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CAPÍTULO 3. Caracterização da situação migratória portuguesa

3.2. Imigração Contemporânea

O ténue fluxo migratório que se iniciou nos anos sessenta, assume uma crescente importância numérica logo a seguir ao processo de descolonização, período que coincidiu com o fim do regime ditatorial e, portanto, com o início de uma nova fase socio- económica e política para o país.

Todavia, a fase que se seguiu ao período revolucionário não foi destituída de dificuldades, bem pelo contrário. O país encontrava-se economicamente depauperado e apresentava graves desigualdades sociais, agravadas por uma taxa de desemprego galopante. A este quadro negativo devemos ainda acrescentar a perda dos mercados das ex-colónias e o retorno de milhares de portugueses na sequência do processo de descolonização, que culminou a 5 de Agosto de 1974 com a publicação do Acordo entre as Nações Unidas e Portugal, no qual foi reconhecido o direito à independência dos povos das colónias.

É certo que o processo de descolonização significa o fim do ciclo de um Império. Mas, em contrapartida representa também o fim do isolamento internacional de Portugal. De facto, novas relações de intercâmbio e cooperação são estabelecidas com diversos países modificando por completo a posição de Portugal no mundo.

No caso particular de Portugal, as alterações radicais de regime político resultaram no regresso de portugueses que até então residiam em territórios coloniais e que se sentiram mais seguros com a nova situação política pelos reflexos positivos que geraram no sistema económico. Note-se, contudo, que o retorno de milhares de portugueses não veio suprir as necessidades de mão-de-obra sentidas por Portugal nessa altura, na medida em que não se enquadravam no tipo de emprego oferecido com maior abundância. De facto, a carência de mão-de-obra manifestava-se apenas em alguns sectores de actividade mais ingratos, como a construção civil.

Aliás, a este respeito E.S. Ferreira e H. Rato defendem que:

“a imigração e o emprego dos trabalhadores estrangeiros na Europa foram (...) criando um estrutura dualista no mercado de trabalho: a mão-de-obra nacional a ocupar os melhores empregos e a mão-de-obra estrangeira com actividade laboral não necessariamente concorrencial com a mão-de-obra nacional” (2000: 7).

Sendo assim, para os estrangeiros profissionalmente menos qualificados, Portugal aparece como um país potencialmente atractivo, da mesma forma como, de forma inversa, ocorreu na década de sessenta para os nossos emigrantes que se deslocaram para França.

Face a estas pressões migratórias, que tendem a se manter, somos levados a pensar sobre as condicionantes favoráveis na indução dos movimentos migratórios. Num sentido generalizado, a imigração está ligada a uma necessidade no tempo e no espaço, de obter mão-de-obra necessária para levar a cabo um projecto de desenvolvimento proporcionado pela expansão económica. Todavia, para além de satisfazerem uma carência de mão-de-obra temporária, a imigração pode funcionar como um factor de regulação em diversos domínios, nomeadamente no demográfico.

O estudo das tendências demográficas a que iremos proceder irá, concerteza, revelar- nos, realidades como a o aumento ou redução do crescimento populacional, o envelhecimento da população portuguesa e as variações da taxa de natalidade.

Diversos estudiosos acreditam que a imigração pode ter um efeito dinamizador numa população envelhecida, podendo funcionar como instrumento estabilizador das taxas demográficas. Coale (1972) foi um dos estudiosos a encarar a imigração como um meio de restabelecer o equilíbrio demográfico numa população que sofre de taxa de fecundidade baixa.

Outros autores encaram o fenómeno imigratório como um precioso instrumento que faz com que aumente substancialmente o número da população activa.

Nem todos os estudiosos reconhecem os efeitos compensatórios da imigração. No entendimento de J. Pestana, não podemos procurar na imigração a solução para todos os problemas demográficos. Segundo o mesmo pensamento, por um lado:

“uma geração não constitui, por si só, remédio bastante para o esgotamento demográfico da Europa e, por outro lado, muito menos corrige – senão uma pequena parte – o excesso populacional do Terceiro Mundo, de tal forma ele se revela desmedido e persistente” (CES, 1995: 56).

Contudo, antes de procedermos à análise dos dados torna-se pertinente recordar que a imigração é um processo em constante mutação muito sensível às alterações sócio- económicas e políticas que marcaram a nossa História. Ao termos abordado, genericamente, a trajectória das migrações, pudemos constatar que muitas das mutações sofridas ao longo de todo o século XX, no campo político tiveram inevitavelmente repercussões no rumo das movimentações humanas.

Especificamente no caso de Portugal, podemos apontar três fases importantes responsáveis por essa mutação:

x Processo de descolonização que origina a vinda crescente de imigrantes provenientes do território das ex-colónias (até 1974 o fluxo proveniente destes territórios eram considerados fluxos inter-regionais);

x Adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia (1986), o que na prática significa que os imigrantes que se encontram no país vindos da UE perdem o estatuto de imigrantes para ganharem o de cidadão comunitário;

x O desmembramento do bloco de soviético (1989) que provocou mutações na história das migrações não só no leste europeu, mas em toda a Europa e, particularmente, em Portugal, ficando evidenciado aos olhos do mundo a sua faceta imigratória;

A partir das observações anteriores somos levados a concluir que os factores políticos induzem às migrações, dependendo da natureza das alterações operadas. No caso particular de Portugal, as alterações radicais de regime político resultaram no regresso de portugueses que até então residiam em territórios coloniais e que se sentiram mais seguros com a nova situação política pelos reflexos positivos que geraram no sistema económico.

Todas estas considerações vão de uma forma mais ou menos explícita ao encontro das justificações clássicas das teorias migratórias. No modelo de “atracção-repulsão”, (push- pull), o qual tem como precursor George Ravenstein, e mais tarde, desenvolvido por diversos autores como Everett Lee ou A. Jackson, os factores económicos, como o emprego e as condições de vida, são tidos como responsáveis, como forças de repulsão em relação ao local de partida, quer como forças de atracção, no caso do local de destino.

Este modelo refere que são os grandes centros de comércio, serviços e indústria que atraem os migrantes, mas conta também com outras características, nomeadamente, oportunidades de educação, segurança, oferta cultural, qualidade de vida, qualidade ambiental, etc.

Ao analisarmos historicamente a situação migratória portuguesa, e as “ligações cruzadas” (Peixoto, 2004:12) da emigração e imigração, verificamos que, de facto, muitos dos factores de repulsão e atracção enunciados por este modelo teórico, estiveram presentes ao longo desses diferentes ciclos migratórios.

O emigrante é um nacional ausente, com perda pouco significativa de direitos no país de onde provém e, talvez até, uma certa diminuição dos deveres e obrigações inerentes à sua qualidade de cidadão. Em contrapartida, como imigrante, é um estranho vindo de fora, encontrando uma sociedade que provavelmente desconhece e onde terá de inserir- se, sujeitando-se às leis que a administram.

Para Rocha-Trindade (1997:37): “designa-se por percurso migratório ou itinerário migratório, o conjunto de passos, acções ou situações, dados ou e por um indivíduo (ou grupo) migrante, com relevância para o processo em que se encontra envolvido”.

Por migração entende-se um processo social condicionado por múltiplos factores, representados no nosso modelo, que motivam o deslocamento espacial de contingentes populacionais de seus lugares de nascimento para outros e que podem variar segundo os níveis de aspiração.

António Barreto reafirma a necessidade de se elaborarem e porem em prática políticas de integração. Considera “integração” o mais consensual conceito em vigor, quer nas sociedades de acolhimento, como nas próprias comunidades de imigrantes. Para Portugal é um desafio, a definição de novas estratégias e mecanismos de integração. Embora considere uma mais-valia a experiência portuguesa:

“Portugal conheceu, em menos de meio século, todas as dimensões das migrações. Seja a emigração transatlântica, seja a europeia. Sejam as migrações definitivas, sejam as temporárias. Quer a facilidade, quer as dificuldades de integração dos seus emigrantes nas sociedades de acolhimento. Mas também teve a experiência dos problemas da imigração (…) falantes da mesma língua, originários da América Latina, da África e da Ásia, quanto os novos imigrantes europeus vindos dos países de Leste, designadamente da antiga União Soviética. E muitos também tiveram dificuldades na integração e na legalização.” (Barreto, 2005: 21-22)