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I DADE : 11 ANOS

2.1 Educação escolar e imigração: uma abordagem bibliográfica

2.1.2 A imigração no debate nacional

A discussão desenvolvida no Brasil em relação a migração internacional possui sua centralidade no movimento ocorrente no final do século XIX e início do século XX. Diversos autores brasileiros se especializaram e desenvolveram suas pesquisas na análise do fluxo migratório internacional de europeus para o Brasil nesse período. Evidente que esses estudos são de primordial importância para a compreensão do movimento migratório, suas estruturas, o cotidiano dos indivíduos e suas comunidades. Contudo, o fluxo migratório do pós-guerra configurou um novo modelo de migração, em todo o planeta, sobretudo, após a descolonização da África e da Ásia.

Apesar de determinados autores e núcleos de pesquisa13 privilegiarem os estudos das migrações internacionais em âmbito mundial, consideramos que o fluxo migratório limítrofe necessita de análises mais amplas, no intuito de identificar as estruturas desses movimentos e contribuir com as políticas sociais inclusivas, à medida que a migração se faz pela busca de trabalho e, se esse fluxo aumenta em determinados espaços sociais, é porque nesses espaços a mão-de-obra desses indivíduos é absorvida por alguns setores.

13 A Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) mantêm nos departamentos de Ciências Humanas alguns núcleos de pesquisas que estudam e analisam as migrações nacionais e internacionais.

Assim, os governos são os principais responsáveis pela instalação, inserção e inclusão digna desses indivíduos que também contribuem com o desenvolvimento e aumento das riquezas nacionais. Contudo a falta de vontade política dos governos em assumirem a responsabilidade em relação a esses indivíduos, promove uma visão sub- reptícia de seus cotidianos, relegando-os a simples objeto exótico, sobretudo quando noticiados em algum meio de comunicação expressivo.

Variados pesquisadores de universidades brasileiras têm na analise das migrações nacionais e internacionais o objeto de suas pesquisas, constituindo suas obras – teses, dissertações, artigos, livros, entre outros – material substancial de estudo e pesquisa. Entre os autores que se inserem nessa perspectiva podemos citar: Teresa Sales (1991; 1992; 1995; 1996, 1999 e 2000), Neide Patarra (1995, 1996, 1999 e 2004), Boris Fausto (1991 e 1999), Giralda Seyferth (1996, 1997, 1999a, 1999b e 2000), Sidney Antonio da Silva (1997, 1998, 2001 e 2003), Maria Tereza Schorer Petrone (2004), Lucia Lippi Oliveira (2001), Margherita Bonassi (2000) e Gladys Llajaruna Huayhua (2001).

No entanto, vários desses trabalhos que tratam das migrações internacionais estão pautados na análise dos movimentos que se deslocaram para o continente americano no final do século XIX e início do século XX. Paralelamente, outros estudos se configuram em exames de movimentos migratórios de brasileiros para o determinados países do continente americano e europeu.

Essas pesquisas, apesar de contribuírem no entendimento das causas da empreitada migratória, das transformações econômicas, sociais e políticas nos países de origem e destino, e do cotidiano dos imigrantes e suas famílias, não se enquadram diretamente no quadro conceitual de análise de nosso trabalho, à medida que examinam universos distantes – históricos e geográficos – e diversos do estudado nesta pesquisa.

Dessa maneira, privilegiamos nessa abordagem os trabalhos de pesquisadores que desenvolveram análises dos movimentos de sul-americanos para o Brasil desde a

década de 1980, uma vez que serviram como importante aporte para o estudo, configuração e análise de nosso objeto de pesquisa. Nesses trabalhos, o universo cotidiano desses indivíduos é examinado por intermédio de diversas categorias, tais como: trabalho, lazer, religiosidade, legislação, cultura e identidade. Tais análises não privilegiaram a educação escolar como elemento central, contudo, foram de suma importância para debatermos determinadas conceituações e considerações acerca do movimento migratório desses indivíduos e suas práticas cotidianas.

A dissertação de mestrado de Sidney Antonio da Silva, publicada em livro pela Paulinas Editora, sob o título Costurando sonhos: trajetória de um grupo de imigrantes bolivianos em São Paulo (1997), é um pioneiro trabalho sobre a imigração de sul- americanos para São Paulo, mas, sobretudo de bolivianos. Esse estudo foi realizado por intermédio de um trabalho de campo intercalado com a análise documental disponível sobre a imigração boliviana e seus aspectos culturais. No trabalho de campo, executa observação participante amparada por séries de entrevistas que procuram desvelar determinados aspectos do cotidiano desses indivíduos, indocumentados e regularizados, sobretudo em suas relações com os conterrâneos no trabalho nas oficinas de costura, no lazer na feira cultural aos domingos e nas festas religiosas da igreja católica. Segundo determinados dados publicados nessa pesquisa, os bolivianos instalados em São Paulo143 estariam representados em ampla maioria por homens,

originários de La Paz, com grau de escolaridade de nível médio. Cita determinadas cifras de órgãos governamentais em relação ao total de imigrantes, não apontando se houve levantamento de números totais na pesquisa de campo. A educação escolar que esses indivíduos possuíam e que recebiam nas escolas de São Paulo foi referenciada pelo autor que, porém, citou pontualmente e em poucas linhas, o problema gerado pela Resolução 09/90 que proibiu os imigrantes indocumentados de freqüentarem as escolas. Considera que os imigrantes bolivianos sofrem discriminação dissimulada em seus cotidianos, tornando sua inserção cultural na sociedade de destino relativamente

1413 O autor não esclarece se a pesquisa esteve voltada para a análise dos imigrantes bolivianos na cidade de São Paulo, na região da Grande São Paulo ou no Estado de São Paulo.

difícil. Também, estabelece que as festas religiosas são momentos significativos de aglutinação cultural entre os diversos grupos existentes na comunidade boliviana.

Nesse sentido, continuando o debate em torno da comunidade boliviana e suas formas de fazer o cotidiano em São Paulo, enfatizando as festas religiosas que havia iniciado na pesquisa anterior, Sidney Antonio da Silva conclui no ano de 2002 sua tese de doutorado sobre as festas marianas e sua influência nas relações sociais da comunidade boliviana, publicando em 2003 o livro Virgem/Mãe/Terra: festas e tradições bolivianas na metrópole, pela editora Hucitec. Essa investigação antropológica procura desvelar as transformações e fusões ocorridas nas devoções marianas e todo seu arcabouço simbólico que congrega de certa maneira os diferentes grupos étnicos da comunidade boliviana. Contudo, consideramos que o retorno à pesquisa anterior, no sentido de revisar alguns aspectos que eram datados, e outros que não estavam inteligíveis, tais como: o número aproximado de imigrantes, sobretudo os indocumentados15; a quantidade de indivíduos em relação ao gênero, os modelos de imigração – individual, familiar ou mista –, a faixa etária predominante, os departamentos de origem, o espaço produtivo de destino e as regiões mais propícias à instalação; foram de grande valia para a ampliação do entendimento do fenômeno imigratório de bolivianos para São Paulo.

O livro de Margherita Bonassi, “Canta, América sem fronteiras: imigrantes latino-americanos no Brasil” publicado pelas Edições Loyola; fruto de sua dissertação de mestrado realizada na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, e finalizada em 1999, centra sua análise no movimento de refugiados e imigrantes sul-americanos no Brasil. Essa obra enfatiza em seu conteúdo a questão jurídica aliada com a questão social desses indivíduos. Essa pesquisa foi desenvolvida por intermédio de observação participante-militante da autora, associada com entrevistas e análise documental. O mapeamento das migrações internacionais na América-Latina, intercalada com um exame histórico da legislação imigratória brasileira, nos fornece importante

15 Sabemos das dificuldades em aferir o total de imigrantes indocumentados, no en tanto, em uma pesquisa de campo em que o investigador observa, participa e dialoga com os seus informantes, torna-se possível construir alguns dados, inclusive um número aproximado de individuos indocumentados.

compreensão sobre determinadas causas e conseqüências desse movimento em direção território brasileiro, principalmente ao aproximar os ditames da Lei à realidade cotidiana desses indivíduos. Faz-se necessário considerar o debate realizado pela autora no que tange a Resolução 09/90 que proibia as crianças imigrantes indocumentadas de freqüentarem as escolas em São Paulo. O material utilizado para o debate foi em parte produzido por Margherita em sua atuação militante junto aos imigrantes indocumentados.

A dissertação de mestrado de Gladys Llajaruna Huayhua, defendida em 2001 na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, é um estudo principiado por uma análise qualitativa que utilizou história de vida como método a fim de, por intermédio de depoimentos gravados, analisar o processo de transformações culturais e identitários de jovens imigrantes peruanos instalados na cidade de São Paulo. Essa pesquisa é de suma importância para todos os interessados em compreender as questões que permeiam o universo de indivíduos que se encontram em um novo espaço cultural. Utilizando os conceitos de socialização, aculturação e identidade, a autora analisa os depoimentos de seus informantes a fim de mostrar os procedimentos que permeiam a vida desses indivíduos ao se inserirem em uma nova cultura, construindo assim uma nova identidade social.

Consideramos que as análises produzidas por estes trabalhos se inserem no rol de materiais essenciais para todos aqueles que pretendam debater os movimentos imigratórios e as questões que os permeiam, principalmente no concernente as condições sociais que engendram essa empreitada, e as condições sociais presentes na sociedade que os agrega.