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Impactos ambientais: visitantes e participantes em geral.

Mazelas Sociais

CAPÍTULO 4 IMPACTOS AMBIENTAIS DO FESTIVAL: IMPACTOS DIRETOS E INDIRETOS

4.2 FESTIVAL FOLCLÓRICO DE PARINTINS: IMPACTOS DIRETOS.

4.2.1 Impactos ambientais: visitantes e participantes em geral.

Em relação ao meio ambiente, as entrevistas demonstraram que o tema dos resíduos sólidos é o que mais preocupa os atores locais. A Secretaria Municipal de Obras e Serviços Públicos (SEMOSP) informa que Parintins gera diariamente, entre 65 a 70 toneladas de resíduos sólidos. No Festival Folclórico de Parintins a quantidade de resíduos produzidos duplica e até triplica, dependendo da quantidade de pessoas que chegam à ilha.

Antes da realização do evento, a prefeitura efetua um trabalho de limpeza e embelezamento das ruas para receber a enorme quantidade de visitantes. Entretanto, todo o seu trabalho de limpeza se perde, quando tais visitantes misturados aos próprios

parintinenses começam a festejar o Festival, lançando toda sorte de materiais nas ruas, sem nenhum tipo de controle. O primeiro impacto do despejo dos materiais é o visual, é a alteração da paisagem das ruas de Parintins, como afirma a entrevistada MB5:

[...] Eles (os visitantes) não tem cuidado com o lixo, jogam o lixo na rua, não há um cuidado quanto a isso. No último dia do festival, a cidade fica imunda, é lixo pra todo canto, é um montueiro de coisas que ficam por aí, mas logo, logo é amenizado isso. No segundo dia, a cidade volta ao normal.

A poluição gerada nos dias do Festival é rapidamente amenizada, pois a prefeitura envia agentes de limpeza, em parceria com os catadores de recicláveis. Estes trabalham para reestabelecer a “normalidade ambiental” às ruas de Parintins, pós evento. O grande problema é todo o resíduo sólido que não é coletado neste ínterim (do começo do evento até o fim).

Desta forma, um dos impactos ambientais que influencia diretamente a produção dos resíduos sólidos é a extrapolação da capacidade de carga em Parintins referente à competência para lidar com os resíduos produzidos. Apesar de haver pessoas que trabalham na coleta de materiais durante o evento e um maior efetivo depois do mesmo, na percepção dos atores locais ainda não é o suficiente. O entrevistado MS7 fala sobre esta insuficiência na coleta de resíduos:

[...] Durantes os 3 dias as ruas ficam sujas, as pessoas que trabalham na limpeza não dão conta de limpar a cidade toda, pois há muita coisa sendo despejada nas ruas, o tempo todo.

Não dar “conta de limpar a cidade toda”, está de acordo com o que MB5 fala sobre a sujeira nas ruas ser amenizada. Quando o Festival começou a ser conhecido fora do Amazonas, a quantidade de pessoas que chegavam à Parintins, às vezes, dobravam o número de pessoas presentes na área urbana do município. Em um certo sentido, é como se a cidade fosse invadida por turistas em uma semana, gerando impactos ambientais que podem reverberar pelo ano todo.

Na percepção de MC19, a cidade ainda não está preparada para receber tal invasão, já

AD11 vai além, ele percebe que falta uma cultura ambiental por parte do povo do Norte em

relação aos resíduos. Vejamos:

[...] Olha, dizer que uma festa como esta não causa impactos, é mentira. Um momento em que a cidade é “invadida”, em que tem sua população quase dobrada, é bem incômodo. É incômodo você se locomover pela cidade, é incômodo ver a quantidade de lixo despejadas nas ruas, a cidade não foi preparada para receber esse povo todo, ainda não está preparada, na verdade.

[...] Quanto a questão ambiental [...] primeiro, o grande volume de pessoas traz um grande problema: A cidade fica “entupida” de gente e o lixo que eles

geram. A maioria dos turistas que vem pra cá são da região norte, se você for comparar a consciência ambiental do povo do norte com o do sul, a do norte é muito menos avançada que a do sul. Jogar lixo no chão é comum para o povo do norte. Do Amapá pra cá (a região Norte como um todo) vem gente, isso causa impacto na cidade por causa do lixo.

As falas mostram duas percepções diferentes, as duas estão ligadas à superlotação de pessoas durante os dias da festa, mas uma recai sobre a falta de estrutura da cidade para receber o grande número de visitantes, enquanto a outra responsabiliza a falta de “consciência ambiental do povo do Norte”.

Quanto à percepção de AD11, faz-se necessário uma outra pesquisa para saber se a sua percepção corresponde à realidade dos nortistas. É muito mais fácil concordar com MC19, quando o mesmo fala sobre a falta de estrutura, pois tal coisa é facilmente constatada nos dias do Festival.

A falta de elementos básicos referentes ao controle ambiental no Festival foi constatado empiricamente. Nas áreas de maior concentração de pessoas, a saber: o centro e os arredores do bumbódromo, pouquíssimas lixeiras, que na verdade eram depósitos improvisados pela própria população, foram encontradas. Tais “lixeiras” estavam abarrotadas de toda sorte de resíduos, os quais transbordavam para a rua.

Como pode um local, como Parintins, que realiza um evento de grandes proporções e atrai várias pessoas, descuidar-se de um aspecto tão básico? Os resíduos ficam para os parintinenses coletarem. Então, o mínimo requerido seriam vários locais espalhados pela cidade para comportar os resíduos sólidos gerados. MT6, MS7 e VP8, respectivamente, endossam o que está sendo afirmado:

[...] Fica muita sujeira. Ano passado não havia lixeiras, o lixo tomou conta. Isso é lastimável. Algumas pessoas improvisam as lixeiras.

[...] Não há muitas lixeiras em Parintins, na orla da cidade também não há muitas lixeiras, então quando as pessoas que estão bêbadas terminam de tomar sua bebida jogam suas latinhas no rio. Ou as deixam jogadas na praça. Quando acaba o festival, fica uma nojeira.

[...] É preciso ter mais lixeiras nas ruas, pessoas orientando na separação do lixo e conscientização do próprio público.

Os resíduos sólidos produzidos no âmbito dos participantes do Festival, ou seja os resíduos que não estão associados às agremiações, geralmente são resíduos urbanos domiciliares, comerciais e públicos. Os resíduos domiciliares são produzidos na atividade diária dos cidadãos, são os restos de alimentos, embalagens, papel, pedaços de louças, vidro, plásticos, metais etc. Os comerciais são os produzidos em atividades de empresas e escritórios, e os resíduos são semelhantes aos domiciliares. E os públicos são os resíduos coletados nas ruas, nas feiras livres; referem-se aos restos de hortaliças, madeira e aos

produtos “descartados indevidamente pela população, como entulho, bens considerados inservíveis, papéis, restos de embalagens e alimentos.” (ZANETI, 2006, p. 62)

Durante o Festival, as atividades dos estabelecimentos comerciais, como bares e restaurantes, aumentam consideravelmente, levando a uma maior produção de resíduos sólidos. Os resíduos que mais inquietam os atores locais entrevistados são referentes aos restos de alimentos, bebidas e as embalagens que os comportam. MM26 identifica os resíduos deixados pelas ruas:

[...] Nas ruas são despejadas muitas coisas durantes esses dias: garrafas plásticas, latinhas de cerveja, embalagens de alimentos, lenços de papel, espetos de churrasco, algum resto de comida.

Em um primeiro momento, estes resíduos podem parecer inofensivos, já que logo após o termino do evento, e mesmo durante, há a coleta e trabalho de limpeza na cidade. Mas há alguns problemas que tais resíduos podem acarretar ao meio ambiente e à saúde pública, pois em Parintins, ainda não há uma disposição correta para os resíduos. Desta forma, mesmo que coletados, os resíduos não terão a destinação correta (Na seção sobre os impactos indiretos, a destinação dos resíduos será melhor abordada)

Como a produção de resíduos é muito grande e o trabalho de coleta não é suficiente, cria-se um acúmulo de resíduos pelas ruas à espera de serem coletados. Levando em conta, somente os resíduos descritos por MM26, nota-se o risco ambiental que o Festival acarreta para a cidade. As embalagens plásticas, a latinha de cerveja e o papel são fontes de metais pesados e tóxicos como o mercúrio, o cádmio e o chumbo, dentre outros que se não forem bem manuseados e terem uma disposição final correta, podem poluir o solo e as águas, gerando, além de degradação, as mais variadas doenças (SISINNO, 2000).

O acúmulo de resíduos durante os dias do Festival além de impactar a paisagem das ruas, sujando a cidade e gerando repulsa por parte dos entrevistados, podem acarretar doenças em Parintins. Aqui entram em cena os vetores: “vários animais encontram no lixo alimento e abrigo, ou seja, condições favoráveis para sua proliferação. Muitos são vetores responsáveis pela transmissão de inúmeras doenças ao homem.” (idem, 2000, p. 44)

Com a aglomeração de resíduos pelas ruas, há a proliferação de ratos e insetos pelas casas em Parintins, como afirma ER18:

[...] Há uma proliferação muito grande de ratos e insetos em Parintins, eu já observei isso, nos quintais. Para tu teres uma ideia, conversando com os alunos em sala de aula, eles dizem que tem um aumento de ratos nos quintais deles.

Os roedores são portadores de várias doenças, as proliferando por meio das fezes e urina. Dentre estas doenças está a peste bubônica, o tifo murinho, a leptospirose, febre, triquinelose (ingerir carne de animal que tenha se alimentado de rato infectado) e salmonelose. Quanto aos insetos (moscas, mosquitos, pulgas e baratas), as doenças mais comuns são febre tifoide e diarreias infecciosas, peste bubônica, leishmanioses, febre amarela, malária e dengue.

Além dos roedores e insetos, locais que apresentam restos de comida atraem cães abandonados e um dos principais vilões dos aeroportos do Amazonas, os urubus. Tais animais podem carregar consigo a toxoplasmose, sendo repassadas ao ser humano por meio da alimentação. Além de colocarem em riscos os voos.

A produção de resíduos sólidos aliada à falta de um comprometimento real em lidar com o problema, traz à Parintins um ônus muito grande do ponto de vista ambiental. A poluição causa impactos no solo, nas águas, na paisagem e na saúde do povo. O entrevistado JD34 afirma que o problema ambiental resultante dos despejo indiscriminado de resíduos nas ruas e em outros locais de Parintins, mediante o advento do Festival, gera impactos significativos no cotidiano das pessoas, mas estas nem se dão conta disto:

[...] A poluição resultante dos resíduos descartados irregularmente deve-se aos metais que se dissolvem com a ação de vários produtos, a combinação destes elementos químicos podem originar outros, e principalmente o chorume, todo esse material pode chegar ao lençol freático. Os metais na água podem se acumular no organismo, eu tenho dito que as doenças decorrentes da poluição são em longo prazo, as pessoas tendem a não sofrer de imediato, na maioria das vezes elas nem se dão conta de que isso é causado pelas suas próprias ações e pelo movimento no Festival.

Um aspecto citado em muitas entrevistas é a preocupação com o impacto dos resíduos sólidos na água. Parintins é uma ilha, onde o seu centro comercial é próximo da sua orla, lá há uma grande concentração de pessoas todos os dias do Festival, portanto é um local vulnerável ao despejo de resíduos sólidos. Na fala dos entrevistados, a preocupação com os resíduos sólidos lançados nas águas de Parintins, divide-se em dois aspectos: os resíduos lançados pelos visitantes em terra firme e os resíduos lançados pelas/das embarcações que atracam na orla de Parintins.

Quanto aos resíduos lançados pelos visitantes que estão próximos à orla, os descartados são os mesmos que são lançados nas ruas: garrafas plásticas, papel e latas de cerveja. Os entrevistados JC2 e MS7, respectivamente:

[...] No rio é jogado plástico e outros materiais. Observa-se que os próprios visitantes não tem a conscientização, isso é do ser humano, ele é destrutivo.

[...] Como eu disse anteriormente, o povo bebe bastante e joga as latinhas de cerveja, garrafas e outras coisas em qualquer lugar, dentre esses lugares, o rio.

Apesar de muitos parintinenses participarem das ações deletérias ao meio ambiente na época do Festival, há um certo conflito ambiental. Os visitantes são tidos como aqueles que poluem o rio, ou melhor, os que não possuem “conscientização”, lembrando o que AD11 afirmou sobre a falta de cultura ambiental do povo do Norte.

Em se tratando das embarcações que chegam à Parintins, este princípio de conflito ambiental torna-se mais evidente. O Festival Folclórico de Parintins notabiliza-se por atrair

pessoas de todas as classes sociais; os visitantes com maior poder aquisitivo compram pacotes fechados, incluindo passagens aéreas, hospedagem e ingressos. Por outro lado, há um grande número de pessoas que chegam à ilha por meio dos barcos, estes chegam abarrotados de gente ávidas pelo Festival. Entre estas pessoas que chegam por meio dos barcos, há quem não consiga hospedagem em Parintins, sendo obrigados a permanecer nos barcos até o fim do Festival.

As entrevistadas VP8 e ER18 relatam sua preocupação quanto às embarcações que chegam à Parintins:

[...] Um dos principais problemas ambientais é o lixo lançado nos rios. Como o principal meio aqui é o barco, todas as horas chegam embarcações aqui, as pessoas jogam lixo dos barcos no rio, todo tipo de lixo.

[...] A questão dos barcos é uma coisa seríssima, não tem uma fiscalização, eles se aglomeram 3 dias direto nos barcos, quanto de dejetos se joga no rio, quem é que fiscaliza? Não tem uma preocupação com a saúde, fica um verdadeiro esgoto a céu aberto em frente ao rio Amazonas.

As embarcações, além de lançar resíduos sólidos, lançam no rio efluentes com o mínimo ou ausência total de tratamento, pois na maioria das vezes os barcos que navegam pela Amazônia não possuem um sistema de tratamento dos seus efluentes. Isto constitui-se em um sério problema ambiental, sendo que a noção de esgoto a céu aberto por parte da entrevistada ER18, faz todo sentido. Grande parte da água utilizada para consumo humano é proveniente dos rios, e é neles que os efluentes, de origem doméstica ou industrial, são dispostos. Desta forma, é essencial que os efluentes sejam tratados da melhor forma possível, pois eles podem prejudicar o uso futuro da água (BASSOI e GUAZELLI, 2004).

A poluição das águas em Parintins impacta a paisagem aquática, impacta a qualidade da água e também impacta locais que poderiam ser usadas para o turismo, como apontam

[...] Um dos principais cartões postais de Parintins está poluída, a Lagoa da Francesa, local de atracação de embarcações, especialmente na época do Festival.

[...] Existem impactos ambientais que acontecem na cidade, eles são em diversos pontos da cidade. Por exemplo, você vai ver a Lagoa da Francesa quando termina o festival, ela está tomada pelo lixo, fora o lixo que está no fundo do rio, à frente da cidade, as lagoas, os portos por detrás da cidade ficam tomados pelo lixo.

Faz-se necessário um trabalho intenso para mudar esta realidade, pois não há fiscalização nos barcos, não há qualquer controle sobre a poluição que estas embarcações e as pessoas que nelas estão acarretam. Devido ao impacto na qualidade das águas em Parintins, o trabalho de tratamento hídrico pode ser muito mais custoso e nem sempre o município possui recursos suficientes. Este é o caso, por exemplo, do plano de gerenciamento de resíduos sólidos em Parintins, onde a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente (SEDEMA) afirma que o munícipio não possui recursos para elaborá-lo e implantá-lo, segundo recomenda a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) (CARDOSO FILHO, 2012).

Um munícipio que recebe recursos para realizar um megaevento, mas padece de soluções básicas é contraditório. Portanto, é preciso rever as prioridades para Parintins não ter que conviver, ano após ano, com a realidade apontada por AD11:

[...] a maioria vem em barcos, “moram” nos barcos ao redor de Parintins. Como Parintins é uma ilha, praticamente todo o arredor da cidade fica ocupada por barcos, nesses barcos as pessoas “moram”, jogam lixo no rio, as necessidades fisiológicas são feitas e despejadas no rio, não existe embarcação, nem existe lei que cobre das embarcações que elas tenham um sistema de tratamento diferente para estes efluentes. Imagine milhares de pessoas nas embarcações fazendo suas necessidades pelo menos uma vez por dia, isso é um impacto ambiental tremendo.

Esses foram os impactos ambientais diretos que mais chamaram à atenção dos entrevistados quanto à ação impactante dos visitantes e participantes em geral. Nota-se que a ideia de que tudo funciona no Festival é um tanto contraditória quando abordamos as relações da festa com o meio ambiente. O evento gera uma demanda por melhores ações ambientais, devido ao número de pessoas que chegam à ilha, mas não tem dado conta de resolver estes problemas de forma satisfatória. A seguir, veremos os impactos diretos referentes às ações das agremiações folclóricas, Garantido e Caprichoso.