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Os impactos do modelo de crescimento econômico com inclusão pelo consumo sobre o mercado

Capítulo 2: Emprego, consumo, flexibilização e dinâmica sindical nos governos petistas

2.2 Os impactos do modelo de crescimento econômico com inclusão pelo consumo sobre o mercado

Os anos 2000 trouxeram uma nova fase de crescimento econômico com geração de emprego e valorização real dos salários para a realidade brasileira. Os indicadores de mercado de trabalho e a evolução da regulação pública do trabalho guardam, entretanto, algumas

contradições e não seria possível analisá-las sem considerar a dinâmica econômica do período. Os anos em que o PT esteve na Presidência da República foram marcados por maior crescimento econômico conquistado, sobretudo, pela indução do mercado interno com ampliação da “sociedade de consumo de massa” (MEDEIROS, 2015). Essa trajetória foi inicialmente impulsionada por um ciclo de exportações favoráveis já presente em 2003, seguida pela adoção de políticas governamentais de valorização da renda, de impulso ao crédito e ao consumo, sobretudo a partir de 2006, com consequente impacto sobre a indução do investimento e o crescimento do emprego. Esse ciclo começou a ser revertido com a mudança de enfoque da política econômica e ampliação do ajuste fiscal a partir de 2011 e apesar das tentativas de redução dos ganhos financeiros e de indução do investimento privado. Com a deterioração dos indicadores econômicos e com o aumento do grau de insatisfação da população brasileira expressado nas Manifestações de Junho de 2013 consolidou-se um rápido aprofundamento da crise econômica e política no país.

A expansão do mercado interno foi o núcleo da estratégia de crescimento do período, pois a partir do boom das commodities, uma série de políticas de indução ao consumo viabilizaram o crescimento da economia. Como se vê no gráfico 1, o consumo foi a variável que mais contribuiu para o crescimento do PIB entre os anos 2003 e 2014.

Gráfico 1: Crescimento do PIB e contribuição dos componentes da demanda ao crescimento (%), 2003-2014.

Fonte: IBGE - Sistema de Contas Nacionais Referência 2010. Elaboração própria.

Em 2003, o PT iniciou o governo enfrentando as consequências econômicas do ataque especulativo que a moeda nacional sofrera durante as eleições presidenciais, quais sejam a aceleração inflacionária, a depreciação do real e a deterioração das finanças públicas. Para lidar

com este cenário, manteve o tripé macroeconômico baseado na revisão altista das taxas de inflação, no aumento da taxa básica de juros, na meta de superávit primário e na manutenção da política de câmbio flutuante. O impacto inicial dessa política foi a desaceleração do crescimento econômico em 2005, apesar do bom desempenho do setor externo.

Entre 2003 e 2005 verificou-se uma recuperação da atividade econômica resultante da situação favorável do comércio mundial, como pode ser visto no Gráfico 1. O crescimento médio do PIB no período foi de 3,4%, não tendo sido mais significativo em virtude da manutenção da visão conservadora sobre o potencial de crescimento da economia brasileira (BARBOSA; SOUZA, 2010).

A dinâmica exportadora do período passou a impactar menos o crescimento do PIB nos anos seguintes. O crescimento do consumo das famílias (em magnitude significativa desde 2004) se intensificou. Desde 2004 o crescimento do consumo vinha sendo estimulado pelas políticas de ampliação do acesso ao crédito, pelo alargamento das transferências de renda aos mais pobres e pela política de valorização do salário mínimo. Entretanto, é a partir de 2006 que, com a redução das exportações, o consumo solidifica sua posição enquanto principal motor de crescimento engendrando a ampliação da dimensão de uma “sociedade de consumo de massa” no Brasil.

A partir de 2006, em meio à crise do mensalão51, nota-se uma mudança de posição do governo em relação ao crescimento econômico, como ressaltam Barbosa e Souza (2010) e Baltar et al. (2010). Segundo os autores, um sintoma dessa mudança foi a recusa do governo em aprofundar o ajuste fiscal, optando pelo alargamento da política de valorização do salário mínimo, pela restauração do quadro de pessoal e do nível de salários dos funcionários públicos e pelo aumento do investimento público, a exemplo do lançamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e da capitalização do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O ano de 2006, neste sentido, marca a passagem para uma mudança do papel do Estado na economia.

A partir desse momento, a aceleração da taxa de crescimento responde a um padrão de crescimento sustentado, majoritariamente, na demanda doméstica (consumo e investimento) e não mais na demanda externa. Deste modo, embora as exportações, principalmente de       

51 A crise do mensalão consiste na denúncia de compra de votos de parlamentares para a aprovação, pelo Congresso Nacional, de projetos de interesse da Presidência da República.

commodities industriais, agrícolas e minerais, tenham exercido papel fundamental no acúmulo de reservas e no afastamento da vulnerabilidade externa, a demanda interna cumpriu o papel determinante no ciclo de crescimento, que passou a ser liderado pela retomada do consumo. Por sua vez, o aumento do consumo, sobretudo de bens duráveis e semiduráveis, a expectativa de continuidade nos elementos que favoreciam sua expansão e a retomada de políticas para coordenação do investimento produtivo e de infraestrutura passaram a ser elementos constitutivos do processo de estímulo ao investimento (SARTI; HIRATUKA, 2011), que veio a ultrapassar a contribuição do consumo para o crescimento do PIB no ano de 2010. Como resultado, entre 2006 e 2010 a taxa média de crescimento do PIB foi de 4,5% e poderia ter sido ainda mais expressiva não fosse a reversão do crescimento no ano de 2009, por conta dos impactos da crise internacional.

A ampla massificação dos bens de consumo duráveis ocorrida no período deve-se, como pontua Medeiros (2015), ao aumento do salário mínimo (seu atrelamento aos benefícios previdenciários e ao Benefício de Prestação Continuada) e do emprego assalariado formal, à expansão do crédito e à valorização do câmbio. Segundo o autor, este último foi um aspecto central na contenção do custo de vida, permitindo que a elevação do salário mínimo nominal resultasse em aumento do salário real. Tal elevação se deu na ordem de 72,31% em termos reais, como se vê na Tabela 1.                  

Tabela 1: Reajuste do Salário Mínimo 2003-2014. Período Salário Mínimo(R$) Reajuste Nominal (%) INPC (%) Aumento real Abril de 2002 200,00 Abril de 2003 240,00 20,00 18,54 1,23 Maio de 2004 260,00 8,33 7,06 1,19 Maio de 2005 300,00 15,38 6,61 8,23 Abril de 2006 350,00 16,67 3,21 13,04 Abril de 2007 380,00 8,57 3,30 5,10 Março de 2008 415,00 9,21 4,98 4,03 Fevereiro de 2009 465,00 12,05 5,92 5,79 Janeiro de 2010 510,00 9,68 3,45 6,02 Janeiro de 2011 545,00 6,86 6,47 0,37 Janeiro de 2012 622,00 14,13 6,08 7,59 Janeiro de 2013 678,00 9,00 6,20 2,64 Janeiro de 2014 724,00 6,78 5,56 1,16 Total do período 262,00 110,05 72,31

Fonte: DIEESE (2014a, p. 4)

A manutenção dos níveis de consumo entre 2008 e 2009 reflete o conjunto de medidas adotadas para impedir a desaceleração do crescimento da economia. Com a crise, o governo optou por responder à queda do preço internacional das commodities e à contração inicial do crédito doméstico, adotando uma série de medidas monetárias e fiscais anticíclicas, tais como: a redução do depósito compulsório do sistema bancário, a intensificação do papel dos bancos públicos no aumento da concessão de crédito e na redução dos spreads, o alargamento do período de concessão e valor do seguro-desemprego, o lançamento do programa habitacional “Minha casa, minha vida” e a redução da taxa básica de juros da economia. Com essas medidas, em 2009 a economia recuou em 0,1%, recuperando-se rapidamente para 7,5% em 2010.

O bom momento vivenciado pela economia brasileira começa a dar indícios de esgotamento no ano de 2011. Neste ano, uma falha de avaliação do governo o levou a reduzir o nível de investimentos públicos e os estímulos ao consumo com vistas a reduzir os impactos inflacionários decorrentes da recuperação do nível de atividade econômica em 2010. Diante desta iniciativa, o crescimento do PIB em 2011 foi de 3,9% e em 2012 de apenas 1,9%, evidenciando, os problemas da estratégia de desaceleração adotada pelo governo em um contexto de aprofundamento da crise externa e de esgotamento do consumo no mercado doméstico.

Para enfrentar esse cenário, entre o final de 2011 e 2014 o governo realizou uma tentativa deliberada de implementação de uma “nova matriz econômica” baseada no estímulo ao

investimento privado. Esta, entretanto, não forneceu os resultados esperados apesar da depreciação do câmbio, da redução da taxa de juros, do conjunto de isenções fiscais fornecidas e da política de concessões públicas para aumentar a presença do setor privado na área de infraestrutura. Assim, embora os estímulos tenham sido concedidos, tal política não teve sucesso em induzir, em termos agregados, a produção e o investimento privado na indústria de transformação. Já o nível de investimentos públicos permaneceu em patamar muito baixo, sofreu queda em 2011 e em 2013 não havia recuperado a proporção do PIB que possuía em 2010 (CARDOSO JR; NAVARRO, 2014). Como resultado, a taxa de crescimento do PIB alcançou 3% em 2013, sobretudo pelo desempenho do consumo, e em 2014 ficou em 0,1%. Entre 2011 e 2014 a média de crescimento do PIB foi de apenas 2,2%.

As explicações para a reversão do ciclo não apresentam consenso na literatura. Para Singer (2015), tratou-se de um boicote do setor industrial ao ensaio desenvolvimentista que, progressivamente, foi se afastando de Dilma, “alinhando-se lenta e continuamente ao bloco rentista de oposição” (SINGER, 2015, p. 59). Para Bastos (2015) e Hiratuka (2015), as causas da reversão relacionam-se, no campo econômico, com a estagnação da produção decorrente da desaceleração cíclica da demanda, do aumento do coeficiente importado e da estabilização dos níveis de capacidade ociosa.

Numa tentativa de aliar as explicações nos diferentes campos, Carneiro (2017) afirma que foi no plano político que os vetores econômico e social desaguaram. Para o autor, um movimento de perda de dinamismo na mobilidade social, sobretudo daqueles de média e alta rendas, gerou um crescente processo de insatisfação social e política, restringindo as possibilidades de repactuar as alianças em nome de um novo e necessário ciclo de investimentos. A deserção dos industriais, outro elemento explicativo, resultou da redução do crescimento do fluxo de caixa e do aumento das dívidas das empresas, processo que ganhou corpo entre 2011 e 2014 e se acentuou a partir de 2015 em virtude da recessão e da desvalorização cambial (CARNEIRO, 2017).

Ao lado desse processo, o endividamento crescente das famílias e as sucessivas tentativas de desvalorização do real realizadas no governo Dilma reduziram a capacidade de consumo da população. A desvalorização do real limitou a capacidade de consumo de bens importados pela classe média. Quanto ao nível de endividamento das famílias, esse cresceu de 18,5% para 46% da renda disponível entre 2005 e 2014, sendo que o grupo de tomadores de

menor renda (até 3 SMs) passou a ser o mais representativo em número de tomadores e o segundo maior em volume de crédito. Além disso, para os tomadores nessa faixa de rendimento a modalidade de crédito de maior peso no endividamento, no ano de 2014, foi o crédito imobiliário, seguido pelo crédito consignado (BCB, 2015). Neste sentido, parece ser entre as faixas de menor rendimento que se encontram os cidadãos mais endividados e dentre eles o crédito ao consumo direto desponta como uma das importantes causas do crescente comprometimento da renda, explicando, assim, a queda da capacidade de consumo dos cidadãos localizados nas menores faixa de renda.

Sintetizando a trajetória econômica desse período, é possível afirmar que a dinâmica do crescimento do PIB entre os anos 2003 e 2014 se caracteriza pelo maior crescimento econômico via indução do mercado interno com ampliação da “sociedade de consumo de massa” no país. Este trajeto foi inicialmente impulsionado por um ciclo de exportações favoráveis e posteriormente sustentado pela valorização salarial, pelo impulso ao crédito e ao consumo com consequente impacto sobre a indução do investimento e o crescimento do emprego. Essa dinâmica foi posteriormente arrefecida por uma estratégia de indução do investimento privado que não gerou os efeitos esperados.

Essa dinâmica de crescimento marcada pela indução do consumo, sobretudo de bens duráveis e semiduráveis e a expectativa de continuidade nos elementos que favoreciam sua expansão lograram estimular o investimento induzido pela demanda corrente (SARTI; HIRATUKA, 2011). Entretanto, a retomada do investimento autônomo, apoiado diretamente pelas ações do Estado e baseado sobretudo no aumento do investimento em infraestrutura, apresentou um crescimento modesto (CARNEIRO, 2017). Como observamos no gráfico 1, somente no ano de 2010, a contribuição de investimento para o crescimento do PIB ultrapassou a contribuição do consumo.

A redução do papel do investimento no crescimento econômico está atrelada à forma assimétrica com que o país se inseriu nas cadeias globais de valor e às opções de política econômica do período, pois as “condições de solvência de um país em desenvolvimento dependem tanto da ordem econômica (...) como das políticas macroeconômicas e industriais” (MEDEIROS, 2015, p. 146). Quanto ao primeiro ponto, um reflexo da posição marginal do país na produção mais internacionalizada de bens e serviços e a da consequente formação de uma estrutura produtiva nacional de caráter especializado e de baixo componente tecnológico foi o

baixo efeito de encadeamento do aumento do consumo sobre o investimento induzido (CARNEIRO, 2017) uma vez que parte da demanda de máquinas e equipamentos e insumos intermediários criada pela expansão do consumo acabou vazando para o exterior, ocasionado o aumento das importações (BALTAR, 2014; SARTI; HIRATUKA, 2017).

No que se refere às opções governamentais, “houve pouco ou nenhum avanço na política industrial brasileira”, condição fundamental para reparar o “vazamento para fora” proveniente da expansão do mercado interno (MEDEIROS, 2015, p. 165). O crescimento extensivo da indústria sem avanço nos setores e atividades de maior conteúdo tecnológico e a inexistência de uma política industrial voltada a ampliar as exportações industriais nas cadeias produtivas resultaram na manutenção substancial da estrutura da oferta. O resultado desse modelo de crescimento baseado no incremento do consumo doméstico e na manutenção do tripé macroeconômico (aumento da taxa básica de juros, meta de superávit primário e manutenção da política de câmbio flutuante) foi a ausência de mudanças estruturais na economia, pois mesmo o consumo mantendo uma trajetória ascendente até o ano de 2014, o produto industrial manteve-se estagnado de 2001 a 2013, declinando fortemente desde então, como mostram Sarti e Hiratuka (2017).

Assim, do ponto de vista da estrutura produtiva permaneceu a preponderância do setor de serviços, ao passo que a indústria de transformação perdeu espaço na composição do PIB. Destaca-se, também, o aumento da participação da indústria da construção civil e a queda na participação dos serviços industriais de utilidade pública.

Tabela 2: Composição do PIB por setor econômico (%), 2003-2014. Período Agropecuária

Indústria

Serviços PIB Ext.

mineral Transformação Construção Siup Total

2003 7,20 2,20 16,88 4,62 3,27 26,96 65,83 100 2004 6,67 2,46 17,79 4,94 3,45 28,63 64,69 100 2005 5,48 3,15 17,36 4,59 3,37 28,47 66,05 100 2006 5,14 3,51 16,59 4,35 3,23 27,68 67,18 100 2007 5,18 2,96 16,60 4,56 3,00 27,12 67,70 100 2008 5,41 3,82 16,52 4,37 2,62 27,33 67,26 100 2009 5,24 2,20 15,27 5,43 2,69 25,59 69,18 100 2010 4,84 3,33 14,97 6,27 2,81 27,38 67,78 100 2011 5,11 4,37 13,87 6,28 2,67 27,19 67,70 100 2012 4,91 4,54 12,58 6,49 2,45 26,06 69,02 100 2013 5,29 4,16 12,31 6,42 2,05 24,94 69,77 100 2014 5,22 3,77 11,67 6,64 1,89 23,97 70,81 100

Fonte: IBGE - Sistema de Contas Nacionais Referência 2010. Siup: Serviços Industriais de Utilidade Pública: eletricidade, gás, água, esgoto e limpeza urbana.

Essa dinâmica da economia, com crescimento econômico sem alteração da estrutura produtiva desencadeou efeitos contraditórios sobre o mercado de trabalho. Por um lado, o maior nível de crescimento econômico entre os anos 2003 e 2014 ocasionou uma queda consistente na taxa de desemprego e um aprofundamento no processo de formalização com diminuição do emprego sem carteira assinada e das pessoas ocupadas em atividades sem rendimento e por conta própria, como é possível visualizar no gráfico 2. Por outro lado, as ocupações cresceram fortemente nas ocupações de baixa remuneração e nos setores vinculados ao consumo e à construção civil.

No gráfico 2, é possível perceber que a pequena recuperação econômica do início do período causou impactos positivos, embora ainda modestos, sobre a taxa de desemprego. A aceleração do crescimento econômico em 2004 gerou um incremento dos ocupados em maior magnitude que o crescimento da População Economicamente Ativa (PEA), resultando em uma queda na taxa de desemprego de 9,7% neste ano para 8,9% em 2005. Mediante a rápida recuperação da economia e o temor de um novo ciclo inflacionário, a autoridade monetária optou pela elevação da taxa de juros, visando o controle dos preços. O caráter restritivo dessas políticas levou ao arrefecimento do crescimento econômico em 2005 e à diminuição no ritmo de geração de novas ocupações pari passu ao aumento no número de desocupados. Como resultado a taxa de desemprego passou para o patamar de 9,3% neste ano.

Gráfico 2: Taxa de Desemprego e Taxa de Formalização 2003-2014.

Fonte: PNAD. Elaboração Própria. Taxa de Formalização: Trabalhadores formais/Total de Ocupados sem considerar os empregadores. Os trabalhadores autônomos foram considerados informais. Trabalhadores formais: empregados com carteira de trabalho assinada, funcionário público e trabalhador doméstico com carteira de trabalho assinada.

A partir de 2006, a trajetória da taxa de desemprego apresenta uma queda mais acentuada em virtude tanto da intensificação do ritmo de crescimento econômico e da diminuição no ritmo de incremento da PEA. Este último fator foi essencial na redução das taxas de desemprego, uma vez que a diminuição no contingente de pessoas com idade ativa na faixa etária até 25 anos reduziu a pressão sobre a população economicamente ativa e sobre a capacidade de absorção do mercado de trabalho.

A partir desse ano também se intensifica o aumento da taxa de formalização, processo que já havia iniciado ao final dos anos 1990. A formalização, além dos importantes desdobramentos provenientes do maior ritmo de crescimento econômico, está vinculada principalmente, como mostram Krein et. al (2018), ao conjunto de políticas voltadas para a formalização de setores com baixo acesso à seguridade social (autônomos, pequenos negócios de Micro e Pequenas Empresas) e ao fortalecimento das instituições públicas que são responsáveis pela efetivação dos direitos.  Esse movimento foi concomitante à redução do emprego sem carteira assinada e das pessoas ocupadas em atividades sem rendimento e para autoconsumo ou autoconstrução e, também, à redução do ritmo de crescimento dos trabalhadores por conta própria.

Apesar da queda do crescimento econômico e da crise política instaurada no país, as taxas de desemprego mantiveram-se em baixo patamar entre os anos de 2011 e 2014, sendo que em 2012 a taxa atingiu o menor percentual de todo o período (6,1%), mesmo com a queda do número de novas ocupações geradas. Isso se deve ao movimento de intensificação da queda no ritmo de crescimento da PEA. Esse processo está atrelado à tendência de queda no contingente em idade ativa na faixa etária até 25 anos, o que se constituiu como um fator de ampliação dos efeitos do crescimento da economia sobre o mercado de trabalho. As políticas públicas de acesso à universidade, neste sentido, também desencorajaram os jovens a pretenderem ter uma ocupação decorrente da atividade econômica. Em 2014, a taxa de desemprego começa a apresentar índices mais expressivos, quando atinge 6,9%.

Embora os anos de 2015 e 2016 não componham o período analisado nesta pesquisa, vale ressaltar que a taxa de desemprego saltou de 9% no último trimestre de 2015 para 12% no mesmo período de 2016 (IPEA, 2017). Os processos de formalização e de diminuição das pessoas ocupadas em atividades sem rendimento, para autoconsumo ou autoconstrução também vem perdendo força ou mesmo sofrendo uma reversão de tendência a partir de 2014. Com a queda no nível de atividade e inflação elevada em 2015, o cenário de melhoria dos indicadores do mercado de trabalho demonstra seu esgotamento e a velocidade de reversão do ciclo de 2014 em diante é surpreendente pela intensidade se comparada às dinâmicas de países da América Latina, como a Argentina que, apesar da reversão do ciclo, não apresenta movimentos tão abruptos (CEPAL; OIT, 2016).

O outro lado desse processo de aumento do assalariamento e da formalização foi o tipo de emprego gerado. Embora tenha ocorrido um crescimento generalizado do emprego em todos os setores (com decréscimo somente no emprego agrícola) e em todas as faixas de remuneração (com exceção somente das ocupações com até meio salário mínimo), foram os setores vinculados ao consumo e induzidos por ações governamentais para o desenvolvimento de segmentos específicos que geraram a maior parte das ocupações.

O gráfico 3 mostra que os grupos de atividade com maior dinamismo em termos de novas ocupações foram aqueles fomentados indiretamente pelas políticas de renda e de facilitação do crédito aos mais pobres que, via consumo, impulsionaram os setores de alojamento e alimentação e de transporte, armazenagem e comunicação. Por exemplo, o setor da construção civil, que apresentou o maior crescimento do emprego nos anos analisados, foi beneficiado pelo

avanço do crédito imobiliário, pelo programa Minha Casa Minha Vida e pelo inciativas no bojo do Programa de Aceleração do Crescimento e da Copa do Mundo sediada no Brasil em 2014. Nesse setor52 se encontram as maiores taxas de rotatividade no país. Além disso, esses setores de atividade são, justamente, os que apresentam maior peso das ocupações de menor remuneração (entre meio e 2 salários mínimos), como mostram Baltar, Souen e Campos (2017). Isso explica porque as ocupações cresceram fortemente nas atividades de baixa remuneração, como mostra o gráfico 4. Ao mesmo tempo o crescimento dessas ocupações foi acompanhado pelo processo de