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2 REFLEXÕES ACERCA DA TEORIA DO IMAGINÁRIO

2.2 O IMAGINÁRIO SOCIAL

O Trajeto Antropológico, como apresentado anteriormente, é um norteador do conhecimento do homem, é uma das formas de se perceber a constituição do imaginário social a partir de sua representação simbólica e mítica que demonstram os valores não só de um indivíduo, mas de um grupo social que ajuda a criar, a manter e a modificar a realidade a qual pertencem. A ideia de imaginário social é ambígua e polissêmica, relaciona-se a diversos campos da sociologia. Sironneau (1993) aponta a distinção entre três significados:

a) Dimensão mítica da existência social: é ela que inspira as mitoanálises sociológicas e conduz ao esclarecimento dos mitos dominantes de uma determinada época, de uma cultura, de uma nação, de uma geração, liter ária ou artística, de uma classe social;

b) Imaginação de uma outra sociedade: ela está em marcha nas utopias, nos milenarismos, nas ideologias revolucionárias. É o imaginário da esperança [...]; c) Imaginário mais moderno e cotidiano (recente): visto nas práticas de todos os

dias: paisagem urbana, objetos familiares, encontros fortuitos, percursos usuais, distrações populares. (SIRONEUAU, 1993, p. 47-8 in LEGROS, 2007, p. 11-12)

Durkheim, Max Weber e Simmel (apud LEGROS et al, 2007), enquanto fundadores da Sociologia, foram os primeiros a estabelecer relações entre os símbolos e a vida social. Ao estudarem os fenômenos sociais afirmam que eles não se separam dos fatos psíquicos, ou seja, que as representações simbólicas são pertencentes a um grupo e a seus indivíduos, por isso compartilham de mitos, lendas, crenças etc.

Simmel (apud LEGROS et al, 2007), ao trabalhar a ideia de imaginário no cotidiano, afirma que a essência das relações que um sujeito estabelece com outro, “faz nascer em um a imagem do outro” e depois complementa ao dizer que “a alma é a imagem da sociedade e a sociedade é a imagem da alma.” Portanto, é no âmago dos processos sociais movidos por afetos e outros sentimentos que percebemos o papel do imaginário social enquanto “priori da significação da nossa presença no mundo” (LEGROS et al, 2007, p. 77). A seguir, o autor apresenta as Funções Sociais da Sociologia do Imaginário:

1) uma função antropofisiológica: a necessidade do devaneio;

2) uma função de regulamentação humana diante da incompreensão (a morte, por exemplo): operando como intermediária do mito, do rito, do sonho, ou ainda, da ciência;

3) uma função de criatividade social e individual: representando os principais mecanismos da criação e oferecendo uma abertura epistemológica (relativizando a percepção do real);

4) e uma função de comunhão social: favorecendo, principalmente pelo mimetismo, os ideais-tipo, os sistemas de representação, a memória coletiva (LEGROS et al, 2007, p. 12).

Complementando o proposto acima, Maffesoli (2001b) pontua que acredita apenas no imaginário social, que envolve, que faz parte, que está incluído em algo. Existe um compartilhamento de ideias, visão de mundo que pertencem ao racional e ao não-racional.

O imaginário é uma força social de ordem espiritual, uma construção mental, que se mantém ambígua, perceptível, mas não quantificável. [...] O imaginário é o estado de espírito de um grupo, de um país, de um Estado nação, de uma comunidade, etc. O imaginário estabelece vínculo. É cimento social. Logo, se o imaginário liga, une numa mesma atmosfera, não pode ser individual (MAFFESOLI, 2001b, p.75).

Conforme Teves (2002), o Imaginário Social traz à luz reflexões acerca dos processos reguladores da vida em sociedade, uma vez que torna-se “necessária a exploração do

invisível que existe na realidade social, aquilo que tem força, que impele, mas que se encontra em outras instâncias do saber”(TEVES, 2002, p. 62). A constituição do Imaginário Social de cada grupo social é dada a partir das representações das crenças que legitimam a ordem social vigente numa disputa de sentidos que regulam ações e aproximações e afastamentos dos atores sociais. O Imaginário constitui-se então, enquanto laço social que representa as crenças e os rituais que circulam em um grupo e constituem o que é verdadeiro. E ainda:

Investigar o Imaginário Social de um grupo é estar propenso a dialogar com seu mistério, com suas crenças mais profundas. Metaforicamente, podem dizer que o imaginário é o locus no qual se ancoram as representações sociais. Acessá-lo significa admitir a possibilidade da surpresa, a presença da sombra (TEVES, 2002, p. 67).

Conforme Silva (2012, p. 7), o imaginário é como algo que move o ser humano, uma vez que “o homem só existe no imaginário”. O imaginário também está associado à realidade, à concretude: “é um motor, um sonho que realiza a realidade, uma força que impulsiona indivíduos ou grupos”. O autor vai acrescentar que:

o imaginário é uma aura, uma atmosfera, um “plus”, um excedente, uma interpretação, uma significação, um sentido relevante individual ou socialmente atribuído a um acontecimento [...] é o fato que passou a ter sentido para alguém. Todo imaginário é um revestimento, uma cobertura, uma sequência de camadas aplicadas sobre um acontecimento, uma obra, um fenômeno, um evento, um trauma, um feito (SILVA, 2017, p. 25).

Para o autor, o movimento de mudança que envolve a tríade “aldeia - cidade natal - metrópole”, incita sentimentos de “surpresa-deslumbramento-perplexidade-temor” (SILVA, 2017, p. 13). Esses são os sentimentos que também buscaremos identificar dentro das narrativas do processo migratório que representam não só o imaginário individual, mas também o de um grupo, ou de um núcleo familiar envolvido no processo com anseios e motivações pessoais e sociais. Para Silva (2017, p. 111), “o imaginário é o que fica depois de um choque de realidade [...] é o discurso que se tornou narrativa mítica, mitologizante, épica e transfiguradora”. O que Silva (2017) propõe é a forma como o arcabouço simbólico de cada grupo toma forma, emerge. O imaginário social traduz os comportamentos, os sentimentos frente ao tempo e ao contexto social que estão em constante mudança.

Teves (1992) também menciona questões que envolvem o imaginário social a partir da articulação de questões subjetivas e sociais que perpassam o sujeito. A autora afirma que “todo grupo objetiva seu imaginário social [...] é mediante esse imaginário que o grupo se identifica, estabelece suas trocas, distribui seus papéis sociais” (TEVES, 1992, p. 25). E ainda

de acordo com Maffesoli (1988), os grupos ou tribos “organizam seus sistemas explicativos de mundo instituem suas diferenças e com isso constroem suas identidades. A riqueza da pluralidade cultural aparece na multiplicidade desses imaginários” (MAFFESOLI, 1988 apud TEVEZ, 1992, p. 25).

Em vista disso, buscamos desvelar a constituição do imaginário social dos alunos migrantes considerando as vivências e motivações que os fazem partir em busca de um lugar muitas vezes distante do seu de origem, que desacomoda, mas que também impulsiona novas relações e experiências.