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2.1 A leitura dos etnotextos na mídia digital

2.1.3 A “ideologia de gênero” no JM notícia

Em 20 de fevereiro de 2016, foi publicado um texto, sem autoria identificada, intitulado “Livros didáticos que falam sobre uso de camisinha, união entre gays geram polêmica no TO”. O contexto histórico se refere à retirada de livros com a temática de gênero e diversidade sexual em algumas cidades do Tocantins. O texto não define explicitamente a expressão ideologia de gênero. Mas chama de “livros didáticos de ideologia de gênero” aqueles que mostram as diversas constituições familiares ou que promova a utilização de preservativos/camisinhas. Apresenta que tanto em Araguaína, Palmas e Gurupi houve debate nas casas legislativas para a retirada desse material de circulação tendo em vista que seus PME baniram esses temas. O argumento que mais aparece é que as crianças não estão prontas para receber esses conteúdos e que esse debate deve se restringir ao espaço da família.

Figura 9 - Captura da tela de etnotexto sobre a “polêmica” em torno dos temas sobre uso de

camisinha e união entre pessoas LGBT.

Fonte: JM Notícia

Nesse mesmo dia foi publicado um texto assinado “da redação” com o título “Feliciano chama OAB do Tocantins de leviana e Movimento Conservador repudia nota da OAB”. O contexto histórico ao qual se refere é sobre uma nota de repúdio que a OAB emitiu sobre o evento do movimento conservador do TO na Assembleia Legislativa. A matéria traz na íntegra uma “nota de repúdio” à nota de repúdio da OAB sobre a reunião do movimento

57 Tentamos fazer um pequeno histórico, mas não encontramos nem no site nem nos e-mails que enviamos para a redação do jornal. Sua página na internet pode ser acessada em: www.jmnoticia.com.br

conservador que ocorreu na Assembleia Legislativa do TO com a presença de Marisa Lobo e Marco Feliciano. A nota chama a teoria de gênero de “um tema de esquerda” que tem sido usado para “intencionalmente confundir a população”. Afirma que a educação moral é dever da família com base no pacto de São José da Costa Rica (Conhecida como a Convenção Americana dos Direitos Humanos). Ele se baseia no artigo 12, inciso 4, que diz: “Os pais, e quando for o caso os tutores, têm direito a que seus filhos ou pupilos recebam a educação religiosa e moral que esteja acorde com suas próprias convicções.” Esse dispositivo jurídico garante que os religiosos terão direito a educação moral de acordo com suas crenças, mas não que todas as escolas deverão se eximir de temas da educação moral. O autor da nota de repúdio afirma que moral é indissociável da religião.

No dia 19 de fevereiro de 2016 foi publicado um texto assinado pela redação intitulada “Palestra com Marco Feliciano e Marisa Lobo lota auditório da AL TO”. No texto Marco Feliciano se apresenta como perseguido político porque foi contra o “Kit Gay” (Kit escola sem homofobia do governo federal)58. Afirma que a “ideologia de gênero” é um perigo para a família e dá o exemplo das famílias francesas que estariam sendo esfaceladas “pelos movimentos libertários”.

Figura 10 - Captura da tela de etnotexto sobre o debate de Eli Borges, Marco Feliciano e

Marisa Lobo na Assembleia Legislativa do Tocantins.

Fonte: JM Notícia

Nesse mesmo dia ainda foram publicadas mais três matérias sobre esse evento na Assembleia Legislativa. A matéria intitulada “Durante debate com Marco Feliciano, Eli Borges defende a família tocantinense” apresenta o deputado Eli Borges e a sua luta contra a destruição da família, contra os movimentos hedonistas e contra a quebra dos valores cristãos. O texto deixa claro que esse movimento considera o “kit gay” ago “famigerado”. Ele afirma

58

Esse material foi produzido pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação em parceria com o Governo Federal e diversos segmentos da sociedade. O objetivo do material era de “alterar concepções didáticas, pedagógicas e curriculares, rotinas escolares e formas de convívio social que funcionam para manter dispositivos pedagógicos de gênero e sexualidade que alimentam a homofobia”. Dentre seus objetivos específicos ele se propunha a promover reflexões, desenvolvimento da criticidade juvenil e a estimulação aos direitos humanos. O material era composto de um caderno com textos teóricos, exercícios e instruções, bem como boletins e três audiovisuais. (CADERNO, [201-]).

que a sociedade é baseada no tripé sagrado “Família, igreja e escola”. Uma outra intitulada “Terciliano Gomes, vereador de Araguaína é elogiado por Feliciano em Palmas” informa que Araguaína foi a primeira cidade do Estado e a segunda do Brasil a pedir a retirada dos livros de ideologia de gênero. Eles deixam claro que a política é do MEC e não da sociedade, já que esta se juntou em peso para ir contra essa ideologia de gênero. E a outra matéria de apenas três parágrafos mostra a crítica do apóstolo Sérgio Paulo, advogado e líder da igreja internacional da renovação e presidente do Conselho Interdominical dos Ministros do Evangelho do Tocantins (CIMETO), à nota de repúdio da OAB sobre o evento do movimento conservador na Assembleia.

No dia 18 de fevereiro de 2016 foi publicado um texto assinado por Isabel Braga intitulado “Bancada evangélica sai vitoriosa em questões sobre aborto e gênero nesta quinta”. Contexto histórico: votação da MP 69659. A autora afirma que ideologia de gênero “nada mais é do que a destruição da família”. Seria um projeto de esquerda “que vai além da defesa dos direitos de homens e mulheres, podendo abrager a comunidade LGBT”. (Em sua fala dá a entender que gays não são “homens” e “mulheres”).

Figura 11 - Captura da tela de etnotexto sobre a “vitória” da bancada evangélica contra os

temas de aborto e gênero.

Fonte: JM Notícia

Também no dia 18 de fevereiro de 2016 foi publicado um texto intitulado “Vídeo: deputado diz que “ideologia de gênero é destruição da família brasileira”. Esse texto também fazia referência à aprovação da MP 696. Afirma o deputado Sóstenes Cavalcante que a “ideologia de gênero nada mais é do que a destruição da família, célula mater e base da sociedade”. O deputado se admira de como os argumentos da perspectiva de gênero estão infiltrados em todos os espaços do mundo, até na ONU. “Essa ideologia de gênero é defendida a nivel mundial, infiltrada até na ONU…”. Ao final da reporagem o deputado elogia a

59 Dispunha sobre a organização da presidência da República e dos Ministérios - em especial atribuindo o “planejamento de gênero que contribua na ação do Governo Federal e das demais esferas do governo para a promoção dos direitos de homens e mulheres” ao extinto Ministério das mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos.

iniciativa da cidade de Nova Iguaçu, RJ sobre a retirada de livros, materiais didáticos, filmes e cartazes com a “temática da diversidade sexual”. (Aqui vemos bem claro que não se pode fazer propaganda da diversidade sexual, somente da heterossexualidade já que a cidade, a TV, as revistas, os livros e filmes todos expressam bem a heterossexualidade e nem por isso há projetos de prefeitos ou deputados para banir tal “propaganda”).

Figura 12 - Captura da tela de etnotexto sobre a retirada de livros didáticos que tratem de

gênero e sexualidade.

Fonte: JM Notícia

No dia 16 de fevereiro de 2016 foi publicado um texto intitulado “Vereador pede a suspensão dos livros didáticos distribuídos no Município”. Contexto histórico: proibição de circulação de livros do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) 2016 sobre “ideologia de gênero”. O texto afirma que o PME de Gurupi foi aprovado com participação popular deixando de fora de suas estratégias as temáticas morais e da ideologia de gênero. Assim indaga-se o prefeito Laurez Moreira e o Secretário de Educação Euripedes Fernandes que suspendam a circulação dos livros didáticos com essa temática: gays, lésbicas, bigamia, poligamia, “bissexualismo”, “transsexualismo”, os corpos, os prazeres e métodos anticonceptivos que deveriam ser temas a serem tratados pelas famílias e não pela escola.

Figura 13 - Captura da tela de etnotexto sobre a suspensão de livros que tratem de gênero e

sexualidade.

Fonte: JM Notícia

No dia 11 de fevereiro de 2016 foi publicado um texto assinado por Katiúscia Gonzaga intitulado “Vereador pastor João Campos requer a suspensão da distribuição dos livros didáticos com ideologia de gênero”. Contexto histórico: proibição de livros em Palmas. O pastor que foi relator do PME de Palmas, afirma ter feito um bom trabalho apresentando “14 consideráveis emendas” ao PME por estar “preocupado com a possibilidade de o texto deixar brechas para a passagem da ideologia de gênero nas escolas”. O texto traz: “A teoria de gênero (chamada de ideologia por ser uma teoria fundada apenas em bases teóricas) afirma que ninguém nasce homem ou mulher e que o gênero é uma construção social e cultural. Para os defensores dessa teoria, uma criança não pode ser considerado do sexo masculino ou feminino, mas somente uma pessoa do gênero humano”. O texto também apresenta que o vereador João Campos já propôs o projeto da escola sem partido afirmando que a escola deve ser neutra e não deve “difundir uma determinada posição” (só isso já é uma posição!!).

Em 4 de fevereiro de 2016 foi publicado um texto sem autoria intitulado “MEC é cobrado a revisar conteúdos de livros didáticos por erotizar crianças de 6 a 10 anos”. Contexto histórico: debate na câmara federal sobre proibição de livros com base no PNE. O deputado federal Elizeu Dionizio argumenta que 11 editoras selecionadas pelo PNLD/2016 trazem livros com a temática da ideologia de gênero e como esse tema foi retirado do PNE, ele não poderia estar presente nos livros didáticos. O deputado afirma que os livros trazem conceitos diversos de família, o que contraria a CF no artigo 226 que fala da família formada por um homem e uma mulher60. A notícia traz uma fala do deputado que afirma ser a “ideologia de

60O que não é de todo uma verdade. Eles usam informação para ludibriar. A CF diz que é reconhecida a união

estável entre homem e mulher como entidade familiar. A CF não diz que é somente, mas dá reconhecimento à união estável, mas somente à união estável entre homem e mulher. O que o CNJ fez foi expandir esse conceito para pessoas do mesmo sexo. Veja que no parágrafo quatro diz: "§ 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes." Isso já expande o conceito de família ao dizer que família, ou entidade familiar, pode ser também somente um dos pais. Ora, imagine um dos pais, mesmo que seja biológico, se ao depois de ter o filho se assume gay, ele não vai ser um pai gay tendo unidade familiar? O parágrafo quatro acabou de afirmar que sim!! Assim, entendemos que o conceito constitucional de família não é somente aquele realizado entre um homem e uma mulher, afinal, a definição constitucional de família é somente de que ela é a base da sociedade e tem especial proteção do estado.

gênero” uma fantasia que quer se tornar realidade de tanto ser repetida nas escolas. Afirma ainda que os pais têm direito sobre a educação dos filhos, assim ele podem comunicar a escola que não desejam receber tal instrução. Assim, ele dá um site para baixar uma notificação extrajudicial elaborada por um procurador: www.bit.ly/protegerfamilias (que não está mais no ar, mas ao se pesquisar no google podemos encontrar a notificação extrajudicial).

Em 23 de janeiro de 2016 foi publicado um texto sem autoria, mas dá a entender que a “reportagem” é uma adaptação de um artigo de Orley José da Silva (professor e mestre em linguística; também é pastor). O título da matéria é: Livros didáticos do MEC para 2016 trazem ideologia de gênero. A notícia é uma defesa sobre a família e o direito da família em manter-se tradicional por influências históricas e religiosas e critica o PT por ser o grande orquestrador dessa tentativa de mudança. O material expresso nessa reportagem está disponível em um blog (SILVA, 2015) que apresenta alguns argumentos de Orley José da Silva para a não aceitação da “ideologia de gênero”. Ele afirma que

De acordo com a Ideologia de Gênero, os seres humanos não se dividem em dois sexos e as diferenças biológicas e naturais não contam para a definição do homem e da mulher, mesmo diante das diferenças anatômicas. As pessoas tornam-se homens ou mulheres, ou adquirem esses papéis, com o passar do tempo, de acordo com o contexto histórico, social e cultural. Em vista disso, as crianças devem ser criadas e educadas de forma “neutra” para que elas mesmas escolham o Gênero no futuro, independente da identidade dos seus corpos. A escolha, no entanto, nem sempre é definitiva porque é visto como normal ao homem gostar de mulher em determinado período da vida, de homem em outro momento, ou gostar de ambos. Da mesma forma, é considerado normal que o mesmo fenômeno ocorra também com as mulheres. Essa ideologia recomenda à escola a não classificar os alunos em meninos ou meninas, mas crianças. As roupas e suas cores, brinquedos e banheiro, é melhor que sejam compartilhados igualmente por ambos os sexos, sem as conhecidas diferenciações marcadas pela cultura tradicional. Todas essas medidas são consideradas importantes porque propiciam um ambiente de igualdade e neutralidade necessário ao processo de definição do Gênero por parte das crianças. [...] Isso não é ciência, devemos destinar recursos para campos “verdadeiramente científicos”: Na própria universidade, há questionamentos sobre os gastos públicos com disciplinas ligadas ao Gênero criadas para espalhar a ideologia nos mais diversos cursos de graduação, especialmente nas licenciaturas, e também na pós-graduação. As interpelações internas à universidade são mais contundentes quando se analisa a função dos grupos de pesquisa e da produção de dissertações e teses. Em parte, essa produção acadêmica é financiada pela CAPES e pelo CNPq, além de agências de fomento estaduais. A crítica corrente diz respeito à necessidade de racionalizar a aplicação do escasso dinheiro público para a pesquisa científica, haja vista que o país carece, prioritariamente, é de encontrar o rumo para o desenvolvimento educacional, científico e tecnológico. O embate entre duas vertentes: O que está em discussão neste momento é a possibilidade de se aprimorar e tornar compulsório o ensino da Ideologia de Gênero para crianças e adolescentes em creches, cmeis de

escolas públicas e privadas. Uma ideologia ainda em desenvolvimento, muito controversa, que substitui a heteronormatividade (eixo no qual as crianças são criadas em nossa sociedade) pela homonormatividade. É justamente esta substituição que se constitui no principal ponto de discórdia entre os dois grupos. Outro ponto de discórdia igualmente importante é a proposta de fazer com que as crianças educadas pela escola nessa ideologia assumam a tarefa de mudar a visão de suas famílias e da sociedade (SILVA, 2015).

No dia 23 de dezembro de 2016 foi publicado um texto de autoria de Katiúscia Gonzaga intitulado “Plano municipal de educação é aprovado sem a inclusão da ideologia de gênero”. O texto se refere ao contexto histórico da aprovação do PME de Palmas. Informa que o pastor João Campos afirma ter apresentado 14 consideráveis emendas, das 54 apresentadas ao todo. Afirma o texto que aquelas 14 emendas retiraram toda brecha de possibilidade de se trabalhar o tema nas escolas. Essa informação já fora noticiada acima. O que mais chama atenção nesta reportagem é a defesa do eleitorado cristão e dos pilares, ou fundamentos legais, para a comunidade, a saber: “A constituição federal, o código civil e a Bíblia Sagrada”.