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Era uma janela de tábuas, Dura, sem frestas, despintada. Mas girando-a sobre ela mesma, Ei-la côncava e todoaberta. Colocavam o recém-nascido Naquele curvo receptivo E davam-lhe giro contrário Simples como passe mágico. [...] E inabordável todo-o-dia: Só pela noite é que ousaria Alguém tentar a operação. A gratuita transmutação De ali sepultar uma vida Que ninguém viu, nem a parida.

João Cabral de Mello Neto. A educação pela pedra e depois (Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997), p. 211- 212.

A Casa dos Expostos era uma instituição nova na vila e demandou por parte do governo estratégias de financiamento e direção, além do esforço de convencimento e de persuasão frente à população para que começasse a se desvencilhar de costumes arraigados como o de abandonar crianças em lugares ermos e perigosos ou mesmo nas vias públicas, levando-as a morte. Era preciso promover uma outra sensibilidade em relação à experiência da morte de crianças no espaço urbano e uma humanização do abandono. Era necessário instituir novas práticas, combater e desestimular antigos costumes, mudar condutas coletivas e individuais em relação às crianças indesejadas. Assim, procurei estudar como funcionou a instituição nos doze anos que se seguiram a sua abertura, como foi administrada, como acolheu, criou e encaminhou os expostos que escaparam da morte.

1 A Casa do Expostos do Recife e as estratégias de financiamento

Desde a sua chegada a Pernambuco, d. Tomás demonstrou o seu desagrado com os aspectos toscos e irregulares das ruas do Recife, com a falta de alguns serviços considerados essenciais, com a ausência de mercados públicos e, sobretudo, com sua gente. Gente como os doentes de lepra esmolando nas ruas, os comerciantes de escravos recém-chegados de África que os expunham em sua nudez e suas chagas, e com o enjeitamento de crianças feito na calada da noite. Sua atenção para com os “inocentes” que morriam nas ruas da vila logo se fez sentir com a implementação de dispositivos para eliminar da paisagem aquelas grotescas cenas, medidas que viabilizaram a existência e o funcionamento de um aparato assistencial para as crianças sem-família.

Em 1789, com apenas dois anos de estadia em terras pernambucanas, o governador instalou a roda e instituiu a Casa dos Expostos. Todavia, os recursos começaram a ser levantados desde o início do ano de 1788, ao mesmo tempo em que começava o recebimento de bebês, como demonstra o Livro de Receita e Despesa da Casa dos Expostos, datado de fevereiro de 1788 a agosto de 1800, totalizando o registro de doze anos e seis meses de funcionamento.1

1

Analisando o respectivo Livro foi possível compreender as formas pelas quais o governante da capitania obteve recursos para a construção do edifício, e depois para a sua manutenção e sustento das crianças. Inventariei as modalidades de receitas da Casa dos Expostos, que elucidam os diversos meios utilizados pela administração colonial para angariar recursos: esmolas pessoais, venda de patentes, multas, aluguel de casas, pagamentos dos pais que iam resgatar seus filhos, impostos pagos por fogo (por casa) para o sustento das crianças expostas e um subsídio real.

À Metrópole interessava a redução de custos com a administração da Colônia, o que deixava os funcionários reais numa situação difícil, pois eram pressionados pelos interesses dos colonos aqui residentes, e deveriam buscar fontes de recursos que não confrontassem com os objetivos da Coroa, e muito menos diminuíssem a arrecadação de impostos para lá dirigidos. De forma que se esperava dos administradores reais uma habilidade muito grande para lidar com os múltiplos interesses: da Metrópole, das elites locais e os seus próprios, pois ninguém vinha para os trópicos destituído da perspectiva de enriquecer. Nesse sentido, d. Tomás foi magistral e criativo, embora a forma pela qual seu governo levantou recursos não tenha sido inédita. Outras obras sociais também tinham, em algumas dessas modalidades de arrecadação, a sua fonte de receitas. Pelos menos três maneiras de captar dinheiro para a montagem do aparato assistencial no Recife se repetiam: a venda de patentes, as doações ou esmolas pessoais e as multas.

Havia dois tipos de recursos importantes, pelas avultadas somas arrecadadas para construção das instituições assistenciais: a venda de patentes e a tributação sobre cada fogo. Como o governador não podia dispor de dinheiro da Fazenda Real, ainda que fosse para uma causa pia, levantou recursos ao criar e vender inúmeras patentes tais como as de capitão, coronel-de-entrada e forasteiro, anexando “honras e privilégios imaginários”, alimentando a fatuidade de homens que estavam “prontos para darem seu dinheiro em troca de um título vão” na opinião de Gama. Segundo esse autor, em troca da permuta dessas cobiçadas patentes, as pessoas que adquiriam esses títulos “ofereciam esmolas para a construção de obras pias”.2 Esse expediente para incrementar fontes de recursos não era específico do governo de Pernambuco. Graça Salgado esclarece que desde meados do Dezoito se alastrou e

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generalizou a prática de venda de empregos e ofícios públicos na Colônia.3 Emanuel Araújo também assinala que a venda de patentes era um bom consórcio para quem as adquiria:

Obter patente superior constituía um bom negócio que ampliava a fortuna ou resolvia trapalhadas financeiras dos que já tinham recursos e dava oportunidade, embora por meios oblíquos, de alguma ascensão social aos plebeus desprovidos de bens. No mínimo levavam a vantagem da isenção do pagamento de taxas e impostos, o que não era pouco.4

Uma outra fonte de divisas foi derivada da criação, em março de 1789, de uma tributação direta sobre os fogos de toda a capitania e suas anexas:

E por que se faz preciso para a sustentação deste pio estabelecimento um fundo certo de que saiam as suas consideráveis despesas; e manda Lei do Reino que nos lugares onde não houverem semelhantes Hospitais a criação dos enjeitados se faça a custa das rendas do Conselho, e que esse não as tenha se possam lançar fintas para esse feito. [...] Ordeno ao Sr. Ouvidor Geral desta praça que participe as Câmaras de sua comarca a urgente necessidade que há de estabelecer esta finta para a criação dos Enjeitados lançando sobre cada fogo dos seus termos cinqüenta réis pagos anualmente aos seus respectivos párocos [...]5

Em virtude daquela resolução, o ouvidor-geral da comarca escreveu às câmaras da cidade de Olinda e das vilas da capitania, mandando-as lançar uma

Finta da Ereção dos Enjeitados. Esse documento é muito esclarecedor da maneira

como o governo objetificava o problema do enjeitamento de crianças, como impunha um imposto à coletividade, definia a forma de ser recolhido, apontava a sua possibilidade de extinção e convocava os fiéis para a demonstração de fé no exercício da caridade. Essa medida não derivava mais da necessidade de criação da instituição para os expostos, antes procurava manter, para o estabelecimento criado e já em pleno funcionamento, “um fundo certo de que saia[ísse]m as suas consideráveis despesas”.

Na seção referente às esmolas que denomino de “pessoais”, a fim de distingui- las das “diversas”, a primeira questão diz respeito aos diversos sentidos da palavra “esmola” presentes no documento: “esmolas cobradas”, “doação de casas como forma de permuta da esmola da lista”, “esmolas da abertura da casa”, “esmolas do

3

Cf. SALGADO, Graça. Fiscais e meirinhos, op. cit., p. 64-65.

4

ARAÚJO, Emanuel. O teatro dos vícios, op. cit., p. 299.

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PORTARIA para cada fogo contribuir com 50$ para o Hospital dos Enjeitados. Recife, 18.03.1789. APEJE, série: R-Pro. n. 4, v. 2, fl. 39v-40. Ms.

benefício da ópera”, “esmolas de preso por ordem do general”, “esmolas dos pais” que retiram seus filhos da roda, “esmolas da venda de patentes”, “esmola” de uma doação de uma “escrava de Angola de nome Joana”, etc.

O termo esmola, segundo o dicionário de Moraes, significa “o que se dá por caridade ao pobre, ou necessitado, para o remediar”.6 Mas, no documento, percebemos que as pessoas usavam a palavra esmola com diferentes sentidos, podendo ser entendida como doação espontânea ou voluntária, forma de punição, pagamento, permutação, donativo, legado, venda. Compreender as diversas acepções do uso desse vocábulo implica, portanto, situá-lo nas relações e práticas nas quais se envolviam os atores, de forma que a “esmola” podia resultar de um negócio como a venda de patente; de um ato de caridade, portanto voluntária; ser uma forma de punição, e assim um ato coercitivo; decorrer de obras de caráter beneficente; ou ainda representar o pagamento das despesas que os pais efetuavam quando resgatavam seus filhos. As esmolas, do ponto de vista da sua materialidade, também mudavam, podendo ser ofertadas em dinheiro, imóveis ou escravos.

Durante os doze anos e seis meses de início do funcionamento da Casa dos Expostos (1788-1800), três modalidades para angariar recursos se destacaram: a venda de patentes, os impostos por fogo que chegavam das freguesias próximas e distantes e as ‘doações’ de pessoas de posses que constavam de uma lista organizada pelo governo. Em valores aproximados, a venda de patentes para provisão dos cargos públicos rendeu Rs. 7:045$4007 em dinheiro e três casas que passaram a pertencer ao patrimônio dos expostos. Como já observei, essa era uma prática entre os governadores coloniais, visando assegurar recursos, lembrando que não se podia contar com verbas públicas para gerir a administração da Colônia, pois além dos impostos arrecadados serem insuficientes para as demandas locais, “parte dele[s] sempre desaparecia nos misteriosos desvãos burocráticos civis e militares”,

como lembra ironicamente Emanuel Araújo.8

Contudo, a venda de patentes tomou forma e ganhou corpo e importância na administração tomasina. Exemplo desse procedimento pode ser verificado na atitude

6

SILVA, Antônio de Moraes. Dicionário da língua portuguesa, op. cit., t. I, p.754.

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Esse valor pode ter sido maior, porque a designação dessa venda nem sempre é explícita. Vide o exemplo de Francisco Xavier Cavalcanti que ofertou casas e esmolas. Outras pessoas podem ter feito doações “de acordo com a lista” ou como “esmolas”, derivadas desse negócio. Daí que os números apresentados não são conclusivos, apenas ilustrativos, correspondentes aos anos de 1792 e 1795.

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de um certo Francisco Xavier Cavalcanti, que em 17 de fevereiro de 1789 doou “uma morada de casas térreas em troca da esmola da lista”, que passou a pertencer ao patrimônio dos expostos. Em 18 de junho daquele mesmo ano, recebeu do Reino a carta patente que o confirmou no posto de mestre-de-campo do terço de infantaria auxiliar da cidade de Olinda.9 No fim da gestão de d.Tomás, essa prática foi alvo de contestação por parte de alguns colonos; apesar disso, se configurava prática lícita, embora a legislação sobre essa questão fosse muito ambígua, mostrando que a Coroa portuguesa não tinha uma posição definida e não conseguia exercer controle sobre a venda de cargos públicos.10

A segunda fonte de “esmolas” era representada pelos impostos cobrados nas distintas e, por vezes, longínquas freguesias, e enviados para o Recife. Através do documento citado, constatei que as freguesias começaram a pagar a finta em 1789 e o fizeram de forma regular até 1792. A cobrança era feita pelo pároco da localidade,

com a autorização do bispo diocesano, no momento de cobrar as “conhecenças”*.

No ano seguinte, aparece apenas referência ao Recife e Santo Antônio, o que pode indicar a recusa do pagamento desse imposto pelas freguesias mais distantes. Ademais, a Casa dos Expostos não atendia a todas as crianças expostas na capitania, pois a sua extensão, além de abarcar o obscuro “sertão”, ainda compreendia as capitanias da Paraíba, do Rio Grande do Norte e do Ceará.

A relação das freguesias que enviaram os impostos para criação das crianças expostas confirma a imposição da tributação direta sobre cada fogo, no processo de deslocamento da responsabilidade com o exposto. Não se esperava que a caridade particular, no fundo pautada pelas escolhas e opções pessoais, resolvesse o problema do acolhimento e criação de bebês abandonados, e nem se pretendia que os encargos financeiros recaíssem exclusivamente sobre o Governo. O seu papel era mais de promover fontes permanentes de recursos e administrá-los na manutenção dos serviços assistenciais, impondo à sociedade o ônus dos encargos

9

Devo esta informação a João Alfredo dos Anjos (A Roda dos Enjeitados, op. cit., p. 105, nota 192), que encontrou o documento no AHU, cód. 152, Livro de Ofícios, fls. 159v/160.

10

Cf. SALGADO, Graça. Fiscais e meirinhos, op. cit., p. 65. Segundo a autora, “as reiteradas ordens expedidas de Portugal para normalizar o provimento de ofícios na Colônia, durante o século XVIII, sugerem que a desorganização e as irregularidades no cumprimento de tais determinações na administração colonial fossem tão freqüentes a ponto de configurar uma regra geral”.

*

Conhecenças: s.f. premio, oferta voluntária feita a curas pelo pasto espiritual, ou devida e

necessária a algum senhorio, por qualquer bom ofício que faça, ou reconhecimento de vassalagem, sujeição. (SILVA, Antônio de Moraes. Dicionário..., op. cit., p. 439).

financeiros com a criação e sustento dessas crianças, ao mesmo tempo em que buscava diferenciar as práticas de abandono civilizadas das práticas infanticidas.

A terceira forma de “esmola” que representava um valor significativo das receitas eram as “doações cobradas” de pessoas que tinham seus nomes “na lista”, as quais resultaram no valor de Rs. 2:880$020. O documento dá sinais de que foi organizada uma lista com nomes de pessoas abastadas, que se comprometeram — ou foram intimadas — a fazer doações para a Casa da Roda, possivelmente em troca das benesses do governo, da aquisição de patentes ou de alianças políticas. Entre essas pessoas, destaca-se a presença de militares bem graduados e representantes do alto escalão de funcionários reais, como desembargador, juiz de fora, ouvidor, capitão, mestre-de-campo, sargento-mor, ajudante-de-ordens, que, em alguns casos, conseguiram suas patentes após a doação de “esmolas” para a instituição, como já assinalei.

Outras fontes de recursos que foram utilizadas pelo governador se articulavam com a forma de administrar a capitania e, mais especificamente, com uma nova racionalização e disciplinamento do espaço urbano: as condenações e as multas. Condenações e multas estão no documento como sinônimos, implicando ambas em pagamento de algum valor. Moraes explica que condenar significa “declarar incurso na pena, sujeitar a pena, multa, pagamento, satisfação etc por sentenças”.11

Condenavam-se presos de condição escrava cujo proprietário era obrigado a pagar um valor, provavelmente de gastos com esses presos ou mesmo como forma de punição pelas transgressões às leis:

Dinheiro da condenação da presa Joaquina, escrava de Thereza da Circuncizão por ordem de V. Exª, 6$000. (22.09.1789)12

Idem da condenação do preto preso, escravo de Francisco Roiz Paiva, por ordem de S. Exª, 3$000. (24.09.1789)

Consegui catalogar as multas cobradas aos proprietários dos cativos de 1789 até 1792, que variam de 3$000 a 12$000, entretanto, não é explicitado o tipo de delito que foi cometido. Condenavam-se também homens livres, mas igualmente não se relacionavam as causas. As multas variavam de 3$000 a 40$000 e constituíram parte da receita de 1789 a 1797. Talvez essas multas incidissem sobre as condutas

11

SILVA, Antônio de Moraes. Dicionário da língua portuguesa, op. cit., p. 432.

12

Doravante usarei as citações do Livro de Receita e Despesa da Casa dos Expostos apenas com as datas, a fim de não dificultar a leitura.

dos indivíduos, exemplificando com a punição as atitudes e as práticas que deveriam ser evitadas.

Uma parte das condenações diz respeito ao ordenamento da cidade, o que se podia e não se podia fazer no espaço urbano: condenavam-se “22 homens por trazerem gado solto sem partirador”, no valor de 220$000; multavam-se “barcos e navios por não porem bandeiras nos dia de Beija-Mão”, no valor de 37$760; condenavam-se “furtos de açúcar” com 8$400; multava-se “uma pouca de carne que se picou no açougue” com 4$115.

A penalidade sobre o gado solto na cidade é a que aparece com mais freqüência. O partirador ou partidor era aquele que partia, fazia a partilha de bens, e a sua ausência implicava em pagamento de uma multa. Punia-se provavelmente por estar fora do controle da fiscalização — impedindo a arrecadação dos impostos sobre as vendas que viessem a ser realizadas —, além de reprimir o trânsito de animais de porte, soltos pela cidade, que tumultuava e colocava em risco a vida de crianças e velhos, como vimos na postura de 1772. Puniam-se os que não se regozijavam com o aniversário do rei, o chamado dia de Beija-Mão, quando a corte, na Metrópole, comparecia à presença do rei para beijar a sua mão e algumas comemorações eram realizadas em suas colônias.

A multa sobre a carne picada talvez tivesse o intento de evitar a sua venda fora do açougue, porque o edital de 3 de janeiro de 1788 “proibia que se vendesse carne fora do açougue público”, a fim de coibir os altos preços. A carne encontrada fora desse estabelecimento seria apreendida, ficando a metade para o denunciante e a outra metade para os presos da cadeia. Os transgressores seriam multados em 10$000, quantia a ser paga na cadeia.13 Nesse caso, punia-se duplamente, uma vez agindo sobre o objeto da transgressão, com a apreensão da mercadoria, e outra sobre o sujeito que transgredia.14 Ademais, estimulavam-se as pessoas a denunciar os atos ilícitos, através de recompensa material. A multa assumia toda a sua magnitude, ela era ao mesmo tempo punitiva e disciplinadora, atuando sobre o indivíduo e o coletivo. Vistas em conjunto, essas condenações eram também pedagógicas, no sentido de disciplinar as condutas dos indivíduos no espaço

13

Cf. COSTA, F. A. Pereira da. Anais pernambucanos, op. cit., v. 6, p. 497.

14

Acácio Lopes aponta um outro aspecto dessa política, qual seja a atenção aos interesses do capital mercantil, somando-se ainda ao fato do próprio governador ter parte nos contratos das carnes, peixe, açúcar, aguardente, melaço, feijão e azeite. Cf. CATARINO, Acácio José L. Da oficina ao Arsenal, op. cit., p. 26.

urbano, bem como atendiam aos interesses da população, por meio do controle de preços dos gêneros de primeira necessidade.

Nem sempre é possível distinguir entre as multas e as doações, porque não se pode saber que práticas originavam umas e outras. Por exemplo, há doações de presos à Casa dos Expostos, mas até que ponto estas eram esmolas espontâneas ou multas como a de João Coelhos Bastos, que deu uma esmola em dinheiro de 50$000 “por ordem do General”? Contudo, havia casos em que as pessoas faziam doações voluntárias. O documento registra esmolas feitas por devotos, em 1797, no valor de 1:668$640.

Algumas doações eram realizadas em função do número de crianças assistidas. O sargento-mor Manoel Gomes dos Santos fez, em 1788, doação em dinheiro de 189$000 por vinte e quatro expostos aceitos, e contribuiu, no ano seguinte, com 56$000 por sete crianças aceitas, ou seja, em dois anos de funcionamento da Casa ele doou 245$000 em dinheiro por 31 crianças expostas. Como sua contribuição parece não ter sido suficiente, ainda em 1789 ofertou à Instituição “2 casas térreas em troca da esmola da lista”; e, logo em seguida, contribuiu com mais 300$000 em dinheiro. Que interesse tinha Manoel Gomes dos Santos para tão avultados donativos? Provavelmente, esses valores correspondiam à compra de sua patente, pois em 1791, ele tornou-se membro da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia do Recife e assumiu o cargo de mordomo.

Constatamos também a transferência de recursos, em 1793, do Hospital dos Lázaros para a Roda dos Enjeitados, doação feita pelo tesoureiro daquela instituição, Domingos Ferreira, “por ordem do General”, isto é, do governador, no valor de 1:200$000. A situação financeira do Lazareto era tão confortável que permitiu àquele Hospital fazer empréstimos à Câmara do Recife para a construção das praças da Polé e da Ribeira, o que dá idéia sobre o volume de dinheiro gerido pela referida instituição e angariado por esse governo.

Em 1790, a Casa dos Expostos teve aprovação régia e, com isto, a concessão de uma verba anual de 200$000 por quartéis da renda da capitania para sua

manutenção.15 Neste ano estão registrados na seção da receita 144$380 oriundos

do Erário Real. No ano seguinte, a instituição recebeu 200$000. A partir de então, e

15

Cf. COSTA, F. A. Pereira da. Anais pernambucanos, op. cit., v. 4, p. 93. O Livro de Receita e