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4.1 DOCUMENTAÇÃO ICONOGRÁFICA HISTÓRICA – FUNDAMENTAÇÃO

4.1.1 A imagem visual como fonte de informação

Em se tratando de documentação histórica, preliminarmente, é importante refletir acerca do potencial da imagem visual como fonte de informação a ser explorada em estudos multidisciplinares. Alguns estudos acadêmicos balizam e indicam que o interesse sobre o assunto tem se ampliado ao longo do tempo. Ulpiano T. Bezerra de Meneses, em Fontes visuais, cultura visual, História visual: Balanço provisório, proposta cautelares (2003), destaca ser a História da Arte, consolidada no século XVIII, um dos primeiros campos disciplinares a reconhecer e adotar a imagem visual como objeto referencial de estudo O autor relata tentativas, já no Renascimento, de decifrar os significados simbólicos contidos nas imagens artísticas. Porém, é com os antiquários38 dos séculos XVI e XVII que a iconografia é utilizada em usos científicos

para extrair informações. Como exemplo, Meneses cita informações contidas em “moedas, esculturas, pinturas das catacumbas romanas e outros artefatos” (MENESES, 2003, p. 13).

Choay (2011) relata o advento da imagem e seu uso crescente como ferramenta para as experiências dos antiquários, entre o século XVI e o fim do Iluminismo. A autora cita o método comparativo que se utiliza das imagens para estudos dos monumentos e “[...] lhes permite estabelecer séries tipológicas, às vezes até sequenciais

38 Choay (2011) cita o significado daquele que é denominado antiquários, de acordo com a primeira edição do Dictionnaire de l’Académie française: “especialista no conhecimento de objetos de arte antiga e curioso deles”. (Apud CHOAY, 2011, p. 62)

cronológicas e realizar, assim, uma espécie natural das produções humanas” (CHOAY, 2011, p. 78).

Outro recurso, citado por Choay (2011), são os desenhos dos edifícios antigos, elaborados “in loco” pelos arquitetos, até metade do século XVIII. Nesse momento, esses não são representações exatas e às vezes contêm partes imaginadas. Em algumas situações, os desenhos de edifícios são elaborados sem até mesmo o arquiteto ter visualizado a sua materialidade. Exemplos da evolução das representações são as diversas imagens elaboradas do Partenon, ao longo do tempo, com suas representações inexatas (Figura 57). Com o tempo, a exatidão é alcançada e isso “[...] contribui para que se complete e se firme o conceito de monumento histórico, que não por acaso recebe sua denominação no fim do século XVIII” (CHOAY, 2011, p. 83).

A partir da concepção da ideia de monumento histórico, inicia-se um vínculo visual com o passado. Posteriormente, a importância cognitiva dos registros visuais, tais como desenho, fotografia, filmes e vídeos, é observada, também, pela Antropologia e Sociologia. É no campo disciplinar da Antropologia Visual39 que se tem um

reconhecimento do potencial informativo das fontes visuais (Menezes, 2003, p. 13- 17).

Figura 57 – Representações idealizadas do Partenon

Fonte: Panayotis (1996) apud Choay (2011).

No campo das investigações na história da arquitetura e da cidade, Jorge Ramírez Nieto, Sobre archivos, imagenes y documentos en la investigación de la historia de la arquitectura (2011), comenta que as imagens documentais assumem papel

39Conforme Meneses (2003), a “Antropologia Visual (expressão corrente após a II Guerra Mundial) logo se organizou institucionalmente [...], no Brasil [...] provocou o surgimento de vários núcleos acadêmicos estruturados dentro da disciplina ou de disciplinas afins [...]”. (MENESES, 2003, p. 17)

importante como nova proposta de investigação histórica com a crise das leituras históricas tradicionais, na segunda metade do século XX. Segundo o autor, essas fontes contêm “[...] informações relevantes para explicar os tempos e espaços de cultura” (NIETO, 2011, p. 261, tradução da autora). O documento visual possui suas limitações e se torna útil como fonte que preenche lacunas históricas. Entretanto, ao abordar a necessidade de utilização de métodos apropriados para interpretação dos documentos iconográficas, Nieto (2011) questiona:

[...] problemas básicos: Que pergunta podemos formular a uma imagem como documento de arquitetura? Qual é a densidade e a profundidade das camadas sucessivas de informação que tem uma imagem? Há uma espécie de gramática e ortografia da imagem? Estas e muitas outras questões permanecem como questões buscam a sua resposta na discussão da historiografia contemporânea. (NIETO, 2011, p. 263, tradução nossa)

Também Menezes (2003), considerando as cautelas para o uso de fontes visuais, no campo da disciplina da História, aponta a problemática da visualidade dessas, que consiste em evitar ilusões. Nesse sentido, no uso de fontes visuais, é necessária a utilização de informações históricas externas a elas. Isso significa que a História, como no passado, ainda utiliza as fontes visuais, salvo algumas exceções, como ilustrações que não têm relação documental com o texto. Isso implica em um desperdício do seu potencial (Meneses, 2003, p. 20-21).

Entretanto, ainda segundo Meneses (2003), é no campo da imagem fotográfica que se excetua a problemática acima citada. Assim,

É o campo que melhor absorveu a problemática teórico-conceitual da imagem e a desenvolveu intensamente, por conta própria. É também o campo que mais tem demonstrado sensibilidade para a dimensão social e histórica dos problemas introduzidos pela fotografia [...]. É também a fotografia que provocou maior investimento em documentação, com a organização de banco de dados, a maioria já informatizados (grandes coleções institucionais de iconografia urbana, álbuns de família, documentação de categorias sociais, eventos ou situações – como guerras, conflitos, migrações, fome, pobreza, etc.). (MENESES, 2003, p. 21)

As reflexões de Marco Aurélio A. de Filgueiras Gomes, em História da cidade e do urbanismo: algumas reflexões sobre a questão da documentação (2011), atentam para a ampliação do uso de fontes documentais em pesquisa histórica, pelos arquitetos e urbanistas no Brasil, ao versarem da temática da cidade. Segundo o autor, na década de 1990, estudos acerca da imagem urbana, oriundos da modernização urbana nos séculos XIX e XX, utilizam diversidades de fontes documentais. Neste contexto, utiliza-se os registros da cidade, como fonte de estudos, por meio das

representações “[...] das artes gráficas à literatura, passando pela fotografia, pelo cinema, pela publicidade, etc” (GOMES, 2011, p. 296-297).