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3.3 O Serviço Social e a Gestão da Qualidade nas IPSS

3.3.1 Impactos da norma ISO 9001:2008 no exercício

3.3.1 Impactos da norma ISO 9001:2008 no exercício profissional dos Assistentes Sociais nas IPSS.

A discussão acerca da gestão da qualidade no Serviço Social tem vindo a revelar-se um dos tópicos centrais dos últimos anos (Langen, 2001).

Os seus efeitos, embora ainda pouco explorados na prática do Serviço Social levam, a que se tema pela padronização negativa das condições do trabalho social. Tomando como exemplo a Alemanha, a introdução de medidas de Qualidade nas instituições de solidariedade social consolidou-se, neste país, no dia 1 de Janeiro de 2009. Desde então, estas organizações têm vindo a ser pressionadas para negociar contratos de qualidade para o desenvolvimento com as autoridades locais. Este facto tem provocado o debate no seio do Serviço Social por considerar que por um lado, este

72 sistema irá exigir uma maior transparência e melhor adequação entre as necessidades e os serviços, mas por outro lado, a introdução de medidas de gestão de qualidade que têm por origem o sector industrial, poderá levar a uma padronização da prática profissional e consequentemente à perda de autonomia profissional e auto controlo (Beckmann et al., 2007).

Para os mesmos autores do estudo, as profissões são vistas como agências especializadas em problemas de processamento e a resolução de tais problemas requer uma margem de apreciação para um julgamento pessoal. A discrição e o controlo profissional são tidos como elementos fundamentais para o desenvolvimento da qualidade profissional, desta forma, a padronização do controlo e da discrição profissionais através de procedimentos de gestão de qualidade, representa a intromissão na autonomia profissional.

Nesta linha de pensamento, Iamamoto (2001) refere que um profissional de Serviço Social deve ser dinâmico devendo na sua actividade, estabelecer uma ruptura com a actividade burocrática rotineira que traduz a acção ao mero cumprimento de actividades preestabelecidas. Ao contrário, no exercício da sua profissão, o Assistente Social tem competência para propor e negociar os seus projectos com as instituições. Para tal, devem ir além as rotinas institucionais de forma a detectar tendências e possibilidades de mudança.

Szarfenberg (2010) reitera que na actualidade domina a ideia de que a melhoria da qualidade deve ser alcançada utilizando estratégias e instrumentos recomendados e aplicados no sector privado. No entanto, os modelos de qualidade do sector fabril e dos serviços comerciais podem não funcionar bem nos serviços sociais. Embora já existam estudos efectuados sobre a qualidade neste sector, nenhum deles concluiu que os requisitos da norma ISO 9001:2008 estão ajustados às especificidades das IPSS e dos clientes. Também não são conhecidos dados concretos que confirmem a existência de um impacto significativo na melhoria da qualidade de vida dos clientes nas IPSS.

Desta forma, Langen (2001) refere Speck (1999) que ilustra alguns impactos do SGQ nas IPSS que podem chocar com os valores do Serviço Social:

• A orientação em direcção a um mercado livre pode gerar conflitos com a natureza do Serviço Social;

73 • O termo cliente relacionado com aspectos económicos tem um significado diferente para o Serviço Social;

• A economização da qualidade social orientada para o mercado livre leva a um comportamento com consequências fatais para os mais desfavorecidos socialmente;

• A padronização dos serviços faz diminuir a criatividade dos cuidadores;

• A gestão da qualidade é usada essencialmente como forma de diminuir as perdas de dinheiro;

• A gestão da qualidade não é mais que um novo mito;

• A maioria dos procedimentos utilizados na gestão da qualidade foram concebidos para as necessidades da economia e não são ajustadas às instituições que praticam o Serviço Social;

• A quantidade pode ser medida, a qualidade não.

Após esta reflexão, Langen (2001) assume que existem questões difíceis de responder tais como:

1- A qualidade no Serviço Social só agora foi descoberta? As Instituições só agora sentem a preocupação em fazer o melhor pelos seus clientes não reflectindo sobre este aspecto no pré gestão da qualidade? Porque a gestão da qualidade tem sido tão debatida na última década?

2- Como se pode definir a boa qualidade em Serviço Social dado que a norma é padrão em todo o mundo?

A qualidade no Serviço Social não é uma invenção do presente. Desde há 150 anos, quando o Serviço Social emergiu como profissão, as instituições tentaram sistematicamente desenvolver a acção com qualidade através de reflexões permanentes, dos feedbacks da acção, de novas propostas de acção de forma a exercer a actividade pelo melhor caminho.

A crescente importância do tema qualidade na última década, tem que ser vista em conexão com os gastos sociais crescentes e os rendimentos decrescentes do terceiro sector. A gestão da qualidade neste contexto é frequentemente utilizada para fins de controlo e cortes financeiros descurando as necessidades dos clientes sendo este aspecto contraditório com o código de ética do Serviço Social. Não se pode descurar que proporcionar "melhor qualidade aos destinatários" é o tema central do Serviço Social e

74 como tal existem aspectos que podem chocar com os seus valores. Exemplo disso é a impossibilidade de padronizar e regulamentar de um encontro entre um Assistente Social e um cliente que se pretende singular e que ao ser padronizado pode enfraquecer a relação social entre ambos. Relacionado com este aspecto encontra-se o valor fundamental do Serviço Social que é a Humanização. A humanização requer respeito pela dignidade humana e orientações para os direitos humanos. Isto também significa orientação para atender às necessidades específicas de cada um não podendo estandardiza-las. Os Assistentes Sociais têm a responsabilidade de proteger a dignidade e especificidade humana de modo a afastar o conceito de “homem meramente económico” desprovido de necessidades afectivas e emocionais. Também a Autonomia na execução da acção dos Assistentes Sociais deve ser preservada pois existem tomadas de decisão que têm que ser ponderadas em função do cliente e das suas necessidades e não em função dos regulamentos. Nas instituições de solidariedade social a autonomia pode ser entendida como forma de prestar ajuda para a sua auto-ajuda sendo esta uma das missões fundamentais do Serviço Social (Langen, 2001).

Outro aspecto fundamental a salientar prende-se com os recursos que os clientes detêm, a capacidade de criatividade para resolver a sua situação, isto é, os clientes não são apenas pessoas com necessidades, como tal, estes aspectos devem ser levados em conta no desenvolvimento dos conceitos da gestão da qualidade. Este aspecto remete para o facto de a estandardização contradizer o dinamismo que se quer no desenvolvimento humano, existem serviços específicos que não podem ser estandardizados. Para finalizar, Langen (2001) defende que a melhor forma de possibilitar elevados níveis de qualidade no seio do Serviço Social e nas instituições de solidariedade social é o incremento de competências profissionais nos colaboradores, melhorar as infra-estruturas de forma a promover conforto e boas condições de trabalho, e realizar reflexões sistemáticas acerca do trabalho que a instituição e os profissionais têm vindo a praticar.

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