos com pessoal para aumentar o número de grupos.

A falta de recursos condiciona também a eficácia de outras iniciativas existentes a nível dos serviços públicos, realizadas em contexto de sobreposição de tarefas: os enfermeiros “encaixam” o apoio telefónico e presencial com demais tarefas inerentes aos serviços de internamento ou de saúde comunitária a que estão afetos, condicionando a disponibilidade para prestar apoio e aconselhamento, pela sobreposição de procedimentos.

Cada bebé, cada díade mãe/bebé, cada família tem caraterísticas próprias, individuais e únicas, que exigem atenção e soluções adaptadas ao caso, impossíveis de otimizar através de chamadas telefónicas, ou de uns minutos que se conseguem entre procedimentos e que levam por vezes os pais a sair do centro de saúde ou hospital, com o mesmo problema com que entraram. Faz-se “o que se pode” e “da melhor maneira que se consegue.” (EP3). Contudo, o que se faz e o que se consegue não é suficiente, e o que há “Não satisfaz as nossas

necessidades” (EM3).

Na Tabela 8 sintetizam-se os problemas atrás descritos, identificados por ambos grupos de informadores-chave no focus group e entrevistas (Tabela A2 no Anexo 2; e Tabelas A5 e A6 no Anexo 3, respetivamente), como causas de dificuldades de adaptação à parentalidade definidas para o âmbito de incidência do projeto.

Tabela 8. Identificação de obstáculos à eficácia dos apoios a que os pais recorrem

PROBLEMAS IDENTIFICADOS PELOS INFORMADORES-CHAVE

APOIOS Profissionais Mães

Familiares e Amigos Informações erradas/pouco credíveis Informações erradas/pouco credíveis Internet Informações erradas/pouco credíveis -

Grupos apoio mútuo Informações erradas/pouco credíveis Desconhecimento projetos/ resultados Desconhecimento dos projetos

Profissionais Falta de articulação das várias entidades Falta de articulação das várias entidades

Circuito de informação ineficaz -

Falta de uniformização informação/práticas Falta uniformização informação Desconhecimento projetos/ resultados Desconhecimento/desinteresse projetos Falta de recursos materiais/humanos Falta de recursos humanos

Falta de iniciativas na comunidade Falta de iniciativas na comunidade Falta iniciativas pós-parto Falta iniciativas pós-parto

Da análise de contexto e dos testemunhos constata-se que as causas ou problemas raiz podem traduzir-se em duas categorias principais: Recursos inadequados e Recursos insuficientes, assumindo-se a existência de uma terceira categoria referente a Problemas associados. Nos Recursos inadequados incluíram-se o Acesso a informações erradas ou pouco credíveis advindas de familiares, amigos, internet ou grupos de apoio mútuo sem colaboração de profissionais; a Falta de uniformização de informações e práticas e consequentes informações contraditórias; a Falta de articulação intra e interinstitucional; o Circuito de informação ineficaz e a Falta de conhecimento e/ou desinteresse pelos projetos e resultados.

Nos Recursos insuficientes englobaram-se a Falta de recursos materiais e humanos; a Falta de iniciativas quer sejam públicas quer da sociedade civil, nomeadamente as respeitantes a Falta de acessibilidade a equipamentos de apoio ao aleitamento materno, de Iniciativas de acompanhamento presencial pós-natal e com componente prática.

Relativamente aos Problemas associados, consideraram-se fatores de índole económica, cultural, socio demográfica e política, capazes de influenciar os apoios a que os pais recorrem. Neles consideraram-se os Fracos recursos económicos das famílias; as caraterísticas da família, designadamente a prevalência de Famílias nucleares, o fraco contacto e Inexperiência com crianças pequenas, as próprias Caraterísticas do bebé e o regresso do Parto domiciliar. Incluíram-se também fatores identificados e abordados na Parte I deste projeto como passíveis de afetar as respostas existentes, os apoios recebidos e incrementar as lacunas, nomeadamente a Alta precoce (também identificada pelos informadores-chave), a Falta de concretização das políticas de saúde e a própria contenção orçamental do Estado.

As relações consideradas mais importantes, apresentam-se na Ilustração 2, onde se esquematiza a integração dos vários elementos da identificação de problemas, através de um diagrama representativo da árvore de problemas.

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Ilustração 2. Diagrama representativo da Árvore de problemas

RECURSOS INSUFICIENTES DIFICULDADES NA ADAPTAÇÃO À PARENTALIDADE RECURSOS INADEQUADOS DIFICULDADES NO ALEITAMENTO MATERNO DIFICULDADES NOS CUIDADOS AO BEBÉ Desmame precoce Cuidados inadequados Aumento recurso ao S.Urgência Elevados níveis de stress progenitores Falta articulação intra e interinstitucional Falta de iniciativas de acompanhame nto presencial pós-natal Falta de iniciativas públicas e comunidade Falta conhecimento projetos e resultados Falta uniformização informações e práticas Falta de iniciativas componente prática Falta de acessibilidade eq. apoio aleitamento materno Aumento da morbilidade infantil Abandono do projeto de aleitamento materno PROBLEMAS ASSOCIADOS Alta precoce Falta concretização políticas saúde Contenção orçamental Estado Parto domiciliar Inexperiência com crianças pequenas Famílias nucleares Caraterísticas do bebé Fracos recursos económicos das famílias Falta de recursos materiais e humanos Acesso a informações erradas/ Contraditórias Circuito de informação ineficaz EFEITOS PROBLEMA CENTRAL CAUSAS

No documento ACALMA (páginas 61-67)