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Neste capítulo, demonstro como a Igreja modificou sua visão de mundo depois do Concílio do Vaticano II, na década de 1960. Essa mudança implicou também na mudança da participação leiga nas pastorais. Participação promovida pela abertura da estrutura católica com o objetivo de popularizar a Igreja, haja vista o descrédito da mesma junto à opinião pública internacional. Descrédito advindo de diversos escândalos financeiros na Europa. Situações não resolvidas que levaram à falência o Franklin National Bank em 1974, e o banco Ambrosiano, que pertencia ao Vaticano, em 1982. Apesar de todos os escândalos, quando a justiça italiana decretou a prisão dos envolvidos, eles permaneceram dentro dos muros do Vaticano sob a proteção do papa João Paulo II (Watson, 1999). Atitude que contribuiu ainda mais para o descrédito da Igreja que, “não reconhecendo publicamente sua culpa, o Vaticano, até 1994, havia pagado 250 milhões de dólares às vítimas da falência fraudulenta do banco Ambrosiano” (Watson, 1999, p. 147). Tais situações contribuiriam para mudar a visão de mundo da Igreja, ou pelo menos, para mudar a sua estratégia de ação.

Mudou a visão religiosa do mundo católico, mas também mudaram os interesses das ciências em estudar a sociedade. A compreensão das ciências sociais sobre o Estado também mudou83, a tal ponto de não se falar mais na neutralidade do Estado e nem mesmo nas liberdades individuais, afinal os indivíduos estão presos em engrenagens ou redes sociais. Sobre a possível neutralidade nas visões de mundo, disse Jürgen Habermas(2007, p. 128):

A neutralidade em termos de visões de mundo, que impregna o poder do Estado, o qual garante iguais liberdades éticas para cada cidadão, não se coaduna com a generalização política de uma visão de mundo secularista. Cidadãos secularizados não podem, à proporção que se apresentam no seu papel de cidadãos do Estado, negar que haja, em princípio, um potencial de racionalidade embutido nas cosmovisões religiosas, nem contestar o direito dos concidadãos religiosos a dar, em uma linguagem religiosa, contribuições para discussões públicas. Uma cultura política liberal pode, inclusive, manter a expectativa de que os cidadãos secularizados participarão dos esforços destinados à tradução – para uma linguagem publicamente acessível – das contribuições relevantes, contidas na linguagem religiosa.

83 - Otávio Guilherme Velho, “Processos Sociais no Brasil pós-64: as ciências sociais”, o foco das ciências sociais muda no período pós-1964. In: B. Sorj & Maria H.T. Almeida, “Sociedade e Política no Brasil pós-64. São Paulo: Brasiliense, 1984.

As sociedades argentina e brasileira viveram transformações profundas na década de 196084. Movimentos culturais e sociedades alternativas eclodiram. A pedagogia de Paulo Freire, cujo lema era a educação como prática da liberdade iria influenciar a práxis eclesiológica85 do catolicismo a tal ponto que no ano de 1966 estavam matriculados em programas de alfabetização mais de trinta mil alunos (Kadt, 2003, p. 197). Movimentos feministas lutavam para a libertação sexual da mulher e, com a chegada da pílula anticoncepcional, se conseguiu a mudança de comportamento social nesse quesito da sexualidade. Era a idade do ouro, segundo Eric Hobsbawm, quem também diz que “A melhor abordagem dessa revolução cultural é através da família e da casa, isto é, através da estrutura das relações entre os sexos e gerações” (1995, p. 314).

Num artigo de Ruth Cardoso (In: Dagnino, 1994), explica-se o fato de que muitos desses movimentos sociais representavam mudança no cenário político latino- americano, pois era a quebra da hegemonia do clientelismo político como modo de atuação do sistema político tradicional. Em outras palavras, as sociedades brasileira e argentina estavam acompanhando as transformações que aconteciam em outros países no hemisfério norte, especialmente a ruptura que se dava entre os valores tradicionais e a perspectiva de novos valores, como diz Edgar Morin (2001, p. 17):

A ética não poderia ser ensinada por meio de lições de moral. ...todo desenvolvimento verdadeiramente humano deve compreender o desenvolvimento conjunto das autonomias individuais, das participações comunitárias e da consciência de pertencer à espécie humana.

Escreve Ruth Cardoso (In: Dagnino, 1994, p. 82): “Como a participação representava essa mudança, ela era, quase fazendo um chavão, uma participação anti- Estado, antipartido, anti-sistema político em geral, sendo o Estado realmente visto como um inimigo”. Apesar das críticas dirigidas às organizações tradicionais, entre elas a eclesiástica, alguns desses movimentos iriam se abrigar na Igreja, ou pelo menos buscar apoio dos bispos progressistas. Isso acontece, por exemplo, quando o golpe militar se instala no Brasil, mas essa atitude não se deu na Argentina quando ali também aconteceu o golpe militar.

84 - Além do regime militar, o capitalismo contemporâneo requeria a participação do Estado no desenvolvimento do trabalho, exigindo “a reformulação das esferas pública e privada, assim como a das necessidades institucionais e ideológicas, que articulam entre si” (Sorj & Almeida, 1984, p. 15).

85 - Paulo Freire, “Concientización”, Buenos Aires, Busqueda, 1974; “Pedagogia do Oprimido”, Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1975; “Acción Cultural para la Libertad”, Argentina, Tierra Nueva, 1975, entre outros editados quase que simultaneamente na Argentina e no Brasil.

Na Argentina, o golpe militar terá em muitos bispos o apoio necessário, escreve Horacio Verbitsky (2006). Outra crítica vem de Luisa Ripa Alsina (2006, p. 2): “La Iglesia argentina en la representación de su Episcopado tuvo un papel por lo menos tímido y de omisión, cuando no cómplice convencido de la necesidad de reprimir y matar en algunos de sus miembros”. Ambos concordam que exceção deve ser feita a uma minoria; entre ela está o bispo da cidade de Quilmes, Dom Jorge Novak, que num ato político e religioso, ao abrir as portas do templo para receber muitos familiares de desaparecidos vítimas do regime militar, “los escuchó, los alentó, presentó sus causas tanto en la autoridad militar correspondiente como en el Vaticano y rezó con ellos una misa por mes en la que se pedía la restitución con vida de los miles de desaparecidos” (Alsina, 2006, p. 1).

Mudanças que atingiram as sociedades argentina e brasileira atingiram também a Igreja durante e, mais ainda, depois do Concílio do Vaticano II. Em 1964 o golpe militar acontece no Brasil e, por influência dos Estados Unidos, os golpes se espalharam pela América Latina, como registra Romero (2006, p. 145): “Em 1965, em uma reunião de comandantes do Exército norte-americano em West Point, ele (Onganía) manifestou sua adesão à chamada ‘doutrina de segurança nacional’”, e no dia 28 de junho de 1966, os comandantes-chefes depuseram o presidente Ilia para assumir a presidencia o general Juan Carlos Onganía, que ficaria no poder entre 1966 a 1970. Durante os regimes militares que se instalaram na Argentina e no Brasil, a Igreja posicionou-se até certo ponto de maneira passiva, mais homogênea na Argentina e mais fragmentada no Brasil.

A Igreja via com bons olhos os golpes militares, pois impunham a rigidez da moral católica na sociedade argentina censurando “novos costumes, como as minissaias ou o cabelo comprido, expressões dos males que, segundo a Igreja, eram a ante-sala do comunismo: o amor livre, a pornografia, o divórcio” (Romero, 2006, p. 162). Politicamente a Igreja estava em harmonia com o regime militar, ela tinha receio de que episódios como o do sacerdote guerrilheiro colombiano Camilo Torres, morto em 1966, pudesse comprometer a imagem da Igreja junto aos militares. No ano de 1968, no entanto, poucas e quase inexpressivas atitudes isoladas perturbaram o acordo da Igreja com o regime militar. A Conferência Episcopal Latino-Americana, realizada em Medellín, na Colômbia, no ano de 1968, encorajou o engajamento da Igreja na luta pelos pobres e oprimidos. Os documentos dessa reunião influenciaram menos os bispos que os católicos leigos, estes se reuniram para apoiar e trabalhar pelos menos favorecidos rotulados de oprimidos pela situação política e econômica (Romero, 2006).

Os discursos da época misturavam esperanças escatológicas do socialismo utópico ao apocalipse católico, permeado de nacionalismos. Contra essas opressões, como diziam os contra, só tinha uma solução que era a luta armada. Em 1967 surgem grupos de revolucionários da esquerda peronista: FAP (Forças Armadas Peronistas), FAR (Forças Armadas Revolucionárias), Descamisados, FAL (Forças Armadas de Libertação), e, em 1970, os Montoneros. Grupos que chegaram a ocupar cidades argentinas (Romero, 2006, p. 174). A Igreja, apesar de se colocar discursivamente ao lado dos pobres, apoiou os militares justificando a tomada do poder por eles e sua continuidade (Romero, 2006). Se o discurso da Igreja foi de apoio aos pobres, sua ação menos os favoreceu.

Outro golpe militar acontece na Argentina no dia 24 de março de 1976. Na oportunidade, a presidente democraticamente eleita Maria Estela Martínez de Perón foi destituída por uma Junta de Comandantes encabeçados por aquele que viria a ser o presidente, general Jorge Rafael Videla. É provável que os golpes não sejam unilaterais, eles contam com o apoio de considerável número de organizações da sociedade, até mesmo da ala esquerda que havia ficado satisfeita com o fim da democracia ‘burguesa’ (Romero, 2006). No ano de 1979, segundo Romero, o regime militar começa a se enfraquecer e, aproveitando-se disso, a Igreja muda da passividade para a atitude de denúncia aos males provocados pelo regime militar: “A Igreja também mudou seu comportamento à medida que o regime militar começava a dar sinais de fraqueza” (2006, p. 215).

No ano de 1979, dentro da Igreja na Argentina é criada a Comisión Diocesana de Justicia y Paz, para tratar da questão dos desaparecidos políticos, cujas mães fizeram a famosa manifestação na Catedral de Quilmes, onde ficaram conhecidas como “las Madres de Plaza de Mayo”. Apesar de essas mães protestarem por seus filhos e maridos desaparecidos durante a ditadura militar (cerca de 30.000 segundo Alsina, 2006), a cúpula da Igreja Católica, inicialmente, não se manifestou. Alsina (2006, p. 2), escreve: “la jerarquía episcopal tuvo implicancia, por acción u omisión, en el genocidio”. Sendo a Igreja de caráter universal (católica), não é lícito falar de uma Igreja única naquele período, mas sim, de uma Igreja plural e com múltiplas visões de mundo, logo, com atuações diferentes e muitas vezes contraditórias, como expressa Marlúcia Menezes de Paiva (2006, p. 35): “Igreja plural com pluralidade de tendências que se traduzem em exteriorizações múltiplas, mas que em última instância se apresenta como um corpo único”. Sobre isso escreve Luis Alberto Romero (2006, p. 215):

A hierarquia eclesiástica – com algumas exceções importantes, como a do bispo de La Rioja, Angelelli, provavelmente assassinado – aprovou a associação que os militares faziam em suas declarações públicas entre terrorismo de Estado e virtudes cristãs, calou todas as críticas, justificou de forma pouco velada a chamada erradicação da subversão atéia, e chegou mesmo a tolerar que alguns de seus membros participassem nela diretamente.

A pluralidade política no interior intelectual da Igreja não é suficiente para que haja dispersão de propósitos quanto às questões centrais da família como a educação e a sexualidade. A Igreja faz, portanto, a opção em não se envolver diretamente com as questões sociais e políticas, preferindo voltar a sua atenção para a sociedade que se tornava mais laica, sem os valores católicos, e mais fragmentada. Mesmo que Antonio Gramsci (1978, p. 144) tenha escrito na Itália que “toda religião, inclusive a católica, é na realidade uma multidão de religiões distintas, freqüentemente contraditórias”, não invalida o fato de a Igreja agir como corpo único nesses países onde aconteciam transformações profundas nos aspectos culturais. Por outro lado, não a isenta das contradições dentro da própria Igreja, pois ela também é reflexo da sociedade (Durkheim, 1989). Exemplo dessa contradição é o documento elaborado no ano de 1981, “Igreja e Comunidade Nacional”, afirmando os princípios republicanos e fazendo a opção pela democracia. Tal documento é contraditório uma vez que a Igreja é privilegiada por regimes autoritários, absolutos, mas não o é na democracia. A democracia pressupõe a liberdade de opiniões, de decisões, coisas incompatíveis com a pretendida sociedade perfeita da Igreja.

Hobsbawm se refere às décadas de 1960 e 1970 como as da liberação sexual tanto heterossexual como homossexual (1995, p. 316). Hobsbawm registra a história da Itália, onde se encontra o Vaticano, a cidade sede da Igreja no mundo, de onde se irradia a contracultura católica para os demais países, especialmente aos países latinos. Na Itália, o divórcio se torna legal em 1970, em 1971 se cria políticas públicas de controle de natalidade e o aborto é legalizado em 1978 – o Vaticano nada pode fazer contra essas determinações do Estado italiano. Nessa época, a América Latina tinha índices de divórcio bem abaixo do italiano. No Brasil, por exemplo, o índice chegava a um divórcio para cada trinta e três casamentos (Hobsbawm, 1995, p. 317), e as pessoas divorciadas eram estigmatizadas pela sociedade. Conversando com um argentino, ele me disse que também na Argentina as pessoas divorciadas eram estigmatizadas.

Como a Igreja na dimensão social é o espelho das sociedades onde está presente, aos moldes de Emile Durkheim, demonstra a fragmentação do Estado, cujas políticas

públicas eram insuficientes para abranger as áreas de maior necessidade. Por exemplo, havia projetos para a área da saúde, mas não se tinha projetos para a área da educação, criando-se novas relações entre os movimentos sociais, a Igreja e o Estado, embora alguns não gostem do termo Estado para tais relações, preferindo, no entanto, substituí- lo por agências públicas (Cardoso, In: Dagnino, 1994). Sem contar que os Estados argentino e brasileiro estavam sob a ditadura militar em boa parte das décadas de 1960, 1970 e 1980. Período em que as críticas ao sistema eclesiástico e ao governo do Estado eram assinadas por centenas de padres brasileiros, seminaristas e demais religiosos,

o primeiro exemplo foi a carta aberta assinada por 300 padres, no final de outubro de 1967, depois veio a carta assinada por 75 padres e ministros e 400 estudantes de teologia de São Paulo, ...e esta foi seguida pelo verdadeiro manifesto progressista assinado novamente por 300 padres na ocasião do encontro preparatório da CNBB para a Conferência dos Bispos da América Latina, em Medelin (Kadt, 2003, p. 394).

Nem todos estavam de acordo com esse tipo de pronunciamento, pois a Igreja durante as ditaduras militares estará dividida nas suas convicções político-partidárias, dificultando a unanimidade de ideologia e da práxis, o que, de alguma maneira, dificultou o diálogo interno da Igreja e desta com o Estado. A Igreja estava vivendo aqui, no Brasil, a contradição histórica entre sociedade perfeita pretendida e sociedade com vícios vivida. Há séculos a Igreja havia se colocado como sociedade perfeita, acima da política, acima de qualquer regime, acima da democracia. A tradição da Igreja era de imposição, mas com o regime militar nos Estados brasileiro e argentino respectivamente, e as reverberações teológicas do Concílio do Vaticano II na sua opção preferencial pelos pobres, a Igreja passou a refletir a sociedade a partir do contexto localizado. O resultado foi que o catolicismo passou por um processo de transformação metodológica. Isso significou a inversão do invertido, ou seja, a crítica da Igreja partiria dela mesma com os teólogos da libertação. Por transformação metodológica designa-se a inversão da tradição. Enquanto a tradição utiliza-se da Bíblia para a compreensão da história, isto é, o texto bíblico como óculos hermenêutico para melhor enxergar a realidade social, a Teologia da Libertação dirá que é a partir da leitura do jornal que se pode compreender a dimensão espiritual da literatura bíblica.

Os teólogos da libertação e o clero lançaram as seguintes questões: - Como uma sociedade perfeita não forma a opinião pública e, portanto, não influencia o Estado através dos seus adeptos? E como a opinião pública, desconhecedora de aspectos importantes da teologia católica, se tornou a opinião dominante na sociedade? Ou seja, o catolicismo não tinha a importância bíblica libertadora apregoada das escrituras

sagradas, diziam os progressistas. Os Liberais já tinham escrito sobre isso86, agora os liberais da teologia, isto é, os progressistas, tentariam responder dizendo que a Igreja estava alienada cultural, econômica, política e socialmente87.

A Igreja em toda sua história não sabe o que é democracia na gestão interna de si mesma. Para Leonardo Boff existe aproximação da hierarquia da Igreja aos regimes militares da América Latina (1981), pois ambos são estruturados a partir de modelos autoritários, onde os líderes não são eleitos pela comunidade, mas indicados pelas autoridades superiores. No modelo autoritário, os que estão em posição hierárquica inferior obedecem aos que estão na posição superior. Sistema que “dá margem à progressão para aqueles que se mostram subservientes à autoridade, incentiva a bajulação e a delação, e aniquila as iniciativas construtivas, relegando os mais capazes à estagnação” (Watson, 1999, p. 148). Na Argentina e no Brasil, o confronto entre Igreja e regime militar se daria entre duas instituições de modelo autoritário, levando à marginalidade os movimentos populares surgidos dentro da própria Igreja ou por ela orientados. Alguns desses movimentos, apoiados por bispos moderados ou conservadores, não seriam abalados, e às vezes até incentivados, como no caso da Tradição Família e Propriedade (Villaça, 1975).

A Igreja até então não tinha aprendido a se sujeitar aos “dogmas” do Estado. Agora, diante de um novo contexto, ela teria que mudar sua ação, não mais bastaria o discurso moralizador, seria necessário agir politicamente com maior eficácia e intensidade, e se possível, criar um partido político que represente seus interesses. Partido que poderia mobilizar a opinião pública em favor da Igreja, mas que diante de

86 - John Stuart Mill (1980), Aléxis de Tocqueville (2000), escreveram, mostrando que a opinião pública assumiria um lugar soberano nas sociedades contemporâneas. Habermas (2003) escreve que “Mill desenvolve, para as opiniões conflitantes na esfera pública, um conceito de tolerância por analogia às lutas religiosas” (p. 161). Tocqueville dizia que através da imprensa, a opinião pública poderia ser moldada: “a opinião pública determinada pelas paixões da massa necessita ser purificada” (Habermas, 2003, p. 163). A Igreja não aceitaria o fato de que o Iluminismo e depois o Liberalismo se propunham a “purificar” a opinião pública, cabendo, portanto, a ela, essa tarefa hercúlea. Pressupostos que seriam debatidos no Concílio do Vaticano I, em 1870 e depois no Concílio do Vaticano II, 1962.

87 - Antes mesmo de alguns teólogos católicos de destaque no Brasil, como Leonardo Boff e outros, fazerem a crítica à Igreja, Juan Luis Segundo escrevia a Teologia da Libertação: uma advertência à Igreja, 1987, como reação ao documento de 06 de agosto de 1984 da Comissão para a Doutrina da Fé, assinado pelo então prefeito da Congregação para a Doutrina na Fé, cardeal Joseph Ratzinger, intitulado “Instrução sobre alguns aspectos da Teologia da Libertação”, apesar das críticas serem suaves para o contexto revolucionário das teologias da época. Pablo Richard faz a seguinte periodização da Teologia da Libertação na América Latina: 1) Período do nascimento, 1960 – 1968; 2) Período da primeira sistematização, 1968 – 1976; 3) Período da expansão, 1976 – 1984; e 4) Período de amadurecimento, 1985... Acrescento a isso o fim da Teologia da Libertação concomitantemente com a Queda do Muro de Berlim, 1989, e outros acontecimentos que apontaram o descrédito do socialismo no mundo ocidental (Richard, 1988). Na Argentina, a Teologia da Libertação pouco influenciou a Igreja daquele país, pelas características já apresentadas, entre elas, a conivência da Igreja com o Estado.

sua pluralidade de opiniões, não conseguiu maior apoio ao projeto idealizado por alguns e descartado por tantos outros (Paiva, 2006). Ao criar dogmas político-ideológicos que repercutiriam nas políticas públicas, o Estado entraria em confronto direto com os interesses eclesiásticos de cunho moral e religioso e com os interesses ideológicos e messiânicos implícitos na escatologia milenarista judaico-cristã. Teologia escatológica que traria o fim dos tempos para a história que estava sendo construída politicamente através da luta social dentro da Igreja que então se popularizava.

A Igreja popular, construída na luta diária de sobrevivência e com a justificação teológica da TL (teologia da libertação), teria a utopia de ser governada por um trabalhador, pobre, e assim poderia destronar a classe empresarial e os banqueiros para distribuir as riquezas de maneira igualitária. Esse sonho, compartilhado nas Comunidades Eclesiais de Base (onde participei várias vezes no ABC paulista), produziria no imaginário popular a idéia de um partido que suportasse esse messias (hebraico האישמ= , em grego Χριστος = Cristo), aquele que viria para libertar os pobres e oprimidos, daí a denominação Teologia da Libertação. A salvação das almas passa a ser salvação da economia, da empregabilidade, da dignidade holística do ser humano. O que significa dizer que o Messias judaico veterotestamentário, que para os cristãos é Jesus o Cristo do Novo Testamento, estaria presente na luta dos explorados contra os exploradores, dos oprimidos contra os opressores, trazendo a preocupação de que isso pudesse gerar confronto entre o poder espiritual e o poder secular, Igreja contra o Estado. Acreditava-se que através da Igreja, como sociedade perfeita, seria possível a

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